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Full text of "Sermoens do P. Antonio Vieira, da Companhia de Jesu, visitador da Provincia do Brasil, Prègador de Sua Magestade. Quinta parte"

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SERMOENS 

D  O 

P.  ANTÓNIO  VIEIRA, 

DA  COMPANHIA  DE 

J  E  S  U, 

VISITADOR  DA  PROVÍNCIA  DO  BRASIL, 

Pregador  de  Sua  Mageftade. 

QVINTA  PARTE. 


LISBOA, 

NaOíficinadcMIGUEL  DESLANDES, 
ImpreíTor  de  Sua  Mageftade. 
A  cufládc  António  Leytc  Pcrcyra,  Mercador  .deLivros^ 

"^  M.DC.LXXXIX. 

Com  todas  as  lianfas  necejfarias^^  Trjytlegh  Reah 


.^■■. 


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V- 


-M  If  tt  MÂÈàààààêààà--àMàÈà 


CENSVKA  DO  M.RP.M.  Fr.  ANTÓNIO  "DE  SANTO 

Thmás,  Kellgiefo  da  Seráfica  Ordem  deS.Francife», 

^dificador do  S.Officio, 

Eminentíssimo  Senhor.. 

VI  cfte  Livro,  quinta  Parte  dós  Sermoens  do  P.  M.  Ante- 
nio  Vieira,  da  Religiofiflima  Companhia  dejESU  ,  & 
Fresador  de  S.  Mageftade:  he  Livro  Quinto  em  numero  ,  & 
noexcellente,entreosdoAuthorpòdefer  primeiro:   fendo 
que  tudo  feu.competindo  fó  entre  fy,náo  parece  ter  fegundo , 
&affimefte,comosmaisem  equilibno,  bem  parece  eíFeito 
do  finsular  engenho  do  tal  Authori  pois  nelle,  como  nos  ou-  > 
tros,  o  efpirito.Sc  eftilo  he  o  próprio,  corrente,  &  o  mais  fobi- 
do,douto,  dócil,  grave,  elegante.  &  tão  claro ,  ^in^a  no  que 
difcorrecomoTheologo,queagentede  toda  a  forte  que  o 
ler,  fe  faràinteliigivel  (  fegundo  a  capacidade  de  c^da  hu»  J 
o  fcudifcurfo:  graça  fem  igual  de  táo  efclarecido  Pregador, 
&náohedefigualàquenáofónefte,  mas  em  q^afi^^doso* 
feus  efcrkos  moftra  a  experiencia,que  ate  no  vulgar  da  Efcri- 
tura  fanta,  fobre  que  conceitúa,&  prova  como  Elcr.turario. 
fe  avantaiatanto,queemvulgaridadesma.sufuaesdella,  & 
mui  repetidas  a  cada  panro.innova  rariffimos  conceitos,  & 
adm  iráveis  provas  o  feu  juizo  -,  &  por  iflo  parece  ao  de  alguns, 
depois  de  lido  em  qualquer  Livro  feu  C  como  ja  pareceo  ao  de 
muitos  ,  quando  ouvido  efte  grande  Pregador  em  «  Pu  P  to  J 
que  diráó  o  mefmo  que  elíê diz,mas  letn  que  o  venhao  a  d  zcr 
nunca,todosopublicáofempre  (  publicidade  que  também 
merecerá  a  licáo  defte  quinto  Livro  )  por  unico  nefta  vei.ta- 
3  f  ij  '  gem. 


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gem.  Efta  ventagem,&:  as  mais  que  refpekão  todos  neíle  Au- 
thorà  competência,  o  dáo  a  refpeitar  por  maior  que  toda  a 
emulação  j&aífim  parece  de  \^eras,f>oisna6  fó  para  comef-' 
tranhos,  mas  para  com  Portuguezes,onde  aqueila  he  mais  vi- 
va, vive  geralmente  applaudido  pelo  fogeito  na  predica  mais 
extremado  j  &  não  paíTa  o  extremo. a  exceílb  neíle  geral   ap- 
plaufoCfendoode  naturaes  como  impoiTivel  3  porque  pri- 
meiro elles  com  a  voz  de  ellranbos  o  reconhecem  Prècrador 
em  tudo  peregrino,  todo  difcreto,  todo  politico,  todo  erudi- 
to,^: eloquente  todo:  incomparável  emfim  no  bem  que  in- 
ílrue^  perruade,rende,&  edifica  quanto  ao  efpiritoj  como  fe 
ye  particularmente  em  os  Sermoens  vários,  que  contem  eftc 
Livro,  que  todo  nefta  fua  variedade,  com  o  aííeio  do  idioma 
Portuguez  mais  dei eitavel,  eílà  refpirando  doutrina  íanta, 
conforme  em  tudaaaoíTa  Santa  Fè  Isc  bons  coftumes.  Pela 
que  fera  beneficio  cómura,&  mui  do  ferviço  de  Dcos  conce- 
dera licença  queíe  pede  ,  para  que  fe  publique  mediante  a 
imprenta.  Lisboa^  Convento  de  S.  Franciíco da  Cidade,  enu 
,  50.de  Abril  dei  d8  a, 

Fr.  António  de  Santo  Thomâs, 

Cenfura  do  M.  R.  P.  M.  Fr,  Thomè  da  Conceyç^oJa  Sagrada^ 
Ordem  do  CarmOyQHaltficador  do  Santo  Offiao^ 

Eminentíssimo  Senhoil. 

Vleíla  quinta  Parte  dos  Sermoens  do  P.  António  Vieír^i 
da  fagrada  Religião  da  Companhia  dejEsu,  &  Prèea- 
dor  de  Sua  Mageftade-,  &  acabando  de  os  ler  com  attençaó> 
leni  achar nelles  coufa  algua  digna  de  reparo,admirando,  naõ 
lei  fe  o  genio,ou  arte  defte  'mÇ\'^nç:  talento,  fó  íç:i  dizer,que  os 
léus  Sermoens  faó  dignos  de  maispreciofa  eílampa,  que  a  da 
comum  imprenfai&:  o  mefino  juízo  que  jà  formei  fobre  ou- 
tros reus,fórmo  agora  dcíles.  Lisbo;i,em  o  Convento  do  Car^ 
n^o,  ^o.deMayodcióSS. 

lr.Tij07Mè  daConcey^aa,  " 


"^htfffiiTin 


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Cenfura  doP.M.  Manoel  de  Souja^  Prepopâ  da  Cengrtgafa» 
do  Ovíttono  de  S.  Felippe  Neru 

SENHOR. 

POr  mandado  de  VoíTaMageftade  vi  eítes  Sermoens  ã^ 
P.  António  Vieira,da  (agrada  Companhia  dejEsu.  O  no- 
me dofeu  Author,que  trazem  na  primeira  pagina ,  baíía  para. 
o  maior  elogio  defta  obra.  Qae  muito  faça  o  nome  do  P.  An- 
tónio Vieira  impreíFojO  que  Valério  Máximo  diíTe  do  nome 
de  Demoftbenes ouvido:  CuJ!4s  cÕwemorato  nomine  máxima 
eloquentͣ  confiimmatia  audkntis animo  oboritur  >  &  com  tanta 
mais  raza5,quanto  he  mais  aplaudido  em  todo  o  mundo  o  F^ 
António  Vieira  por  Frincipe  da  eloquência  lagrada,.  do  que 
o  foi  Demoíthenes  porPrincipe  da  eloquência  Girega.   E  ju« 
ftamente  he  nk.i& aplaudido,  pois  be  entre  todos  os  Pregado* 
res,  o  queo  Sol  entre  todas  as  luzes.  Santo  Agoílinho  dizjquc 
o  Sol  he  próprio  fymbolo  do  Pregador  Evangélico :  &  deite  a 
heproprijílimos^porquenellere  vem  todas  as  propriedades 
daSol,naó  fóao  vivo,  mas  comi  exceílb.  Ao  Sol  chamou  o  Ec- 
cleííafticoinftru mento,  ou  vafoadmiravel  do  todo  Poderofoy 
êcobr3,díga3.doA\ú{rimo:Fafadmirabiky0j>usExcelJí.^ 
mais  admirável,  que  o  P.  António  Vieira  rios  feus  Sermoeas ,. 
admiráveis  em  tudo,  como  procedidos  do  feu  entendimento, 
vafo  de  luzes  verdadeiramente  admirável :  Fas  admirabiile  ^ 
&  obra  íingul  ar  de  Deos ;  Opiis  Excelfi  que  parece  o  fez  co  jai 
erpecial  providencia,  para  que  viíTemos  atè  donde  pôde  che* 
gar  o  entendimento  humano  ajudado  do  poder  Divino.  Ab- 
iorve  o  Sol  a  luz  de  todos  os  aftros :  com  a  do  P.  António  Vi- 
eira parece  que  fica  abforta  a  dos  mais  engenhos.    A  luz  do 
Sol  faz  manifeílos  os  lugares  mais  tenebrofos :  a  intelligencia. 
doP.  António  Vieira  faz  claros  os  lugares  da  fagrada  Efcri- 
tura  mais  efcuros.  Penetra  o  Sol  aprofundidade  dos  abifmosj, 
para  iielles  formar  o  ouro^  &  os  diamantes^:  penetra  o  P.  An* 
tonio  Vieira  os  cora^oens  humanos^abifinos  mais  profundos, 

&comi 


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gc  cem  a  cíficadadafuaperfuaraô  introduz nellesoouro  pu- 
ro da  caridade,  &  os  diamantes  das  folidas  virtudes.    Único 
heoSol:&oP.  António  Vieira  também  he único:  he o  Fé- 
nix do  noíío  feculo ;  fabuloíb  he  o  Fénix,  mas  verdadeiro  no 
que  repreíenta;  o  verdadeiro  Fenix(^  como  em  vários  luga- 
res prova  o  doutiílimo  P.Cornelio  AlapideJ)  he  o  Sol :  porque 
para  reprefentar  as  qual  idades  defte  Planeta  invétáraó  os  E- 
crypcios  efta  fabula ;  ao  que  (no  fentir  do  mefmo  Author^alu- 
dio  o  Profeta  Malachiasántroduzindo  ao  Sol  com  pennas,  ou 
com  azas  •,  he  pois  o  Sol  Fénix  da  esfera  quarta:  &  o  P.  Antó- 
nio Vieira  Fénix  da  noíTa  Esfera  -,  Fénix  efcrevendo,  melhor 
que  o  Sol  voando  5  Fénix  fó  com  a  pcnna  de  feus  efcritos^me- 
Ihor  que  o  Sol  com  as  pennas  de  feus  rayos.  Defta  forte  fe  vem 
retratadas  nefte  Sol  racional  as  propriedades  do  Sol  viíivel. 
Forem  não  fó  as  retrata  ao  vivo,  mas  com  exceíTo  -,  porque  a 
luz  do  Sol  não  fe  dilata  mais,que  por  hum  hemisfério ,  &  a  do- 
P.  António  Vieira  por  dousj  eftando  no  da  A  merica,tambeni 
allumea  ao  da  Europa^  quando  refide  aíèm  da  Linha,refplan- 
dece  em  Lisboa,  &  delia  por  meyo  da  imprenfa  em  todo  o 
mundo.  O  Sol  tanto  que  declina  para  o  occafo,modéra  os  ref-. 
plandoresto  P.  António  Vieira,taó  declinado  jà  pelos  annoS' 
ao  feu  occafo,  reforça  agora  mais  as  luzes  Emíim,o  Sol  jà  pa- 
rou, &  jàretrocedeo  :6c  o  P.  António  Vieira  nunca  rctroce- 
deo,nem  parou  j  nunca  parou  no  zelo  ,  nunca  retrocedeo  no 
eftilo.  Não  ha  coufa  neítes  Sermoens,que  dcfdiga  do  real  fer- 
viço  de  Voífa  Mageftade }  &  fe  alguém  fentiíTc  o  contrario,fe 
lhe  poderia  dizer  o  que  Pithagoras  diíTe  do  Sol :  Contra  Solem 
ne  loquaris;  Do  Sol  naó  ha  que  dizer:  do  P.  António  Viena  naó 
ha  que  notar.  Oqueeuquizera,Senhor,he,que  todos  os  que 
leíremefLCsScrmoens,fcnaófatisfizeíremfóda  fua  luz  ,  mas 
que  também  fcdcixaíTem  penetrar  do  feu  calor  i  a  luz  lhe  iii- 
fundiofeu  Author  pelo  entendimento  j  o  calor  pelo  clpuitoj 
aluzheplaufivei,  mas  ocalorutil  imuitos(comoordinai  ia- 
nientc  fixede  no  mundo  }  naó  fazem  cafo  do  útil  ,  fazem  uo- 
do o cafu do piaufivcl  i  cmbcbcmfc  de  todo  noplaulivcl  áo 


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conceito,  que  os  lifongea  j  deíxaó  o  útil  do  efpintOjque  os  de- 
fengana  j  &  depois  de  húa  liçaó  taó  efficaz,  como  a  dtíícs  Ser^ 
moensjficaó  com  os  entendimentos  admirados,  mas  com  os 
coraçoens  taò  frios ,  como  antes,  no  amor  de  Deos.  A  fanti- 
dade,6c  virtude  naóconfifte  nas  efpeculaçoens  do  entendi- 
mento, mas  nas  determinaçoens  da  vontade  5  fe  a  vontade  naô 
tiver  calor  para  bem  obrar,  pouco  importa  a  luz  do  entendi- 
mento, que  para  no  entender-,  deve  pois,  quem  ler  eftes  Ser- 
moens,attenderniaisaocalordoerpirito,  que  fe  encerra  na 
fua  doutrina,  do  que  à  luz  do  entendimento ,  que  fe  difunde 
na  fua  elegância.  Seja  a  conciufaó  a  do  mefmo  Ecciefiaítico, 
q\ji3,ndolouv3.^o Sol: MagnusT>ommus,qmfecit  illum^  &  in 
Sermonibus  ejusfeftinavit  iter  5  naó  ha  melhor  modo  para  iou- 
varao  Sol,que  louvar  a  Deos,que  o  criou  taó  luminofo  vaííim 
tambê,à  villa  do  Sol  defte  felicilli  mo  engenho,  o  melhor  lou- 
vor he  louvar  a  Deos,que  o  fez  taó  fabio.  O  Sol  faz  o  feu  cami- 
nho com  a  palavra  de  Deos:  &oP.Antonio  Vieira  com  a  pa- 
lavra de  Deos  faz  o  feu  caminho :  In  Sermonibus  ejusfeftinavit 
iter,  O  Sol  com  a  palavra  de  Deos  faz  o  feu  caminho  pelo  Zo- 
diaco,  que  fe  divide  por  doze  íignos:&  o  P.  António  Vieira 
com  a  palavra  de  Deos  faz  o  caminho  dos  feus  Sermoens,que 
divide  por  doze  Tomos,  que  faó  os  doze  íignos  deíle  Sol.  De- 
fte  nu  mero,  que  nos  prometeona  primeira  Parte,  he  eíta  a 
Quinta  5  importa,queapreíre  as  mais,&que  VoíTa  Mageílade 
iho  mande allim,  para  que,  como  Sol,  lhe  naó  falte  eíla  pre- 
rogativa  da  diligencia,&  fe  diga  entaó  cabalmente  deIle,G  que 
do  Sol :  Et  in  Sermonibus  ejus feftinavit  iter.  Eíle  he  o  meu  paf 
recer,  fe©  pôde  dar  nefta  matéria,  quem  como  eu  ,  tem  taó 
pouco  de  Águia ,  pois  fó  as  Águias  podem  examinar  os  rayós 
do  Sol.  VoíTaMageftade  mandará  o  que  mais  for  de  feu  fer- 
viço.  Lisboa,  &  Congregação  do  Oratório,  26.  de  Junho  de 
a688. 


Mmeelde  Souja, 


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LICENÇAS 

Da  Religião. 


ç    ,^    ^ 


Eu  Alexandre  de  Gufmaó,  da  Companhia  de  Je5u,  Pi-o^ 
vincial  da  Província  do  Braíll ,  por  efpecial  comiíTaó, 
que  tenho  de  noííb  M.  R,  P.  Vigário  Geral  Domingos  Maria 
de  Marinis ,  dou  licença  para  que  fe  poíTa  imprimir  efte  quin* 
toTomodosSermoensdoPadre  António  Vieira,  da  mefma 
Companhia,  Pregador  de  Sua  Mageftade,  o  qual  foi  revifto , 
&  approvado  por  Religiofos  doutos  delia,  por  nòs  deputa- 
dos para  iíTo.  E  em  teftemunho  da  verdade,  dei  eílaaílinada 
com  meu  final,  &  feliada  com  o  Sello  de  meu  Oificio.  Dada 
na  Bahia  em  1 2 .  de  Agoíto  de  1 687. 

Alexandre  de  Gufmao. 


Do  Santo  Oificio. 

V Tilas  as  informaçoens,  pòdemfc  imprimir  os  Sermocnf 
de  que  eíla  petição  faz  menção,  Author  o  P.  António  Vi* 
«ira  da  Companhia  dejefu ,  &  depois  de  impreíTos,  tornaráò 
para  fe  conferir ,  &  dar  licença  que  corraó,&  fem  ella  naó  cor? 
xeráó.  Lisboa  o  primeiro  dejunho  de  1688. 

Jeronyma  Soares.     Joaõ  da  Cofta  "P  intenta. 
Bento  de  Beja  de  Noronha.     Tedro  de  At  t  ai  de  de  Caftrs, 
fr  Kicente  de  Santo  Thomás.  Eftevao  de  Brita  Fo^ês, 
loao  de  Azevede, 


Do  Ordinário^ 

POdcmfe  imprimir  os  Sermoens^de  que  a  petição  faz  men- 
ção, &  depois  de  impreíTos  tornaráó,  para  fe  conferirem, 
&  fe  dar  licença  para  correr,&  fem  ella  naó  correráó.  Lisboa 
20.  de  Junho  dei  688. 

òerrao. 


Do  Paço. 

POdemfe  imprimir ,  viftas  as  licenças  do  Santo  Officio,  Sc 
do  Ordinário,  Sc  depois  de  impi  eílbs  tornaráó  à  Mefa  pa- 
ra fe  conferirem,  &  taixarem,&  fem  iífo  naõ  correráó.  Lisboa 
28.  de  Junho  de  1 688. 

MelloT.         Lamprea.        Ribeyro. 

lOncorda  com  feu  original.  Carmo  de  Lisboa  1 8.  de  Fe- 
vereiro de  168^. 

Fr.Thomè  daConceiçãê. 


V 


líloeftar  conforme  com  feu  original,  pôde  correr.  Lis- 
boa 1 8.  de  Fevereiro  de  i  (58p. 

Jeronymo  Soares.     JoaÕ  daCofta^imenta, 

Bento  de  Beja  de  Noronha,     ^edro  de  Attaide  de  Cajlre. 

Fr,  Ficente  de  Santo  Thomâs.  Eftevae  de  Brito  Fops, 


Ode  correr.  Lisboa  ip.  de  Fevereiro  de  1 6  8p» 

Serrão. 


'Aixaòefte  Livro  em  doze  Toíloens.  Lisboa  21.  de  Fe- 
vereiro dei  6  85). 


Roxas.     Lamprea,     Marchao.     Riheiroi. 

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r;>    (Jk   rp    f^   t^y    -^ 


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SERMOENS. 

Que  contém  eíta  Quinta  Parte. 


1. 

11 
111. 

IK. 

V. 

VI. 


SErmão  da  primeira  T>ominga  do  Advento.         ^^g  i . 
Sermão  dafegunda  T^ominga  do  Advento.       ^^g-  f  ^. 
Sermão  da  terceira  T>ominga  do  Advento.  ^^g-  S  S» 

Sermão  da  quarta  T>ominga  do  Advento.  ^^g- 1  *  i  • 

Sermão  de  no(fa  Senhora  da  Conceição.  ^^g- 1^8. 

Sermão  da  T>ominga  decima fext a  fof  Tente- 
coften.  Tag. 191» 

Vil.  Sermão  do  Sacramento  em  dia  do  Corpo  de  T>eos 

na  Encarnação.  Tag.i^u 

Flll.Sermão  de  S.Gonçalo.  Tag.1^1, 

IX.  Sermão  da  T>ominga  vigefitnafigundapoji  Ten- 

tecojfen.  Tag.^^iç. 

X.  Sermão  de  no  ff  a  Senhora  da  Graça.  Tag .  3  <^3 . 

XI.  Sermão  de  S.  hão  Evangelijia.  Tag .  4,04. 

X II.  Sermão  dafegunda  "Dominga  da  §}uarefma.  Tag.  43 1 . 
XllL  Sermão  de  Santa  Barbara.  Tag.^j  i . 
XIF.  Sermão  do  fabbado  antes  da  T^ominga  de  Ra^ 

mos.  Tag.^o^í 

XV.  Sermão  de  S. hão  Bautijia,  "P^^ll- 


Erratas  ãejla  ãluinta  Parte. 


?agin. 


Ifl. 

Sevoshadepczar. 

If(^. 

^£rms. 

156. 

Náo,porque  os  ou- 

tros fagrados. 

3^P' 

E  certamétCjquan- 

do  fc  não  coníide- 

raíTe. 

37P- 

Quereis, 

461. 

Redaet, 

52P. 

Derrubados  dos  al- 

tares hião  caindo 

as  imagens. 

Í9^ 

Ebem, 

Se  vos  naó  ha  de  pezar.  ^ 
SlUiSretis. 

Não,porque  os  outros  li- 
vros  fagrados. 
E    certamente    parecia 
imaginário  o  remédio, 
quando  fe  não  coníide- 
raííe. 
Querieis. 
Reddet. 

Derrubadas  dos  altares 
hiáo  caindo  as  ima- 
gens. 

Nem; 


SERMAM 

DA  PRIMEIRA  DOMINGA 

DD 

AD V  ENT  O 


C(elum^&  terrAtranJibunt*.  njerbaautemmea  non 
tranfibunt,  Luc.21. 


§.  I. 

AíTarào  GeOjSc 
a  terra  ,  mas  o 
que  dizê  as  mi* 
nhãs  palavras 
naópaíFarà.  C6 
efta  notável ,  &  naó  ufada 
fentença  conclue  Chrifto 
RedemptornoíTo  a  narra- 
ção do  Evãgelho,  que  aca- 
bamos de  ouvir.  Diz  que 
h^  de  vir  julgar  ,  &  pedir 
•  Tom./. 


conta  ao  mundo  no  ultimo 
dia  delle :  &  porque  antes 
de  o  mundo  fer  julgadojha 
deferabrazado  primeiro,. 
6c  convertido  em  cinzas  5 
fobre  o  incêndio,  que  o  ha 
deconfumir,  cae  a  primei- 
ra parte  da  concluíaó :  C£-  lu 
lumy  &  terra  tranfibunt  3  &  ^  ^ 
fobre  a  conta  que  depois 
promete  ha  de  tomar  ^ 
todo  o  género  humano, 
çae  a  fegunda:  FL{rbaautem 
Ar^  mea 


I 


n 


2  Sermão  da  prime  ir  a^ommgâ 
7nsa  nmi  tranjibunt.  Eíles  verá  também  ,&  com  ma- 
faó  os  dous  maiores  por-  ior  aíTombro,  que  nenhúa 
tentos,  que  no  theatro  uni-  delias  paíTou  ^  jion  tranfi' 
verfal  do  juizo  veráó  na-  bunt.  Eftas  duas  verdades 
quelle  dia  Homens,  &:  An-  pois,  cuja  fé  o  mefmo  íu- 
j-os.  Allifeverà  o  princi-  premojuiz  com  tanta  ex- 
pio do  mundo  junto  com  o  preíTaõ  nos  ratifica  :  eftes 
fim,  &  o  fim  junto  com  o  dous  defenganosja  que  táo 
principio;  o  principio  com  mal  nos  perfuadimos  os 
o  fiai,  em  tudo  o  que  paf-  mortaes  em  quanto  vive- 
fou,  &ofimcom  oprinci-  mos  :&  eftas  duas  coníl- 
pio ,  em  tudo  o  que  nao  ha  deraçoens  do  que  paílbu  > 
de  paíTar.  Parece  difficul-  &  do  que  náo  ha  de  paíTar , 
tofa  efta  união  em  tanta  tranjibunt  ,  &  non  tranfi- 
diftancia  de  feculos  j  mas  himt^  feráó  hoje  os  dous 
effe  he  ,  &  fera  hum  dos  pólos,  ou  pontos  do  meu 
maiores  milagres  daquel-  Difcurfo.  No  primeiro  ve- 
ie dia;  porque  tudo  o  que  remos,  que  tudo  paíTa:  no 
paílbu,  &  deixou  defer,  &  fegundo ,  que  nada  paíla. 
defapareceocomotempo,  No  primeiro  ,  que  tudo 


como  fenão  tivera  paílà- 
ào  5  ou  tornara  a  fer  de  no- 
vo, ha  de  aparecer  com  a 
conta.  Se  olharmos  para 
todas  as  coufas  quantas  ou- 
ve, ha,  &  ha  de  haver  no 
mundo,  então  fe  verá,  que 
todas  paílaraó ,  tranjibimt. 
Was  fe  olharmos  para  eílas 
mefmas  coufas  ,  as  quacs 
como  refufcitadas  com  o 
género  humano  háo  defer 
citadas  com  elle  para  apa- 
recer cmyuizo  s   então  fc 


paíTa  para  a  vida  :  no  fe- 
gundo,que  nada  paífa  para 
a  conta.  Emdiataó  gran- 
de naó  pôde  o  Sermaó  fcr 
breve.  Aos  ouvintes  naó 
peço  attençaõ,  mas  paci- 
ência. Deos^a  quem  tomo 
por  teftemunha  de  que 
procurei  naó  lhe  dar  conta 
do  que  hoie  difler,  fc  lirva 
denosafliílira  toáos  com 
fua  graça  em  ma  teria  que 
tanto  toca  a  todos. 

■ê-  II. 


doAdnjentõ.  ^ 

cional  tão  importante  fc 

^,  II.  edendeíTetambemàscou- 

fasnaturaeS3&:  indiíferen- 

3   ^T^UdopaflasSc  nada     tes,  inventou  o  Apoílolo 

X  P^^^a.   Tudo  paíla     S.  Paulo  hum  notável  ad- 

paraavida  ,  &:  nadapaíTa     verbio.  Equal  foi  ?  íHc??- 

paraaconta.   A  verdade,     quam  noriy  como  feníoiUí' 

^defengano  deque  tudo     qtáhabentuxoreSitanquaffP 

paíTa^  quehe  o  noíTo  pri-     non  habentes  fint :    &  qui  ^  ç^,^ 

meiro  ponto)  poílo  que  fe-    flent^  tanquam  non  f entes  :  t^j» 

ia  por  húa  parte  taô  evi-    &  qui gaudent  ,  tanquam 

dente,  que  parece  nam  ha     non  gaudent  es :  d^  ^///  €mút\ 

miíler  prova ,  he  por  outra    tanquam  ncnpofffaentes :  & 

quiutimttirhoc  mundo  ^tan- 
quam non  utantur.  Sois  ca- 
fado?  (diz  o  Apoílolo} 
pois  empregai  todo  o  vof- 
fo  cuidado  em  Deos  ,  co- 
mo fe  o  naó  fôreis.  Ten- 
des occaíioens  de  trifteza  ? 


taó  difficultofo  >  que  ne 
fthua  evidencia  bafta  para 
o  perfuadir.  Lede  os  Fi- 
lofofos^ledc  os  Profetas, 
lede  os  Apoílolos ,  lede  os 
Santos  Padres  5  &  vereis 
como  todos  empregarão  a 


penna,  &  naó  húa,  fenaó  pois  chorai  ,  como  fenaó 

muitas  vezes,&:  com  todas  chorareis.  Naófaò  de  tri- 

f.s  forças  da  eloquência,  na  íleza,  fenaó  de  goílo  ^  pois 

declaração  deíle  defenga-  alegraivos  ,  como   fenaó 

nojpoíío  que  por  fy  meA  vos  alegrareis. Compraíles 

mo  taõ  claro.  o  que  havieis  mifter  ,  ou 

5      Sabiamente  fallou  defejaveis  ?  pois  poíTui-o , 

quem  diíTe  que  a  perfei-  como  fe  o  naó  poíTuireis. 

çaó  naó  coníiíle  nos  ver-  Finalmente  vfais  deaigúa 

bos,  fenaó  nos  advérbios:  outra coufa  deíle  mundo? 

naóemque  asnofiasobras  pois  ufai  delia  ,   comofe 

fejaó  honeílas,  8c  boas5fe-  naóufareis.  De  forte  que 

naó  em  que  fejaó  bem  fei-  quanto  ha ,  ou  pode  haver 

tas^  E  para  que  eíta  condi^  nefte  mundo,por  mais  que 

Ai]         nós 


í 


Ibidem 
3'r 


4  Sermão  da  primeira  dominga 


nos  toque  no  a  mor, na  uti- 
lidade, no  goílo  3  a  tudo 
'quer  S.  Paulo  qacrecen te- 
mos hum,  como  Ccnaòjfan- 
■qí-iam  non.  Como  íenaó  ou- 
vcra  tal  couíli  ,  como  fe 
naó  fora  nofla>  como  íenaó 
nos  pertencera. E  porque  ? 
Vede  a  razavõ  :  ^pratertt 
€nhyi  fia^nra  bujiis  mundi. 
Porque  nenhua  couíli  de- 
ite mundo  pára, ou  perma- 
nece, todas  paíTaó.  E  co- 
mo todas  paÍlao,&:  fao  co- 
mo íe  naó  forao ,  aílim  he 
bem  que.nòs  ufemos  del- 
ias, como  ife  naó  ufáramos: 
Tanqnamnonutantur,  Por 
iíTb  a  eíTas  mefmas  coufas 
naó  lhe  chan^uo  Oráculo 
do  terceiro  Ceo  coufas, 
ienaó  aparências  j  &  ao 
mundo  naó  lhe  chamou 
mundo  ,  íenaó  íigura  do 
m  u  p  do :  Traterit  enlm  fi- 
gmajjujíis  nnmdi. 
,  4  Canfideraime  o  mu- 
do defdc  ícus  principies , 
&  velolicisíbmpre  ,  coma 
nova  figura  no  thcatro  , 
aparecendo  ,.&  dcíapare- 
çendo  junta  mente^porque 
íempi*c  paifando.  A  pri- 
meira ílcaa  dcilç  clicaa-o. 


foioParaifo  Terreal  ,  no 
qual  apareceo  o  mundo 
vefrido  de  iijimortalidade, 
&  cercado  de  deliciasj  ma^ 
quanto  durou  eíl:a  aparên- 
cia? Eílendeo  Eva  o  bra* 
çoá  fruta  vedada  ,  ôc  no 
breviílimoefpaço,em  que 
o  bocado  fatal  paíTou  pela 
garganta  do  homem  ,  paf- 
Ibu  também  com  elle  o 
mundo  do  eílado  da  inno- 
cenciaaoda culpa,  da  im- 
mortalidade  á  morte  ,  da 
pátria  ao  defterro ,  das  flo- 
res às  efpinhas,  do  defcan- 
foaostrabalhos,&:da  feli- 
cidade fumma  ao  fummo 
da  infelicidade,  &:  miferia. 
Oh  miferavel  mundo>  que 
feparárasafiím,  6c  te  con- 
tentaras com  comer  o  teu 
paó  com  o  íuor  do  teu  ro- 
ílo  ,  foras  menos  mifera- 
vel!  Mas  naó  ferias  mun- 
do, fe  de  húa  miferia  gran- 
de naó  paíraíTcs  femprc,  & 
por  tua  natural  inclinaçaó> 
a  outra  maior.  Os  homens 
naquella  primeira  mfancia 
do  mundo  todos  vcíHao 
depellcs  ,  todos  crão  de 
húa  cor,  todos  falhivão  a 
mcfinaUngua,  todos  guar- 
' da vão 


'^ 


íím^  ley-  Mas    losçx' 


davão  a  rneíS^  ley.  Mas    losçx^  natureza, hoje die- 
iião  foi  muito  o  tempo  em     gar^não  a  hum  feculo,rnas 
que  fe  conferrárão  na  ar-     perto  delle  ,  he  milagre, 
monia  deíla  natural  irmá-     Tardarão   em   pafíar   ate 
dade.  Logo  variarão  ,  &     Noe,  6c  também  paíTárão. 
niudáráoaspelles  comtã-     Com.  aquellas  vidas  náo 
tadifl-erença  de  trajos.que     fó  crecião  os  annos,  fenam 
cada  âh  de  pès  x  cabeça     também  os  corpos  :  &c  dos 
aparecem  com  nova  íigii-     filhos  de  Deos,  que  erão  os 
ra.  Logo  variarão,  &  mu-   ,  defcendentes  de  bethj  êc 
darão  aslínguas  com  tanta     das  filhas  dos  homens,  que 
.diíronanciaj&confuram,     erão  as  defcendentes  do 
xomoadaTorredeiBabeL     Cain  ,nafGérãoos  Gigan- 
Logo  variarão,  Sc  mu  darão     tes,  de  quem  diz  a  Efcritu- 
ascorescomadiverfidade    ra,:  Erant  Gigantes  fuper 'f^f 
das  terras  &  clipas  ,  Sc    torram.  Alguns  oíTos  que 
com  a  miftura  do  fangue,     ^linda  durão  à^^ç.s  que  o 
poílo  que  todo  vermelho.   ,  pi. efmp  ^  Texto     fagrado 
Logo variárão5& mudarão     chama  V"aroens  famofos, 
:is  leys,  não  com  as  de  Pia-     demoílirãQ  pcla^  fymetria 
tão,  Sólon  5  ou  Lycurgo ,     humana ,  que  não  podião 
mas  coma  do  mais  impe      fer  menos  qiíe  de  vinte,  & 

mais  covados :  &  ainda  na 
hiftoria  das  batalhas  de 
David  temos  memoria  de 
outros  quatro  ,  pofto  que 
de  -muita  menor  eftatúra. 
Mas  eiiifim  acabou  a  era 
dos  Gigantes  >  porque  tu- 
do neíla  vida  ,  éc  mais  de- 
^preíTa^o  que  he  grande, 
acaba,&paíía. 
.  , "  6     Diminuídos  os  ho- 


rioíb,  &  violento  Legifla- 
dor,  que  hc  o  próprio  alve- 
driq.TudomudárãOjOU  tu- 
do íe  mudou  j  porque  tu- 
do paíTa,  í  -r 

f       As  vidas  naquellc 

principio   coílumavão  fer 

.  ,cie  fete,  d e oito  ,  de  no ve- 

-  centos,  3c  quaíi  de  niil  an- 

...nos  j&  que  brevemente  fe 

.acabou  eíle  bom  coíiume  ? 

Então  oviver  muitos  íecu- 

Tom 


•/ 


mens  nos  corpos  , 
A  iij 


Sc  nas 
ida^ 


I 


1^ 


h.  í 


y 


1 


^  Sermão  daprimeira^omtn^a 

íàiáts  y  quando  tinhão  a     rios  a  hum  Key  5  &  a  Á6m 

morte  mais  perto  da  vifta,     Profetas:.    A  primeira  vi- 


Cquem  tal  crera!  ')  então 
creçérão  mais  na  ambição, 
&foberba.  E  íèndo  todos 
iguaes,  &  livres  por  natu- 
reza, ouve  alguns  que  en- 
trarão em  penfamento  de 
fe  fazer  fenhores  dos  ou- 
tros por  violêciaj&j  ocon- 
feguírão.  O  primeiro  que 
featreveoa  pôr  coroa  nà 
cabeça  5  foi  Membroth, 
que  também  com  o  nome 
deNinojOii  Belo  deu  prin- 
cipio aos   quatro  Impé- 
rios 3  0'ci  Monarchias  do 
inundo.  O  priíTkeirò  foi  o 
dos  Aflyrio^,  &  Chaldeos : 
&  onde  eftà  d  Império 
Chaldaico  ?  Ofegundo  foi 
Ò  dos  Perfas :  &  onde  eílà  a 
Império  Perllano?  O  ter- 
ceiro foi  o  dos  Gregos :  & 
onde  cftà  o  Império  Gre- 
go ?  O  quarto,  ôc  maior  de 
todos  foi  o  dos  Romanos  : 
^  onde  cílà  o   Império 
Romano  ?  Sc  algiía  couíli 
jpermanecedeílc,  he  fó  o 
home:  todos  paífárãOípor- 


íaó  foi  a  Nabucodonofor 
na  tftatua  de  quatro  me- 
tacs:  a  fegunda  a  Zacha- 
riaS  em  quatro  carroças  de 
cavallosdediífererítes  co- 
res :  a  terceira  a  Daniel  em 
hum  conílid-o  dos  quatro 
tentos  principaeè,  que  no 
meyodomarfe  dayaó  ba- 
talha. Pois  fe  todas  éítas 
vifoenseraó  de  Deos  ^  & 
todaá  feprefentavaó  oi^ 
ínefmos  Impérios^  porque 
variou  tantd  a  Sabedoria 
divina  asfígitfas,  &:  fobre 
a  primeira  da  Eftatua  taõ 
clara  ,  Sc  nianifcíta  acre- 
Centoií  outra S  duas  taõ  di- 
verfas  em  tudo  ?  Porque  a 
Eftatuana  dureza  dos  me- 
faes  de  que  era  compoíla  j 
ícnòmefmo  nòmc  dcEf- 
tatua^paréce  que  reprefen- 
tava  eílabilidadc,6c  firme- 
za :  ^  porque  nenhum  da- 
quelles  Impérios  havia  de 
perfeverariirmè  >  ^  eíía- 
vci,  mas  todos  íè  havia 6  de 
mudar  fuccel]ívamente,& 


<[ue  tudo  pafia.  Em  trcs  fá-  ir paíTando de  hãas  naçosá 
xnofas  viroeiísrcprefcritou  á  outraáj;  por  illb  os  tor« 
Çeos  çítes  meímos  Jmpe-    jiotí  a  reprcftjit^u:  na  varie- 

..d^dc 


iif 


'^m 


wam 


iifAdvent».  ^              \f 

dadexlasVaírbças,  nain-  quem  havcm  q«e  P^J* 

conftancia  dasrodas,  &  na  comprehender  quato  paf- 

ca"rcira,&  velocidade  d,o5  fou  no   mefmo  mundo? 

cãvallos.   Mas  naó  parou  Qi.ando  começou  o  pri- 

aquiacnergíadarepíefen-  meiroimpeno,  entaocp- 

S,cQmo'naõ  .encareci-  meçou  também  a  idc^la- 

daaindabaftancemente.A  tría,  digno  caftigo  do  Ceo. 

Eftatua  eftava  em  pé,  Çc  as  que  pois  QS  homens  fe  faze- 

carroças podiaóeftar para-  raóadorar  ,  chegaíTem  oç 

Ôas. E porqueaquelleslm-  m,efmos  homens  a  adorar 

perioscgrrendò  maispre-  paos,& pedra?,  OsV^tjf 

?ipitadameníequeàrpdea  ^orèmqueerap,putinhao 

Íblta,na6bayiaô  depara^  fi^oos  idolatras  .canoni^ 

aomefmopaflp,  nem  pqr  zados  depois  vf^^^f^ 

immÍQ mompnto,  &  fem-  ça6,& hfonja.pu pa  vida, 

prcfe   haViaÒ  de  ir  mu-  ftu  depQi?  4^  T"?    It 


.dando,  Sç  paíTandg  5  pprif- 
íb  finalmente  os  reprefea: 
tqu  Deqs  na  couía  mais  in- 
quieta 5  mudável)  &infta- 
Vel,  quaesfaóos  yentos,ac 


nhaó  também  elles  »  fer 
Ídolos.  Aflim Saturno,  af- 
fim Júpiter,  sfliraMercur 
rio  ,  aflim  Appllo  ,  affim 
Marte,  aflim  VenH??  ?flí'7?-. 


muito   mais  quando  em.  Çiana :  &  poftp  que  f qdo? 

bravecidos,&í^iripros:£í  jsftss  deixarão  os  feusno. 

ecce  quatuor  venti  calim^  mes  gravadps  naç  liitreir 

7nabLinmarmagm.  ías,ellaspermane^ni,ma? 

'■    -      ■--        '='  elles palTárao.  Paffarap  PS 

íf    in  idplos,&  também  paflarao 

*■     ■''  os  oráculos  com  que  pelles 

•f  "CM  quanto  paíli-  refpondia o  pay  da Rienti- 

r,  raó  eftes  quatro  ra ;  porque  ao  forn  da  yer- 

'    impen^s,  que  foi  atercei-  dade  do  Eyaiigelhp  tpdpí 

xa,quarra,qmnta,&fext^  ^miide^erao. 

idade  do  mundo,  e«trand9        .§     Ppíaó  começarão  a| 

lambem  'pela'' ^úm.i  pmm^m^ *^"%xS* 


4 


S 

exércitos 

das  batalhas  ca m pães 


& 


Sermão  ãa primeira  dominga 
innumeraveis  ,  apareceo  fendo  desbaraM- 
do,Scvencido,queró  fícoii 
delle  efte  dito.  O  mefmo 
Temifrocles.que  cô  muito 
deíigual  poder  o  desfez,  & 
pozem  fugida  ,  também 
paflbu^comona  Grecia^iSc 


maritimas ,  das  vitorias  &: 
triunfos  de  húas  naçoens, 
&  da  ruina,  abatimento,  & 
fervidaó  de  outras,taó  va- 
ria, &  alternada  fempre? 


Sò  digo,  que  aíHm  a  gloria,  fora  delia  paíTáraÓ  todos 

&  alegria  dos  vencedores,  os  famofos  Capitaen» ,  & 

como  a  dor,  &  afronta  dos  fuás  vitorias.    PaíTou  Pyr- 

Vencidos,tudopaíIbujpor-  rho  ,    paíTou  Mitridates, 

que  tudo  paíTa.  O  exercito  paíTou  Felippe  de  Mace- 

de  Xerxes,  que  foi  o  maior  donia :  paíTáraò  Heitor  6c 

que  vio o  mundo,  confiava  Achilles,  paíTáraó  Anibal 


de  cinco  mil  nãos,.  &  cinco 
milhoens  de  combatentes: 
&  porque  de  húa,  &  outra 

Í)arte  fez  continente  o  He- 
efponto,  &  Cavou  ,  &  fez 
nayegavel  o  mont€  Atho, 
diílè  delle  Marco  Tullio, 
que  caminhava  os  mares  a 
pè,&  navegava  os  montes: 
Tantis  clãffibus  Xerxes  in 
Grã  ciam  tranjijt^  nt  Helef- 
fontojunEío^  Athoqnemxm- 
Occro  tej)erfo{foy7naria  ambularit^ 
lia.buó'.  terramqne  na^uigarit^  mar  ia 
pedibusperagrans ,  clajjibtis 
montes.  Mas  todo  aquelle 
ímmenfo  ,  &  formidável 
apparato,que  viíto  fez  tre- 
mer o.  miu*,  &  a  terra  ,  tam 


&:  Cipiaó ,  paíTiraó  Pom- 
peo  &:  Júlio  Ceíar,  paíTou 
o  grande  Alexandre,  no  me 
fingular,&:fem  parelha,  & 
atè  Hercules,ou  foíle  hum, 
ou  muitos,  todos  paíTáraÓ  > 
porque  tudo  paíTi. 

5>  Coílumaò  as  Letras 
feguir  as  Armas  ,  porque 
tudo  leva  após  fy  o  maior 
poder  :&  aílim  ílorecéraò 
variamentc,&  cm  diverfas 
partes  no  tempo  dcíles 
impérios  todas  as  Ciécias> 
5c  Artes.  Florcceo  a  Filo  • 
foíia,  íioreceo  a  Mathcma- 
tica,fiorcceoa  Thcología,; 
íioreceo  a  A  Urologia,  Íio- 
receo a  Medicina,íioreceo 


brevemente paílbuj.  ^  dcf-    u^Iuíka^  florcceo  a  Ora- 


ão  Advento,  ^ 

tom ,  florecco  a  Poética ,     ca  &  Moral  como  taÕ  ne 


floreceo  aHiftoria,  flore 
ceoa  Archítedura  ,  flore- 
ceo a  Pintura  ,  floreceo  a 
Eílatuaria:  mas  aílim  co- 
mo as  flores  fe  niurchaô,  & 
fecaó,  aíHm  pafiliraó  todos 
os  Authores  mais  celebra- 
dos das  mcfmas  Ciências, 
&  Artes.  Na  Eftattiaria 
paílbiT  Phidias  &  Lyfippo : 
na  Pintura  paflbu  Timan- 
tes  Sç  Apelíes :  na  Archite 


ceíTaria  à  vida3&  à  virtude, 
parece  que  naó  havia  de 
paíTar ;  mas  os  Platónicos , 
os  Peripateticos  ,  os  Epi- 
cureos,  os  Cinicos,  os  Pi- 
tagoricos,  os  Eftoicos ,  os 
Académicos,  elles,  Sc  fuás 
Efeolas  5  ôc  Seitas  ,  todos 
paílarao. 

IO  Nenhua  coiifa  he 
mais  própria  defira  coníi- 
deraçaó   em  que   himos. 


aura  paífouMeliagenes  5c     que  os  jogos,  Sc  efpedlacu- 
Democrates  :    na  Mufica     lospublicos,queoshomês 


paíToii  Orpheo  Sc  Anfion : 
na  Hiftoria,  Tucidides  Sc 
Lívio :  na  Eloquencia^De- 
moftenes  Sc  Tullio  :  na 
Poetica,Ro  mero  &  Virgí- 
lio :  na  Aflrología ,  Anaxa- 


inventarão  a  titulo  de  paf- 
fatempo ,  como  fe  o  meí^ 
mo  tépo  naó  paílara  mais 
velozmente  que  tudo  quá- 
to  paíía.  Huns  jogos  foraõ 
os  Circenfes  ,  outros  os 


goras  êcPtolomeo :  na  Me-     Dionyfios,  outros  os Juve 
dicina,  Efculapio  &   H7-     naes,  outros  os  Nemeos, 


pocrates :  na  Mathemati- 
ca,  Euclides  &  Archime- 
á&s  :  na  FilofoíiajPlataé  Sc 
'Ariftoteles:  naTheología, 
Mercúrio  Tremigifto  Sc 
Apollonio  Tyanéo :  Sc  por 
junto  em  todasas  ciências 
pafTáraa  no  mefmo  tem po 
os  fete  Sábios  de  Grecia3 
porque,  ou  junto,  ou  divi- 
dido j  tudapaifa  .  Sò  a  E  thi- 


outros  os  Mara toneos  5  to- 
dos cheos  de  diíFerentes 
divertimentos,  em  que,  ou 
fe  perdia  a  lioneílidade> 
como  nos  de  Vénus  y  ót?  o 
juizo,  como  nos  de  Bac- 
cho  >  mas  nenhuns  mais  in- 
dignos dos  olhos  hunia- 
nos,  &piedade  na  tural,  que 
os  Gtadíatorios.  Sãhia  to- 
da; Rom=a  ao  AnfiteatFOiiiii 
que  ? 


m 


n 


IO  Sermão  da  primeira^  omin^a 

que  ?  a  ver^Sc  feftejar  coitíO     quem  levava  hiía  coroa  de 


Icmatavaó  homens  a  ho- 
mens :cahia6hunSv&  ío- 
brevinhaó  outros  ,  &:  ou- 
tros, fem  eftar  o  poílo  va- 
go hum  lo  momento  ,  ac- 
clamando  a  cabeça  do  mil- 


louro.  Por  cílcs  jogos  ma:5 
que  pelo  curíò  do  Sol  fe 
contavaó>iSc  dilHnguiaó  os 
annos.  Mas  como  coda  a 
competência  era  a  correrj 
&  o  que  mai$  corriajO  que 


do  com    applaufos  mais     triunfava,  naó  pq.diaó  á^i- 
carniceiros,' que  cruéis,  ab     xarde  paíllir  as  Qlimpia- 


íim  no  dar,  como  no  rece- 
per  da$  Feridas,  tanto  a  in- 
frepidez^^dos  mortos,  co- 
mo a  fúria  dos  matadores. 
Os  jpgoç  Seculares  fe  cha- 
marão aílim,  pprque  fe  ce^ 
iebravaó  hua  íq  vez  ác  fe^ 
ícuioa  feçuio  i  (Sc  dizia  o 
pregão  publico  qije  f  oi]t 
vidava  para  elles:  í^erjtead 
fudosj  úiios  nernç  vidit  un- 
quãK',  neç  yifuru^  efl:VindQ 
veros  jogos,  que  ninguém 
yÍQ,nem  ha  de  tornar  a 
ver.  E  cani  efte  defengano 
da-ivida  paHàda  ,  &:  defefr 
peraçaódafpíurajj  03  hiao 


cias,  como  paflaraò  todo§ 
ps  outroi?  jpgqs  ^aquelle^ 
tempos,  ou  todos  pspaíTa-. 
tempos  daquellps  jogos, 

II  Sò  húa  coufa  ha 
que  naó  pôde  paílàr ,  por- 
que o  que  nunca  foi,  nara 
pôde  deixar  de  fcr  ^  &c  taeç 
parece  que  foraó  as  f:ibu- 
Jasjque  neíle  mcfmo  tépq 
íe  inventarão  ,  &  fingirão. 
Mas  fe  filas  naó  paíTáraó 
^m  fy  mefmaçjpaílaraó  na.- 
quelles  caíbs,&:  coufis  que 
jderaó  occafiaó  a  fe  fingi- 
rem. Na  fec ca  univçrlLU 
qucabrazQu  todo  o  munr 


^odos  ver ,  &  fe  chama vap  do,  paíTou  a  fabula  de  Fae- 
jogos.  Os  Oiimpicos  for  tonte:  no  djlnvip  particu^ 
faó  os  mais  celebres,  &  fur     lar ,  que  inundou  grande 


jnofos  de  todos,  cm  que  de 
cinco  em  cinco  annos  có- 
corria  todo  o  mundo  a  hur 
jna  Cidade  do  mcfmo  np- 
i7)e4  ou  a  levar?  ou  a  yer 


parte  dcllc,paííbu  a  fabula 
ide  Deucalióa :  ao  cftudí) 
com"  que  EÍRcy  Atjantc 
^zontemplava  p  curfo,  6c 
nioyimcntps  das  Ellrcllas» 
gaílby^ 


\ 


m Advento]  '^^^'^^  íi 

Ça&u  a  fabula  de  trazer  o  bios  daqtíelle  tempo  o  que 
Ceo  aos  hombros:  na  efpe-  Ha  com  o  que  naÓ  ha  ,  &  ú 
culaçao  continua  de  todas  certo  com  ofabulofo:  para 
às  noites  com  que  Ende-  que  nem  o' louvor  nos  deP 
inidri  dbíervava  ò^  effeitds     vanèça ,  nem  a  caMninia 


èo  Planeta  mais  viíinhò  à 
terra,  paíToú  á  fabula  dòá 
feus  amores' com  a  Liia.E 
porqiíe  também  dsnoíTds 
vicios;ancr{íaífaca  virtu- 
de, èc  a  rioíTa  mefma  vida 
|)aíla  como  fabiiíaj  qambr, 
&  cdmpía c eii c ia  de  noS 
inefmos  jSaíTòu  ih  fabula 
de  Narcife:  a  rlquez^  íeni' 
juizò",  ria  fabiila  de  NÍ  ida^ : 
à  cubica  infaciaveU  ria  fa- 
bula de  Tan táld :  à  invej  a 
do  benl  alheo,  ria  fabula, Sé 
abutre  de  Ticio  :  ainxrorí- 
flancia  da  fortuna  ninais  al- 
ta, ria  fabiiH;  Sc  roda  de 
Euxiori:  o  perigo  de  acer» 
farconí  òirieyo  da  virtii- 
tie,8ciíaò  declinar  aos  vi- 
cios  dosextremos  ,  na  fa- 
bula de  Sciíla  Sc  Caribde$ : 
éc  finalmente  a  certeza  da 
niorte,&  incerteza  da  vida 
pendtrite  femprç  de  llum^ 
ío,paírdu,  &  eftà  cõtinua- 
jhénte  paíiàndo  na  fabula 


fiosdefanime,  pdis  o  ver- 
dadeiro, &  o  falfo,  a  verda- 
de, &  a  nteittira,  tudd  piar- 
12 Mas  liàô  lie  jufto' 
qu^enefíía  paíTagem  de  tu^ 
do  ó  qiiè  paííou  no  tempo 
dos  qu^atro"  IrripeViols:  pro- 
larios  do  mundo,  paíTenioi 
iíòs  erri  lllencio;  àqiíellá 
Republica  íagrada,qu?e  al- 
cançou a  to-dd^s^^atrd,  6c 
por  fer  fundada  pdr  Deos  5 
parece  (|iíe  tinlía  direito  a 
iíaó  paílar.,  Nafced'  a  Re- 
publica Hebréa  líú  c^ti- 
y  eira  do  Egypto  j  Sc  quent 
èntaõ  llíe  leVa^taíTe  figu- 
ra ,  facilm^ente  llíe  poQia: 
pronofticar  os  três  cativei- 
ros, 8c  trarifniigraçoerS  cú 
que  fdi,  arrancada  da  Pa-^ 
fria;  riuá  vez  cativa  pór 
Salníariaíaf ,  em:  que  paP 
fou  deflerrada  aos  Aílj- 
fips ;  diitra  vez  eativá  pdr 
■  ííabutoddnofor ,  cní:  que 


das  P^arcaâ.    Affim  ènvol-    paíToii  defEerrada  ao^^Ba- 
f  éraóy 6c- mifturáraó  os  Sa-     byl(^ios ;  6c  a  t^rceira^  &' 

•  •  "       MB- 


12  ■  Sermão  dapriynelra^^ommga 

ultima  vez  cativa  por  Ti-     Nos  Capitaens   paíTou  o 

to&  Vefpafiano  ,  em  que     braço  invcncivcl  àç.]\\à-\s 


% 


paííbu  deílerrada  a  todas 
as  terras  ,  &  naçoens  do 
mundo.  Começou  no  fa- 
jiiofo  Tri j virato  de  Abra- 
ham,  iraac5&:Jacob5tantas 
yezes nomeado,  &  honra- 
do  por   boca  do  mefmo 
Deos  ;  mas  nem   por  iíTo 
deixarão    de  paíTar  todos 
três.  Succedeolhejorcph  o 
quefonhou  as  Tuas  fcUci- 
dadesj  &  as  adoraçoensde 
feupayjôc  irmãos  •,  &  po- 
%:0  que  todas  fe  cumpri- 
rão, todas  paíTaraó  como  íe 
foraó  fonho.  Teve  o  mef- 
nio  Povo  três  eílados  de 
governo ,  o  dos  Juizes  >  o 
dos  Rcys,  o  dos  Capitrtés , 
&:  fc  bem  fubindo  ,  Sc  de- 
cendo  as  varas  íc  trocarão 
com  os  cetros ,  &  os  cetros 
comos  baftoens,  nenhum 
daqucUes  eílados  foieíla- 
.  vcl,  todos  paílaraó.     Nos 
efpada  de 


Macabco  vencedor  de  ta- 
tás batalhas ;  paliou  a  fcça- 
nhaimmortal  de  Eleáza- 
ro,  que  metendofe  debai- 
xo do  Elefante  ,  matou  a 
fua  própria  íepultura  ;  ôc 
paílbu  mais  gloriofo  que 
todoso  honrado,  &:  zeloíb 
tcílamento  do  velho  Ma- 
thatias,  digno  de  fer  eícri- 
toem  bronzes.  E  porque 
naó  fiquem  totalmente  em 
fílcncio  as  Heroinas  da 
melmanaçaò  -,  quatro  ou- 
ve nella  iníignes  na  Fcrmo- 
fura,  Sara,  Rachel, Fílh cr, 
&:Judith,  todas  pOTcm  fa- 
taes  a  qu c  m  as  a \\\ o u .  Sara 
a  hum  Peregrino  com  pe- 
rigos: Rachel  a  hum  Pa- 
ílor  com  trabalhos:  Efrher 
a  hum  Rcy  com  deígoílos: 
6cjudith  a  hum  General 
com  a  morte,  Efte  acabou 
mifcravelmente  a  vida-; 
mas  as  fcrmofuras  antes  de 
fe  acabarem  as  vidas ,  jà  ú" 


Juizes  paílou  a  eipaaa 
Gedeaó,  o  arado  de  San 

^ar,&:  a  queixada  de  Sam-  nhaòpaflado.   Florecêraó 

ílim.    Nos  Rcys  paílbu  a  no  meimo  Povo  alem  de 

valentiade  David, a  labc-  outros  igualmente  vcrda- 

doria  de  Salamaó,  &:  a  pie-  deiros ,  dezaiejs   Profetas 

dade,vk  rcUgiaò  de  Joliaí.  Canónicos ,  quatro  maio- 

res> 


do  'Advêntffiò  *4^wí -'.  ''  1 3 

res,  &:  doze  menores  •,  mas     dcs,_ a  quinta^o  Maujoleo 


em  efpaço  de  três  feculos 
os  maiores5&  menores  deí- 
de  Ofeas  a  Maíachias  to- 
dos paíTáraó.  Paflaraó  os 
milagres  da  Vara,  pafTáraó 
os  da  Serpente  de  metal, 
paíTáraó  os  de  Elias  &  Eli- 
feo:  &   porque  fó  faltava 


de  Caria,  a  fexta  o  Tem- 
plo de  Diana  Epheíina  ,  a 
íeptima  o  Simulacro  de 
Júpiter  Olympico.  E  dei- 
xando o  Aníitheatro  de  q 
fófevem  asruinas,  as  Py- 
ramides  cahíra5,os  Muros 
arrazáraófejO  Coloílb  átí- 


paíTar  a  Ley  de  Moyfes ,  &     fezíe  ,  o  Maufoleo  fepul 
o  Sacerdócio  de  Aram  ,  a     toufe ,  a  Torre  fumiofe,  o 


Ley,6co  Sacerdócio  tam- 
bém paíTáraó  j  porque  tu- 
do paíla 

13  Agora  quizera  eu 
perguntar  ao  mundo  ,  fe 
como  me  enche  a  memo- 
ria de  tantas  couías, que  to- 
das pafilraó ,  me  moilrarà 

algúa  aos  olhos   que  nam      , 

paíTaíTe  ?  As  íctQ  fabricas  a     mais  poderofos  Impérios : 
que  a  fama  deo  nome  de  *.^..^^a^a^.^^^^ 

maravilhas  ,  acrecentáraò 


Farol  apagoufe,  o  Templo 
ardeo,&:  o  Simulacro,  co- 
mo íimulacro  ,  defváne- 
ceo fe  e m  ij  mefm o .  Tem 
mais  que  dizer,  ou  queop-' 
por  o  mundo  ?  Sò  pode  ap- 
pellarparaasmais  fortes, 
&  bem  fundadas  Cidades , 
Cortes,6c  Metrópoles  dos 


argumento  verdadeiramê- 


alguns  como  oitava  o  An- 
íitheatro Romano.  Mas  a 
maravilha  oitava,  ou  nona 
he,  que  todas  eíías  maravi- 
lhas, que  par  eciaó  eternas, 
paílanio.  A  primeira  ma- 
raviílii  forao  as  Pyrami- 
desdo  £gypto,  a  fegunda 
os  muros  de  Babyloiiia ,  a 
terceira  a  Torre  de  Faro,  a 
quarta  o  ColoíTo  de  F^o-^ 


te  de  grande  boato 


antes 
de  fe  lhe  tomar  o  pefo.  Ni- 
nive  Corte  de  Nino  foi  a 
maior  Cidade  do  mundo : 
andavafe  de  porta  apor- 
ta, naó  menos  que  em  três 
dias  de  caminho  :  edifica- 
da de  propoíito  com  arro- 
gância de  que  nenhua  ou- 
tra a  igualaiTe  ,  como  naó 
igualou.  Mas  onde  eilà  ef-^ 
fa  Nipive?£cbatanis  Coc- 
te 


1 4,  Sermão  da  primeira  ^o^fiinga 

te  de  ArFaxad  ,  &  Cidade     dar  volta  a  toda  a 


que  o  Texto  fagrado  cha- 
ma potentiíllma  ,  era  cer- 
cada de  fete  ordens  de  mu- 
rosjtodos  de  pedras  qua- 
dradas, cada  húa  de  vinte 
&  fete  palmos  por  todas  as 
faceSjSc  as  portas  com  pro- 
-digiofa  altura  de  cem  co- 
vados.  Mas  onde  eftà  eíía 
Ecbatanis?  Sufa  Corte  de 
AíTuero  ,  &:  Metropoli  de 
cento  &  vinte  &  fete  Pro- 
vincias  ,  cujo  Palácio  re- 
prefentava  hum  Ceo  ef- 
trellado>fundado  fobreco- 
lunasdeouro  ,  &:  pedras 
preciofas ,  &  cujos  muros 
eraó  de  mármores  brácos , 


redon- 
deza da  terra.  De  Troya 
diíle  Ovidio :  Jam  f^ges eft 
ubi  Trota  fui t.  E  o  mefmo 
podemos  dizer  das  plani- 
cies,  vali  es,  &:  montes,  dó- 
de  fe  levanta vaó  às  nuvens 
aqnelles  vaíliílimos  cor- 
pos de  cafas,  muralhas ,  & 
torres.  De  hiãas  fe  naó  fa- 
bem  os  lugares  onde  efti- 
veraó ;  de  outras  fe  lavraó, 
femeaó,  6c  plantão  os  mef- 
mos  lugares,  fem  mais  ve- 
fbigios  de  haverem  fido, 
que  os  que  encontrão  os 
arados,  quando  rompem  a 
terra.  Para  que  os  homens 
compoílos  de  carne  ,  «Sc 


&jafpesdediíFerentes  CO-     fanguefe  naó  queixem  da 


res  j  bem  fe  deixa  ver  quaó 
forte, &:  inexpugnável  fe- 
ria, pois  defendia  taó  gra- 
de Monarca  ,  dominava 
tantos  Reynos,  &  guarda- 
va tantos  thefouros.  Mas 
onde eftà eíía  Sufa?  Seou- 
vcílemos  de  fazer  a  mefma 
pergúta  às  ruinasdcThe- 
bas,  de  Memphis  ,  de  Ba-  14 


brevidade  da  vida  ,  pois 
também  as  pedras  mor- 
rem:  &  para  que  ninguém 
fe  atreva  a  negar,  que  tudo 
quanto  ouve,  paílbu,&:  tu- 
do quanto  hc,paíla. 

í.    IV. 


ítra,  de  Carthago ,  de  Co- 
rintho,de  Scbalte  ,  &:  da 
mais  conhecida  de  todas 
Jerufalcmi  neccílarío  feria 


Ar; 


G;d. 


F.aza6    deílc 
urfo,  ou  pre- 
cipício geral  com  que  tu- 
do paílà,  naó  he  hua  fó,  íe- 
naó duas:  húa  contraria  a 
toda 


^V, 


'^-^S^o  Advento. 


toda  aeílabilidade,  &  ou- 
tra repugnante  ao  mefmo 
fer.  É  quaes  faó  ?  O  tem- 
po 5  &:  antes  do  tempo  ,  o 
nada.  Que  coufa  mais  ve- 
loz, mais  fugitiva  5  &  mais 
inftavel  que  o  tempo?  Taó 
inftavel,  que  nenhum  po- 
der, nem  ainda  o  divino  o 
pôde  parar.    Por  iíTo  os 


if 


quatro  animaes,  que  tira- 
vaó  pela  carroça  da  gloria 
deDeos  nefte  mundo ,  na5 
tinhaó  rédeas.  Defcreveo 
o  tempo  no  Palácio  do  Sol 
o  mais  engenhofo  de  todos 
os  Poetas  ,  &  dividindo-o 
em  fuás  partes ,  diíTe  aflim 
elegantemente: 


jl  dextra  lava  que  dies^  &  menjis^  ò^rmus^ 
S(£cula  que-^Ò* fofitsfpatijs  aqiialibus^hara^ 
Ver  que  novum  Habat  cmEium  for  ente  corona^ 
Stabatnudaaftas^  Ò^fpcafertagerebaty 
Stabat  &  Atitumnus  calcãtisfordibusvuis^ 
Etglacialis  Hyems  cams  hirfâta  capiUis, 


Elegantemente,  torno  a 
dizer,  mas  falfa,  &  impro- 
priamente. Aquelle7?<í?^/?í 
tantas  vezes  repetido,he  o 
que  tirou  toda  a  femelhan- 
çadeverdadeà  engenhofa 
pintura.  Porque  nem  a 
Primavera  com  as  fuás  flo- 
res, nem  o  Eílio  com  as 
fuás  efpigas ,  nem  o  Outo- 
no com  os  feus  frutos,  nem 
o  Inverno  có  os  feus  frios 
ScneveSj  por  mais  tolhi- 
d0,&:  entorpecido  que  pa- 
reça, podem  eftar  parados 
hum  momento.   Paífao  as 


íliuí.- 


horas,  paílàó  os  dias  ,  paí^ 
faó  os  annos  5  paílaó  os  fe- 
CUI0S5&  fe  ou  veíFe  gerogli- 
ficocomque  fe  podeíTem 
pintar,  havia  de  fer  todos 
eom  azas,naó  fó  correndo, 
ôc  fugindo,  mas  voando,  & 
defáparecendo.  JSTem  ef-; 
cufa  efta  impropriedade 
eftar  o  Sol  aífentado :  Sede- 
batin  folio  Th^bus  i  por-s 
queo  Sol  pôde  parar,  co- 
mo no  tempo  dejofwe,oii 
tornar  atraz^como no  tem- 
po de  Ezechias  5  mas  o  tê- 
po  em  nenhum  tempo  >  nê 
parar. 


•^:i 


Mi 


Mi! 


Meta- 
mor. 


I  (í  Sermão  da  primeira  dominga 

parar  ,  nem  deixar  de  ir  emendou  eíla  fiia  ímpro- 
por  diante fempre,  &  com  priedadeo  mefmo  Poeta, 
a  mefma  velocidade.  -Bem     quando  depois  diíFe : 


r    o 


Ipfa  qtioque  affiduo  labuntwf  têmpora  motu 
Nonfectís  ãcfiumcn^  neque  enim  confifterefumen 
Aut  levis  horafotefl. 


E  como  o  tempo  nam 
tem,  nem  pôde  ter  confi- 
ftencia  algua  ,  &  todas  as 
couíasdeídefeu  principio 
nafcérao  juntamente  com 
o  tempo,  por  iíTo  nem  elle, 
nem  ellas  podem  parar 
hum  momento ,  mas  com 
perpetuo  moto ,  &  revolu- 
ção infuperavelpaílar  5  & 
irpaííando  íempre.  >  ■  \ 
\^  A  fegunda  razão 
ainda  he  mais  natural ,  & 
mais  forte,  o  nada.  Todas 
as  coufas  fe  revolvem  na- 
turalmente, &  vaó  bufcar 
com  todo  o  pcfo,  Sc  Ímpe- 
to da  natureza  o  principio 
donde  nafcérao  O  homem 
porque  foi  formado  da 
terra  ,  aindaquefeja  com 
difpendioda  própria  vida, 
&  fumma  repugnância  da 
vontade,  fempre  vai  buf- 
caratcrra,  &  fó  dcfcanfa 
nafcpultura.  Os  Kios  ef- 


quecidos  da  doçura  de 
fuás  aguas,  poílo  que  as  do 
marfejaó  amargofas  ,  co- 
mo todos  nafcérao  do  mar, 
todos  vaô  bufcar  o  mefmo 
mar,  &  fó  nelle  fe  defifo-' 
gaó,  6c  paraó  como  era  fea 
centro.  Aílim  todas  as  cou- 
fas defte  mundo,  por  gran- 
des, 6c  cílaveis  que  pare- 
çaó,  tirou-as  T>cos  com  o 
mefmo  mundo  do  naó  fer 
ao  fer  ,  ^  como  Dcos  as 
criou  de  nada,  todas  cor-; 
rem  precipitadamente ,  6c 
fe  m  qu  e  n  i  n  gii  e  m  a  s  p  o  fl  a 
terma6,ao  mefmo  nada 
de  que  foraó  criadas.  Vi- 
ftes  o  torrente  formado  da 
tempeíladc  fubita  ,  como 
fedefpenha  impctaofo,6c 
com  ruído  :  <Sc  tanto  que 
cGÍlbu  a  chuva  ,  também 
ellefc  fcccou,  6c  fumio  fu- 
bitamentc,  6ctornoua  fer 
o  nada  que  dantes  cra.-pois 
a  111 111 


Is  Advento'. 
áíiim  he  tudo,  &:  fomos  to-     à- generatio  âdventt 
úos-.à^iz  David  :  Ad^nihi" 
íum  devmient  fanqua  aqua 
decurrens,  SonJiaílcs  no  ul- 
timo quarto  da  noite,  qua- 


í7 
terra 

ajaemin  ^ternumflat. 

ló  Mas  fe  bem  fe  re- 
para nefta  mefma  fcnten- 
ça  ,   fendo  taõ  poucas  as 


do  as  reprefentaçoens  da  fuás  palavras ,  aííimcoma 

fantaíiaíaó  menos  confu-  kúasconíirmaó,  aíilmou- 

fas,  que  poíTuhieis  grandes  trás  parece  que  impugnao, 

riquezas  >  que  gozáveis  &:  cieftruem  quanto  imo& 

grandes  delicias  ,  &  que  dizendo.  Porque  fe  a  terra 

cftaveis  levantado  a  gran-  câá  fempre  firme ,  &  eíla- 

áts  dignidades  \  Sc  quando  v el,  terra  autem  in  aternum^ 

depois  acordaftes  ,  vi^^^  fiat  i  fegucfe  que  ao  menos 

com  os  olhos  abertos,  que  a  mefma  terra  naõ  paíTa,  & 

tudo  era  nada?  Pois  aílim  que  ha  no  mundo  alguma 

paíTaóa  fer  nada  em  hum  coufajque  naó  paífe.  Con- 

abrir  de  olhos  todas  as  cederemos  pois  eíla  excei- 

aparencias  defte  mundo,  çaóao  noífo  aíTumptOí^c 

diz  O  mefmo  Profeta :  Ve-  diremos  que  paíTaó  as  fígu- 

lutfomniumfurgentiu  2>?-  ras,  como  diz  S.Paulo>mas 

fnine imaginem  ipfonim  ad  que  a  terra,  que  he  o  thea- 

nihilum  rediges.   De  forte  tro,  naó  paíla  >  Naó  digo , 

que   eílas  faó  as  duas  ra-  nem  concedo  tal.  A  terra 

zoes  porque  todas  as  cou-  toda  naó  paíTa,  mas  paífaó, 

faspaífao.  Paflaõ,  porque  6c  fempre  eílaó  paíTando 

voaócomotempOj&paf-.  todas  as  par:tes  delia.    A 

fa65porquevaócaminhan-  terra  compoemfe  de  Rey- 

dopara  o  nada  donde  fa-  nosjos  ReynQS  compoem- 

híraó.  Por  iílb ,  como  à:iz  fe  de  Cidades ,  as  Cidades 

oEfpirito  Santo,  quando  compoemíe  de    cafas   & 

haaspaíTáraóíOu  tempaf.  campos, 6c  principalmente 

fado,  he  neceíTario  que  ve-  de  homens ,  6c  tudo  ifto , 

nhaò  outras  para  também  que  tudo  he  terra  (^  &  toda 

^■sSiM  \QeneratÍQ  tr^terit-i  aterra  }  perpetuamente 

Txim.7.-  §          eftà 


/ 


:.   ií 


I »  Sermão  da  prime  ir  a  ^ornsTÍgà 

cfti  paíTando.  Daniel  revê-     tado  nas  entranhas  da  ttt^ 


lando  a  Nabucodonofora 
intelligencia  da  fua  Eíla- 
tuaj  diífe  que  Dcos  muda 
os  tempos, ocas  idades,  & 
conforme    elias    paííii  os 


rajfaó  muito  raros,  mas  os 
que  fe  fazem  na  fuperíicie 
delia,  fcmpre  a  trazem  em 
perpetuo  movimento. 
17       E  fe  os  grandes 


3.31. 


Reynos  de  hiaa  parte  para  Reynos,  &  Impérios  nam 
outra  ;  Ipfe  miitat  têmpora^  faó  eíl:aveis,&:  paífaó  j  que 
& £tates :  transferi  Regna^  feráó  as  Cidades  particu- 
atque  canftituit.  Afum  paf-  lares ,  para  que  naô  he  nç- 
fou  o  Reyno  do  meímo  ceíTario,  que  a  roda  da  for- 
Nabucoparaa  Períia  ,  o  tuna  dè  toda  a  volta  ?  Naò 
dos  Perías  para  a  Grécia,  o  fallo  daquellas  que  acaba- 
dos Gregos  para  Roma,  &     raó  como  de  morte  fubica, 

abrazadas  atè  a  ultima 
cinza  no  incêndio  de  húa 
noite  ,  como  Troya  ,  & 
Lugduno.  Dertadiírejudi- 
ciofamente  Séneca:  ^mn- 


o  dos  Romanos  para  tan- 
tos outros,  quantos  hoje 
coroaò outras  cabeças,  as 
quaes  fe  devem  lembrar 
daquclla  infallivel  fentea- 


Ecci.  10.  Ça :  Regmim  agente  ingen-  do  tmanox/itit  Í7iter  urbem  Se'^^<^* 

^-        temtransfertwr  propter  in-  maximam-,& nullam ^  nlhil  ^^"^* 

juftitias.   O  noífo  Reyno  privatm-^nihil fublice  fta^ 

naó  fendo  no  íitio  original  bile  efiv  tam  hmninum^quàm 

dos  maiores  ,  quantas  ve-  urbinmfata^vohútur.  Dei- 

7:es  paílbu  a  outras  gentes  ^  xadas  pois  eftas ,  que  fiibi- 

Paífou aos  Suevos,  paííbu  tamentepaifáraódo  ferao 


aos  Alanos  ,  paífou  aos 
Carthaginefes,  paílbu  aos 
Romanos  paílbu  aos  Ára- 
bes &  Sarracenos ,  &  den- 
tro da  mel  ma  Hcfpanha 
também  paífou,  &:  tornou 
a  paniir.  Os  terremotos, 
c|ue  íc  gcraò  do  ar  violcn- 


naòíerj  íó  fallo  das  que 
por  feus  paílbs  contados 
vieraòdchum  domínio  a 
outro  dominio.  E  quantas 
vezes  as  Pombas  deBaby- 
lonia,  quantas  osLcoens 
deJeruÍLiIem  ,  quantns  as 
^'  d€ 
iJon- 


Aguias  de  Roma 


■I 


j 


doAda)entoV  19 

Gonftantínopia ,  viraó  fo-    que  à  maneira  de  pexes  no 
bre  fuás  muralhas  outras     níarjfeandaó  fernpre  mo 


bandeiras?  O  maior thea 
tro  de  Marte  no  noílb  fe- 
culo,  &  por  ventura  ,  que 
cm  nenhum  outro  >  forao 


vendo,  6c  paííando  de  huin 
dono  para  outro  dono. 
Ouçamos  a  familiar  evi^ 
dencia  com  que  o  grande 


as  guerras  Belgicas  v  ^  na-    j«izo  <íeS.  Ágoílinho  de 
grande  Provincia  de  Olá-     moftrou  a  hum  delles  eíla 


da,  excepta  Dorth,por  ifíb 
chamada  a  Virgem  ,  ne- 
nhúa  Cidade  ouve>  que 
fiaô  foíTc  conquiílada  >  & 


perpetua  infírabiiidade. In- 
troduz hum  Rico  5  que  ja- 
d-anciofo  de  fer  fcnhor  da 
fuacafa  >  dizia  :   ^omum 


alternaíTeodominio.  Que  meamhako  :  6c  pergunta* 

direi  dos  confins  fempre  IheoSantoaífim   :  ^am 

incertos  5  &  taò  frequente-  í/í?;;^^  w  tuam  ?  ^^á^;;^  ^/ííít 

mente  mudados  de  Hcf-  meus mihi dimtjit .  Efunde 

panha  com  França  ,   de  iUe  habuit  ?  Ams  nofier  il- 

França  com  Germânia,  de  Iam  reliquit.    Eecurre  ad 

Germânia  com  a  Turquia,  ^roavurn-^inde  adAbavmn^ 

êt  da  Turquia  com  Itália  ?  d?7^^  nomina  nonpotes  dl* 

Annos  ha  ,  que  a  antiga  cere.Tatertuushkeam  dt- 

Creta,  hoje  Cândia  ,  fem  mijihtranfivitper  iUam^fic 

fer  das  Ilhas  errantes  do  cí^í/^ír/^^^/tò.  Eftacafa  de 

A  rcipelago,  tem  pofto  em  que  vos  jadais  fer  fenhorj 

duvida  o  mundo  para  on**  porque  he  voíTa  ?  Porque  a 

de  ha  de  ir ,  &  fe  ha  de  rc-  herdei  de  meu  Pay :  &  vof- 

conhecer  as  Cruzes»  ou  a$  fo  Pay  de  quem  a   ouve? 

ineyasLuas.  De  meu  Avo  :  6c  de  quem 

18     E  quanto  às  cafas  aouve  voíToavo?  Demeu 

membros  menores,de  que  Bifavo :  &:  voíTo  Bifavo  de 

ie  compõem    innumera-  quem?  De  meu Trefavo. 

velmente  as  Cidades;  que  Jà  naó    tendes     palavras 

poderá   comprchender  o  com  que  profeguir  de  que 

inextricável laberinto,  có  mak  foi ,  ^  a  quem  mais 

B  ij       ,paí^ 


Angt-íl:. 
Come. 
in  Pi&l. 
122. 


t;:^ 


li  '< 

'■í!| 

■li! 


20  Sermão  da  prime  ir d^  (minga 

paflbu  eíTa  cafa ,  que  cha-     a  parte  principal, mas  ver- 

maisvoíTa.   Pois  aílimco-     dadeira mente   o  tudo  do 


mo  ella  paíTou  ,  &  voíTos 
anteparfiidos  paíTáravõ  por 
ella,  amm  ella,  Sevos  tam- 
bém haveis  de  paíTcir.  Por 
efte  modo  fem  firmeza, 
nem  eílabilidade  alguma 
eílaófemprepaflando  ne- 
íle  mundo  as  caías  ,  as 
quintas,  as  herdades  ,  os 
morgados  :  huns,porque 
os  fazpaHaramorte,  ou- 
tros,porqueos  manda  paf- 


mefmotudo.  E  vendo  o 
homem  có  os  olhos  aber- 
tos,&:  amda  os  cegos  ,  co- 
mo tudo  paíla  i  fó  nòs  vi- 
vemos como  lenaõ  paíla- 
ramos.  Somos  como  os 
que  navegando  com  ven- 
to ,  &  maré ,  6c  correndo 
velociíHmaméte  pelo  Te- 
jo acima,  fe  olhaó  fixam  é- 
te  para  a  terra  ,  parecelhe 
que  os  montes,  as  torres, & 


far  a  juftiça,  outros,porque     a  Cidade  he  a  que  pafi^i^  & 
os  convida  a  paííàr  a  ri-     osquepaílaó,raóelIes.Hc 


queza  dos  que  os  coprao  j 
outros,porque  os  obriga  a 
neceílidade  dos  que  os  ve- 
dem, outros,porque  a  for- 
çaj& poder  os  rouba,  & 
íenhorea  por  violência : 
cm  fiimma,  que  naó  ha  pe- 


o  que  ii^c  o  Poeta  :  Mon- 
tes^ urbesque  recednnt.  Mas 
demos  volta  a  eíla  meíma 
comparação ,  &  veremos 
na  terra  outro  género  de 
engano  ainda  maior.  A 
maior oftcntacaõ  deeran- 


dra,  nem  telha ,  nem  plan-  deza,  &  mageílade  que  fe 
ta, liem  raiz,  nem  palmo  vio  neíle  mundo, &:huána 
de  terra  na  terra,  que  nam  das  três  qu-e  S.  /Igoílinho 
eílcja     fem  pre  paíTando ,     defejára  ver,  foi  a  pompa , 

&  magnificência   dos  tri- 
unfos Romanos.  Entravaó 


porque  tudo  paííà. 
§■  V. 


DEíle  tudo    que 
cílàrcrDprc  paf- 
faadojhc  o  homem  naófó 


por  hua  das  portas  da  Ci- 
dade naquelle  tempo  va- 
fliilima,  encaminhados  lo- 
gamente  ao  Capitólio  : 
prcccdiaò  .os  Toldados  ve- 


cccore* 


cedorescomacciamaçoés:  taíTc ,  qúaes  éráo  os  que 
íêguiáofe  repreféntadas  ao  paíTavão :  fe  os  cfo  triuafo  , 
natural  as  Cidades  venci-     fe  os  que  o  eílaváo  vendo: 


das  5  as  montanhas  inacef- 
íiveis  efcaladas  ,  os  rios 
caudalofos  vadeados  com 
pontes  :  as  fortalezas  ,  Sc 
armas  dos  inimigos ,  &  as 
machinas  com  que  fora 6 
çxpugnadas  :  em  grande 
numero  de  carros  os  def- 
pojoSjSc  riquezas  5&  tudo 
o  raro, 8c  admirável  das  ré- 
gio ens   novamente  fogei- 


não  ha  duvida  ,  que  pare- 
ceria a  pergunta  digna  de 
rifo.  Mas  o  certo  he,  que 
tanto  os  da  prociílàó,  &  do 
triunfo ,  como  os  que  das 
janellasj.  &  palanquesjquc 
os  eílavão  vendo,  huns,  6c 
outros  igualmente  paííà- 
váo,  porque  a  vida,  &:  o 
tempo  nunca  pára  :  &  oií 
indo,  ou  eílanaoj  ou  camJ-' 
tas:  depois  de  tudo  iíFo  a  nhando^  ou  paradosjtodoí 
multidão  dos  cativos,  &  fcmpre,  &  com  igual  velo- 
tal  vez  os  mefmos  Reys  cidade  paíFamos. 
maniatados  5  &  por  fim  em  20  Declarou  efta  ver- 
earroça  deouro^  5c  pedra-  dadetao  mal  advertida  cò 
ria, tirada  por  Elefantes,  húafemelhãça  muito  pro- 
Tigres,  ou-  Leoens  doma-  pria  S  Ambrofio  elegante- 
dos,o famofo  Triunfador : :  mente :  Etfinon  Vídemur' 
ouvindo  a  efpaços  aquelle  ire  corpo-rditer  ^  progredi^ 
gloriofo ,  &  temerofo  prc-  mur,  Namficut  in  na-vibus  ^^^^  ^ 
gão :  Memento  te  ejfe  mor-'  dormientes  Gentis  ãgu7itnr  in  píài. 
í^/é-w.  Em  quanto  eíla  grã-  in  portas  -,  fie  vit£  noftr£  ^-^^'i-^- 
de  prociíTaó  ("  que  allim  fpatiodefluente  ^  ad  propriu 
lhe  chama  Séneca  ^cami-  anus  qtii f que  finem  ^  curfiulã' 
nhava,  eílavão  as  ruas,  as  bente  deducimur.  Tu  enim 
praças,  as  janenas,&  os pa-  dormis ^ér  temptis  tuum  am^ 
ianques,  que  para  efbe  fim  bulat.  Todos  imos  embar- 
fefazião,  cubertos  de  iníi-  cadosnamefma  nao  ,  que 
nita  gente,  todos  a  ver.  E  he  a  vida,  ôc  todos  navega- 
fe  Diógenes  então  pergun-  mos  com  o  mefmo  vento  > 
Tom./».  B  iii  que 


í  '1' 


2  2  Sermão  ddprhnéira  l^omifiga 

queheotêpo  :&  aflim  co-  que  nenhum  flofticm  po* 

mona  nao  huns  governaó  dia  entrar  duas  vezes  em 

oleme  ,  outros  mareaó  as  hum  rio:  &porquc?  Por- 

velas-.huns  vigiaó,  outros  que  quando  entraíTe  a  íç> 

dormem:  huns paíreão,ou-  gúda  vez,  jà o  rio,qu«  femí* 

tros  eítáo  aíTentados :  huns  pre  corre,  &  paíía  ,  hc  ou^ 

cantáo,  outros  jogáo,  ou-  tro.  E  daqui  infiro  eu,  que 

troscomem  ,    outros  ne-  omefmofuccederia  fenao 

nhúa  cou-fa  fazem,&  todos  foíTc riojfenaó  lago,ou  tan- 

igualmente  caminhão  ao  queaquelleem  que  o  ho-. 

mefmo  porto  •,  aílim  wòs  ,  mem  entrafie >  porque  ain-. 


ainda  queonãopareça,in 
fenfivcl  mente  imos  paf- 
fando  femprej&avifmhan- 
dofe  cada  hum  ao  feu  fim ; 
porque  tu  ,  conclue  Am- 
broíio,  dormes ,  &  o  teu 
tempo  anda :  Tu  dormis^  ò* 
tempus  Uium  amhulat  J^'\.& 
poucoemdizer  que  o  tê- 
po  anda,  porque  corre  ,  & 
voa :  mas  advertio  bem  em 
notar  qu€  nòs  dormimos  i 
porque  tendo  os  olhos 
abertosp  iraver  qije  tudq 
paíHi  5  ió  para  confiderar 
que  nòs  também  paílamos, 
parece  que  os  temos  fe- 
chados. 

21     Dito  foi  do  grande 
Filofofo  Eraclito,alcg:ido, 
&  celebrado  por  Sócrates , 
Socrat.  ]\lunpolJt'  qiieriUjtiam  bis  m 


da  que  a  agua  do  lago^Sc  da 
tanque naó  corre,  nem  fe 
muda  ,  corre  porém  ,  &; 
femprefe  eílà  mudando  a 
homem,que  nunca  perma  • 
neceno  mefmo  eílado  :  Et 
minoiu^m  in  eodemftatuper-  Jo^- 1* 
«í/í!/^'/'.  AíIimodiíreJob,&: 
quem  o  não  diíler  aílim  de 
todo  o  homem  ,  &  de  fy 
mefmo  ,  não  fe  conhece. 
Admirafe  Philo  Hebreo, 
de  que  perguntando  Deos 
a  Adam  onde  eftava  ;  j^-  c.fiícC 
dam^  ííbí  es ,  elle  não  refpó-  >  9- 
deíTe.  Mas  logo  efcufa  ao 
mefmo  Adam  ,  &  a  qual- 

Sueroutro  homem  a  quem 
)cosfizcírea  mefma  per- 
gunta j  porque  comopòd^ 
rcfpondcr  onde  cílà,  quem 
waóeílà?  Sc  diílcra,  cíiou 


eumd^mjiuvmm  defeedder&s     aqui  (^  como  futilme.itc  ar- 


do  Adoenta. 
gucS.  Agoftinho^  entre  a 
primeira  fyllaba  ,  &  afe- 
giinda  ;á  o  eftou  nam  feria 
eíloUí  nem  o  aqui  íeria  o 
mefmo lugar  :  porque  co- 
mo tudo  cílà  paílândo ,  tu- 
do fe  teria  mudado.  Por  ií- 
fo  conclue  o  mefmo  Phi- 
lo>  que  fe  Adam  ouveíle  de 
refponder  própria,  &  ver- 
dadeira menfe  onde  cita- 
va >  havia  de  dizer  >  mfr 


Thilus. 


riciaà  Adolecéncia^morrc 
a  Puericia  :  paíTando  da 
Adolecencia  á  Juventud, 
morre  a  Adolecencia :  paf- 
fando  da  Juventud  à  idade 
de  Varão,  morfe  a  Juven- 
tud :  paíTando  da  idade  de 
Varaõ  á  Velhice ,  morre  a 
idade  de  Varaó  :  &:  final- 
mente acabando  de  viver 
portaata  continuação,  6c 
fucceíTaô  de  mortes  j  com 
€[Mam  ,  cm  nenhua  parte  i  a  ultima,quefó  chamamos 
porque  cm  nenhua  parte  morte  ,  morre  a  Velhice, 
cftàaquilbqucnúca  eftà,  Aífim  o  coníideravaó  a- 
mas  fempre  paífa :  Adquod  queiles  Sábios,  mais  larga, 
-fropTte  refpondère  foteraPy  &  menos  fabiamente  do 
nufquam  :  eo  quod  humana  que  devéraójaps  quaes  por 
resnunquam  in  eodemjiatu 
maneat, 

Confiderandò  eíle 


21 


iíTo  emendou  S.  Paulo,  di- 
zendo que  morria  todos  os    _ 
ám^'.§luoUdiemorwr.  K  ja  .^.^x. 


continuo  paífar  do  homem  pòdefer,  que  da  cómuni- 

(  naó  Fora  de  fy,  fenaó  on-  caçaó  que  Séneca  teve  c5 

de  verdadeiramente  pare*  S.  Paulo,  enfmou  elle  eíla 

ce  que  eílà ,  &  permanece,  mcfma  lição  ao  feu  Difci 


quehc  dentro  em  íy  meí^ 
mo  ^  diziaó  os  Sábios  da 
Grécia,  como  refere  Eufe- 
bio  Cefarienfe,  que  todo  o 
homem  ,  que  chega  a  fer 
vclh o,  morre  féis  vezes.  E 
como? PaíTando  da  Infân- 
cia à  Puericia ,  morre  a  Tn- 


pulo,quando  lhe  diz  :  Sin- 
gulos  diesyfivgíilas  njitasf  ti- 
tã, ^c  o  Sol,  que  fempre  he 
o  mefmo,  to  dos  os  dias  tem 
hum  novo  nacimento,  & 
hum  novo  occafo,  quanto 
mais  o  homem  por  fua  na- 
tural inconílancia  taó  mu- 


fanci^  :  paíTando  da  Pue-    davcl,  que  nenhum  heho* 

a  iiij  jc 


\ 


^4*  .  Sermão  da prmeiraVyommga 

jeoqueFoihontem  ,  nem     fando  tudo  para  a  vida,  na 


f  •; 


nem 
ha  de  fer  à  manhãa  o  que 
hehoje !  Defenganemonos 
pois  todos,  &  diga  ,  ou  di- 
gafe  cada  hum  com  ElRey 
ifj^i.,8,  Ezechias  :  T>e  mane  nfqtie 
12,  advefperam fintes  me,  E  fej  a 
a  ultima  conclufaó  defte 
largo  difcurfo  -,  que  entaó 
diriiiiiremoS'bem  ,  &  co- 
nheceremos.o  quehe  efta 
vida,&:  efte  mundo ,  quan- 
do entendermos  que  nam 
fó  eílamos  nelle  em  per- 
petua paíTagem  ,  mas  em 
perpetuo  paíiamento. 


23 


§,Nl, 


dapaíTc  para  a  conta.  O 
que  faz,  &  ha  de  fazer  dif- 
ficuftofa  a  conta  faó  03 
pecca  dos  da  vida,  &  de  to- 
da a  vida.  Eque  confufao 
fera  naquelle  dia  taó  cheo 
de  horror  ,  &:  aíTombro, 
olhar  para  a  vida  ,  &:  para 
os  peccados  de  toda  ella,Ôc 
ver  que  a  vida  paííbu,  &  05 
peccados  naõ  paíTáraó. 

24.  Deixe  paíTar&naó 
pai  lar,  na  6  fó  temos  os  do- 
cumentos da  Efcritura, 
mas  grandes,  &  manifeílos 
exemplos  da  mefma  natu- 
reza. Chrifto  Redeniptor, 
&: Juiz  uni verfal  noííocó- 
parou  o  dia  do  Juízo  ahúa 


ASíim    paíTamosf 
todos,  &  aílim     Rede  lançada  no  mar,  Sa-  ^^'"^ 
paíTa  tudo  para  a  vida  :  de-    gen£  mijfa  in  maré .  O  mar  ^^'^^' 
lengano  verdadeiramente     he  eíte  mundo :  a  rede  he  a 
nam  fó  trifte ,  mas  triftilll-     comprehenfaó  da  ciência, 
mo,  íe  efte  fuperlativo ,  &: 
outros   de   maior    horror 
naõ  foraó  mais  devidos  ao 
que,  8c  depois  de  tudo  pa  f- 
far,  fefeguc.  Depois  da  vi- 
da feguefe  a  conta.  E  fendo 
aconta,que  fchadedar,dc 
tudo  o  que  paílbu  na  vida  3 
triílillima,  ik  tcrribiliílima 
f  Oiiii Jcra^aó  hc  í  qucpaf- 


&  juítiça  divina  :  os  que 
nella  andáo  nadando  jk 
prefos,ou  com  maior  5  ou 
com  menor  largueza ,  faó 
todos  os  homens.  E  aílim 
como  na  rede  ,  quando  jí 
malha  he  muito  eílrcitaífo 
a  agua  pòdc paliar,  &  ne- 
nhúa  outra  coufa  j  aílim 
paíFa  íòmcntc  pur  cl-la  a 
Vida, 


ão  Advento.  if 
vida,  &  tudo  o  mais  C  que  mo  documêto :  Cribram  a-  ^^^^f^ 
faóospeccados  }íicaden-  quasdenuMusc^loru.Dcí- 
trOj&nadapaíIa.Ohquam  ceanuvé  como  efponj-a  a 
apertad;i5&  eíireita  he  efta  beber  no  marjêc  fendo  a  a- 
malhadarededeDeos:  &:  guado  niarfalgada  ,  &:a- 
qiiam  fácil  de  paílar,  ainda  margofa,paífada  porê  pela 
por  ell  a  5  a  vida,  que  como  nuvê;,o  q  là  fícajhe  o  amar- 
agiia  fempre  eftà  paífando!  gofo^,  &  o  que  cà  defce  ,  o 
Omnesmorimiir  ,  &  quaíi  doce.  Por  iífo  com  grande 
aqua  dilabmur.  O  meíluo  propriedade  efte  paífar ,  Sc 
Chriílo  cóparou  eílc  paf-  naô  paífar  fe  compara  na 
far,&naó  paífar  ao  crivo,  nuvem  ao  crivo ,  &:  navi- 
quando  diífe  a  feusDifci-  da,  &  na  conta  ànuvem.O 
Luc.22.  pulos  \  S'atanas  expetivit  que  paífa  por  ella,  &  calo- 
sa- .'vosíit  CYíbraret  ficut  triti-  crânios ,  he  o  doce  da  vi- 
cum.  AlTimcomo  no  crivo 
(^diz  SJoaô  Chryfotlomo, 
comentando  eftas  pala- 
vras. '  Aílimcomo  no  cri- 
vo dando  hua  &  muitas 
voltas,  paífa  o  graó ,  &  fò 


da:  o  queíicalà  em  cima,' 
&  naó  vemos,  he  o  amar- 
gofo  da  conta. 

2  5"  Naó  podia  Job  fal- 
tar a  enobrecer  efle  mef- 
mo  aíTumpto  ,  como  ta6 
fica  a  palha  •,  aífim  neíle  próprio  das  fuás  experien- 
niundo  ('  que  todo  he  fu-  cias,  com  algua  femelhan- 
rado  )  com  a  volta, que  daó  ça  que  mais  ainda  nolo  de- 
os  diaSjSc  os annos,  paífaa     clare.    Diz  que  obfervoíi 


vida,^: os goílos delia,  Et 
innovíjjimo  nihtl  remanpt^ 
nififolum  feccatum  ,  &  no 
.jíim,3cparao  íim  fo  íica  o 
-  peccado.  De  outro  crivo 


Deos  todos  feus  caminhos, 
&  coníiderou  as  pegadas 
dos  feus  pès:  Obfervafii  om-  lob. 
nesfimitas  meas^  ér  'vefttgia,  ^  ''- 
fedum  mearum  cõnJtderaftL 


falia  David,  qhe  o  das  nu-  E  porque  confidera  Deos 

vês,por  onde  fe  coa  a  agua  naó  os  paífos,  fenão  as  pe- 

da  chuva,o  qual  mais  alta-  gadas   ^  Porque  os  paífos 

mete  nos  inculca  elle  mef-  paífaó>  as  pegadas  íicão:  os 


m 


y  as  pegadas  a 


■■■< 


2  <>  Sermão  da  primeira  dominga 

paíTos  pertencem  à  vida,     das  cílaó  manifefras  ,  5c 

vemfc  ,  as  raízes  eílão  es- 
condidas, &  náo  fe  vem  :  & 
aíllm  tem  Deos  guardados 
inviíivelmenre  todos  os 
noíTospeccados,  os  quaes 
no  dia  da  conta  rebentarão 
comoraizes  ,  ôc  brotarão 
nos  caftigos ,  que  pertence 
à  natureza  de  cada  hum. 


que  paílbu 

cóta,q  náopaíTa.  Masque 
differentementenaó  paíTa 
Deos  pelo  que  nòs  taò  fa- 
cilmente paíTamos  !  Nòs 
deixamos  as  pegadas  de- 
traz  das  coftas ,  6c  Deos 
tem-nas  fempre  diante  dos 
olhos,  com  que  as  nota,  & 
obfer va  :  as  pegadas  para  lilo  he  o  que  canto  cuida* 
nòsapagaófe  ,  como  for-  do  dava  a  Job. 
madas  em  pó,  para  Deos  26  Finalmente  o  Apo* 
naó  fe  apagaó ,  como  gra-  ílolo  S.  Paulo  >  pregando 
vadas  em  diamante.  Tal  contra  os  que  abuíaò  da 
he  a  conílderação  dos  pec-  paciência,  Ôc  benignidade 
cados,  que  na  noíTa  memo-  de  Deos ,  &  em  vez  de  fe 
ria  logo  fe  perde,  &  na  ci-  aproveitarem  do  efpaço  q 
encia  divina  fempre  eftá  Ihedàparaapenitécia,  ga- 
prefente.  O^  Setenta  em  fí"áoa  vida  em  accumular 
lugar  de  pegadas  trefladá-  peccados  fobre  peccados, 
rão  Raizes :  Et  radicespe-  Naó  vès  ("  diz  J  ò  hom em , 
dum   meorum    conjiderafti.     que  defprezas  as  riquezas 


Aíllm  como  os  pés  fecha- 
máo  plantas,aílim  às  pega- 
das lhe  quadra  bem  o  no- 
me de  Raizes.  E  porque 
deo  eíle  nomejob  às  pega- 
das dos  feus  pafibs?  Não  fó 
porque  os  paíTos  pafiaó,  & 
as  pegadas  íicão  j  mas  por- 
que ficaó  como  raízes  fun- 
das,6c  firmes  ,  6c  que  fem- 
pre permanecem.  As  pega- 


do fofrimento,  5c  longani- 
midade divinaj6c  que  pelo 
contrario,  fegundo  a  dure- 
za do  teu  coração  ,  enthe- 
fouras  para  ti  a  ira,  6c  vin- 
gança, que  te  cfpera  no  dia 
do  Juízo?  An  divitias  honi- 
tatisejusy  &patíenti£i  & 
longantmitatis  contemnis  >  ^^^ 
Secundam  autcm  duritiamy  ^*^* 
(^  impaniíms  cory  thefauri- 


ão  Advento.  >7 

%as  tihi  iram-,  m  die  ira ,  &  todos  enthcfoura mos  :  to- 
revelattonis  juHt  judicij  dos  gaftamos  o  que  paíTa, 
"Dei  ?  De  maneira  qu®  ao  &  todos  enthefouramos  a 
peccar  fobre  peccar  chama  que  nao  paíTa :  o  que  gafta- 
S.  Paulo  enthefourar ,  the-     mos^he  o  da  vida,o  que  erir 


faurizastibi :  porque  ainda 
que  a  vida ,  &  os  dias  em 
que  peccamos  paíTaô  -,  os 
peccados,que  nelle  come- 


thefouramoSjO  da  conta. 

27  Infinita  matéria  fe- 
ria^  fe  agora  ou  vera  mos  de 
reduzir àpraticahuma 5  6c 


temos^naó  paífao  ,  mas  fí-  outra  parte  defta  demo- 
cão  depofitados  nos  the-  ílração^  &poIas ambas  em 
fouros  da  ira  divina.  Falia     theatro   Mas  por  iíTo  nos 


o  Apoílolo  por  boca  do 
mefmo  DeosjO  qual  diz  no 
Deuteronomio:M>;?;2é'^^^ 
conditafiint  apudme^  ò^fi^- 
mata  m  theÇauris  meis^Mea 
ejfultio^i&ego  retribuam  in 
tempore^    Eíles  theíburos 


detivemos  tanto  íio  pri- 
meiro ponto  do  noílb  diC- 
curfo.  Naó  vimos  nelle 
defde  o  principio  domun- 
dojcomo  tudo  paíTouPNaò 
vimosj  comotodos  os  que 
em  tantos  feculos  vivèraó> 


pois,que agora eftáo cerra-  paíTáraõPPois  eíTe  tudo  q 

dos/e  abriráó  a  feu  tempo,  entáo  paíTou  para  a  vida , 

&  fe  defcubriráó  para  a  có-  he  o  nada  que  naó  paífoii 

ta,  no  dia  doJuizOíque  iíTo  para  a  conta:  &  qí^qs  todos> 

quer  dizer, /;í&/>^,d^•^í'-  q^e  então  morrerão  ,  & 


velãtianis juftijíidictj  T>ei. 
Confideraime  hum  home 
rico ,  8c  que  tem  mais  ren- 
das cada  anno  do  que  ha 
miíler  para    fe  fuftentar: 


agora  eftáo  fepultados,  faò 
Qs  que  refufcitados  nefte 
mefmo  dia  haó  de  apare- 
cer vivos  diante  doTribu* 
nal  diviíio  ,  para  dar  eífe 


que  faz  efte  homem  ?  Hãa     conta  eftreitiíTi ma  de  quã 
parte  do  que  tem  gafta ,  &:     to  fizerao.  Nefte  Tribunal 


outra  parte  enthefoura. 
Pois  ifto  he  o  que  fazemos 
todos.  Todos  gaftamos,  6c 


vio  S.  Joaõ  aílèntado  fobre 
humthrono  de  admirável 
mageftade  o  fupremo  Juiz, 

6c  com 


Apoc. 


Ibid.  i; 


Uul. 


Sermão  dã primeira  dominga 
afpe^bo  taó  tcrrí-  fcriptaeraiit  mlibrls.k^vvcí 
entendem  literalmente ef» 
tes  textos  como  foaó  ,  Be^ 
da,^:  outros  Padres.  Mas 
porque  razão  o  livro  da  vi^ 
da,  era  livro  ,  £c  os  livroy 
daconta,livros?  Porqueo 
livro  da  vida  contém  os 
dias  da  mefma  vida  ,  que 
faópoucos.Sc  os  livros  da 
conta  contem  ospcccados 
cometidos  nos  mefmo» 
dias, que faó  muitos.  Aí- 
fim  que  poílos  à  viíla  no 
tremendo  tribunal  de  húa 
parte  o  livro,  &:  da  outra  oá 
1  ivrosr então  fe  veráó  jun- 
tas, &  concordes  as  duas 
combinaçoens  do  nollb  aí^ 
fumpto:  no  livro  ,  como 
Et  líb]  i  ãperti junt ,  &  dius  tudo  paííli  para  a  vida  j  nos 
líber  apertus  ejt  y  qui  ejl  vi-  livros,  como  nada  paíla 
t^y  &  judlcati  fnnt  mc"Uú 
ex  hís  qtí£  [cripta  erant  in 
libris  Jecundhm  opera  Ip fó- 
rum. DeíladiílLnçaòqueo 
Evangeliílafazde  livro  a 
livros,  fc  vè  claramente, 
que  o  livro  era  da  vida ,  //- 
ber^qui  eft  -vit^-,  $c  que  os  1  i- 
vros  eraó  da  conta^  porque 
pelos  livros  foraò  jul ira- 
dos os  mortos:  Etjudicã' 
ti  fiint  mortm  cx  his  qiiíe 


2% 

&com 
vel,  que  afíirma  fugio  delle 
o  Ceo,&  a  terra  :  Et  vi  dl 
thronummagnnm  candidú.y 
érfedentemfiiper  eiim^  à  ca- 
jus covfpeãufiigit  terrã^  ò* 
calum.  Diz  mais,que  vio  a 
todos  os  mortos  grandes, 
&  pequenos  em  pè,  como 
rcos  ,  diante  do  mefmo 
throno ;  Et  vldl  mortuos 
magnos^  Ò^pufiUosft antes  In 
conjpeãu  thronl.  E  final- 
mente conclue,  que  entaó 
aparecerão,  6c  fe  abríraô 
hum  livro,  &  muitos  li- 
vros, Seque  pelo  que  eíla- 
va  efcrito  neíles  livros  fo- 
raó  julgados  todos  ,  cada 
hum  conforme  fuás  obras: 


para  a  conta. 

28  c^t' 


VII. 


te  nada  do  qual 
azemos,  que  na- 
da paíla  para  a  conta ,  he  o 
que  agora  havemos  de  ex- 
aminar. Pergunto:  Sc  na- 
da pafia  para  a  conta, pare- 
ce que  também  o  nada  pô- 
de ler  chamado  a  juízo?  E 

fc 


'    do  Advento^.  29 

fcacafo  for  chamado  ,  ef-  tinha  por  nada  jVCrdadei- 
caparà  da  conta  o  nada  ramente  era  nada;  t//^/^^- 
porfernada  ?   Creio  que     ras miquitatem  meam  ,  d^Jpb.  10. 


todos eflâo  dizendo,  que 
lim.  Mas  he  certo  ,  &  de 
fé, que  tambcín  o  nada, 
por  mais  caliíicado  que 
fejajhadefer  chamado  a 
juizo,  8c  porque  nada  paf- 
faparaa  conta  ,  nem  o 


í.'Cor, 
44- 


peccatum  meum  fcruterisy 
érfcias^  quia  nihilimpíum 
fecerim.  E  S.  Paulo  dizia , 
que  elle  fe  naó  dava  por 
juftiíicado  do  que  na  fua 
confciencia  reputava  por 
nada,  porque  deíle  nada 
niefmo  nada  ha  de  paíTar  naó  avia  elle  defer  ojuiz , 
femella,  &  muirigurofa.  fenaó  Deos  :  Níhil  mthi  ,.Cor.. 
Ninguém  foi  mais  caliíi-  confciusjum^fednoninhoc'^''' 
cado  na  Ley  da  Natureza,  jufttjicatiisfumiqui  atitem 
que  íob:&:  ninguém  mais  judie at  me^^ominus  eft, 
califícado  na  Ley  da  Gra-  £is-aqui  quam  manifefta, 
ça,que  S.Paulo  ;  &  que  &  provada  verdade  he> 
dizia  de  íy  hum,  &  outro?  que  nada  paíTa  para  a  con- 
ta,  pois  atè  do  mefmo  na- 
da a  ha  de  tomar  Deos  >  Sc 
tão  eílreita. 

29  Mas  qual  he  ,  ou 
pôde  fera  razaó  ,  porque 
onde  dous  homens   taò 


f  ob  dizia,  que  nada  tinha 
lob.  10  fçito  contra  Deos  :  §luia 
^*  ni^il  impmm  fecerm,  S. 
Paulo  dizia, que  nada  avia 
na  íua  confciencia,  de  que 
dia  o  acufiíTe :  NihilmiM 


confciusfiim.  E  eíle  nada  grandeSjtáo  caliíicados3& 

de  Job ,  &  efte  nada  de  S.  táo  fantos  como  Job,  &  S. 

Faulo  efcapáraó  por  ven-  Paulo    náo    reconhecem 

tura  da  conta,  6c  do  juizo  >  nada  de  culpa ,  lha  haja  de 

Eli  es  mefmos  confeíTaó,  arguir  Deos,  £c  pedirlhe 

que  de  nenhum   modo.  conta?  A  primeira  razão, 

Job  dizia,  que  Deos  o  ti-  &  da  parte  de  Deos {^a  qual 

nha  poílro  a    queftaó  de  fó  pôde  ignorar    quem  o 

tormento,  como  reo ,  pa-  não  conhece  )  he,  porqoe^ 

ra  averiguar,  fe  o  que  dle  ainda  nas  couías  mais  m- 

teriores 


M.at.h. 

25.21. 


50  Sermão  da pr 

reriores  noíías  ,  conhece 
Deos  muito  mais  de  nós , 
do  que  nós  de  nós.  Quan- 
do Chriílo  na  mefa  da  ul- 
tima cea  re  v^elou  aos  Apo- 
í Lolos  5  que  hum  deíles  o 
avia  de  entregar  :  Amen 
dico vobisy  quiaunus  veftru 
tnetrãdituniseft  :  diz  oE- 
vangeliíla,  que  muito  tri- 
íles  todos  com  tal  noticia, 
começou  cada  hum  a  per- 
guntar :  Nunquid  ego  fum 
iUd.2z.  ^]Jo7nine>VoT  ventura, Se- 
nhor, fou  eu  eíTe  ?  Pedro  , 
Andrè,JoaÓ5&:os  demais, 
excepto  ludaSjbemfabía 
cada  hum  de  fy,  que  nam 
era  o  traidor,  nem  tal  cou- 
fa  lhe  paíTára  pelo  peníà- 
mento :  pois  porque  fenao 
deixaó  eílar  muito  íegu- 
ros  na  boa  fé  da  fua  lealda- 
de, mas  pondo  em  duvida 
o  de  que  nao  duvidavam , 
pergúta  cada  hum  a  Chri- 
ílo fe  he  elle  o  traidor: 
Nunquid  ego  fiim  ?  Porque, 
ainda  que  a  própria  coní^ 
cienck  os  naó  accuíava, 
fabíaó  todos  que  fabía 
Chriílo  mais  de  cada  hum 
dellcs,  do  que  elles  de  fy. 
EUcs  conJiçcia6fc>  como 


imeira  ^õmmg^ 
homens,  Chriílo  conhe- 
cia-os,  como  Deos.  EíTe  foi 
o  erro,  &:  engano  de  S.  Pe- 
dro, que  eílava  à  mefma 
meíli !  Pedro  diíTc  ,  que  fc 
foíTe  neceíTario  daria  a  vi- 
da por  Chriílo;  CIhííIo 
pelo  contrario  diíTe,  que 
três  vezes  o  avia  denegar 
naquella  noite.  E  porque 
foi  eíla  a  verdade  ?  Porque 
Pedro  fallou  pelo  que  \%^ 
noravadefy,  6c  Chriílo 
pelo  que  conhecia  delle. 
Hoc  illi  Chriftus  pranuTU  ^^^^a,, 
ttabat^  quodínfe  fpfe  igno^  ° 
r/?^^í,dizS.Agoílinho.  E 
como  o  Juiz  daquelíe  dia 
conhece  mais  de  nôS)  do 
que  nós  de  nós  ;  nam  he 
muito  que  elle  nos  conde- 
ne pelo  que  nós  ignora- 
mos, 6c  que  no  feu  juizo  fe- 
ja  culpajO  que  no  noílb  pa«» 
receinnocencia. 

30  A  fegunda  razaò, 
&  da  parte  noíTa  he  •,  por- 
que alllm  como  Deos  fabc 
tanto  de  nós,  aíHm  nós  fa- 
bcmos  muito  pouco  de 
Deos :  &  por  iíTo  as  noíílis 
razocns  naó  pódcm  alcan- 
çar as  luas.  Hum  dia  de-' 
pois  de  Chriílo  entrar  tri-' 
iinfante  ( 


do  A  advento]  ji' 

linfante   em  Jeruíalem  ,     to  no  £c\i  tQ,mi^o -: E t  fru cí u  pcm 

fimm  dabit  in  temporefu 


vindo  de  Bethania  para  a 
mefma  Cidade,  efiirijty  te- 
ve fome  •  &  como  vííle  ao 
longeíiua  figueira  verde > 
&-  copada,  encaminhou  os 
paílbs  atè  ella,  por  fe  aca* 
íb ti veíle algum  fruto :.4SV- 
quid forte  inveniret  in  ea^ 
Mas  porque  naó  achou 
mais  que  folhas,Iançojalhe 
o  Senhor  maldição  ,  de 
que  eternamente  naò  déí^ 
fe  fruto  :  Nunquam  ex  te 
fníCiusnafcatur  in  fempi- 
ternum :  &c  no  mefmo  mo- 
mento fe  íeccou  a  arvore 
defdeas  folhas  atè  as  rai^ 
zes.  He  porem  muito  de 
notar  nefte  cafo,  como  no« 
taS.  Marcos ,  que  naó  era 
tempo  de  íig05:  Nonenim 
erattempiisficontm.  Pois  fe 
naó  era  tempo  de  aquella 
arvore  ter  fruto^  porque  a 
amaldiçoa  Chriílo  ,  &  a 
fécca,naófó  para  aquelle 


HW.  ''l* 

Poisfehe  louvor  nas  me- 
lhores arvores  darem  a  feu 
tempo  o  feu  fruto,  como 
foi  culpa  nefta  ,  não  fe  a- 
char  nella  fruto  ,  quando 
naó  era  tempo?  O  mefmo 
Evangelifta  S.  Marcos  diz, 
que  eita  fen tença  de  Ch ri- 
flo foi  repofta,  que  o  Se- 
nhor deu  à  Arvore:  Et  ref- 
pondens  dixit  ei  :  Iam  non 
ampUus 


m  aternum  ex  te 
frutftim  qttífquam  madvicet. 
Se  a  fen  tença  de  Clirifco 
foirepoíla  que  deu  à  ar- 
vore, final  he  que  a  ouvio 
primeiro  ,  &  ella  allegou 
de  fua  juíliça.  Reparem 
aqui  os  Juizes  ,  ou  conde- 
nadores,  que  nem  a  hum 
tronco  irracional,&:infeH- 
fi vel  condena  Deos  fem  o 
ouvir.  Mas  que  he  o  que 
allegou  a  Arvore?  Allegou 
o  mefmo  texto  do  Evan- 


14, 


anno,  fenaó  para  femp re  ?     gelifta :  &  efia va  como  ÒX" 
Podia  a  ver  califa  ,ou  def-     zendo  mudamente  ao  Se- 


culpa  mais  natural  de  naó 

ter  fruto ,  que  naó  fer  tem- 

o  delle  ?  Da  srvore  a  que 

e  comparado  o  jufto  ,  diz 

David,  quedara  o  feufru- 


nhor:  Eu  bem  tomara eftar 
carregada  de  frutos  ma- 
duros, 6c  fazoa dos ,  para  os. 
oíferecera  meu  Creador  j 
porém  a  cauía  ^  &  impedi- 
menta 


Rom. 


2  2  Sermão  dap 

meto  natural  de  me  achar 
íèmelles,  he  pornaó  fer 
ainda  chegado  o  tempo: 
Nonerat  tempusficorum.  E 
que  fetn  embargo  defta 
replica  ao  parecer  taóju- 
lUíicada  ,  a  condenaíTe 
Chrifto,  &:  com  condena- 
^ao  attn-siyinfempternuml 
Aílimfoi.  Mas  com  que 
fundamento,  oujuíliça? 
Entre  todos  os  Expofito- 
res  da  Efcritura,  mais  Le- 
trados, ôc  de  maior  enge- 
nho, nenhum  ouveatègo- 
ra,  que  déíTe  íatisfaçaó  ca- 
bal a  efta  duvida.  E  a  ra- 
zão de  fe  lhe  naó  achar  ra- 
zão, hejporque  as  razoeiís 
dos  homens  naò  alcançaó 
as  de  Deos,  &  onde  naó  fa- 
bedefcubrir  culpaojuizo 
humano,  a  pôde  achar  o 
divino.  Porque  naó  com- 
prehende  o  home  a  Deos  ? 
Forque  Deos  he  lacom- 
prehenfivel.  Pois  também 
por  iíTo  os  juizos  humanos 
naó  comprehcndem  os  di- 
vinos, porque  os  divinos 
fió  incomprehenfiveis  : 
^am  tncomprehenfibdta 
iudícia  ejus ! 

íi    Sobre   eítes  dous 


r  inteira  ^omingu 

princípios  taó  manifeííos, 
mim  da  ciência  de  Deos 
para comnofco,  outro  da 
noíTa  ignorância  para  com 
Deos  >  fica  fatisfeira  ,  & 
emudecida  toda  a  admira- 
ção de  que  Deos  haja  de 
julgar  atè  o  que  reputa- 
mos por  nada,&  neíTe  mef- 
mo  nada  haja  de  arguir,  & 
achar  culpas  ,  de  que  pe- 
dir, Sc  tomar  conta  no  dia 
dojuizo.  Sòrefta  humef- 
crupulo  ,  que  ainda  nam 
acaba  de  fe  aquietar,&na5 
menos,  que  acerca  daju- 
íliça,  com  que  Deos  nos 
hajadecaíligar  pelo  que 
naó  conhecemos.  He  ver- 
dade que  Deos  íabe  de 
nòso  que  nòs  ignoramos 
de  nòs,  mas  eíla  mefma  ig- 
norância noíTIi  naó  íb  pa- 
rece que  nos  derculpa,mas 
nos  livra  de  ler  peccado  o 
que  naó  conhecemos  co- 
mo tal.  Sem  vontade  nam 
ha  culpa ,  fem  conhecimê- 
to  naó  ha  vontade-,  como 
logo  pôde  fer  peccado,  & 
caltigadocomo  peccado  o 
que  eu  naó  conheço  ?  Bem 
tinha  decifrado  cíhiThco- 
WAx  o  Autor  do   noífa 


PrOT 


:rí 


ão  Aò'úent6.  3^ 

Provérbio   :  Qiicm  igno-     ignorância  lhe  aGrecentoia 


laor. 


rancemente  pecca,  igno- 
rantemence  vai  ao  Infer- 
no. Huafó  ignorância  ef- 
ciifa  cíopeccado,  queliea, 
ifívencivel.  Mas  eíia pou- 
cas vezes  fe  acha.  Os  de- 
mais não  fó  peccáo  no 
peccadoj  mas  na  i^oran- 
cia,  com  q o  naó  conhece.. 
Nãopeccárão  graviílima- 
mítç,  os  Judeos  na  morte 
deChriílo?&:cótudo  diz 
S.Pedro,q  elIes^Scosfeus 
Principes  o  íizeraó  igno- 
rantemente :  Seio  qmaper 
ignorantiam  feciUis^  ficut 
ér  Trincifes  <vefirL  £  o 
mefmo  Chriílo  quando 
á^iKc  y  Tãter^ignofce  ilUs^ 
nouenimfciunt  quidfaciut^ 
juntamente  alíegou  par 
elles  a  ignorância, &  pedio 
para  elles  o  perdão.  Se  a 
ignorância  os  livrara  do 
pecçado  ,  não  tinháo  ne- 
ceflidade  de  perdão  :  mas 
pediolheo  Senhor  o  per- 
dão, quando  lhe  confeílbu 
a  ignorância  5  porque  tam 
fora  eíliveráo  de  ficar izé 
tos  do  peccado  pela  igno- 
rância coQi  que  o  comete- 
rão ,  que  antes  a  meíma 
:     Tom./. 


hum  peccado  íbbre  outro 
peccado.  Hum  peccado, 
porque  tirarão  a  vida  ao 
Meílias  não  conhecido,  & 
outro  peccado  5  porque  o 
não  conhecerão ,  tendo  tá- 
ta  obrigação  ,  como  evi-- 
dencia  para  o  conhecer. 

3  2  lílo  meímo  he  o  que 
fe  vè  hoje  entre  os  que  co- 
nhecem, «Scadorão  a  Chri- 
fto  5  &  não  por  aconteci- 
mento raro,íenão  comum . 
mentejiiem  fò  nas  vidas  $ 
fenão  também  nas  mortes. 
Quantos  peccados  vemos., 
&  quam  grandesjnê  emen^ 
dados  na  vida, nem  confef^. 
íãdos  na  morte,  os  quaes 
não  ío  Deos  ,  mas  todo  o 
mundo  eílà  conhecendo  ^ 
&  fó  os  mefmos,que  os  co- 
mctem,osnão  conhecem! 
Não  os  conhecem  ,  por- 
que a  largueza  ,&  relaxa- 
ção da  vida  efcurece  a  co- 
fciencia,  6c  cega  a  alma:  . 
não  os  conhecem  ,  porque 
o  amor  próprio  fempre  ef- 
cufa,  &  aligeira  o  que  nos 
códena:  não  os  conhecem, 
porque  os  intereíres,&  có- 
veniencias  deíle  mundo 
C  tra- 


5  ^  Sermão  da  primeira  T)omÍTiga 

trazem  configo  o  efqucci-  ^bitabfcondiui  tencbrarum. 


u 


Píalm. 


mento  do  onero :  nam  os 
conhecem  5  poí  que  os  naó 
querem  examinar  ,  nem 
confulrar  com  quem  de- 
viáo  ;  não  os  conhecem  fi- 
nalmente, porque  com  ig- 
norância aífedada  os  nam 
querem  conhecer  para  os 
naó  emendar  :  Noluit  in- 
telliaere  ,  ut  bene  ageret. 
Vede  agora  ,  fe  caftigarà 
Deos  julhimente  no  dia  do 
Juízo  os  peccados  naó  co- 
nhecidos, fc  por  cometi- 
dos merecem  hum  caíli- 
gOj&pornaó  conhecidos 
outro  maior  ?  Forem  fe  atè 

aquellcdia  eílaràó  defco-  nareprefentação  do  mef- 
nhecidosj&fepultados  nas  mo  dia  dojuizo ,  o  mefmo 
trevasdeíla  maliciofa  ,  &:  foberano  Juiz  nos  cõmu- 
ignorante ignorâncias  en-  nicárahum  rayo  daquelhi 
táo  refufcitaráó,  &  ílihiràó  luz,para  que  viramos  ago- 
a  kiz  ,  porque  o  mefmo  raoque  então  avemos  de 
juiz  univerÍLil, como  diz  S.  ver  ,  &  com  os  peccados 
Faulo,  com  os  refplando-     conhecidos  nos  preíenta- 


,.Co,-. 
4Í- 


Pormeyodeílaluz  desen- 
ganadas entaó ,  &:  aílbm- 
bradasasmcfmas  confci- 
encias  do  muito  que  ve- 
ráó  ÍI\ir  de  baixo  do  nada 
quenaóviáo,  ou  não  qui- 
zeráo  ver^nenhCia  terá  que 
eílrajihar,  nem  replicar  á 
fentença5ainda  que  leja  de 
eterna  condenação ,  &  to- 
das diráó  convencidas  :  pfaim. 
hi}us es'Bomine,&r^um  •'^'^r 
jiidiciiim  tiium. 

§•  VIII. 
33  /^^^^    <^^^^  grande 
V_y  mercê  de  Deos 
fora,  fe  hoje,  que  eílamos 


res  de  fua  prefcnça  alki- 
miarà  as  confciencias  de 
todos  os  homens, &  defco- 
brirà  manifeíta mente  a  ca- 
da hum  tudo  o  que  nellas 
clbiva  cfcondido,  &  ásef- 
cu  ras :  (^oadulquc  ^Y  niat 
^DrminiiSj  qui  &  tUumu.a- 


ramos  antes  ao  tribunal  de 
fua  mifericordia,  que  de- 
pois ao  de  fua  juíliça !  Mas 
bcmdita  feja  a  bondade 
do  mefmo  Senhor  ,  que 
nãofó  nos  deixou  comu- 
nicado na  fua  doutrina  hií 
rayodaquclla  luz  ,  iVr.am 
trcs, 


do  Advento.  .  Jf 

e  não  cerrar-  ne^n  vãlicattonh  tu£ ,  jãm  í- 
enim  non  poteris  njilltcare. 
Dai  conta  da  voíTa  admi- 
niftração  ,  porque  defdc 
eíla  hora  eílais  excluído 
delia.  Eíla  circunftancia 
de  fera  conta  a  ultima  j  & 


três,  fenos  Ih 
mos  os  olhos.  Sendo  a,ma- 
teriadetudoo  quepaífou 
para  a  vida  ,  &  náo  ha  de 
paífar  para  a  conta  ,  tam 
immcnfa  à  capacidade  hu- 
mana, fó  a  Sabedoria  divi- 
na a  poderá  comprehêdcr:  naó  fe  poder  emendar ,  he 
ôcaílim  o  fez  Chrifto  Se-     hííadas  mais  rigurofas  do 


ac.i5. 


nhor  noíro5reduzindo-a,& 
repartindo-a  em  três  Pará- 
bolas, nas  quaes  nos  eníl- 
nouemfummatoda  a  có- 


dia  dojuizo.  Vindo  pois 
aofentidoda  Parábola  5  o 
homem  rico  he  Deos  ;  as 
fuás  herdades  faó  as  Igre- 


ta,quenoshade  pedir,  &     jas,  &asFrovinciasi  oad- 
deque.    A  primeira  Para-     miniftrador  noefpirituaí. 


bola,  he  dos  Officios,  a  fe- 
gunda  dos  Talentos,  a  ter- 
ceira das  Dividas.  E  eíle 
mefmo  numero  5  &  ordem 
feguiremos  para  maior  di- 
ftinção,&  clareza. 

34     Quanto  aos  Offi- 
cios, diz  a  primeira  Para- 


he  o  Papa,  no  temporal  he 
o  Rey  ,  6c  abaixo  deíles 
dous  fupremos  todos  os 
outros  Miniílros  Eccleíia- 
ílicos,8c  Seculares,  que  re- 
partidamête  tem  inferior 
jurdição  fobre  os  mefmos 
fubditos.    A  todos    elles 


bola("queheado  Villico^     pois  ha  de  pedir  Deos  ef- 
que  ouve  hum  homem  ri-    treita  conta,  não  fó  quan- 


CO5  o  qual  deo  afuperin- 
tendenciadas  fuás  herda- 
des a  hu  m  criado  com  no- 
me de  adminiílrador  del- 
ias E  porque  naó  teve  boa 
informação  de  feus  proce- 
dimentos, o  chamou  a  fua 
prefença,&  lhe pedio co- 
ta, dizendo  :  Redde  ratiu^ 


toàspeflbas,  fenão  tam- 
bém,&  muito  mais  quanto 
aos  officios.  Qiianto  àpef- 
íba,  ha  de  dar  cada  hú  con- 
ta de  fy,  &  quanto  aos  offi- 
cios ,  ha  de  dar  a  mefma 
conta  de  todos  aquelies, 
que  governou,  &  lhe  foraò 
fogeitos.  De  forte  que  o 
Ç  ij  I^a- 


:;  6  Sermão  da  primeira  TDom-inga 

Papa  hà  de  dar  conta  de     to,  que  não  temos  fé,  nem 


roda  a  Chriftandade  ,  o 
Rey  de  toda  a  Monarchia, 
o  Bi  fpo  de  toda  a  Diocefí , 
o  Governador  de  toda  a 
Província ,  o  Parocho  de 
rodaaFregiiefia,o  Magi- 
ilrado  de  toda  a  Cidade, 
&  o  cabeça  da  cafa,  de  to- 
da a  família.  Oh  íe  os  ho- 
mens foubéráo  o  pefo  que 
tomão  fobre  fy  quando 
com  tanta  ancía ,  Sc  nego- 
ciação pertendem ,  &  pro- 
curáoosoíiieíos,  oufecu- 
laresjou  EceleíiaíiícoSjCO* 
mo  he  certo  que  havíáo 
de  fugir  3  &  benzeríè  del- 
Its !  Mas  não  os  procurão 
pelo  pefo,  fcnão  pela  dig- 
nidade, pelo  poder,  pela 
honra, pela  eílímação,  & 


fabemosaquenos  obriga. 
Vedes  quantas  Almas  ha 
neíta  Cidade,  quantas  Al-^ 
mas  ha  neíla  Província^ 
quantas  Almas  ha  em  to- 
do o  Reyno  ?  Pois  fabei,fe 
oignoraís,au  não  adver- 
tis, que  de  todas  eíl as  Al- 
mas hão  de  dar  conta  a 
I>eos  os  que  governam  a, 
Cidade,  a  Província  ,  &  o 
Reyno.  Porque  aílim  co- 
mo fobre  todos  ,  ^  cada 
hum  tem  poder  <Sc  man- 
do, aílim  em  todos, &  cada 
hum  faò  obrigados  a  lhe 
fazer  guardar  as  Leys,nam 
fó  as  humanas,  fenáo  tam- 
bém as  divinas.  Não  he 
iílo  encarecimento  meu, 
fenão  doutrina  folida  ,  & 


maisque  tudo  hoje,  pelo     de  fé  pronunciada  por  bo- 
intereíle.    Porém  quando     ca  de  S.   Paulo  :  Obcdne 


no  dia  dojuizo  fc  lhe  to- 
mar a  conta  pelo  pefo,  en- 
tão veráó  onde  os  leva  a 
balança. 

^f  Sc  he  tão  diílicul- 
tofodarboa  conta  da  Al- 
ma própria ,  que  he  huma, 
quam  diíhcil,  6z  quaniim- 
poíQvel  fcrà  dalla  boa  de 
tantas  mil  P  Çoaio  hc  ccr« 


Tr^pofitis  vejiris^&fubjn- 
cete  eis :  iffi  enim  fer^vigi-  ^^^^^. 
lant  qiiafirationernpro  ani-  xiij^ 
mabus  vejiris  reddituri. 
Obedecci,díz  a  Apoílolo, 
a voíTos  Superiores,  &:  fe- 
dclhe  muito  fogeitos^por- 
que  a  fua  obrigação  hc  ze- 
lar, &  vigiar  fobre  asvof- 
fis  vidas  í  como  aqucUcs 
que 


do  Advento'.  ^7 

que  hão  de  dar  conta  a     revelação  do  mermoCh ri- 


Deos  de  yoílàs  A  Imas.  Ve- 
de quanto  maior  he  a  fo- 
geiçáo  dosSuperioreSjque 
a  dos  ílib ditos.  Quantos 
íàó  os  fubditosjqiie  eíláo 
fbgeitos  ao  Superior»  tan- 
tas faó  as  Almas  de  queeí- 
tàfogeito  oSuperior  a  dar 
conta  a  Dcos.  E  pofto  que 
çílc  oráculo  baftava  para 


fto,  todos  os  homícidios, 
todos  os  adultérios,  todos 
os  furtos  5  todos  os  facri- 
legios5&  mais  peccados 
que  os  vaíTailos  cometem 
na  vida,  &rcynadode  hu 
Rey,  &  as  ovelhas,  &  fub- 
ditos  na  vida,  &  governo 
de  hum  Prelado ,  todos  eA 
tes  peccados  íè  lançáo  lo- 


nenhum  homem  que  tem     gOí&cícrcvem  nos  livros 
fé  querer  tomar  fobre  fy     de  Deos  debaixo  do  titulo 


dotalReyj&  debaixo  do 
titulo  do  tal  Prelado,  para 
fe  lhe  pedir  conta  delles 
no  dia  do  Juizo. 

jd    Ponhamos  agora 


húa  tal  fogeição^ouvi  ago- 
ra o  que  nunca  ouviftes. 
Nem  todas  as  íentenças 
deChriílo  eftão  efcritas 
fio  Evangelho  :  algúas  fí- 

cáráo  fomente  impreííãs  efteRey,  &  depois  pore- 
lla  tradição  defeus  Difci-  mos  também  eíle  Prelado 
^ulo»,  entre  as  quaes  he  diante  do  tribunal  divino, 
Kéfer-  ^^^  Jf^o^^vel  como  terrivcl  &  vejamos  que  refpon- 
eíla:  Omnêpsccatum^  quod  dem  a  eftes  cargos.  O  Rey 
^  remiJJiíSi  &  indifciplinatus     he  a  cabeça  dos  vaíTallos  : 


Haber 
to  Pha' 


fi»  in-  admíferitfrater  ,  ad  negll 


dos  os  peccados  ,  que  co^ 
metem  os  íubditos,fe  ef- 
crevem ,  6c  carregáo  logo 
no  livro  das  culpas  doSu- 


&  quem  ha  de  dar  conta 
dos  membros?  fenão  a  ca- 
beça ?  ORey  he  a  Alma 
do  Rcyno  :  &:  quem  ha  de 
dar  conta  do  corpo,fenam 
a  Alma  \  Pedira  pois  conta 
Deos  a  qualquer  Rey,naó 
perior,  porque  ha  de  dar    digo  dos  peccados  rcusj&r 
conta  delles.  De modo,que     da    pefíba   ,   fenam   dos 
(çgundo  eíla  fentença  ^  Sc    aIheos,&  do  oíiicio,  E  que; 
.-.To Cl. 7»  ^  C  ii]        refr- 


1. 

^cAiz-^ i^t^^pT^otinus  revertltiiT 

^aíab  feniorem.  Quer  dizer:  to. 

nicnfi 
Abbare 
in  Mo- 
nafiicis 

ftrioni- 


58        ,    > 
reípondera 

BiMS  Reo  ?  Parece  que  po- 
derá dizer  :  Eu,  Senhor,  bé 
conhecia  que  era  obrigado 
a  evitar  os  peccados  dos 
meus  vaílal los,  quanto  me 


Sermão  daprmeira  T>õmin^a 

não  Rey,  tcrceíTaò  ,  &  outros  por 
adulação  ,  &  outros  por 
ruim, &  apaixonada  infor* 
mação?  fc  os  que  ficarão  de 
fora  com  mais  conhecido 
merecimento,  porc]ue  os 


foíTe  polliveh  mas  a  minha     excluiftes  ?  Mas  dado  que 


Corte  era  grande  ,  o  meu 
Reyno  dilatado,  a  minha 
IvJonarchiaeftendida  pela 
Africa,  pela  A íia,  &  pela 
America  •,&  como  cu  não 
podia  eílar  cm  tantas  par- 
tes, &  tão  diílantes  ,  na 
-Corte  tinha  provido  os 
Tn  bunaes  de  Prefidentes, 
^cConfelheiros  ,  no  Rey- 
no de  Miniílros  de  Jufti- 
ça,&:  Letras ,  nas  Conqui- 
HasdeVifo-Reys,  &  Go- 
remadores ,  inítruidos  de 
Regimentos  muito  juíios, 
Zic  approvados.  E  illo  he 
tudo  O  que  fiz,  &  pude  fa- 
zer Também  poderá  me- 
ter ncita  conta  o  feu  pró- 
prio Palácio,  &  aqucllcs 
de  que  íe  fervia  mais  fami- 
]iar,&  interiormente.  Mas 
fobre  todos  cae  a  replica. 
E  cíles  que  cicgcílesjfdirà 
Dcos  3  porque  os  elege- 
rdes ?  Não  foráo  algús  por 
aiiciv^ao ,  &  outros  por  m- 


todos  foífem  eleitos  com 
os  olhos  em  mim  ,&  jura- 
mente-, depois  que  na  ad- 
miniílração  de  feus  offi- 
cios  conheceftes,  que  nam 
procedião  como  eraó  o- 
brigados  ,  porque  os  nani 
removeílcs  Jogo,  porque 
os  dillimulaítes,  &;  confer- 
vaftes  3  &  o  quepeorhe, 
porque  os  deípachalles  de 
novo,&com  mais  autho- 
rizadospoílos?  Se  o  que 
aílblou  húa  Província  ,  o 
deixaíles  cócinuar  na  mcf- 
maaííblação,  &  depois  o 
promoveftes  a  outro  go^ 
verno  maior  ,  como  nam 
foftes  complice  das  fuás 
iiijuftiças,  &  das  culpas, 
qucelleemvez  de  reme- 
diar acrecentou  com  as 
fuas,&:com  o  excplo  del- 
ias? Se  as  fuás  tiranias  vos 
foraó  manifeftas ,  como  as 
dcixaíles  fem  calligo  ,  &z 
os  d;^x\o$  dos  oílcndiuos 
.  .    fcna 


do  Advento. 


fem  rcftituíçáo  ?  Quantas 
lagrimas  de orfa os )  quan- 
tos gemidos  de  viuvas, 
quantos  clamores  de  po- 
bres chega  vão  ao  Ceo  no 
roííb  Reynado  ,  quando 


^9 


lado  a  dar  conta,  &•  a  ouvir 
em  eílatua  o  proceífo,  que 
depois  da  refurreiçáo  lhe 
fera  notificado  em  carne. 
Oh  que  efpedacuío  íerà 
aparecer    defcoroado  da 


paraííiprir  íuperfluidades  MitrajScdefpido  dos   pa- 

vans>  &  doações  inofíicio-  ramentos  Pontificaes  dia- 

fas,  voílbs  Miniílros  Ç  por  te  da  Mageftade  de  Chri- 

iílb  premiados  >  &  louva-  fro  Jefu  aquelíe,  a  quem 

dosj  com  impiedade  mais  o  mefmo  Senhor  authori- 

que  deshu mana    náo   os  zou  com  o  nome,  &  podev 

defpoj  a  vão,  mas  defpião  P  res  de  feu  Vigário,  &  cuj  a 

Ifto  hco  quepoderàrepli-  hainiana ,  &  divina  Peííba 

car  Deos,  emudecendo,  &  reprefentou  nefta    vida ! 

náo  tendo  que  refponder  O  Taftor^&  Idólum  f  lhe 

o  trifte  Rey .  E  qual  íerà  a  diràChrifto.Tu  q  foftePa 


Z3ck. 
11.17. 


ília  fentcnça  ?  No  dia  da 
Juizo  fe  ouvira.  O  certo 
he,  que  David  R.ey  imanto 
antes  de  peccador,  &  de- 


ítor  no  nomc,&  como  Ído- 
lo te  cótentaílc  có  a  adora- 
ção exterior q  náo  mere- 
cias, dà  conta.  Náo  ta  pe- 


pois  de  peccador  exemplo  codas  miferias  occultas, 
de  penitenciado  de  que  pe-  íenâo  das  publicas,  Sc  ef- 
dia  perdão  a  Dcos,  era  dos  candalofas  de  tuas  mal 
peccadosoccultos5&  dos  guardadas,  &  defprezadas 
aiheos  :  Ab  occultis  méis  ovelhas.  Erão  miferaveis 
mudame^Ó'  ab  alienisparce  no  temporal,  &  não  trata- 
fervo  tua.  Mas  os  peccados    íle  de  remediar  íuas  po- 

brezasj  &  eraô  muito  mais 
miferavcis  no  efpiritual , 
& naó cuidaftc  de  curar, 
jnem  de  prcfervar  íèus  pec- 
cados. Se  as  rendas ,  que 
com  táta  cobiça  recolhias, 
C  ini  & 


occultos  naquelle  dia  fe- 
ráó  manifeflos  ,  &  dos 
aiheos  5  por  teríidoRey, 
fe  lhe  pedira  taó  cítreita 
conta,como  dos  próprios. 
j7    £nt-re  agora  o  Pre- 


4-0  Sermão  da  primeira  ^07n  ingá 

&com  táta  avareza  guar-     caía,  8c pcíToa,  foi  para  fa- 


davas, eraó  o  meu  patri- 
monio,qiie  eu  acquiri  naó 
menos,  que  c5  o  meu  Tan- 
gue j  porque  o  não  diftri- 
buLÍle  aos  meus  verdadei- 
ros acredores  >  que  faó  os 
pobres  ?  Porque  o  defpen- 
delleem  carroças5criados> 
&cavalIos  regalados,  ci- 
tando elles  morrendo  de 
fome:  Sc  em  vellir  as  tuas 
paredes  de  ouro ,  &  feda , 
andando  ejlcs  dcfpidcs,  & 
tremendo  de  frio  ?  Se  o  ze- 
lo de  teus  Miniílros  viíi- 
tava  as  vidas  dos  pequeni- 
nos 3  tratando  mais  de  fe 
aproveitar  das  condena- 
çoens,  que  de  lhe  emendar 
as  confciencias :  os  pecca- 
dos  monftruoíbs  dos  gran- 
des, que  taó  foberba^Ôc  ef- 
candaj-ofa mente  vi  viaó  na 
facç  do  mundo,  como  os 
deixalíe  triunfar  com  per- 
petua immunidade,  como 
íe  foraõ  íuperiores  às  Leys 
da  minha  Igreja? 

38  Coiífe fio.  Senhor, 
rcfpondcrà  o  Prelado,  que 
cm  húa,&:  outra  couíii  fal- 
tei, iiias  naó  ícm  caula.  O 
que  dcípçndi  cpai  nuuh^ 


tisfazeraos  olhos  do  vul- 
go, que  fó  fe  leva  à^^^% 
exteriores,  6c  para  confer- 
varaauthoridade  do  oíE- 
cio, &  veneração  da  digni- 
dade. E  fe  contra  os  pec- 
cados  dos  grandes  me  naó 
atrevi, foi,porque  os  feus 
poderes  faó  inexpugná- 
veis ;  &  julguei  por  menos 
inconveniente  naó  entrar 
com  ellcsem  batalha,  que 
com  afronta  ,6c  dcfprezo 
das  mcfmas  Leys  da  igre- 
ja ficar  no  íim  da  peleja 
vencido  :  6c  final  mente  > 
Senhor,  cm  húa  ,  6c  outra 
omiílaó  fegui  o  exemplo 
univerfal,  ^  o  que  ufió 
nefte  officio  os  que  com 
mais poderofas  armas,  ^ 
com  maiores  jurdiçoens 
que  a  minha,cofi:umaó  cm 
toda  a  parte  fazer  o  mef- 
mo.  O  Ignorante,  ò  covar- 
de, replicará  Chrifto.Taó 
ignorante,6c  covarde,  co- 
mo fe  não  tiveras  lido  as 
Efcrituras ,  nem  os  Cano- 
nes,6c  exemplos  da  mefma 
Igreja.  For  vxntura  Fedro 
6c  FauIo,vSc  os  outros  A pp- 
ftolçs,  que  me  juni rá \  aò  a 
aniu. 


do  Advento.  41 
mím,&  os  feusverdadei-  valor  deíles  ,  fenaó  o  que 
rosfucceflbre^.queosimi-  chamas  coftu me  dos  ou- 
táraó  adies,  conciliavaóa  tros,  agora  veras  em  ti,  & 
authoridade  das  peíToas.Sc  nelles,  que  fe  elles  o  coita- 
do oíHcio  ,  ainda  entre  maó  fazer  aílim,  eu  tam- 
Gentios,  com  os  appara-  bem  coftumo  mandar  ao 
tos  exteriores  ?NaôfabeSj  Inferno  os  que  aílim  o  fa- 
queeíTemefmoPovo.com  zem.  Ifto  baile  quanto  à 
cujos  olhos  te  cfcufas,  fe  conta  dos  oííicios  ,  &  to- 
pordarestudo  aos  pobres  mem  exemplo  os  Mmi- 
teviíTem  defacompanha-  Urosfecul ares  na  conta  do 


do,  fó,&  a  pè  pelas  ruaSí& 
ainda  com  os  pès  deícal- 
ços,  entaó  fe  ajoelhariam 
todos  diante  de  ti  ,  6c  te 
adorariaó  ?  E  quanto  à  co- 
vardia de  te  naó  atreveres 
com  os  grandes  ,  tendo  a 

teu  lado  a  efpada  de  Pe-     .. 

droi  contra  quem  featre-     criados  a  quem  oReyen 
via  David,  que  foi  o  exem-    comendou  diíFerentes  ca 


Rey  ,  &OS  Ecclefiaíticos 
na  QO  Prelado. 

5.  IX. 

39  /"^Uanto  à  conta 

V^dosTalétos,  ef- 

ta  temos  na  Parábola  dos 


piar  dos  meus  Paílores  .^ 
Entre  as  feras  tomavafe 
com  osLeoens  ,  Sc  entre 
os  homens  com  os  Gigan- 
tes.Que  fera  mais  ferajquc 
a  imperatriz  Eudoxia-,  §c 
vè  como  a  naó  temeo 
Chryfol]-omo>  Sc  que  Leaó 
maiscoro.do, que  o  Em- 
peradorTbeodoíÍo-,&:  vè 
como  o  hu  m i  1  ho u,  &  poz 
a  feuspès  Ambroíio.  Fi- 
nalmentej  fenáo  fegiiiíle  o 


bedaesjpara  que  negociaf- 
femcom  elles  em  quanto 
fazia  certa  jornada :  iVi^í7-^ 
ttaminidíimvenio.  O  Key  43. 
he  Chrifto,  a  jornada  foi  a 
defuafubidaaoCeo,  6c   a 
tornada  ha  de  íer  no  dia  da 
Juízo,  em  que  ha  de  pedir 
conta  a  cada  hum  do  que 
ne^^ociou  com  os  t3  lentos, 
que  lhe  deo,  <Sc  do  que  lu- 
crou, Sc  eanhou  com  elles : 
TojimuUum  ví^ro  tempons  2^.1^ 
'venit 


4  i  Sermão  da  primeira  T>om'nga 

venit    T>õminus  fervortim     tinha  negociado  com  el- 


zUorum^  &  pofuit  rationem 
cum  eis.  Os  talentos  fam 
os  meyos  aílim  univeríaes 
como  particulares  có  que 
a  Providencia  divina  aíli- 
fte  a  todos  os  homens,  5c  a 
cada  hum  para  fua   falva- 
ça5,&:  perfeição;  &os  avá- 
ços,  ou  ganâncias  ,  faó  o 
augmento  das    virtudes, 
merecimentos  ,  &  graça, 
que  no  exercicio,  agencia, 
6c    induftria ,  com  que  fe 
applicaò  os    mefmos  me- 
yos, alcançaó  os  que  nam 
fao   negligentes.     Quam 
exa£ta  pois  haja  de  íer  efta 
conta  ,  &  quam  riguroía 
paraosqueuíarem  mal  do 
talento,  na  mefma  hiíloria 
o  temos.  Os  criados,  a  que 
o  Rey  fiou  os  talêtos ,  eraó 
três:  ao  primeiro  entregou 
cinco50  qual  grangeou  ou- 
tros cinco:  ao  legimdo  en- 
tregou dous  ,  o  qual  gran- 
gcou  outros  dous,  &  am- 
bos foraò  louvados.    Ao 
terceiro  deo  hum  fó  talen- 
to, o  qual  ellc  enterrou.  E 
poíloqucna  conta  ooífe- 
receo  outra  vez  ,  &  rcíli- 
tiúo inteiro,  porque  nam 


Icjnem  acquirido  coufa  al- 
gúa,  o  Senhor  não  fó  o  lan- 
çou fora  de  fua  cafa,  5c  o 
mandou  privar  do  talen- 
to, mas  o  pronunciou  porLuc.rp: 
mao  crvxàoyftrve  nequam^  ^^■ 
que  foi  a  fentença  de  fua 
condenação.  E  fe  quem  na 
conta  torna  a  entregar  o 
talento  que  Dcos  lhe  deo 
inteiro,  &fem  defraudo  fe 
condena  j  que  fera  dos  que 
o  desbarataó,ôc  perdem,& 
tal  vez  o  convertem  con- 
tra fy,  &  contra  o  mefma 
Deos.^ 

40     Para  intelligencia 
defta  graviílima,&  perigo- 
fa   matéria    havemos  de 
fuppor  o  que  fe  naó  cuida  5 
&  he,que  naó  fó  faó  talen- 
tos os  dotes  da  natureza , 
os  bens  da  fortuna  ,  &  os^ 
doensparticularcs  da  gra- 
ça, fcnaó  também  os  con- 
trários, ou  privaçocns  de 
tudoiílo.  Nãofó  hedotc 
da  natureza  a  fermofura, 
fenaótarnbema  fealdade: 
nió  fó  as  grandes  forças, 
fenaó  a  fraqueza:  naò  fó  o 
agudo  entendimento,  fe- 
naó o  rude  :  naó  fó  a  per- 
feita 


4Í 

Afajzaõdcíla  ver- 


dõ  Advento. 
feitavifta,  fenaô  a  ceguei-  41 
ra :  naó  fó  a  íaude ,  fenaó  a  dade  interior,  &  providé- 
cnfennidade :  naó  fó  a  lar-  cia  verdadeiramente  divi- 
ga  vida,  fenaó  a  breve.  Do  na,  he,  porque  todas  eftas 
niefmo  modo  nos    bens     coufas, pofto que  entre fy 


que  ciiamaô  da  fortuna, 
naó  fó  hc  bem  o  illuftre 
nacimentOjfenaó  o  Iiu  mil- 
de  !  naó  fó  as  dignidades 
altas,  fenaó  o  lugar,  &  offi- 
cio  abatido  :  naó  fó  as  ri- 
quezas, fenaó  a  pobreza  : 
naó  fó  o  defcaníò  ,  fenam 
os  trabalhos:  naó  fò  os  fuc- 
ct^os  profperos ,  fenaó  os 
adveríbs:  naó  fó  os  man- 
dos, fenaó  o  fer  mandado  i 
nem  fó  as  vitorias ,  &  tri- 
unfos, íènaó  o  fer  vencido. 
Finalmente  nas  graças ,  ou 
doens  da  graça ,  naó  fo  he 
graça  o  dom  das  linguas, 
masonaófaberfallar ,  ou 
fer  mudo ;  naó  fó  o  das  le- 
tras5&  ciências,  fenaó  o  da 
ignorância  :  naó  fó  o  do 
confelho,  &difcríçaó,  fe- 
nam o  de  naó  ter  nem  po- 
der dar  voto  :  naó  fó  o  da 
oílentaçaó ,  &  boato  dos 
liiilagres^  fenaó  o  de  nam 
ferem  coufa  algua  mara- 
vil  h ofo,  fenaó  cota I  m  en  te 
defconhecido  ,  Sc  defpre- 
zado. 


contrarias,  podem  fer  me- 
yos,que  igualmente  nos  le- 
vem à  falvaçaó,  6c  promo- 
vaó  à  virtude  ,  principal- 
mente fendo  diíiribuidos, 
&difpenfados  por  Deos^ 
&applicados  conforme  o 
génio  de  cada  hum  ,  que 
por  iílb  diz  o  Texto ,  que 
foraó  dados  os  talentos, 
Unicuique  jecundum  pro^ 
friamvirttítem.  Aírim,que  ^fff 
tanto  fe  podia  aproveitar 
Rachel  da  fua  fermofura  , 
como  Lia  da  fua  deformi- 
dade-.tanto  Achitofel  do 
feu  entendimento  ,  como 
Nabal  da  fua  rudeza:  tan* 
to  Mathufalem  dos  feus 
novecentos  annos,  como  o 
moço  de  Naim  dos  feus 
vinte :  tãto  Creíiu  do<?  feus 
thefo-jros  ,  como  iro  da 
fua  pobreza  :  tanto  Júlio 
Cefar  da  fua  fortuna ,  co- 
mo Pompco  da  fua  def*^ 
graça  :  tznto  Alexandre 
Magno  das  fuás  vitorias^ 
como  Dário  6c  Foro  de  cl- 


[I 


^^  Sermão  da primeiraT)om}ngà 

leos  ter  vencido  :  tanto     asqiielifongcaóo  appetí- 
Aramdafoltura  ,   &  cio-     te  ;ôc  mais  íbguras  para  a 
quencia  da  fua  língua ,  co-     falvaçaó  as  que  pezaó ,  & 
mo  Moyfes  do  impedimé-     carregao  para  a  humilda- 
to  da  fua  :  tanto  o  futiliíTi-     de,  que  as  que  elevam  ,  íc 
mo  Efcoto  da  fua  ciência,     defvanecem  para  a  fober- 
como   Frey  Junipero  da     ba.  Só  foubéraó, manejar 
fua  fímplicidade  :  tanto  S,     huns,&  outros  meyos ,  ôc 
Pedro  dos  fcus  milagres  ,     aprovcitarfe  com  igualda- 
comooBautifta  de  nunca     de  de  ambos  os  talentos 
fazer  milagre.  Daqui  fefe-     hum  S.  Paulo,  qie  dizia: 
gue,  que  tanta  conta  ha  de    Seio  abtinâare^&fcio  efurt-^w.y,^ 
pedir  Deos  ao  rico  da  fua     re.  E  humjob^quena  mef-  f '^^ 
riqucza,comoaopobreda     ma  volta  da  fua  primeira 
fua  pobreza  :  tanta  ao  fam     para  a  fcgúda  fortuna ,  diA 
dafuafaude,  como  ao  do-     fe  :  Si  bonafufcepimus  ^^^^ 
ente  da  fua  enfermidade :     tnanu  l^eiy  mala  quare  non  ,^  - 
tanta  ao  honrado  da  fua    fufcipiamus  ?    Mas  eíles 
eftimaçaó,  como  ao  afron-     homens  quadrados  nafcé 
tadoda  fua  injuria;  &tá-     poucas  vezes  no  mundo. 

Os  dados  taõ  firmes  fc  af' 
fentaó  com  poucos  pótos, 
como  com  muitos  >  &  ta6 
direitos  eítaó  com  as  for- 


tes, como  com  os  azares. 

42     Deíla  maneira  (  & 
fejaeftaaunica,&:  impor- 


^A\ 


ta  a  todos  do  que  deo  a 
hunsjcomodoquc  negou 
a  outros;  porque  fe  o  rico 
pódegrangearcom  o  feu 
talento  por  meyo  da  ef- 
mola,o  pobre  também  pô- 
de com  o  feu  por  meyo  da  ._,  , 
paciência.  Eaílim  dosde-  tantiflima  advertência.  J 
mais.  Antes hc certo, que  Deíla  maneira  devemos 
^  *  aceitar  como  da  maò  de 
Deos,  fie cótcntarnos  çom 
o  talento,  ou  talentos,  que 
ellc  foi  fervido  darnos,oii 
fcjaó  como  os  cinco  ,  ou 
como 


entre  as  coufas,quc  fc  cha- 
maò  profpcras,  ou  advcr- 
fas,  mais  eficazes  faòpara 
o  merecimento  as  que 
mortiticaõ  a  natureza,  que 


ão  Advento'.  4^' 

como  os''dous,  ou  como     IJfachar  Afimisfortts.  Os 


Imm  fomente :  &  fe  pode- 
rá fer  nenhum,  ainda  fora 
mais  feguro.  Quando  o 
Rey  diílribuío  os  talen- 
tos aos  criados ,  naó  lemos 
que  algum  delles  fe  dcfcò- 
tentJ.dh  da  repartição.  Se 
os  que  Deos  deo  a  outros , 
faò  maiores  que  os  voílbs , 
elles  teráó  mais,3c  vòs  me- 
nos de  que  dar  conta  ao 
mefmoDeos.  Mas  fomos 
como  os  que  lanção  nas 
rendas  dos  Rey s  5  que  fó 
olhaó  para  o  que  recebem 
de  prefcnte,  &  naó  para  a 
conta,  que  Iiaô  de  dar  de 
futuro.  A  ã  mira vel  foi  ne- 
íle género  a  variedade,  & 
repartição  de  fortunas,  cÓ 


animaes  todos  tem  fuás 
inclinaçoens,  inftintos  ,& 
propriedades,& todos  fuás 
como  virtudes,  ou  vícios 
naturaes :  o  Leaó  género- 
fo,a  Serpente  afl:uta,o  Lo- 
bo voraz,  o  Gervo  ligeiro,- 
ojumêtofofredor  do  tra-, 
balho.  E  debaixo  defiras 
metáforas  íignificaya  Ja- 
cob aos  filhos  os  talentos 
de  cada  hum ,  &  o  ufo  dei- 
lesj&quaes  haviaõ  de  fer 
asacçoens,  &fucceíibs  de 
fuás  vidas,  &  defcenden- 
cias.  E  fendo  aílim,  que 
eíles  meímos  irmãos  fo- 
fréraó  taò  mal  aa  mefmo 
Pav  fazer  liuma  Túnica  a 
hum  delies  de  melhor  ef- 


quejacob  (  digamolo  aí^     tofa,queporiíIb  a  quize- 
íimj)  fadou  a  feus  íilhos,     raõ  tingir  em  feu  próprio 


quando  na  hora  da  morte 
lhe  lançou  a  benção.  Ufou 
dos  nomes  de   diírerentes 

Gencf.  animaes  ,  &c  ajudas  cha- 
mou Leaó ,  catulus  Leonis 

ibid.17. yíida\2L  Dan  Serpente,jí/2í 
^anCoIuber hivia:  a  Ben- 

^'^■^7-  jamim  Lobo  ,  Benjamm 

^^^^^  Lúpus  rapax  :  a  NeptaM 
'  'Cervo  5    Neptali  Cervus 


fangue  >  como  agora  ne- 
nhum delles  fe  queixa  de 
o  Pay  os  veílir  dé  taó  áit-r 
ferenres  pelles,  &:pelos,&; 
de  lhe  dar,  ou  chamar  taó 
diíferentes  nomes  ,  &  de 
taó  diíferente  nobreza , 
quãtovai  deLobo  a  Cer- 
vo, de  Serpentea  Leaó,  &c 
de  Leaó  a  Jumento  ^  Por- 


ibid. x4.  emijjiis :  a  Izaçhar  Juniéto.,     que  na  diíferença  da  tun i- 

ca. 


Sermão  daprimeira^ominga 
Jacob  como  minimos  pela  defefpera- 
çaó,&  pufilanimidade.Da 
cafta  deftes  últimos  foi  o 
que  enterrou  o  talento, 
podendo  fer  melhor  ,  & 
mais  celebrado  que  todos, 
fe o  naò  enterrara.  Puze- 
raó  alguns  Thcologos  em 


4<) 

ca   obrava 

Pay  em  íeu  nome  :  na  dif- 

fercnça,&:  repartição  dos 

talentos  ,   fallava    como 

Profeta  em  nome  de  Deos: 

&  como  a  diftribuiçaó  era 

feita  por  Deos,  &  os  talê- 

tos  dados  por  elle  -,  pofto 


que foíTem  taó  diverfos  na  queftaó  qual  dos  criados 

elHmaçaóA  credito,  quá-  fe    moftrára    mais   indu- 

to  vai  do  império  à  fervi-  ílriofo,feoque  com  dous 

da5,&  do  Leaó  aojumen-  talentos  grangeára  dous, 

to,  todos  abaixando  a  ca-  ou  o  que  com  cinco  gran- 

bcça  fe  contentarão,  &  có-  geara  cinco :  &  como  en- 

formarão  com  a  fua  forte ,  tre  elles  fe  naó  decediíTe  a 

&  nenhum  ouve  que  abrif-  queílaó,  devolveofe  a  húa 

fe  a  boca  para  fe  queixar,  academia  de  mercadores, 

ou  meteíTe  os  olhos  debai-  os  quaes  todos  rcfolyéraó, 

xo   das  fobrancelhas  para  que  mais  induílriofo  fora 

jnoR-rar  defcontentaméto.  o  que  com  dous  negociara 

E  que  diráo  a  iílo  os  que  dous,  que  o  que  com  cinco 

tantas    vezes   deixarão  a  grangeára  cinco  :  porque 

Relig;ia6,  &  a  n-iCfmaFè,  mais   diíiicultofo   he  ga- 

por  naó  terem  humildade,  nhar  pouco  com  pouco, 

nem  paciência  para  fofrer  que  muito  com  muito.  E 

que  fe   lhe  antepuzeíTem  fobreefta,  que  heprimei- 

os  que  naó  podiaó  Igualar  ra  máxima  nos  negocian- 


no  talento  ? 

43  Todo  o  talento  he 
arriicado  ao  perder  ,  ou 
naó  dar  boa  conta  dcUc  a 
prcfumpçaò  humana.  Os 
maiores  pela  fobcrba  ,  os 
menores  pela  cnvcja,  &:  os 


tes,  provada  com  a  expe- 
riência, acrecentáraó,  que 
feoque  teve  hum  fò  ta- 
lentOjgrangeára  outro,ex- 
cedcria  fcm  comparação 
nainduílria  ao  dos  dous, 
&:  ao  dos  cinco.  Grande 
con- 


do  Advento]  '  ^f 

conrolaça6,&:  verdadeira,     viadeierde   Agortiníio, 


fe  a  quizeOem  aceitar  os 
talentos  medianos.  Mas 
quem  poderá  curar  a  ce- 
gueira, Sc  contentar  a  en- 
veja  dos  que  fe  vem  exce- 
didos ?SauI  porque  ouvio 
(^vedeaquem  ?  )  porque 
ouvio  que  as  chacotas  lhe 
prereriaó  a  David  ,. tantas 


de  quem  fe  rezava  nas  Ef- 
colas  Catholicas  \  A  lógica 
Atiguftini  libera  nos  ^omi^ 
ne-y  fe  amolecido  com  as  la- 
grimas de  fua  mãy  ,  ella 
(como  hum  li  rio,  q  fe  ge- 
ra das  lagrimas  de  outro  3 
o  naò  tornara  a  gerar  ? 
Succederlhehia  o  que  ao 


vezes,&:por  tantos  modos     proFundiííimo  engenho  de 
oquizmatar  ,  &  por  i(^o     Tertulliano  ,  &    ao  im- 


perdeoacoroa.  E  Dédalo, 
aquelle  famofo  artiíice, 
que  prefo  em  hua  torre, 
inventou  ,  &  formou  as 
azas  com  que  fugio  delia 
voandojveiido  que  Perdiz 
Teu  difcipulo  inventara  o 
Êompaílbj&da  imitaçam 


menfo  de  Origenes  ,  os 
quaes  venerados  como 
oráculos  da  fua  idade,  & 
primeiros  Meftres  da  I- 
greja,aperdéraó,&fe  per- 
derão. Mas  que  muito  he 
que  o  barro  caya,&  fe  que^ 
bre ,  fe  o  entendimento  de 


de  húa  efpinha  a  ferra,  te-     Lúcifer ,  fendo  o  maior ,  q 
mendo  que  o  havia  de  ex-     Deos  criou ,  excedendo-o 


ceder  no  talento,  odefpe- 
nhou  primeiro  da  mefma 
torre. 

44  Mas  ainda  faó  mais 
arrifcados  os  talentos  , 
que  na  eminência  fe  eílr^- 
mão  fobre  todos.  Que  ha- 
via de  fer  de  Saulo  ,  fe  o 
mefmo  Chrifto  naò  decé- 
ra  do  Ceo,  &  o  derrubara 
do  cavallo  para  lhe  en« 
frear  o  orgulho  ?  Queha- 


fó  o  do  mefmo  Dcos,antes 
quiz  cair  do  Ceo,  que  ver- 
fe  nelle  excedido  !  Tanta 
conta  tem  como  iílo  os 
talentos  menores  ,  &  fó 
por  iífo  poderáó  dar  boa 
conta. 

5.  X. 

45*     A    Das  Dividas  hc 

x3l  ^  que  fó  nos  re- 

.fta, 


^,ê 


4,8  Sermão  da f  rime  ir  aT)omm^d 

lia, ultima, maior, Sc  mais     zes outros  tantos,  aincía 


^  8.2;. 


difficultofa  dc  todas.  Efta 
íe  contém  na  Parábola  do 
outro  Rey  ,  o  qual  fez  o 
que  muitos  naó  Fazemjque 
he  tomar  conta  aos  cria- 
dos de  fua  cafa :  ^i  voluit 


diria  muito  menos  do  que 
queria  ílgniíicar.  Porque 
eíle  Iley  he  Deos ,  6c  eíta" 
divida  he  a  dos  benefícios,. 
que  Deos  tem  feito  ao  ho- 
mem ;  &  como  o  menor 


rationem ponerecum  fervi s     beneficio    divino  por  fy 
Juis.  Do  que  logo  fe  fegue     mefmo,  ou  por  feu  Autor, 


no  principio  das  contas  fe 
moftra  bem, que  efte  cha- 
mado Rey  feria  o  mais 
poderofo,'&:rico  Monar- 
chade  quantos  ouve  >  ou 
naó  ouve  no  mundo  j  por- 
que o  primeiro  criado  foi 


ibid.24 


he  de  valor  infínitOjnaó  ha- 
numero  em  toda  aArith-- 
mctica,  nem  preço  em  to-, 
das  as  criaturas,  com  que- 
fe  poíTa  comparar,  quanto 
mais  igualar. 

46     S.  Agodinho  para 


convencido  de  que  era  de-     reprefcntar  mais  clara ,  & 
vedora  fazenda,  ou  erário     mais    patentemente   efta- 


Rcaldc  cento  &  vinte  mi- 
Ihoensdeouro.  Tátovem 
a  montar  os  que  o  Texto 
çhim^i-^decem  miilia  t alen- 
ta •,  porque  filiando  Chri 


conta,  introduz  ao  mefmo 
Chriílo  fazendonos  por 
fua  própria  Peílba  os  car^ 
gosdo  que  lhe  devemos, 
como  fará  no  dia  dojuizo: 


ílo  com  os  Hebréos ,  &  na     ^iid  eft   quod  debui  ultra 

lino-ua  Hebraica,  também    facerevine^medi.o-mnfc' 

^  -       .     ,.     ' ^^- ^^ ?  Que  coufa  ha>  que 

cu  dcveíle  fazerte,ò  ho- 
mem, ou  de  veíTc  Bi  zcr  por 
ri ,  que  naó  tenha  fcito.^De 
nada  te  era  devedor  >  & 
como  fe  o  fora  dc  quanto 
tenho ,  dc  quanto  poíro,&: 


ocomputo,&:valor  da  di 
vidafe  ha  dc  entender  de 
talentos,  naó  Gregos  ,  fe- 
naó  Hebraicos.  Mas  como 
crapoíIivcl>quehum  cria- 
do dcvcíTc  a  fcu  Kcy  cen- 
to 8c  vinte  nulhoc! IS  ?  Rcf- 
pondo,  que  quando  a  Pa- 
rábola diílcra  dez  mil  ve- 


de quanto  íòu  ,  tudo  em- 
preguei, (^  dcipendi  com- 


tigo. 


dú  Advento]  4.9 

tígo.  Crieite  quando  nao     o  mefmo  poder,  &  provi- 


eras, tirandote  dos  abif- 
mos  do  naó  fer  ao  fer :  dei- 
te hum  corpo  formado  có 
minhas  mãos ,  o  mais  per- 
feito :  deite  hila  Alma  ti- 
rada de  minhas  entranhas, 
&  feita  à  minha  imagem, 
dcfemelhança  :  ornei  ,  & 
habilitei  hum  >  6c  outro 
com  as  mais  excellentes 
potencias,  &  os  mais  no- 
bres fentidos  ,  para  que 
foílem  os  inftrumentos  có 


dencia  te  naó  confervára  ? 
De  repete  perderias  o  fer , 
&  tornarias  ao  nada  don- 
de fahifte.  Para  tua  con- 
fervação  te  àó.  nam  fó  o 
neceíferio,  íenaó  o  fuper- 
abundante  ,  &  tanta  im- 
m  eníidade  de  criaturas  no 
Ceo,^  na  terra,  todas  fo- 
^^itTíiS^LÚ  »  &  occupadas 
em  teu  ferviço.  Deite  hum 
Anjojque  de  dia,&  de  noi- 
te velando, &  dormindo  te 


quemefervifles,  &amaf-     aíHftiíIe,  &  guardaíTejCO- 
fes :  &  tu  ingrato  que  íize-     mo  fempre  afliílio,&  guar- 


He?  Dà  contados  cuida- 
dos, penfamentos,  &  ma- 
chinas do  teu  entendimê- 
to:  das  lembranças,&  ef. 
quecimentos  da  tua   me- 


dou.  Agora  te  revelo  os 
perigos  fecrctos,  &  occul- 
tos  de  que  foíle  livre  por 
feumeyo:  &  tu  lembra  te 
dos  públicos  ,  &  manife- 


moriaidosdefejosj&affei-  ílos,  que  experimentaííe, 

çoens  da  tua  vontade.  Dà  &  vifte.  Quantos  perecé- 

contadetodosospaííbsde  raó  em  outros  muito  me- 

teus  pès  >de  todas  as  obras  nores  .^  Quantos  mais  mo- 

de  tuas  mãos,  de  todas  as  ços  que   tu   acabarão  de 


vidas  dos  teus  olhos  ,  de 
todas  as  attençoens  dos 
teus  ouvidos,  de  todas  as 
palavras  de  tua  lingua ,  6ç 
de  tudo  o  mais  que  tu  fa- 
bes,  ôcnaó  cabeem  pala- 
vras. Depois  de  criado  , 
que  feria  de  ti,  feeucom 
Tom./. 


mortes  defefbradas ,  &:  re- 

Í>entinas3fem  tempo,  nem 
ugar  de  arrependimento , 
6c  emenda,  que  eu  fempre 
te  concedi.^  Dà  pois  con- 
ta da  vida,  dà  conta  da  fau- 
de ,  dà  conta  dos  annos,  dà 
coata  dos  dias,  dà  conta 
D  à^% 


>o 


das  horas,  fendo  mui  poii 
cas,&:  contadas  asquenaó 
emptregafte  em  meoíFen- 
der. 

47     Atègora  te  referi 
as  dividas  exteriores  do 


Sermão  daprimeirdT^ommga 


cios,  odios  por  amor,  per- 
feguiçoens  por  boas  obras: 
por  ti  fuei  fangue  ,  por  ti 
fui  prefo  5  por  ti  afronta- 
do, por  ti  esbofeteado,por 
ticufpido,  por  ti  açouta- 
poder  •,  agora  me  refpon-    dojportiefcarnecidojpor 
deras  às  interiores,  &pef-     ti  coroado   de  efpinhos, 
foaesdo  amor,  &  do  mui-     por  ti  emíim  crucificado 
to  que  fiz  5  &  padeci  por  ú,     entre  ladroens,  aberto  em 
Por  ti  depois  de  te  fazer  à    quatro  fontes  de  fangue , 
minha  imagem  ,  &  feme-     atormentado,  &  affligido 
Ihança,  mefizàtua^fazen-     de  anguílias  ,  &  agonias 
dome  homem  :por  tinaci     mortaes,  &  ainda  depois 
nos  defemparos  de  hum     de  morto   atraveíTado    o 
Prefepio :  por  ti  fui  deíler-     coração  com  húa  lança.De 
radoaoEgyptoipor  ti  vi-     tudoifto  pedi  por  ti  per- 
vi  trinta  annos   fogeito  à     daò  a  Deos,  &  o  pago  que 
obediência  de  hum  offi-     tumedèíte,  foi  nam    me 
ciai,  ajudando  o  trabalho     perdoar  ,  tornandome  a 
de  fuás  mãos  com  as  mi-     cruciiicar    tantas  vezes, 
nhãs ,  fie  acompanhando  o     quanta»  gravemente  pec- 
fuor  dofeu  roílo  com  o     caíle,  como  te  mandei  de- 
mcu.  Por  ti,  Separa  ti  fahi     clararpelomeu  Apoílclo^ 
ao  mundo  a  pregar  o  Rcy-     Rurfum  crucifigentes  Filiíi  ^^^^, 
no  doCeotporti  naspe-     T>et.  Se  as  gotas  de  ílm- ó.d. ' 
regrinaçoens  de   todaju-     gue,  que  derramei  por  ti, 
déa  ,  &:  Galilca,fempre  a     tiveraó   conto  ,  nem  de 
pè,  Ôc  muitas  vezes  defcal-     hua  fó  me  poderás  dar  boa 
ço,padeci  fomes,  fedes,po-     conta ,  ainda  que  padccé- 
brezas  ,fem  ter  lugar   de     raspormim  mil  mortes; 
defcanfo,  nem  onde  recli-     mas  os  milhares ,  &  os  mi- 
nar a  cabeça:  por  ti  recebi     Jhocns   foraò   das  vezes, 
in^raádoen^   por  bçncfi-    que  pizalle  o  mcfmo  lan- 
gue, 


do  Advento]  fi 

guç  j  facriíícando  o  infini-    Perdida  a  graça  da  primei- 


to  valor ,  &:  merecimento 
delle  aos  ídolos  do  teu 
nppetite. 

48  Ainda  cm  certo 
modo  he  maior  áivià^. ,  a 
de  que  agora  te  pedirei 
conta  5  que  lie  a  da  voca- 
ção. Refervei  o  fahires  à 
luz  deíle  mundo  para  o 
tempo  da  Ley  da  Graça; 
chameite  à  Fè  antes  de  me 
poderes  ouvir :  anticipou- 
ie  o  meu  amor  ao  teu  ufo 
da  razaó,  &  fízte  meu  ami- 
go pelo  Bautifmo.  Como 
I ei te, &  doutrina  da  Igreja 
te  áti  o  verdadeiro  conhe- 
cimento de  mim,  benefi- 
cio que  por  meus  juftos 
juizosem  quatro  &  cinco 
mil  annos  naó  concedi  a 
tantos  5  6c  de  que  ainda  nos 
teus  dias  carecerão  mui-» 
tos.Naó  tivefte  juizo,nem 
coníidcraçaó  para  ponde- 
rar, ScpaOnar  de  queten 


ra  vocação  caiíle  ,  &  t?or- 
neite  a  chamar  ,  ôc  dar  a 
maó  ,  para  que  te  levan- 
taílès  :  levantado  tornaftc 
a  reincidir  húa  ,  6c  tantas 
vezes,  &  eu  poílo  quetao 
repetidamente  ofFendido , 
6c  com  taó  continuadas 
experiências  da  pouca  fir- 
meza de  teus  propoíltos, 
6c  falíidade  de  tuas  pro- 
meílas ,  naó  ceílêi  de  te  of- 
ferecer  de  novo  meus  bra- 
ços 56c  te  receber  íempre 
com  elles  abertos :  atè  que 
infiel ,  rebelde,  Sc  obíiina- 
do ,  cerrando  totalmente 
os  ouvidos  a  minhas  vo- 
zes, te  deixaíle  jazer  no 
profundo  letargo  da  im- 
penitencia  final.  Dà  agora 
conta  de  tantas  infpira- 
çoens  interiores  minhas, 
de  tantos  confelhos  dos 
ConfeíTores,  6c  amigos^  de 
tantas  vozes  ,  6c  ameaças 


do  a  minha  juftiça  razocns     dos  Pregadores  ,  que  ou 
para  condenar  hum  gen-    naó  querias  ouvir,  ou  ou- 


tio,  que  me  naó  conheceo , 
as  tiveííè  minha  mifericor- 
dia  para  perdoar  a  hum 
Chriftáo,  que  conhecen- 
dome,  tanto  me  offendia. 


vias  por  curiofídade,6c  ce- 
remonia:  6c  também  ta 
poderá  pedir  de  eu  mef- 
mo  te  naó  chamar  eíiicaz- 
mentenahora  da  morte, 
Dij       por- 


^: 


m 


V  ir 


ji  Sermão  da primeiraT>ominza 

porque  o  defmereccfte  na     naó  minha  a  fentença,  què 


wiáx, 

49  Sete  fontes  de  gra- 
ça deixei  na  minha  Igreja 
f  que  he o  beneficio  daju- 
íHíicaçaò  ^  para  quenellas 
felavaíTem  as  Almas  de 
feuspeccadoS5&  com  ci- 
las feregaíTcm  ,  &  creccf- 
fem  as  virtudes.  Em  húa 
te  facilitei  em  tal  forma  o 


logo  ouviras  com  os  ou- 
tros malaventurados  :  Ite 
malediãi-  in  ignem  ater* 
num. 


fo 


S^    XI. 

AQui  parou  a. 
conta  das  Di- 
vidas, que  era  a  ultima,  ôc 
remédio  para  todas  as  cul-  maior  partida,  que  fó  re- 
pas, que  fó  com  as  confef-  ftava  para  as  contas.  E 
íar  te  prom eti  o  perda6>  aqui  viráó  a  parar  todos  os 
quetunaõ  quizefte  acei- 
tar, fugindo  da  benignida^ 
de  daquelle  Sacramento 
como  riguroíb,  &  amando 
mais  as  mefmas  culpas, 
queeílimando  o  perdão. 
Em  outra  te  dei  a  comer 
minha  carne,  &  a  beber 
meu  fangue,  &  juntamen- 
te os  thefouros  infinitos  de 
toda  a  minha  Divindade 
em  penhor  da  gloria  ,  &c 
bcmaventurança   eterna. 


que  ta6  defcuidados  vi- 
vem de  as  dar  bo.is  naquel- 
ledia.  Oh  dia  de  ira  I  ô 
dia  de  furor  !  ô  dia  de  vin- 
gança !  ô  dia  de  amargura ! 
ô  dia  de  calamidade  1  o  dia 
de  miferia !  ô  dia  eftupen- 
do !  ô  dia  tremendo !  ô  dia 
fobre  toda  a  comprehen- 
faó,  terrível  !  Aíllm  lhe 
chamaò  com  horror  os 
clamores  dos  Profetas  pe- 
la eftreitiílima  conta,  que 


quefoio  altiíTimo  fim  para     nelle  fe  nos  ha  de  pedir  a 
que  te  criei.  Defprezafte  o     todos.  Ê  fe  tudo  paíTi  para 


fim,  naó  quizeíle  ufar  dos 
meyos  •,  &  porque  efcolhe- 
íle  antes  citar  parafempre 
fem  mim  no  Inferno ,  que 


a  vida,  &  nada  paííli  para  a 
contai  que  cegueira, &  que 
iaf mia  lie  a  dos  que  todos 
fcus  cuidados   cmprcgao 


comigo  uo  CcQjf  tua  hc>  6c    no  que  paíTa  ,  fem  memo- 

na> 


ão  Advento^.  '^^ 

ria  ,  nem  cuidado  do  que     lias  de  levaf  comtigo,  he  o 


naò  ha  de  paílar  ?  Pode  ca- 
ber em  entendimento  có 
juizo  maior  locura  ^  qlie 
trabalhar  de  diajSc  de  noi- 
te hum  homem,  &:  cançar- 
ícj&defvelaríej&r  matarfe 
pelo  que  pa fia  com  a  vi- 
da, 8c  ha  de  deixar  com  a 
morte,  &:naó  fer  o  feu  úni- 
co cuidado3&:  defvelo  tra- 
tar fó  do  que  fó  ha  de  levar 
comíigo,&  do  que  fó  fe  lhe 
ha  de  pedir  conta  ?  Ouçaò 
cftes  loucos  a  S.   y\goíH- 


peccado.  Toda  a  matéria, 
dos  peccados  cà  ha  de  fi- 
car, porque  paííbu  com  a 
vida, 5c  fo  o  peccado  ha  de 
ir  comnofco,  porque  nam 
pafi?òu  para  a  conta. 

f  I  Pa  recém  e,  que  pa- 
ra defenganara  quem  tem 
fé,  baila  a  evidencia  deíles 
dous  pontos.  O  que  fó  qui^ 
zera alcançar  deDeos^  & 
pedir  aos  que  me  ouvirão , 
he^que  tomem  eíle  defen- 
gano  em    quanto   vivem 


nho :  Teccas  propter  pecn-  nefte  mudo,  &  naó  o  guar- 

niam?  híc  dimittenda  eft.  demparao  Inferno.  D^^^ 

"Peccas propter  vrllam  ?  hic  creve  o  Efpirito  Santo  no 

dmittendaeft.Teccasprop"  livro  da  Sabedoria  huma 

ter mulierem?  hlc dimítm-  pratica,  que  tiveraõ  entre 

da  eft.  Et  quidqutdeftprop^  fy  no  Inferno  o^  que  Là  fo  - 

ter  quodpeccas  ,  hk  dimit-  raó,depois  de  ter  gaftado  a 


tts^ò'  ipfiimpeccãtumyqtwd 
cÕmtttis^  t  ecum  portas, Vcc" 
cas,  homem,  por  amor  do 
dinheiro .?  êc  cà  ha  de  ficar 
o  dinheiro.  Peccas  por 
a  mor  da  herdade  ?&cà  ha 
de  ficar  a  herdade.  Peccas 
por  amor  da  mulher  ,  ou 
tua,ou  não  tua  ^  êc  cà  ha  de 
íicar  a  mulher.  Mashavê- 
do  de  ficar  cà  tudo  aquillo 
porque  peçcaíle  j  o  que  fó 
Toin./v 


vida  em  tudo  o  que  paíla 
com  a  mefma  vida  :  &  o 
que  fallaváo,era  defia  ma- 
neira ;  Ergo  errãvimtis  h 
via  veritatis^  &  Solintelli- 
gentia  non  eft  orttts  nobis.  O 
certo  he(^diziáo3que  errá- 
mos o  caminho,  &  que  an- 
dámos às  efcuras  ,  &  que 
em  tantos  dias,quantos  vi- 
vemos 5  nunca  nos  ama- 
nheceo  a  luz  do  Sol.  ^'td 
D  iij 


só. 


t^u 


Sermão  da  primeira  T>ominga 
ibiaem  7if)bisprofuitfuperbia  :  que     como  a  Teta  defpedidado 
^-        nosaoroveicárão  a  fobcr- 


ba,  Sc  gloria  váa  das  honras 


arco  ao  lugar  dellinado, 
qiic  dividindo  o  ar,  o  qual 
logo  fe  ccrra,&:  unc^naó  fe 
pôde  conhecer  por  onde 
paíTou  ;  Aut  tanquamfu-^^-^^^^ 
gitta  emiffa  tn  locum  defti- 


Xbid.o. 


do  mundo  ?  T>ivitiarinn 

jaãantia  qutd  corUulit  no^ 

fc:  de  que  nos  fervioaja- 

dbancia  das  riquezas  j  Ocos  ^ ^.-jj  . 

goílos,  delicias  ,  &  paíTa-  natitm,  divtjus  aer  in  fe re- 
re m  pos  em  que  ellas  fe  có-  clufus  efty  ut  ignoretur  tran^ 
ÍLimem,  deque  nos  apro-  fittisilíhts.  Agora,  agora 
veiráráo? Todas eíTascou-  conhecem  bem  no  Infer- 
ias paílaráo  como  a  fom-  no,&:  não  achaõ  compara- 
bra :  Tranfienmt  omniailla  çáo,com  que  baílanrcméte 
tancjuam  timbra.  Todas  declarara  fum ma  veloci- 
pafniráo  como  o  correio,  dadc,cò  que  todas  as  cou- 
que  fempre  caminha  ,  &  ílispaínió,  &coma  meíma 
niõ^xx2i\Tanq74am  níítim  preíTa  (dizem)  paííaraos. 
/í'rr«rrí'??j-.  Todas  paíTarão  nós,  porque  apenas  naci- 
como  a  nao,  que  vai  cor-  dos  logo  deixamos  de  Ter  , 
tando  as  ondas  ,  &  depois  ócfem  deixar  íinal  algum 
que  paífou.re  lhe  iiaó  acha  de  virtude,  em  noiTos  pro-. 
raílo  :  Et  tanquam  navis  prios  vícios  nos  confumi- 
qu.e  pertranfit  fluãiiantem  mos :  Stc  &  nas  n  ti  conti- 

^'^'^  '''•  aquam,  cnjus^cumprceterie-  mio  defivimus  cp :  é/  vir t ti-  ^^-^  ,^, 

rit^noneíiveftighm  inverti'  tis  quidem  nulkm figrium 

re.  Todas  paíBrão  como  a  valumus  oftendere :  tn  ma- 

ave,  que  voando,  &  baten  -  lignitate  aut  em  nojlra  con^ 

doolevcvento,quecorta,  fumpti fumiis . 
nem  final  deixa  do  feu  ca-  f  2     lílo  conferiaó  en- 

minho :  Aut  tanquam  avis  tre  fy  naquella  trií"l:e,&c  tar- 

^^''  ' ''  qiu  tranfuolat in aere  ver-  de deíengnnada  converfa- 

berans  levem  ventnm  ,  &  çaó  os  mílcravcis  conde- 

niiliim  ííg?in  inVi-nitur  iti-  nados:osquaespara  maior 

?;£r/.y/7/^//j-.  Todas  paíTáiaò  doe   levantando  os  olhos 

ao 


do  Advento,  f^ 

ao  Ceo,&:  vendo  là  glorio-     da  gloria  entre  os  Santos, 


como   nós  padecendo  as 
penas  entre  os   condena- 
dos. Nos  infenfati  vitam  il^  ibid.  4; 
lonvm    /eftimãbamus  inf<í>- 


fos,  &  triunfantes  os  que 
tratarão  mais  da  eflreiteza 
da  conta,  que  da  largueza 
da  vida  \panitcntiam  agen- 
Sz^.<;.i.tesy&  pr<e  angi^^ia/piritus  niamyéf finem  iilorumfine 
gementes 'y  com  vozes  que  honore-.ecce  quomodo  coni- 
Thefahiaó  do  interior  an-  putatijimt  inter filws  T>eh 
guftiado,  &  CO m  arrepen-  ér inter SanÕíosfors  illorum 
dimento,&  gemidos,  que  ^/^.Taesfaóascoufas  que 
jà  naó  aproveita  vaó,^/V£^«-  diíTeraó,  conclue  o  Eípiri- 
tes  intrafe^  diziaò  entre  fy,  xb  Santo, Sc  taes  os  difcur- 
^comíigo:  queheo  que 
diziaó?  Hifu7it  quos  hahui- 
fnus  aliqtiâão  in  derifum^  & 


fos  que  íizeraó  no  Inferno 
os  máos  quando  là  fe  vi- 
rão. Talia  dixernnt  in  In^ 


íbii. 


H- 


injirnilitudinúm  improperij:    ferno  hi   qui  peccaverunt, 
Aquellesíàóos  dequenòs     Vejamos  agora,  &  confí 


zombávamos  ,  rindonos 
dos  feus  efcrupulos  de  có^ 
fciécia,  &  das  penitencias^ 
&  rigores  com  que  morti- 
jficavaó  íeus  corpos ,  quan- 
do nòs  fó  tratávamos  de 
regalar  os  noíTosjSc  fatisfa- 
2er  noílbs  appetites  5  & 
agora  vemos  que  elles  fo- 
Taó  os  prudentes  ,  &  llzu»- 
dos,&  nòs  os  loucos,  &  vcv- 
fenfatos  ,  pois  elles  pondo 
^s  olhos  no  fim,  &  no  pre- 


deremos  bem  os  que  por 
mifericordiade  Deos  ain^ 
da  temos  tempo,  &  vida, 
fe  he  melhor  aproveitar 
defte  defengano  neíle  mu- 
do,ou  guardalo  para  o  In- 
ferno:  &  fe  folgaremos  no. 
dia  da  conta  de  ter  imita- 
do os  prudentesjque  eter- 
namente haó  de  gozar  a 
viíla  de  Deos  no  Ceo ,  ou 
acompanhar  os  loucos  ,  & 
infenfatosjque  haó  de  par 
mio  de  que  nòs  naó  hze*-  deceras  penas  do  Inferno 
tnos  caio  5  eíláo  gozando     por  toda  a  Eternidade  ? 


Diiij 


SER- 


fifl 


fí>^«^*J> 


'^'S»9«9^9a> 


SERMAM 

DA  SEGUNDA  DOMINGA 

DO 

A  D  V  E  N  T  O 


Joannes  in  vImuUs.  Mattli. 


II. 


§1. 

Uehade  haver 
outro  juízo  5  & 
outro  mundo 
nos  eníinou  a 
igreja  Catho- 
liça  o  Domingo  paíllido 
com  a  fé :  o  meímo  artigo 
(^fe  nienaò  engano  }  nos 
prova  hoje  com  a  razaõ. 
Dizo  Evangdiíla  S.  Ma- 
theus,q  o  Bautiíla,  aquel- 
le grande  Santo  y  aqucllc 
grande  í^rccuríbrdç  Ç.liri- 


fto,  por  mandado  de  He- 
rodes,  aquelle  máo  home , 
&aquelle  mio  Rey,  eílà 
hoje  em  prifocns ;  [joannes 
iwvmcuUs.  loannesin  lin' 
ctilisl  O  Bautiíla  empri- 
foens !  Logo  ha  de  haver 
outro  juizo,  &  outro  mun- 
do. Provo  a  confequencia,' 
Forqueie  ha  Deos,  he  ju- 
ílo  :  íc  he  juílo,  ha  de  dar 
premio  a  bons,  6c  caíligoa 
máos :  no  juizo  dclle  mun- 
do vemos  os  mios  ,  cornei 
Hcrodcs,  levantados  j  os 
bons. 


Sermão  da  fegunãa  dominga  do  Advento^. 
bonSj,  como  o  JBautiílajOp-     lo^nnes  in  vinculis  ? 


n. 


primidos  :  íeguefe  logo 
que  ha  de  haver  outro  juí- 
zo,^ outro  mundo ;  outro 
juizoj,  em  que  fe  emendem 
eílas  deíigualdadeSj  &  in- 
juíliças :  outro  mundo^em 
que  os  bons  tenhaõ  o  pre- 
mio de  feus  merecimen- 
tos, &  os  máos  o  caíligo  de 
fuás  culpas.  Oh  que  altos 
faó  os  fegredos  da  provi- 
dencia divina  !  os  noíibs 
próprios vicios faz  que  fe- 
jão  teílemualias  de  noíla 
fé.  Ham  dos  principaes 
fundamentos  de  noíla  fé  , 
•he  a  immortaíidade  das  al- 
mas^&anoíla  injuíliça  he 
a  mais  evidente  prova  da 
noííii  immortaíidade.  Se 
os  homens  naó  foráoinju- 


5-4  Masaílim  comoas 
prifoens  do  Bautiíla  con^ 
iirmãoefba  parte  da  dou- 
trina que  preguei  no  Ser- 
mão paílado  j  aíHm  tam- 
bém me  obrigaó  as  mef- 
mas  prifoens  ,  a  retratar 
outra  parte  da  mefma  dou- 
trina. Preguei  que  havia 
de  haver  hum  juizo  final, 
em  que  Deos  nos  ha  de  jul- 
gar atodos  :  ainda  o  digo 
aííim.  DilTe  mais,  que  eíte 
juízo  de  Deos  havia  de  fer 
o  mais  rigurofo ,  o  mais 
eílreito,  &  o  mais  terrível* 
Ainda  o  torno  a  dizerrpor- 
que  verdadeiramente  af- 
íim  he.  Porém  hoje  por 
muitas  razoens  vos  pare- 
cera, que  ainda  ha  outro 


ílos,  puderafe  duvidar  fe     juizo  mais  terrivel,  ainda 


eraoimmortaesj  masper- 
mite  Deos  que  haja  inju- 
íliças  no  mundo,  para  que 
a  innocencia  tenha  coroa , 
&  a  immortaíidade  prova. 
■Quem  pôde  duvidar  da 
immortaíidade  da  outra 
vida,fe  \^è  neíla  a  maldade 
deHerodes  levantada  ao 
trono,  Sc  a  innocencia  do 
JBâutiílapoítaexn  prifoés.. 


ha  outro  juizo  mais  rigu- 
rofo, ainda  ha  outro  j  ui  zo 
maiseftreitOj  que  o  juizo 
de  Deos.  E  que  juizo  he 
efte.^  Heojuizo,quepoz  o 
Bautifta  em  prifoens  ,  o 
j  uizo  dos  homens,  loannes 
in  'V incutis  \  O  Bautiíla  em 
prifoens!  Logo  o  juizo  dos 
homens  he  muito  mais  te- 
meroíò  >  que  o  juizo  de 
Deo'3. 


s. 


m 

li 


PiVim. 
14Í.2. 


5f 


Sermão  dafegmida^omingd 
Ainda  eíia  confe-  difcernecatifrmmeam  :  Sc^ 
nhorjjulgaimevòs  ,  &  de- 
cidi a  minha  caufa.  Nota^ 
vel encontro  de  aíFedos: 
fe  David  no  primeiro  Piai- 
mo  diz  a  Deos  ,  Senhor, 
naó  me  julgueis  j  como  o 
mefmo  David  nofegundo 
Pfalmo  diz  a  Deos  5  Se- 
nhor, julgaime?  Húa  vez 
julgaime,  outra  veznam 
me  julgueis;  que  varieda- 
de he  cila  P  Do  que  acre- 
centa  David  fe  vera  a  ra- 
zão da  diíFerença  :  lúdica 
me  T>etis ,  c^  difcerne  cau» 
fam  meam^  decente  nonfan^ 
Sfa^  ab  homine  iniqiw  eripe 
»^^.  Julgaime  vos  Senhor^ 
livraime  de  me  julgarem 
os  homens.  Aqui  eílà  a  dif. 
ferença.  No  primeiro  ca* 
fo  confiderava  David  o 
juizo  de  Deos  abíbluta- 
mente5&:por  iflb  pedia  a 
Deos,  que  o  naójulgafie; 
porque  o  juízo  de  Deos 
verdadeiramente  he  mui- 
to para  temer.  No  íegun- 
do  cafo  conílderava  Da- 
vid o  juizo  de  Deos  por 
comparação  ao  juizo  dos 
hom  cns,  &:  por  iílò  queria 
que  Deos  o  julgaílc}  por- 
que. 


Deos. 

quencia  he  mais  clara,que 
a  primeira.  No  juizo  de 
Deos  atè  hum  ladraò  fe 
falva  •,  no  juizo  dos  homés, 
atè  S.Joaó  Bautiíla  fe  con- 
dena :  loannes  In  v incidis^ 
E  juizo  em  que  atè  a  inno- 
cencia  do  Bautifta  fahe  có- 
denada,  eftehe  o  juizo  te- 
merofo,  elle  heo  juizo  for- 
midável, eíle  he  o  tremen- 
do juizo.  Eeíla  fera  a  ma- 
téria do  Sermão.  Que  o 
juizo  dos  homens  he  mais 
temerofo,  que  o  juizo  de 
Deos. 


í.  II. 


QUem  melhor 
que  todos  en- 
tendeo  eíla  grande  verda- 
de,ou  novidade  ,  que  te- 
nho propoíto  ,  foi  o  Real 
Profeta  David.  No  Pfal- 
mo cento  &  quarenta  & 
dous,  diz  David  a  Deos : 
Non  intres  injudichim  cum 
feri:o  ttio ;  Senhor ,  naó  en- 
treis em  juízo  com  vollb 
fervo  :  no  Pfalmo  vinte  &z 
quatro  diz  o  mefmo  Da- 
vid liz/^/í-^  ^^í'  'Deus  y  à' 


que  comparado  o  rigor  do    rofo ,  Sc  muito  mais  horri- 


juizo  de  Deos  comos  ri- 
gores do  juizo  dos  homês , 
muito  mais  rigurofo ,  & 
muito  mais  tremendo  he  o 
juizodos  homens,  que  o 
juizo  de  Deos.  No  primei- 
ro cafo  tinha  David  diante 
defy  o  temor  do  juizo  de 
Deos.  No  fegundo  cafo  ti- 
nha de  hua  parte  o  temor 
do  juizo  de  Deos,  &  da  ou- 
tra parte  o  temor  do  juizo 
dos  homens,  &  poíto  en- 
tre temor,  &  temor,  achou 
que  tinha  mais  que  temer 
no  juizodos  homens,  que 
no  juizo  de  Deos.  Agora 
entendereis  o  mifterioda- 
queflas  palavras ,  que  dei- 
xamos de  ponderar  noE- 
vangelho  paíTãdo.Tunc  vi- 
debtmt  Ftliúhomiràs  veni- 
entem  innubibus  C^li :  En- 
tão veráõ  o  Filho  do  ho- 
mê,qvirà  nas  nuvens  do 
Ceo.  Chriílo  he  homem, 
&  he  Deos  :  pois  porque 
naó  diz  virá  o  Filho  de 
Deosjfenaó  virá  o  Filho  do 
homem  ?  Porque  o  intento 
deChrifto  era  fazemos  o 
feu  juizo  tem erofo,  Schor- 
rivel :  &  muito  mais  teme* 


vel  ficava  reprefentado 
como  juizo  de  homem, 
que  como  juizo  de  Deos. 
He  tanto  mais  temerofoo 
juizodos  homens  5  que  o 
Juizo  de  Deos,  que  quando 
eíle  fe  quer  fazer  refpei- 
tar,  &  temer,  quando  fe 
quer  veftir  de  horror, &  af- 
íbmbro  ,  quando  fe  quei? 
moftrar  medonho ,  ôc  hor- 
rendo ',  chamafe  juizo  de 
homem :  naã  achou  outro 
nome  mais  fero,na6  achou 
oiitro  nome  mais  atroz, 
naó  achou  outro  nome 
mais  tremendo  :  Tunc  ^vU 
debunt  FHium  hominis. 

56  Temos  provado  o 
aífumptoem  comum:  de- 
çamos  agora  às  razoens 
particulares  delle,  quefaò 
muito  varias  ,  muito  foli- 
das5&  de  muita  doutrina  ^ 
8c  pode  fer ,  que  vos  pare- 
çaõ  tio  grandes,  &  taó  no- 
vas como  o  mefmo  af*^ 
fumpto, 

5 .  IIL 

jL    juizo  dos  homês 
lie 


\% 


6o 

hemaís  tem 

juizo  de  Deos  5  porque 
Deos  julga  com  o  enten- 
dimento, os  homens  jul- 
gaó  com  a  vontade.  Quan- 
do entre  o  entendimento 
de  DeoSjSc  a  vontade  dos 
homés,  naòouvera  aquel- 
la  infinita  diftancia,  baila- 
va fó  a  difrerença  ,  que  ha 
entre  vontade,  &  entendi- 
mento 5  para  fer  grande  a 
defigualdade  deííes  juí- 
zos.Quem  julga  com  oen- 


SermaÕ  àafegunda  T>cmmgã 
rofo  5  que  o     entendimento 


Declaran^ 
do  o  mefmo  Chrifto  Se- 
nhor noíTo  os  feus  poderes 
fupremos  de  Juiz  univer- 
fal  do  mundo  ,  diz  que  o 
Pay  deo  todo  o  juizo  ao  loan. 
Filho  :  Tateromne judicia  ^*'--- 
dedii  Filio.  Pergunto  :  & 
porque  o  naó  deo  o  Padre 
ao  Efpirito  Santo  ?  Para 
hum  juízo  perfeito  reque- 
remfe  três  coufas  :  Scien- 
cia  para  examinar  ,Juíli ca 
para  julgar  ,  Poder  para 


tendimento,  pode  julgar  executar.  Pois  feapeíToa 
bem,  &  pode  julgar  mal;  do  Filho,  &  a  do  Elpiriro 
quem  julga  com  a  vótade,     Santo  temamefma  fabe- 


nunca  pôde  julgar  bem  A 
razaó  he  muito  clara.  Por- 
que quem  julga  com  o  en- 
tendimento ,  fe  entende 
mal,  julga  mal,  fe  entende 
bem  ,  julga  bem.  Porém 
quem  julga  com  a  vonta- 
de, ou  queira  mal,ou  quei- 
ra bem,  fempre  julga  mal: 
fe  quer  mal  ,  julga  como 
apaixonado,  fe  quer  bem, 
julga  como  cego.  Ou  ce- 
gucira,ou  paixaó,vede  co- 
mo julgará  a  vontade  com 
ta  es  adjuntos.  No  juizo 
divmonaóhcaílim:  julga 
fó  O  entendimento,  &:  tal 


dória,  a  mefma  juíliça,  &  a 
mefma  omnipotécia  -,  por- 
que razão  dà  o  Padre  Eter- 
no o  ofHcio  de  julgar  ao 
Filho,  &  naó  ao  Eípirito 
Santo .?  A  razLió  moral ,  & 
altifllmaheeíla.  Porque  o 
Efpirito  Santo  procede 
por  adiro  de  vontade,  5c  o 
Filho  he  gerado  por  aíto 
de  entendimento :  &  o  jul- 
gar (^  ainda  que  fcja  Deos, 
o  que  julga}  pertence  ao 
entendimento  ,  &  nam  à 
vontade.  Ao  KrpiritoSá- 
tOjque  procede  por  vonta- 
de ,  dcolhe  o  Padre  o  dcf- 
pacho 


io  Advento:    ^i 

pacho  das  mercês  :  T>ator  nar  fó  por  entendimento , 

munertim :  ao  Filho,  que  fe  fem  vontade  5  o  dar  mui 

produz  por  entendimen-  por  vontade,  mas  com  en- 

to,  deolheo  juizo  das  cul-  tendimento.  E  feria  bem 

pas:  Omnejudichm  dedit  queodarfoíTe  fò  por  en- 

Filio  5  porque  o  dar, para  tendimento  ;  &   que  no 


que  fe  agradeça, ha  de  pro 
ceder  da  vontade,  Sc  oco- 
denar ,  para  què  fe  naó  er- 
re 5  ha-o  de  regular  o  en- 
tendimento. Ainda  nam 
eftàdito:  ouvi  húa  coufa 
grande.  Quando  o  Padre 
ab-eterno  gera  o  Filho, 
^era-o  por  puro  aábo  de 
entendimento,  íem inter- 
venção ainda  da  vontade : 
quando  o  Padre  >  &  o  Fi- 
lho produzem  o  Efpirito 
Santo ,  prqduzem-no  por 
a£to  da  vontade  ,  mas  jà 
com  fuppoíiçaó  do  enten- 
dimento. Pois  por  iííb  o 
dar  íe  attribue  à  terceira 
peífoa ,  Sc  o  j  ul  gar  à  fegun- 
da  5  porque  o  dar  ha  de  fer 
da  vontade,mascó  fuppo- 
íiçaó do  entendimento:  o 
julgar  ha  de  fer  fó  do  en- 
tendimento íem  interven- 
ção nenhúa  da  vontade. 
Eis  aqui  hum  perfeito  di- 
£tamedajuíliça  punitiva, 
&diílributiva.  O  conde- 


condenar  entraíTe  tam- 
bém a  vontade  ^  Naó:  por- 
que dahi  naceria  o  que 
acontece  algúas  vezes  , 
que  nem  as  mercês  obri- 
gaó,nem  os  caftigps  emen- 
dáo.  Condenar  com  von- 
tade, he  paíTar  além  de  ju- 
fto,  dar  fem  vontade,  he  íi» 
caràquem  de  liberal :  no 
primeiro  vai  efcrupulofa  a 
3uftiça,no  fegundo  íica  de- 
fairofa  a  liberalidade. 

f8  De  maneira  que  em 
Deos  a  vontade  ,  Sc  o  en- 
tendimento tem  reparti» 
dos  osofficios,  o  entendi- 
mento j  ulga^  a  vontade  da . ' 
Nos  homens  naó  paíTa  af- 
íim.  O  entendimento  eítà 
depoílo  de  feu  oíficio,  a 
vontade  ferve  ambos  :  a 
vontade  he  a  que  dà,  6c  a 
vontade  h e  a  que  jul ga .  A 
queixa  de  fer  a  vontade  a 
que  dà,  deixemola  aos  co-- 
biçofos,  Sc  aos  pertenden- 
tesy  afem-razaò  dcíer  a 
voa- 


<?2  SermaÕ  ãafegunda  dominga 

vontade  a  que  julga,  he  a     mefmo  Chríílo  l  Ha  coufa 


que  faz  o  juizo  humano 
mais  formidável  ,  que  o 
divino.  Veyo  hua  vez  a  luz 
a  fer  julgada  no  juizo  dos 
homensj&  vinha  ella  mui- 
to confiada  5  porque jà  an- 
tigamente tinha  apareci- 
do diante  do  Juizo  de 
Deos,  8c  fahio  delle  com 
grandes  approvaçoés:  Fiat 
íux-,&faifa  efl  iiix-^ér  vidit 
IDeus Incem  >  quodejfet bo-^ 
na,  Comeftasabonaçoens 
do  juizo  de  Deos  entrou  a 
luz  no  juizo  dos  homens, 
&como  vos  parece  que 
fahiria  delle^DiíTe-o  Chri- 
íto  no  Capitulo  terceiro 


mais  fermofa  ,  ha  coufa 
mais  útil ,  ha  coufa  mais 
ncceíTaria  no  mundo  ,  que 
a  luz?  Pelo  contrario  ha 
coufa  mais  fea  ,  ha  couía 
mais  horrenda  ,  ha  coufa 
mais  inútil,  ha  coufa  mais 
chea  de  inconvenientes, 
que  as  trevas?  Naó  íaó  as 
trevas  a  capa  dos  latrocí- 
nios, as  terceiras  dos  adul- 
térios ,  as  complices  ,  8c 
as  confentidoras  dos  ma- 
iores infultos,  das  maiores 
enormidades  ,  que  fe  co- 
metem no  mundo  ?  Pois^ 
comohepoílivel,  que  ho- 
mens com  olhos  ,  8c  çom 


de  S.  JoaòjSc  foi neceíHirio     entendimento  antepuzef- 


que  o  mefmo  Chriílo  o 
diíTcíle ,  para  que  nòs  a 
creíTemos  :  Venit  lux  in 
miindiim ,  &  dilexerunt  ho- 
mines  magis  tenebras^  quàm 
hicem.  Veyo  a  luz  ao  mun- 
do,  8c  os  homens  antepu- 
zeraó  as  trevas  à  luz.  Ha 
talfem-razaó  !  ha  tal  ce- 
gueira !  ha  tal  maldade  ! 
Quem  ouvera  de  crer  de 
juizosracionacs  hiia  Çç,\\- 
tença  taõ  barbara  como 
Q^x^  fe  Q  nag  aíiirmiira  o 


fem  as  trevas  à  luz? As  mef- 
mas  palavras  de  Chriflo 
deraóa  razão  '.'Dilexerunt 
homines  magis  tenebras^ 
quàm  luccm.  dilexerunt: 
julgarão  com  a  vontade,^ 
naõ  com  o  entendimento : 
8c  onde  a  vontade  he  juiz, 
ta  es  como  eílas  faò  as  Çcn- 
tenças.  Qiie  havia  de  fazer 
hua  cega ,  fcnaô  condenar 
a  luz  ?  'Dilexerunt  magis: 
air.áraó  mais:  Eis  aqui  to- 
do o  juizo  dos  homens: 
a  má- 


àmarao  mais  5  ou  amarão 
menos.  Se  amáraÕj  aitida 
que  feja  as  trevas,as  trevas 
haó  de  ier  melIioreS:,que  a 
luz :  Te  náo  amáraó ,  ainda 
que  fejaaluz  jaluzha  de 


caufa  em  Chríílo,  Ego  nuU 
Iam catifam inverno:  como 
lhe  puzeraó  a  caufa  cÇcm^ 
na  Cruz :  Impofuerunt  cau- 
fàmejmfcrlptam  ?  Aqui 
vereis  quanto    vai  defer 


fer  peor^que  as  trevas.  Oh  julgado  com   o  entendi-* 

quantas  vezes  renova  o  mento,  ou  com  a  vonta- 

mundo  eíla  fentençalQuã-  de.  Depois  que  Pilatos  de- 

tas  vezes  vem  a  juizo  a  clarou   a  innocencia   de 

luz,&  as  trevas,  &fahe  c5-  Chriílo,  devolveo  as  acu- 

denada  a  luz  !   Vede  que  façoens  ao  juizo  davonta- 

fegurança  pôde  ter  o  me-  de  dos  Principes  dos  Sa- 


reci mento,  ou  que  immu- 
nidade  a  innocencia  em  tal 
juizo  .^  O  fummo  mereci- 
mento, &  a  fummaHino- 
cenciaodiga. 

fp  Prefentado  Chii- 
ílo  ante  Pilatos ,  tirou  elle 
as  teftemunhas,  examinou 
as  acufaçoens  ,  &  decla« 
rouaChjifto  por  innocé- 
Lac.23.  ttiEgo  nuUam  cãtifam  in- 
vmio  in  homine  ifto :  £  u  ne  - 
nhúa  caufa  acho  neíle  ho- 
mem. Da hi  a  pouco  leva- 
rão a  C "hriíio  ao  Calvário, 
pregáraónoem  hua  Cruz^ 


«4- 


c^tàotQs-.Jefum  vero  tra^L'ac.:ty, 
dídUvolmitati  eomm -,  &^^' 
como  Chriílo  foi  julgado 
no  juizo  da  vontade ,  logo 
lhe  acháraó  caufa  para  o 
crucificar.  No  juizo  do 
entendimento,  ainda  que 
era  entendimento  de  Pila- 
tos, naò  fe  achou  caufa  a 
Chriílo :  no  juizo  da  von- 
tade ,  ainda  que  era  o  jul- 
gado Chriílo,  achou  fel  h« 
caufa.  E  porque  acha  mais 
a  vontade  fendo  cega,qiie 
o  entêdimento  fendo  lyn- 
ce.^  Porque  o  entendimen- 


Matth.  Et ^^^pofaenmt fuper  caput     toachaoqueha  ,a  vonta- 
27.3  7>  ejus  cãufam  ipfitis  fcriptar/iy     de  acha  o  que  quer.  Con? 
&:  puzeraó  nella  ,  diz  o     foniieavontade  quer,  af- 
TextOjafiacaufa  efcríta.     fim  acha.    Se  a  vontade 
Pois  fe  Pilatos  naò  acliou    quer  fav  orecerjaeharà  me- 
reci- 


644  Sermão 

rccimento  em  Judas  ,  fe 
a  vontade  quer  condenar, 
achará  culpas  em  Chrifl-o. 
Que  culpas  tinha  o  Bauti- 
íla  contra  Herodes>para  o 
meter  em  prifoens  ?  mas 
tinha  contra  fy  a  fua  von- 
tade, que  era  a  maior  cul- 
pa de  todas.  Bem  enten- 
dia Hcrodesjque  era  inno- 
cente  o  Bautifta :  mas  naó 
quero  ir  por  aqui :  ou  He-* 
rodes  entendiajque  era  in.- 
nocenteo  Bautifta,  ou  naõ 
o  entendia:  fe  o  naó  enten- 
dia, vede  a  cegueira  da  vó- 
tade,  que  o  fazia  entender 
contra  a  razão :  fc  o  enten- 
diajvedeatyrannia  da  vó- 
tade,queo  fazia  obrar  có- 
tra  o  que  entendia.  De  húa 
maneira,  ou  de  outra  fem- 
pre  o  Bautifta  tinha  cer- 
tas as  prifoens:  Joannesin 
n;incuiis. 


5.  IV. 


60 


A; 


ra- 


Segunda 

^zaó  de  o  jujl- 

zo'dos  homens  fcr  mais 
terrivcl,  que  o  juizo  de 
Dcos,  hc  porque  no  juizo 
dcDcos  geralmente  baila 


íhãa^omtnga 
fó  o  teílemunho  da  pro*. 
priaconíciencia  :  no  juizo 
dos  homens  a  própria  con- 
fciencia  naó  vai  teílemu- 
n ha.  Vede  que  grande  he  a 
fidalguia  do  juízo  deDeos. 
Apareceis  diante  do  Tri- 
bunal divino,  acufaóvos 
os  homens  ,  acufaóvos 
os  AnjoSj acufaóvos  os  De- 
mónios,  acufaóvos  voífas 
próprias  obras ,  acufaóvos 
o  CeOja  terra,o  mundo  to- 
do j  fe  a  voíía  confciencia 
vos  naõ  acufa  ,  eftais-vo» 
rindo  de  todos.  No  juizo 
dos  homens  naó  he  aílim. 
Tereis  a  confciencia  mais 
innocente,quea  de  Abel, 
mais  pura ,  q  a  de Jofeph , 
mais  juftiíicada ,  que  a  de 
S.  J02Ó  Bautiíla :  mas  fe  ti- 
verdes contra  vòs  hum 
Caim  envejofo ,  hum  Pu- 
tifar  mal  informado  ,  ou 
hum  Herodcs  injullo  ,  ha 
de  prevalecer  a  enveja  có- 
traainnocencia,a  calum- 
nia  contra  a  vcrdadc,a  ty- 
rannia  contra  a  juftiça ,  & 
por  mais  que  vos  cíleja 
fakando,8c  bradando  den- 
tro no  peito  a  confciencia, 
não  vos  hao  de  valer  fcus 
cia- 


doAd^ventd.  éj 

damores.  Vede  que  com-     homens  verem  òs   còm- 


pn.rnç-^ó  tem  eííe  rigor  c6 
o  do  juízo  de  Deos.  Acho 
eu  muita  graça  aos  Pre- 
gadores, que  para  nos  re- 
prefentarem  aterribilida- 
dc  do  juízo  divino  5  tra- 
zem aquella  authoridade^ 
ou  oráculo  de  Deos  a  Sa- 
vncg.  i^x^d-.Homovídet  ea^qu^  grandccoftume>ô  qgran- 
»^-7-    parent^^Gmintts autemin-     Af^f'^^'^y*A.^A^Çr^^^]\/\^^^^ 


çoens  ?  para  os  rraydores , 
para  os  hypocritas,para  os 
lífongeiros,  para  os  micnti- 
rofos,&:  para  outra  gente  ' 
deílarelèjmaspara  os  ze- 
lofos,  para  os  verdadeiros^ 
para  os  honrados,  para  os 
homens  de  bem  i   ô    que 


tuetur  cor :  os  homens  vem 
fó  os  exteriores  ,  porem 
Deos  penetra  os  corações : 
antes  por  iíTo  mefmo  he 
muito  mais  para  temer  o 
juizo  dos  homens  j  fe  os 
hòmensconhecéraó  os  co- 
raçoens,  fe  aos  homens  fe 
lhe  pudera  dar  como  co- 
ração na  cara  j  então  nam 
havia  que  temerfeus  juí- 
zos. Que  maior  defcanfo, 
&:  que  maior  fegurança, 
que  trazer  hum  homem 


de  felicidade  fora!  Mas  co- 
mo aconfcienciano  juizo 
humano  nao  vai  tefiemu- 
nha,quem  leva  a  calum- 
nia  nas  obras,que  importa 
que  tenha  as  defefas  no  co- 
ração f* 

6i  A  maior  defefa,  Sc 
juílincaçaó  ,  que  Chriílo 
tevedeluainnocencia,  foi 
o  depoimento  de  Pilatos, 
quando  pedindo  agua  la- 
vou as  mãos,&  pronúcioui 
queelle  era  innocente  no 


fangue  daquelle  juílo;  Ac-  ^^^^^^^ 
lempre  coníigo  no  feu  co-     cejpta aqua^  lavzt  manus  co-  --i^^, 
raçaó  a  fua  defefa?  Acuíàif-     rampopulo-^dícens:  Innocens 
me  5  condenaifme,  infa-     egojtim  àfãnguine  juftihw 
maif lie  ?  quereis  mil  tefte-    pis.  Reparou  neíta  agua,&: 
munhas,  pois  eilas  aqui,  &     neíle fangue  S.  Cyrilloje- 

rofolymitano,&:  diíTecom 
opinião  íingular,  q aquel- 
la agua,&  aquelle  langue, 
que  fahio  do  lado  de  CÍiri»- 


moílrari  he  o  coração ;  Bo- 
na confcícntia  milie  tefles. 
Sabeis  vòs  para  quem  naò 
era  boa  invenção  a  de  q% 
Tom./.. 


66  Sermão  da figimdaDomm^a- 
lio  na  Cruz,  faziaó  alufaô  fefas  do  coração  eraõ  ver* 
a  efta  agua,  &  a  eíle  fan-  dadeiras  •,  mas  como  o  co- 
%\xç.\  Erant  hac  duo  de  late-  ração  no  mundo  naó  vai 
reyjudicanti  aquã^claman-  teílemunha,  morreo  cru- 
tíbusverofangtiis.  A  agua  cificadaainnocécia  Quã- 
fignificavaa  agua,có  que  rostresladosdeíle  procef- 
Pilatos  lavou  as  mãos:  ^r-  fofe  formão  cada  dia  no 
cepta  aquãy  lavit  manus :  o  juizo  humano !  por  iíTo  os 
fangue  fignificava  o  fan-  innocentes  padecemy&os 
gue,  que  o  mefmo  Pilatos  culpados  triunfaó.  Quem 
declarou  por  jufto  ,  &  os  mais  innocente  ,  quejo- 
acuíadores  tomáraó  fobre  feph,  quem  mais  culpado, 
n)id.25.1y,  Sanguis  ejusfuper  nos:  queaEgypcia?mas  acul- 
de  maneira ,  que  airim  co-  pada  moltrava  os  indícios 
mo  cà  o  reo,  ou  o  homifia- 


do,  traz  no  feyo  os  papeis 
de  fua defefa,  aílim  Chri- 
ílo  meteo  no  coração  a- 
quella  agua,&  aquelle  fan- 
gue, em  que  confiíliaó  os 
teftemunhos  authenticos 
de  fua  innocencia.  Ora 
vede  agora  fair  a  Chriílo 
do  Pretório  de  Pilatos  , 
acompanhado  de  grande 
tropel  de  juftiças,  Sc  vereis 
nareprefentaçaó  daquella 
tragedia ,  o  que  cada  dia 
acontece  no  mundo.  O  in- 
nocente caminhava  para  o 
fuppUcio,  o  pregaó  dizia 
as  culpas,  o  coração  leva- 
va as  dcfcfas.  As  culpas  do 
pregaõ  erag  falfas,  as  dc- 


naçapa,6c  o  innocente  ti- 
nha as  defefas  no  coração-, 
por  iffo  ella  triunfa  ,&:el- 
le  padece.  Morre  em  fim 
ChriftonaCruz,  abrelhe 
húa  lança  o  peito  ,  fica  o 
coração  patente,  &:  entaò 
fahiráoem  publico  asfuas 
defefas:  Exi-vitfangiíis,&  ^^o.nn: 
^^«^.  Pois  agora  depois  de'  ■'  ■ 
Chriílo  morto?  Sim  ago- 
ra: queefiahe  adilleren- 
ça,queha  de  hum  juízo  a 
outro  juizo.  No  juizo  de- 


que 


hc   o 


pois  da  morte  , 
juizo  de  Deos  ,  cntao  va- 
lem as  defefas  do  coração  i 
no  juízo dcíla  vida,  que 
heojuizo  dos  homens,  iie- 
nhúa  valia  tem.  Oii  dcf- 


gra- 


do  Advento. 
graçada  forte  a  áo  coração     logrados 


^7 


humano  .'poder  fer  julga- 
do dos  homens  para  a  cul- 
pa, «Scnaó  poder  fer  vifto 
dos  homens  para  adefeíaí 


Náo  ha  maior 
delid-o  no  mundo  ,  que  o 
fer  melhor.  i\o  menos  eu 
a  quem  amara  das  telhas 
abaixo,  antes  lhe  defejára 


Se  aílim  he,  que  muito  que     hum  grande  deliílo ,  que 
fenaô  defenda  a  maioria-     hum  grande  merecimen 


nocencia ,  loannes  in  "vin- 

€1iU$> 


6i 


O  Terceiro  mo- 
tivo de  maior 
temor,que  ha  no  juizo  dos 
homens,  comparado  com 
o  de  Deos,  he,  que  no  jui- 
zo de  Deos  as  noíTas  boas 
obras  defendem -nos  ,  no 
juízo  dos  homens,o  maior 
inimigo,  que  temos,  fao 
as  noílas  boas  obras.  De- 
mos reviílaa  algus  exem- 
plares do  juizo  humano,& 
conflarnosha delia  verda- 
de. O  primeiro  condena- 
do, que  ouve  no  juizo  dos 
homens,  foi  Abel  5  &  por- 
que culpas.^  Porque  o  feu 
facriíicio  agradou  mais  a 
Deos,  do  q  o  de  Caim. Ha 
tal  crime  como  eíle.^  Se  A- 
bel  fora  como  Caim ,  elle 
tivera  os  feus  dias  mais  bé 


to.   Hum  grande  deUdo 
muitas  vezes  achou  pieda- 
de: hum  grande   mereci- 
mento nunca  lhe  faltou  a 
enveja.  Bem  fe  vè  hoje  no 
mundo  :  os  delidros  com) 
carta  de  feguro  ,  osmere-; 
cimentos  homiíiados.  Va- 
mos  a    outro  exemplar. 
Saul  condenou  tantas  ve- 
zes à  morte  a  David  ,  ôc 
chegou   a   lhe   tirar   elle 
mefmo  às   lançadas  :    Sc 
porque  crimes. ^Porque fe 
cantava  pelas  ruas  dcjc- . 
rufalem  ,  que  David  era 
mais  valente  ,  que  Saul : ,  j^^g 
^ercuJJJt  Saidmiíle^lDãvid  18.7. 
autem  de  cem  milita.    Efte 
premio  tirou    David    de 
matar  hum  Gigante  com 
híía  funda.  Maisventuro- 
foshaviaóde  fer  os  tiros, 
fe  náo  deraó  tamanho  eíla- 
lo.  AoGigãtederrubou-o 
a  pedra,  &  a  David  o  foni-  . 
do.   Eis-aqui  porque  Da*  ; 
£  ij  vid 


I-1 


Matth. 


6  8  Ser  ma  o  da  feguntía  ^o?mnga 

vid  queria  que  o   julgaííe  vem,  os  mancos  andaõ,  os 

Deos,  &   naó  os  homens :  mortos  reíufckaõ :  Et  bea- 

íiojuizodeDeosperdoaó-  tus  qui  fcandalizatus  non 

fe  os  peccados  como  fra-  fueritinme  •,  &:  bemaven- 

quezasi  no  juizo  dos  ho-  turadooquefenáo  efcan- 

mens,  caíligaófe  as  valen-  dalizarem  mim.  y\quire- 

tias  como  peccados.  Gra-  paro  >  ò'  beatus  quijcanda^ 

çasaDeos,  que  jà  nos  hi-  lizatusnonfuerít,^  bem- 


mos  emendado  defte.  Va- 
mos ao  terceiro  exemplar. 
Mas  para  que  he  ir  mais 
longe  5  fe  temos  o  maior 
exemplo  de  todos  no  Evã- 
gelho  ^ 

63  Mandou  o  Bauti- 
íla  do  cárcere  dous  difci- 
pulosíeus,  que  fofiem  per- 
guntar a  Chriílo  fe  era  el- 
le  o  Meíllas,  Tu  es^  quivcyi- 
turusesy  an  alium  expeça- 
?;í«j.^Suípcndeo  o  Senhor 


aventurado  o  que  nam  fc 
efcandalizarPE  que  tinha 
feito  Chrifto,  para  fe  efcã- 
dalizaremos  homens.^  Se 
Chrifto  arrancara  olhos, 
&  fizera  cegos  •,  fe  cortara 
pès,  &  fizera  mancos  -,  fe 
tirara  vidas, Sc  matara  ho- 
mens :encaó  tinhaó  razaó 
de  fe  efcádalizar  de  Chri- 
fto j  mas  por  farar,  por  re- 
mediar, por  refufcitar  ? 
Sim.Porquenaó  hacoufa 
a  repofta,  porque  havia  ao  de  que  mais  fe  efcandali- 
redor  grande  multidão  de  zem  os  homensjquc  de  ha- 
cnfermos,  que  efperavaõ,  ver  quem  faça  milagres. 
&  depois  de  os  firar  a  to-  Antigamente  efcandaliza- 
dosmilagrofamente,  vol-     vao  os  peccados  ,  &:  edifí- 

cavaòas  virtudes:  hoje  as 
virtudes  efcandalizaó,  & 
queira  Deos ,  que  os  pec- 
cados naò  edifique.  Deos 
vos  livre  de  voíTiis  boas 
obras ,  &  muito  mais  àxs 
grandes  :  os  pcccaiios  fo- 
ircmolos  facilmente  j  os 
mi- 


toufc  para  os  Embaixado- 
res do  Bautifta5&:diftl^lhes 
aílim :  Ite  rennntlate  loa^^ 
ni  qua  audiHis^  ér  vidijlis. 
Ide,  dizei  ajoaó  o  que  ou- 
vi ftes  5  &:  vi  ftes  :  Caci  vi- 
denty  c landi  ambiilant^^mor- 
tui  refurgiiíiP,    Os    cegos 


^doAdiíêntol  6§ 

BiHagf es  não  os  podemos    milagres naô  efcapa  ?  Ain- 


íbfrer.  E  porque P Forque 
os  peccados  faó  oífenfas 
de  Dcos  y  ^  os  milagres 
íaóolfenfanoílà.  Bem  fe- 
guro  eu  5  que  havia  mais 
de  quatro  enfermos  em 
Jcrufalemj  que  não  quize- 
ráoferfarados ,  fó  porque 
Çhrifto  não  foUe  o  mila- 
grofo,  Naó  atirara  Saul  a 
lança  contra  David,  que 
lhe  tirava  a  enfermidade, 
fe  lhe  naó  doera  mais  o 


da  dizia  mais  o  proceflb  de 
Chrifto :  Ecce  totus  mim-  ísan.ís  ■ 
dusfoft  eum  vadrt :  que  era  '^' 
tal,  que  ília  todo  o  mundo 
anos  elle.  Se  diílèraó ,  que 
ellehia  após  o  mundo,  có- 
denaíTemno  muito  embo- 
ra j  mas  porque  o  mundo 
hia  após  elle  l  Eis  ahi 
quaesfaó  os  crimes  do  juí- 
zo dos  homens.  Se  fores 
após  o  mundo  ,  ninguém 
vos  ha  de  condenar  5  fe  o 


milagre,  do  que  lhe  agra-r  mundo  for  após  vos,  naó 

dava  a  faude.  vos  ha  de  valer  fagrado. 

6^       Oh  quanto  mais  Que  diíTe  hoje  Chrifto  do 

íeguro  heir  com  peccados  Bautiíla.?que  fe  deípovoa- 

âo  juízo  de  Deos,que  com  vão  as  Cidades  para  o  buf- 


milagres  ao  juízo  dos  ho- 
mens! Em  Deos  hamife- 
ricordia,  na  enveja  não  ha 
perdão.  Que  levou  a  Mag- 
dâlena  ao  juizo  de  Chrí- 
íío  ?  peccados ;  6c  como  fa- 
hio  ?  perdoada ,  Remittun^ 
tur  eipeccata  multa.  Que 
levou  Chrifto  ao  juizo  dos 
homens  ?  milagres :  &  co« 
mo  íahio  >  condenado, 
^da  hic  homo  multa  fgna 
facit,  Comqueefcaparáó 
os  homens  do  juizo  dos 
homens,  fe  Deos,  &  com 
•    Tom. 7, 


car,  para  o  ver  :  ^id  exi- 
ftis indefertum  viderelQuz  x .^"s. 
não  era  cana  verde  ,  que  íè 
moveífe  com  o  vento : 
Arundimm  veto  agitatam  > 
Que  não  era  homem  da 
Corte ,  que  veílilfe  fedas , 
fenão  cilícios  ,  Hominem 
mollibusvejfitum:  Que  era 
mais  que  Profeta,  Tlufqm, 
^rophetãm  :  finalmente , 
que  era  hnpyEcceegomit-  ibid.io, 
to  Angelum  menm :  Ah  íim, 
meu  Santo  Precurfor  ,  & 
vós  tendes  cinco  culpas 
E  íij      "     láp 


70  Sermão  dafegunda  "'Dominga 

tio  grandes  como  eílas,  ác  fó  Deos.  Eis  aqui  atè  don-« 
tão  provadas  ?  Máo  pleito  de  chega  o  Demónio,  quã- 
levaisaojuizodoshomês}     do  acufa  j  &  o  homem 


a  vòs  vos  tiraráó  dos 
olhos,  &  dos  ouvidos  do 
mundo,  a  vós  vos  fecha- 
rão em  hum  carcere>  loan- 
nesinvinculis. 

§.  VI. 

6j  A  Quarta  cófide- 
/\  raçaó  de  fer 
maistemerofo  ojuizodos 
homens  ,  que  o  juízo  de 
Deos,  he  porque  Deos  jul- 
ga o  que  conhece  5  os  ho- 
mens julgáo  o  que  não  co- 
nhecem. Hum  dos  maio- 
res rigores  do  dia  do  Juí- 
zo, he  que  os  mefmos  De- 
mónios hão  de  fer  alli 
noííbs  acufadores  ;  mas 
eu  antes  me  quizera   ver 


quando  julga  ?  Julga  vos  as 
obras  5  julgavos  as  pala- 
vras,&atè  o  mais  intimo 
penfamento  vos  julga,  6c 
vos  condena.  Ha  tal  teme- 
ridade de  juizo  ?  Quejul- 
gue  o  homem  as  obras,quc 
vè,  que  julgue  as  pala- 
vras, que  ouve,  feja  embo- 
ra>  masque  queira  julgar 
os  penfamentos ,  onde  naò 
chega  com  algum  fentido 
do  corpo,  nem  com  algua 
potencia  da  alma  l  Ella  he 
hua  das  mais  graves  ra- 
zoens,  porque  ojuizodos 
homens  he  mais  para  te- 
mer,queojuizo  de  Deos: 
Deos  julga  os  penílimen- 
tos,  mas  conhece-05',  o  ho- 


acufadodeDemonios^que  mem  não  pôde  conhece^ 
verme  julgado  de  homens. 
O  Demónio  no  dia  dojui- 
zo  hanos  de  acufar  de  to- 
das noílas  obras,  hanos  de 
acufar  de  todas  noíTis  pa- 
lavra9:  mas  em  chegando 
aos  penfamentos  ha  de  ta- 
par a  boca  o  Demónio, 
porque  os  pcccados  de  pé- 
íramejQCQjTuO  jccfcrvados  a 


penfamentos,^  julga-os. 

66  Dirmeheis,  queos 
homens  julgão  os  penfa- 
mentos pelas  obras  ,  6c 
que  pelas  obras  ,  que  fe 
vem,  bem  fe  podem  julgar 
os  penía  mentosjque  fe  na5 
vem.  Seaílim  fora  ,  nani 
eráo  tanto  para  te:riCr  os 
juízos  dos  homens  i    mas 


€.  Res. 


doAãventú,  ji 

vede  quanto  ao  contrario  quodoccdjtones  quarat  ad- 

das  obras  julgaó  ainda  os  verfumme.  Lãçoufe  Aman 

melhores  homens  os  pen-  aos  pès  da  Rainha  Eílher, 

fa mentos.    Efí-ava  Anna  pedindo  que  lhe  valeíTc 

iTiáy  de  Samuel  orando  no  contra  a  indignação  del- 

Templo  com  os  afFedos>  Rey,  de  cuja  graça  fe  via 

&  eíFeitos,  que  coílumão  tão  inopinadamente  cahi- 

os  afligidos  :  &   que  juizo  do :  &  que  juizo  faria  ÁP 


vos  parece  ,  que  faria  o 
Summo  Sacerdote  Helí 
deftaoraçaó  ?  Julgou  que 
era  intemperança  :  &  que 
os  movimentos,  que  fazia 
ilnna  com  a  boca^tinhaò  a 
caufa  na  mefma  boca  ,  & 


;.«. 


fuero  deíla  acção  de  A- 
man  ?Julgou-a  tanto  con-' 
tra  toda  a  razão ,  <5c  contra 
o  decoro,  que  a  fy  mefmo 
fe  devia  3  que  em  nenhum 
penfamenco  pôde  caber  o 
penfamento,que  lhe  veyo, 
não  no  coração  laftimado  nem  ha  palavras,  com  que 
donde  íàhião: Exíjiimavit  fe  poífa  explicar  fem  dif- 
tilam  tenmlentam  ,  &  ait:  fonancia :  Et  iam  Reginam  s<Ji^cr 
Vfquequoebriaeris  ?  Veyo  ^ult  ofprimere,  meprasête^ 
Naamão  Syro  à  terra  de  indõmo  mea.  Eis  aqui  co- 
Judea  para  que.  o  Profeta  mo  interpretaó  os  homés 
Elifeo  o  curaíTe  da  lepra :  as  acçoens,6c  como  julgao 
6c  que  juizo  faria  EÍRey  por  ellas  os  penfamentos. 
Ezechias  defta  jornada  de  Anna  orava  a  Deos  ,  &  a 
Naamão  ?  Julgou,  que  era  fua  oraçaó  foi  julgada  por 
mandado  cautelofamente  intemperança  :  Naamão 
por  íeu  Reyj  para  que  tor^  bufçava  a  faude  ,  6c  a  fua 
nandofefema  faude,  que  confiança  foi  julgada  por 
vicrabufcar,  tomaííe  da-     hoftilidade  :  Aman  pedia 

perdão,  êc  o  feu  arrependi- 
mento foi  julgado  por  fa- 
crilegio.  Nem  chorar  o  ar- 
rependido, nem  curarfeo 
enfermo )  nem  orar  one- 
Eiiij        ceíll? 


quioccaíiáodequeixa,  & 
da  queixa  paífaíle  a  rom- 
pimento de  guerra,  6c  lhe 
vieíTe  conquiítar  o  Reyno: 
^■.^^^'  Anitmdvertíte ,  é"  Videte 


"/  2  Sermão  dafegunda  T>aminga 

ceílitado  ,  efl:à  izento  de  do  a  fó  Deos   o  juizo  dos 

fer  mal   julgado   dosho-  penfamcntoSíquc  nem  de 

mens.Anna  pedia  o  reme-  toda  a    Igreja  Catholica 

dio  de  fua  eílcril idade  a  fiou  Deos  o  julgar  hum 

Deosj  Naa  máo  pedia  o  re-  penfamento :  Ecclefta  non 

médio  de  ília  enfermidade  judicatâe interno.  E  o  que 

aEIifeo  ,  Aman  pedia  o  Deosnáo  fía  dos  Pontifí- 


remédio  de  fua  infelicida 
de  a  Efther  j  6c  nem  em 
Efther  o  fer  Rainha  ,  nem 
em  ElifeooferSantOjnem 
no  mefmo  Deos  o  íer 
Deos, lhe valeo  aos  mife- 
raveis  para  que    efcapat 


ces,  o  que  não  fia  dos  Con- 
cilies, o  que  não  fia  de  to- 
da a  Igreja,  que  he  julgar 
meus  penfamentos  ,  iflb 
faz  o  juizo  de  qualquer 
homem.  Parecevos  muito 
iílo?  Parecevos  muito,  que 


fcm.  Nemcomos  Reys,     os  homens  julguem  penfa 


nem  com  os  oantos  ,nem 
com  Deos  fe  pode  tratar 
fem  fer  mal  julgado  dos 
homens.  Táoinjuílo  he  o 
juizo  humano  em  inter- 
pretar intençoens  ♦,  tão 
atrevido,  &:  táo  temerário 
he  em  julgar  pelas  obras 
os  penfamentos. 

6/  Julgar  mal  huma 
obra  boa,  grande  maldade 
he  :  mas  julgar,  ou  bem, ou 
mal  huiii  penfamento, que 
nao  pode  fer  conhecido, 
ainda  he  maior  tyrannia. 
Sc  não  conheces ,  nrm  po- 
des conhecer  o  penfa  men- 
to^ como  te  atreves  home 
ajulgalo.^Hctáo  refcrva- 


mentos  ,  &  condenem  fó 
por  penfi mentos  ^  Ora 
aguardai ,  que  ainda  nani 
diílenada.  E  quantas  ve- 
zes vos  julgarão,  êf  conde- 
narão os  homens  pelo  que 
nunca  vos  paflbu  pelo  pé- 
fimento  ?  ^\s  aqui  outra 
maior  diíferença  dos  dous 
juizos:  Deos julga^Sc  con- 
dena por  penfamentos,  os 
homensjulgaó,  êc  conde- 
nao  pelo  que  nunca  pnílbu 
pelo  penfamento.  Paílbu- 
Ihe  aigãa  hora  pelo  penfa- 
mento a  Jofcph  atreverfc 
á  honra  de  fcu  Senhor  ^ 
Paílòulhealgua  hora  pelo 
penfainenroa  Daniel  que- 
rer 


:ão  Advento.  _                 7Í 
íer  machinar  contra  o  Im-  vos  ccíadenlo  os  homens 
períodos  AíTyrios  ?  Paf-  pelo  que   não  vos   paíTou 
foulhe    algua   hora   pelo  pelo  penfamento  a  vós, 
penfamêtoaChrifto^que  mas  condenãovos  pelo  q 
tatnbemniíloquiz  darnos  nem  lhes  paíToupelo  pen- 
exeniplo  )  quererfe  fazer  famentoaelles.  Mais  cia- 
Rey  temporal,  de  que  ta-  ro.  Naó  fó  vos  condenão 
tas  vezes  fugira  ?  E  com  os  homens  pelo  que  vòs 
tudo Jofeph  por fe  atrever  nunca  imaginaftes  ,  mas 
à  honra  de  feu  Senhor  eftà  condenãovos  pelo  que  né 
em  hum  cárcere  :  Daniel  elles  imaginão  de  vòs. 
por    machinar  contra  o  68    Chegarão  os  irmãos 
Império  eílà  no  lago  dos  de  Jofeph  ao  Egypto,apa- 
Leoens  :  Chrifto   por  fe  recéraõ  diante  delle    ,  &: 
querer  fazer  Rey  eítà  po-  depois  que  diíTeráo,  quem 
ftoemhúaCruz.  Comef-  eráo,&a  que  vinhaó  ,fe- 
te  rigor nenhúa compara-  coufe  Jofeph  mui  ao  de 
çaótemojuizo  de    Deos.  miniftro,  &   comafpe£to 
Para  Deos   condenar  por  fevero  diíTe  :  Vaó  prefos 
penfamento  heneceíTario,  eíTes homens.  Prefos  nos, 
que  hajapenfamento,que  Senhor  Viforey,C  replica- 
fejamáo,&  quefeconfm-  raó  elles  tremendo  )   &: 
ta :  para  o  homem  conde-  porque  ?  Explor atares  ef-  ^^^^^ 
nardomefmo  modo,nam  tis:  Sois  efpias  :  vindes  a  ^ij?. 
heneceíTario,  que  fecon-  explorar    os  Reynos   de 
fmta,  nem  que  feja  máo,  Faraó  meu  Senhor.  As  pa- 
nem que  haja  penfamen-  lavras  não  eraó  ditas,  &jà 
to.Pòdefe  imaginar  maior  os  dez  irmãos  eftavaó  com 
rigor,  maior  injuíliça,  ma-  ospès ,  Sc  mãos  em  outros 
ior crueldade,    que  eíla.^  tantos grilhoens,  &  alge- 
.Eu  cuidava,  que  não  •,  mas  mas.  Pergunto  agora  :  Ef- 
ainda  paíTa  adiante  a  futi-  tts  homens  iraagiiáraô  ai- 
leza,&acrue.dadedojui-  gõaiioradevir  fer   efpias 
20  dos  ho)iiens.    Naó  fó  ao  Egypto^  ôc  explorar  q% 

ReY«f 


7Í  Sermão  dajegimáa  dominga 

Reynos  de  Faraó?  Claro  deiras.  Diga-o  a  de  Na- 
eíUqne  nunca  tal  imagi-  both  em  Samaria  ,  &a  de 
náráo.  Eraó  huns  pobres  SufanaemBabylonia.  Por 
lavradores,  que  vuihaó  fu-     ventura  imaginava  Jeza- 


gindo  à  fome  ,  comprar 
quatro  grãos  de  trigo  para 
manter  a  vida>  &  deitar  ,à 
terra.  Pergunto  mais  :  <Sc 
Jofeph  imaginava  dclies  5 
que  foíTem  efpias ,  &:  ex- 
ploradores }  Ainda  iílo  he 
mais  claro )  (Sc  mais  certo. 


bel^que  Naboth  blasfema- 
ra o  nome  de  Deos ,  &  ád- 
ReyPNáo  imaginava  tal 
coufa.  E  com  tudojeza- 
belfezcódenar  a  Naboth 
pelo  que  nem  €í[ç^  imagi- 
nou nunca5nem  ella  imagi- 
nava àú\^.  Por  ventura  os 


Nunca  tal  imaginou  Jo-  Juizes  de  Babylonia  ima- 

feph   5    porque  conhecia  gináraó  de  Sufana  ,  que 

mui  bem  ,  que  cráo  osfí-  violara  a  fé,  que  devia  a 

lhos  de  Jacob  feu  pay.Pois  Joachim,  no  crime  de  que 

fe  eftes  homens  nuca  ima-  a  acufavão  ?  Não  lhes  paf- 

gináraó  em  fer  eípias,&  íè  fou  tal  pela  imaginação.  E 

a  Jofeph  nunca  lhe  paíTou  com  tudo  foi  condenada. 


pela  imaginação  ,  que  o 
foíTem  5  como  os  manda 
prender?  He  poílivelque 
hão  de  eílarhuns  innocé- 
tes  arraílando  cadcas  em 
húa  mafmorra  pelo  que 
nem  clles  imaginára6,nem 
imaginou  dclíes  quemalli 
os  metco  ?  Aííim  palFa.  Na 
hiíloria  de  Joíeph  era 
aquelle  rigor  fingido  -,  mas 
ainda  mal,  porque  tantas 
tragedias  fe  rcprcfcntaó 
no  mundo,  em  que  as  mcf- 
mas  injulli^as  íàò  verda- 


de levada  ao  fupplicio  Su- 
ílina  pelo  que  né  cila  ima- 
ginou ,  nem  imaginarão 
delia  os  mefmos:,  que  a  có- 
denáraó.  Quantas  vezes 
julgais,  condenais  ,  infa- 
mais, &  dcílruis  hum  iw- 
noccnte  pelo  que  nem  c:\Lq, 
imaginou  5  nem  vós  ima- 
ginais dellc?  Sabeis  de  cer- 
to, que  não  fez  o  crime,  & 
iní  a  mailo,  c^  acufulo  ,  & 
condenailo  como  fe  o  fize- 
ra. Sc  condenar  por  culpas 
duvidofas  hc  mjuílica,  cò- 
ocnar-i 


âoAãventcT. 
denar  por  innocencia  co-    muito  ré 
nhecicia ,  que  tyrannia  fe- 
ra? a  que  ufa  o  juizo  dos 
homens  eom  o   Bautifta: 
loannes  in  vinctãis. 


omite 


§.  VIL 


^9 


A  Quinta  razão, 
Sc  diíFerença, 
que  acho  entre  o  juizo  de 
Deos>  &  o  juizo  dos  ho- 
mens, heaquellajque  pare- 
ce faz  o  juizo  de  Deos 
mais  temerofo  ,  que  he  o 
fer  juizo  final.  Juizo  íinal  l 
Oh  que  temerofa  palavra ! 
Mas  dahi  mefmo  tiro  eu 
quanto  mais  temerofo  he 

o  juizo  dos  homens^que  o  fins  pelos  principies ,  mas 
juizo  de  Deos.  Deos  naó  comoosíucceííbs  do  mu- 
julga  fenão  no  fim,  os  ho-  do5&  da  vida  ,  Sc  muito 
mensnáo  efperâo  pelofim  mais  os  que  dependem  do 
para  julgar.  Gram  rigor!     alvedriojnãoguardãopro- 


tttraque  crefiere  ufque  ad  i^[^^^^^ 
mejjem.  Deixai  nacerjdei- 
xai  crecer,  deixai  amadu- 
recer 5  là  virá  o  tempo  da 
mefíe,  então  fe  conhecera, 
qualheo  trigo,  &  qual  a 
zizania.  Eis  aqui  qual  he 
Deosno  julgar,  éÇc  quaes 
faó  os  homens.  Deos  não 
condena  fenão  no  fim:  os 
homens  não  efperâo  pelo 
fim  para  condenar.  Deos 
para  colher  efpera  peio  A- 
gofio  :  os  homens  fegaò 
em  Janeiro.Os  que  mais  ti- 
moratamente procedem 
em  julgar  antes  do  fim,  faó 
aqueiles ,  que  reguião   os 


Semeou  zizania  o  inimigo 
na  feara  do  Pay  de  Fami- 
lias  j  &  que  a conteceo? Ve- 
de a  diferença  do  Senhor 
aos  criados.  Os  criados 
muito  fervorofos    :    Fis 


porção  algíia  ,  todo  eíle 
juizo  he  incerto  ,  &  todo 
injuílo. 

70  No  dia  da  Payxão 
de  Chrifto  morrerão  qua- 
tro peííbas  notáveis  ,  de 


imus^ér  çolligimus ea  ^  Se-  que  faz  menção  o  Evan- 
nhor,quereis  que  vamos,  gelho.  Morreo  Chriílo, 
&  arranquemos  logo  a  zi-  morrerão  os  dous  ladroes, 
zania  ?  O  Pay  de  f  amiiias  &  morreo  Judas.  Ora  no- 
tai 


i 


n 


É 

«;: 

II 
1 

M 
II 

í  1 


ii 


7<:>  Sermão  da fegíinda^ommgd 

tai  a  diílTerètlça  dos  princi-  diria,  que  havia  de  fer  tra-^ 
PÍ0S5&  fins  de  todos. Chri-  balhofo,  &  foi  feaciírimo. 
ílo  começou  bem  ,  acabou  Antes  de  ver  o  fim  náo  fe 
bem:o  máoladraó  come-  pode  fazer  juízo.  Pedro 
çoumal,  &  acabou  mal:  o  feguio  a  Clirifto  para  ver 
bom  ladrão  começou  mal,  o  fim :  Vt  vider  et  finem :  fe  J-^^^J- 
&  acabou  bem  :  Judas  co-  efperaraatèrero  fim,  éii^  '  "^  * 
meçou  bem  ,  6c  acabou  não  negara.  Efperai  pelo 
mal.  Taes  íaó  as  contin- 
gências das  coufas  do  mu- 
do, (5c  apouca  proporção, 
que  guardâo  os  fins  com  os 
princípios.  Muitas  vezes  a 
bons  princípios  feguemfe 
bons  fins  ,  como  em  C h ri- 
flo ,&  a  mãos  princípios 
máos  fins  ,  como  nomáo 
ladráo ;  8c  outras  vezes  pe- 
lo contrario  a  máos  princí- 
pios feguemfe  bons  jfins> 
como  no  bom  ladrão,  &  a 


11 
fim,  enrão  negareis  •,  mas 
eu  vos  fio  5  que  fc  chegar- 
des a  ver  os  fins,que  haveis 
de  querer  feguir  ,  6c  não 
negar.  Se  alguém  pudera 
julgar  antes  do  fim  ,  era 
Deos  j  porque  conhece  os 
futuros j  &  com  tudo  nun- 
ca Deos  jà  mais  julgou,  né 
condenou  a  ninguém ,  fe- 
não  depois  das  obras.  O 
juízo  dos  homens  náo  he 
aílim  ,  conhece  pouco  do 
bons  princípios  feguemfe  prefente,  menos  do  pafla- 
máos  fins,  como  em  Judas^     do,8cnadado  futuro,   ^ 


Poríífo  quem   quizcr  juí 


gar  bem  ,  ha  de 


aguardar 


pelos  fins.  Nos  Reynos 
paífi  o  mefmo  ,  que  nos 
homens.  Q^iem  julgaífe  o 
fímdoRcyno  de  Saul  pe- 
los princípios,  diria  ,  que 
havia  de  fcr  fcliciífLmo,  6c 
foi  defcftrado  :  quem  jul- 
ga fie  o  fim  do  Rcyno  de 
David   pelos  princípios, 


antes  de  as  coufas  terem 
fcr,  jàeíbão  julga  das.  No 
mefmo  dia  em  que  fe  Faz  a 
eleição,  jà  eftà  adevinhado 
ofucceífo  ,  jà  eftà  conde- 
nada a  obra  ,  jà  eílà  deía-* 
creditada  a  pcífoa.  Valha- 
me  Deos,  ainda  não  fiz  bé, 
ncni  mal,  6c  jà  me  condc- 
não  !  Náo  teremos  huma 
pouca  de  paciência  para 
cfperar 


cfperaf  pelo  fim?;  Nolite  ^  Naófeiferepiráis  m  dii- 
*  '•  -  -  -  vida.  Se  eftehafBem  ain- 
da tivera  lepra  ,  que  lhe 
chamaíTemleproíb,  miiitia 
juílo  >  mas  íe  elle  eílava 
faó  5  porque  lhe  haò  de 
chamar  leprofo?  Porque 
eíTe  he  o  j uizo  dos  homês. 
Foíles  vos  leprofo  algum 
dia  ?  pois  ainda  que  Deos 


1  Co-  antetempusjuditare  ^  iiani 
'^''^y  íjueirais  julgar  ante  tem- 
po, diz  o  Apoftolo.Jàque 
quereis  ter  predeftinados, 
&  precitos  como  Deos, 
julgai  também  comoDeos 
ao  íim  das  obras.  Mas  que 
aopredeftinadofe  lhe  ha- 
ja de  adevinhar  o  mereci- 


nientopara  felhe  dar  logo  faça  milagres  em  vòs ,  Ic-, 

o  premio  -,  &  ao  precito  fe  profo  ha veis  de  fer  todos , 

lhe  haja  de  profetizar  a  os  dias  de  voíTa  vida. Deos 

culpa  para  o  condenar  dá-  podervos-ha  dar  a  faude> 

temaóPterriveljuizo.  masonomedaenfermida- 

71     Ainda  paílaadian-  de  naó  volo  hao  deper- 

te  a  razaò  porque  Deos  doar  os  homens   Nojuizo 

jui gano íim, &.OS homens,  de  Deos  com  a  mudança 

naó.  He  porque  no  juízo ;  dos  procedimentos,    mu-; 

de  Deos  naó  bafta  a  certe-  daóíe  os  nomes  ,  antiga- 

za  do  futuro  para  o  cafti-  mente  éreis  Sauio  ,  hoje 

go,Ã:  bafta  a  emenda  do  fois  Paulo  :  no  juizo  dos 

paíTadoparaoperdaé.No  homens  por  mais  que  os 

juizo  dos   homens  5  nem  procedi rnentos  fe  mude, 

para  o  futuro  vai  a  incerte-  os  nomes  naó  fe  mudaó  jà 


za,  nem  para  o  paíTado  a 
emenda.  Diz  o  Evangeli- 
fta  S.  Marcos  ,  que  veyo 
Chriílo  Senhor  noíTo  co- 
mer  a  cafa  de  Simaó  Le- 
profo :  chamavafe  aífim 
efte  homem,  porque  fora 
1  eprofo antigamente, &  o 
mefíno  Senhor   o  farára. 


mais.  Se  foftes  leprofo  hu- 
mavez,  leprofo  vos  haó 
de  chamar  em  quanto  vir  j^/j^,.^ 
verdes  :  Simonis  Leprofi.  i^\.i^ 
Poderá  haver  milagre  pa- 
ra farar  o  Simáo  j  mas  mi- 
lagre para  tirar  o  leprofo , 
naó  he  poíIiveLOh  grande 
fem-xazaõ  do  juizo  huma-. 


7  8  Sermão  da fegunddT)  o  minga 

no  •,  que  da  enfermidade  occidere  \  feã potim  timeie 

vos  hajaó  de  fazer  appel-  enmtquipoteji  &  anima yé* 

lido  !  E  vem  a  fer  peor  o  corpus  per  der  e  in  gehenna. 

appelíido  ,  que  a  meíma  Quer  dizer  :  Naó  temais, 

enfermidadcj  porque  a  en-  aquelies,que  mataóocor-- 

fcrmidade,  quando  muito  po,  &  naó  podem  matar  a 

chega  ate  a  morte  jo  ap-  alma:  mas  temei  antes  a 

pelUdo  paíTa  à  defcenden-  quem  lançando  o  corpo,^ 

cia.  OjuizodeDeosterri-  alma  no  Inferno,  tanto  pó- 


Marrh. 


vel  he,  mas  poíTome  livrar 
dclie  emendandome.  Po- 
rém ojuizodos  homens, 
em  que  naó  vai  emenda, 
quem  poderá  negar  ,  que 
hemais  terrivei?  Efe  con- 
tra o  juízo  dos  homens  naó 
vai  a  emenda  onde  a  ha  : 
que  remédio  teria  aquelle 
innocente,  em  que-a  nam 
podia  haver,  porque  nam 
havia  que  emendar,  loan- 
nes  in  vinculis'-^  -  o 1 1 j  i.  u  a  i  v 
..  j  ....  ■  .  :'.iii  'íoq  pr'3ffi(: 

73  ''A  Ntesque  paíTe 
x\adiante  (  que 
naó  feife  mo  permitira  o 
tempo  3  me  occorre,  que 
pode  occorre r  a  alguém 
aquella  famofa  fcntcnça 
deChriílo  :  Nolite  timere 
eos^  qui  occtdunt  corpus^ 
animam  autsm  nonpojjunt 


de  matara  alma,  como  o 
corpo.  E  quem  faóaquel- 
les5&:  quem  he  eíle?Aqueí- 
lesfaò os  homens,  eíle  he 
Deos.  Logo  parece  que 
daqui  fe  infere  contra  a 
doutrina  que  atègora  pro-» 
vamos  por  tantos  meyos, 
que  mais  temeroro,&:  mais 
para  temer  he  o  juízo  de 
Dcosjqueo  dos  homens  , 
como  maisfe  deve  temer 
o  Inferno ,  Sc  morte  da  al- 
ma,que  a  do  corpo.  Mas 
taó  erradas  como  iflo  co- 
flumao  fer  as  confequcu- 
cias  de  quem  fcgue  as  fuás 
apprehéfoenSjOu  affedos, 
&  naó  olha  para  o  cafo  de 
que  fallaõ  os  Textos, ív  pa- 
ra o  intento,  com  que  fo- 
raó  ditados,  ou  elcritos.  O 
intento  do  divino  Meílre 
nella  occafiaò  foi  animar  a 
fc  dos  primitivos  Chri- 
llãos, 


do  Advento]  79 

ftãos^paraqucpadeceíTem  &:perig05&:  entre  pena,  &: 
confiantemente  os  tormê-  pena:  porque  comparada 
tos,  &  martyrios  dos  tjr-  a  pena  do  Inferno  com  a 
rannos :  &  para  que  poítos  pena  da  morte ,  ciaro  eílà, 
entre  dous  temores,  hum,     que  muito  mais   para  te- 


ou  ©utro  inevitável,  com  o 
niaior  venceíTem  o  menor, 
>  ifto  he,com  o  temor  do  In- 
ferno o  temor  da  morte. 
Aílimo  entenderão  fem- 
pre  Padres,Pontiíices  ,  6ç 
interpretes,  dos  quaes  co- 
mo  tão  diligente,  foiido,6c 


merheado  Inferno.  Pelo 
contrario  fe  a  comparação 
fe  fizera  entre  juizo  ,  & 
juizQ,  ifto  h,e,  entre  o  juí- 
zo de  Deos ,  &  o  dos  ho- 
mens, poílo  que  os  homês 
fó  poílaó  condenar  à  mor- 
te, &:  Deos  ao  Inferno^çoiíi 
a  mefma  evidencia  fe  fe- 


literal  abbreviador  de  to- 
dos, fó  porei  aqui  as  paia-  gue  ainda  neíle  cafo,  que 
vras  do  doutiílimo  Aiapi-  Biais  para  temer  he  o  juizo 
Aiapif  c  <Íg-  '  í^?^'!/^  diceret  :  Kottte  dos  homés, que  Q  de  Deos  % 
jbi.       metu  mortisyquam  vabis  /»-  porque  o  juizo  'dos  homés 
tentãhnnt  per fecut  ares  yue^  condenandome  ir  morte, 
garemeamfidemyaut  ceifar  e  pódefer  injufto  j&o  de 
abejmprddicatianevohisà  Y>tos  condenando  me  ao 
meimperatayvel  aliquidea  Inferno,  naó  pode  deixar 
indignum  committere :  qma  de  fer  redto :  Jujhm  es  'Do-  praing^ 


fiidfeceritis  incurretis  mor" 
tem  tum  corporis ,  tum  ani- 
m£  hnge  atrociarem  ,  & 
diHturniaremyfciUcet  ater^ 
nam  ingehennãy  ubidamna- 
timortuntur  morte  immor 
taliy&vita  moribunda  vi- 
vunty&perdurant.  De  for- 
te que  a  comparação  nam 
fe  faz  aqut  entre  j  uizo ,  & 
juizoj  fenaô  entre  perigo  j 


mim  y  &  reãum judiçium^^T- 
tuum.E  fe  ao  juizo  de  Deos 
fó  eftá  fogeita  a  culpa  ,  Sc 
do  juizo  dos  homens  nam 
eftà  fegura  a  innocenciaj 
vede  qual  mais  fe  deve  te- 
mer. DeDeosfaó  mais  pa- 
ra temer  os  caítigos  ,  dos 
homens  mais  para  temer 
os  juízos  E  deites  he  que 
nós  falíamos,  ^-^ 

"       .     Tam-' 


8  o  Sermão  âàfegúnda  5?<?  minga 

7:5  Também  faííoudos 
mefmos  juízos  o  mefmo 
Chriílo,  Sc  naõcmoutroj 
fenaó  no  mefmo  Texto^ 
immediatamête  antesjém 
admirável'  comprovaçam 


fó 5 &  dl gn a  de  feu  Aii f hdr . 
Si  Tatr em  famílias  Beeí^^^^nu: 
zebuh  vocaverunt :  quanto  '"•  =f- 
magis  domefticos  ejus  ?  Ne  '  ' 
ergo  timtieritis  cos  ,  nihil 
enimeftopertum^  qiiod  nan 


do  que  digo.  A  frontavam     reveletur-^é' occultíim^quod 
osEícribasj^cFarifeósaos     nonfcietur.   Naó  vos  de- 


Difcipulvos  do  Senhor  com 
nomes  tao  injurioíbs  ,  ôc 
blasfemos  como  a  feu  Me- 
ílre :  &:  chegavaô  a  dizer, 
6cprégar,  &  apregoar  ao 
inundo, que  as  maravilhas, 
que  ellej&elles  obravaój 
eraó  feitas  em  virtude,  & 


veis  admirar  ,  que  fendo 
vòs  os  Difcipulos ,  &  eu  o 
IVl  efi:re3&  fendo  vós  os  fer- 
vos,8c  eu  o  Senhor  ,  vos 
tratem ,  &:  vos  julguem  a 
vós  os  homens,  como  me 
tratão,&  me  julgaô  a  mim. 
Masparaquenaó  temais, 


com  poderes  de  Belzebut     nem  façais  cafo  dos  feus 
Príncipe  dos   Demónios,     juizos,&  das  afrontas, que 


vos  dizem  j  fibei  que  Deos 
manifeftarà  a  voífa  verda- 
dcj&casfuascalumnias,  ou 
no  dia  do  Juizo,  ou  ainda 
antes.  Noíite  ta^ncneoriirn 
frobra^  irrijiones ,  érfamias 
timere-,  qtiia  tandem  ^eus 
autorizadoSjScdosquccn-  veftram  jidem  ,  cr  i-eram 
tre  os  demais  profeílavaó  Religionem  patefaciet  non 
Religião ,  &  letras}  nam  tantumin  dtejudicij  ,  fed  ^  ^^ 
defmayaílc-,  com  que  ia-     etianiJnhacvita-.còmcnfJLThco' 

o  mefmo  Author  com  S.  P'''^-^' 
Chryfoílomo,  Thcophila-  'çí.ná. 
to,(Sc  Euthymio.Ohargu- 
mcr.ro    verdadeiramente 
div'nio,& outra  vez  di-nio 
'da 


E  para  que  a  innocencia,& 
conftancia,  ainda  noviça, 
dos  Apoílolosjvêdofe  taó 
indignamente  caíumnia- 
da,  &  condenada  pelo  jui- 
'  zo  dos  homens  (^  &  naó  de 
quaefquer,  fenaódos  mais 


zoens  os  animaria,  Sc  con- 
solaria o  divino  Medre 
para  que  naó  fizeílcm  cafo 
da  temeridade   daouclles 


J 


uizciJ.    A  razaòfoi  huma 


do  Advento.  8i 

da  fabedoria  de  ̀u  Au-    car  a  melllia  verdade:  mas 


thorí  De  maneira 


5  que  a     porque  nem  o  tempo 


dà 


conrolaçaÓ3&:  appellaçaó ,  lugar  ,  nem  eu  volas  qui- 
que tem  o  juizo  dos  ho-  zera  totalmente  deven* 
mens,  he  para  o  juízo  de  partamos  o  trabalho.  Eu 
Deos  :  Sc  debaixo  defta  as  aponto, difcorreyas  vós, 
efperança  certa  enfína  Hemaistemerofoojui- 
Chrifto  a  Çcus  Difcipulos ,  zo  dos  homens,  que  o  jui- 
que  os  naó  temaó  ,  Ne  ti-^  zo  de  Deos,  porque  o  juí- 
mtieritis eos  ?  Sim .  Logo  fe  zo  de  Deos  he  juizo  de  hu 
o  juizo  de  \^ç.ç>s  he  o  íegu-  fó  dia ;  o  juizo  dos  homês 
ro  ,  que  nos  dà  o  mefmo  he  juizo  de  toda  ávida, 
Deos  para  naó  temer  os  Todos  os  dias  para  os  que 


juizos  dos  homens,  bem  fe 
concluc,  que  o  juizo  dos 
homens  he  o  formidável , 
&oquefedeve  temer,  & 
náo  o  de  Deos  neílas  cir- 
cunftancias.  O  dos  homés 
temerfej  porque  quando 
menos  pode  fer  falfo,&  in- 
jufto  j  6c  o  de  Deos  efpc- 
rarfefem  temor  5  porque 
fempre  he  juíi:o,&:  redo. 

\    5    IX. 

,_  -:.^  .  •■    •■ 

74  ^  I  ^Udoifto  ficou 
j[  jà  convencido 
com  as  razoens,  que  pon- 
deramos antes  de  refpon- 
der  a  eíla  replica:  reílando 
muitas  outras,  com  que  fe 
podia  provar  5  &  amplitl- 
Tom.  7. 


vivem  entre  os  homens , 
fao  dias  do  juizo. 

O  juizo  de  Deos  ha  de 
fer  em  hum  fó  lugar  j  o  jui- 
zo dos  homens  he  em  to- 
dos os  lugares  \  julgaóvos 
na  cafa  , .  ^  julgaóvos  na 
rua  i  julgaóvos  na  praça, «Sc- 
julgaóvos  na  Igreja  5  jul- 
gaóvos na  Cortej&julgaó*^ 
vos  no  monte  5  julgaóvos 
no  mundojSc  julgaóvos  na 
Religião  s  julgaóvos  em 
todos  os  lugares,  onde  ef- 
tais,  &:  nos  lugares  ,  onde 
fiaó  cftais  ,  também  vos 
julgaó :  Emfim  para  o  jui- 
zo de  Deos  ha  de  irão  vai- 
le  dejofaphat  todo  o  mu- 
do i  para  o  juizo  dos  ho^ 
mens  todo  o  mundo  he 
F  valk 


m. 


1.! 


Í-M 


m 


■A 

,•      '"ir' 


8  2  Sermão  dafegunda  Dominga 

valle  de  Jofaphat.  vir  a  julgar  os  vivos ,  &  os 


Ojuizode  Deos  come- 
ça a  julgar  defdos  annos  do 
ufo  da  razaó  por  diante :  o 
juizo  dos  homens  muito 
antes  do  ufo  da  razaó  jul- 
ga, &  condena.  Digaó-no 
as  lagrimas  de  Rachel,  & 
o  fangiie  dos  Innocentes 
dejBethlem.  Faltavaólhe 
cinco  annos  para  o  alve- 
drio, &  baíláraólbe  dous 
para  o  cutello  :  Ab  imatUy 
Ma^th.  ^  infra. 

75"  Ainda  depois  do 
ufo  da  razaò  wàò  nos  j  ulga 
Deos  mais  ,  que  as  duas 
partes  da  vida  j  porque  a 
terceira  parte,  que  nos  le- 
va aquella  morte  quoti- 
diana, a  que  chamamos  fo- 
i\o>comonaóhe  capaz  de 
peccar  ,  nem  de  merecer , 
naó  a  julga  Deos.  No  juizo 
dos  homens  naó  he  affim  j 
nem  dormindo  nos  izen- 


mortos :  os  homens  no  feu 
juizo  julgaó  os  vivos,  jul- 
gaóos  mortos,  &  julgaó 
os  por  nacer.Naó  vos  lem- 
bra a  hiíloria  do  cego  de 
feu  nacimento  ,  a  quem 
Chrifto  deo  vifta  ^  ainda 
naóera  nacido,&jà  o  fa- 
ziaó  peccador  :  Í)tfw/W,  loann.  ■ 
quispeccavít ,  hic  ,  aut  pa-  ^'^' 
rentes  ejm<i  ut  c£cus  nafce- 
r^r«r.?^  Deos  julga  fomente 
do  fadbo,  os  homens  atè  do 
impoílivel. 

Antes  do  dia  do  juizo 
verfehaó  muitos  íí^^ísilu^^, 
Eruntjigna  m  Sole^  &  Lw^^.  ' 
na :  mas  notai  a  diíFerença. 
No  juizo  de  Deosjos  fmais 
dizem  com  o  juizo  :  no 
juizo  dos  homens,  o  juizo 
naó  diz  com  os  íinais.  No 
juizo  de  Deos  dizem  osíi- 
naiscomojuizo  ,  porque 
os  finais  faó  de  rigor,  &  o 


tamos  de  fua  jurdiçaó:  juizo  herigurofo:  no  juizo 
Dormindo  eftava  JolèpU  doshomens,  ojuizo  nam 
quando  fonhou,  &  porque     diz  com  os  íinais ,  porque 


Crnef 
97 '9- 


íbnhou  o  condenarão  a 
morte  feus  irmãos  :  Ecce 
fomniator  'venit ,  venite  oc- 
cidamus  eum. 

Deos  no  feu  juizo  ha  de 


os  íinais  íàó  de  amizade,& 
ojuizo  he  deodio:  Vede-o 
em  Judas,  os  íinais  eram 
abraços ,  &  o  juizo  trcico- 
cns:  Tradííor  aut  cm  dedit^  ^'l\. 
eis 


Mtmh. 


do  Advento.  8^ 

essfignum :  qnemcunque  oj-  mes,  fendo  os  homês  a  meí-- 
culatusfuiro ,  ipfe  efi^  tene^  ma  mudança,por  mais  que 
te  eiim.  hòs  nos  mudemos,  nam  íc 

Deos  no  feu  juizo  ,  he    muda.  Mudoufe  a  Mag- 
verdude,  que  ha  de  lançar    dalenaj&no  j  uizo  deChri- 
os  homens  ao  Infernojmas     fto  ficou  fanta  j  mas  no  juí- 
zo do  Farifeo  taó  pecca- 
dora  como  dantes    era  : 
^oniampeccatrix  eft. 
No  juizo  de  Deos  ave-^ 


ha  de  fer  dizendolhe  mui- 
to clara,  &  defcubertamê- 
te;  Ite  malediãi  in  tgnem 
^ermm:  os  homens  nam 

fazem  aílim  no  feu  Juizo :     mos  de  fer  julgados  pelos 
eftaõvos  dizendo  :  Venite     Mandamentos  j  quéguar 


i?" 


Ibi4.34- 


benedtãh  Bemdito,6c  bem 
vindofejaisj^  no  mefmo 
tempo  eftaóvos  metendo , 
&  defejando  debaixo  do 
Inferno. 

Deos  julga  como  Juiz  > 
oshomêsjulgaó  como  ju- 
diciários :  entre  o  JUÍZ5&  o 
judiciário  ha  efta  differen- 
ça,  que  o  Juiz  fuppoem  o 
cafo  ,  o  judiciário  adevi 
nha-o. Quantos  vemos  ho* 
je  julgados,  &  condenados 
por  adevintiaçaó :  naó  pe- 
lo que  íizeraó ,  fenaó  pelo 
quefe  adevinha,  que  ha- 
verão de  fazer! 


dou  os  Mandamentos  pô- 
de cftar  feguro  :  no  juizo 
dos  homens  naó  aproveita 

fuardar  os  Mandamentos, 
'izeftes  O  que  vos  manda- 
rão, &  muito  melhor  do 
que  volo  mandarão  ,  &  fo- 
breiílbfois  julgado,  &có- 
denado.  Comoaíèm-ra-' 
zaó  hetaó  moderna,  nam 
ha  exemplo  delia  nas  Ef- 
crituras;  telohaó  os  vin* 
douroSjfe  o  crerem. 

Deos  julga  a  cada  hum 
pelo  que  he  ,  os  homens 
julgaó  a  cada  hum  pelo 
quefaó.  Mais  claro.  Deos 


-j^  O  juizo  de  Deosjfen-  j  ulganos  a  nos  pôr  nòs :  os 

do  Deos  por  natureza  im*  homens  julgaónos  a  nòs 

mutável,  fe  nòs  nos  có ver-  por  fy.  Donde  fe  fegue 
temos,  &   nos  mudamos , 
mudafe  :  o  juizo  dos  ho- 


que  para  feres  bem  julga- 
do no  j  uizo  xi  e  \^^^^ ,  ba  lia 
F  ij         que 


84-  Sermão  da fegunda  dominga 

quevòslejais  bom  -,  mas     tecido nelle,   oquefucce- 


para  feres  bem  julgado  no 
juízo  dos  homens  ,  he  ne- 
ceílarioque  ninguém  feja 
máo.  Terrível  juízo,  em 
queparaeunaófahir  con- 
denado, he  neceílario  que 
todo  o  mundo  feja  inno- 
cente ! 

NojuizodeDeos  bafta 
fer  bom  no  ultimo  infiian- 
te  da  vida,  para  fer  eterna- 
mente bom:  no  juízo  dos 
homens ,  baila  fer  máo  em 
qualquer  tempo  da  vida, 
para  fer  eternamente  máo. 
Sefoílesbom,&foís  máo, 
julgaóvos  mal  pelo  que 
fois :  fe  foftes  máo,  &  fois 
bom,  julgaôvos  mal  pelo 
que  foftes  j  &  fe  fois,  &:  fo- 
lies fempre  bom,  julgaô- 
vos mal  pelo  que  podeis 
vir  a  fer. Ha  juízo  taó  cruel 
comoefte  !  As  culpas  em 
profecia^  Sc  o  Profeta  em 
prifoens  :  Joannes  in  viu- 
culísl 


77 


5.  X. 


Enho  acabado 


T 

parece  que  me  tem  acou- 


deaosmáos  Médicos  ,  & 
aos  máos  confelheiros.  O 
máo  Medico  encarece  a 
enferm idade, Sc naó  Ihedà 
remédio:  o  máo  confelhei- 
ro  exagera  os  inconveni- 
entes, &  naó  dam  eyo  com- 
que  os  melhorar.  O  oíficio 
de  Pregador  também  he 
decurar,&:de  aconfelhar. 
Tenho  encarecido  a  en- 
fermidade ,  tenho  ponde- 
rado os  inconvenientes» 
tenho  moftrado  a  ceguei- 
ra, a  fem-razaò,  a  injufti- 
ça,  Sc  a  tyrannia  do  juízo 
aos  homens  ,  mas  que  he 
do  remédio  para  nos  li- 
vrarmos defté  juízo  ?  Se- 
não ha  remédio,  ainda  he 
mais  temerofa  efta  ultima 
circunftancia  ,  qiie  todas 
as  que  atè  agora  temos  có- 
íiderado.  Verdadeirame- 
te,  difficul to fa,  Sc  impoíli- 
vel  coufa  parece,  achar  re- 
médio para  efcapar  do  juí- 
zo dos  homens,  fendo  tan- 
tos, taó  livres,  Sc  taó  teme- 
rários. 

78     Mas  ouçamos  o 

querefolve  nclla  matéria 

o  todo  Podcrofo  com  fa- 

bcdoria 


bedoria  infinita  :  Nolne    julgiíe  tambeíft  à  nòs :  Lf- 
jumcare^  ut  nmjudiceminh :  gemfrius  ipfe  pojmjih  /2"w*  ^ 
*/>/  f  «i?  ^»iw  judicio  judie  d"     rins  de  his  5  qu£froximus 
^eritis  ,  judicabimini.  Se*    peccavetit^judicando'.  por- 
naó  quereis  que  vos  Jul-     que  fe  nòs  julgarmos  còM 
guemi;  naõ  julgueis,  pòr-     benignidade  -aos    noífòs 
íjiíe  com  o  meíino  jui'ZD>    próximos,  também Deòs^ 
Cbm  qu€  julgardesjfereis     nos' julgara  benígnamen* 
julgadoSvÈfíaff ntença die  ^  tè /^>^âs  fe  nos  o^ julgar- 
Cferifto  Senhor noflb:,  ou     túq^  fèvefamentey  també - 
(c  pode  entendeu  dojm^^  -  eHenos  julgara  c6í€\^eM^^^ 
dos  homens  para  coni  as  *  d-áde.  De  forte,  q  no  juizo 
hõníens,  oã  do  jiiizo;  dê^l  díí^Ekos  para  corai  os  Í10- ^ 
Deos  para  -  com^^Iles^^.-  Se'i  nífen^  êíla   regra  lie  geralf  í 
feelitender  do  juizo  de     femexceiçâo  :  porém  no 
Deos  para  com  o»  homê^ ,  ■    juizo;  dos  fioniens  para  gó  > 
he'ablôluta,  &^nivtírfàt^?   dsílíoftiefí^têm  tãé^polK^ 
ráèfi^e verdadeira :  mas  fc'  ctrtezIyneníPáindáí^prtíb^-  ' 


féentender  do  juizo  dos ^ 
hóitíéns  p^ra*  com  OS  ho- 
mens, naô.  Donde  fe  tor- 
na a  confirmar  onifa  ,  & 
n^iii  vezes,  que  mais  rigu- 
rbfojôc  mais  para  teníer  he 
o  juizo  dos  homens,  que  o 
de  Deos. No  juizo  deDeos 
para  com  os  homens  he 
fempre  verdadeira  j  por- 
^je,:c<í>nio  altamente  diííe 
èjoaó  Chryfoftomo  5  o 
juizo  com  que  nòsnosjul- 
gamosJiiins  aos  outros,he 
ley,  que  puzemos  1  Deos, 
paraaucelk  por:Cila  nos 
"'  ■;!.;  ^  Tom. 7. 


biiidad€,qu^atèxí)  mefmo  * 
Ghriflo,  íèndo^  taó  benig- - 
no  em  julgar,  oz  perdoar  a 
todos,  naô  efcapou  de  fcr;, 
taó  injuílànYente  julgado  >' 
&  condenado  por  cUes. 
SeChrifto,  fuma  Innocé- 
cia,  teve  hum  Anàz,  hum 
Gayfaz,hum  Pilatos ,.  &• 
humHerodes,  que-ojul- 
gáraó,6ccondenára63  quf 
homem  aVerà  taó  innbcê^ 
tc,&jun:o,  que  por  cftes 
quatro.  Juizes  naó  tenha 
quatrocentos,  que í o  jul- 
guem;^ condenem?    • 

Fiij         Com 


m 


.í|v| 


S6  Sermão  da fegwndalHmin^ 

75>  .   iÇ^!^  (Eudo.çft;^-.  LuciícE.  Selmftt  Scrafioit 
mefrti^;  f^,ntfòn^a7 ».  vcainda.-;  fcQaòatrevea  jirfgar  hurw  ^ 
qu^.  uniíriErftlriieíite  ;n4Q     Etenxonio, camo  fe  ha  deí 
}ie<íertai),^  juizo  dQs  ho^-  atrever  htmi  homem  a  juk.: 
raens   para  com  ^s  ho-    gaí  outro  homem  1  i 

niensxppr  dídlanje  a^tu-        8a    Se  queremos  jdUr 
rald^raz^^  poí^^fppovi-    garweniosos  olhos  par*j 
déc,í^parCÍcMlar€teDeo3,-i  a  parte  díí.  dcntra.^  que- 
muitas  y^zes  Je  vçrigca:    aioda-xisal  , -porque  tanso 
nelles,  Rolitej^caréy  &     acharemos  que  julgar,  quc- 
nofijudkahimmincliteeo-i-^^cmímtm  i,  &  que  conde- ^ 
demnarei  &im^  condemno^-  nar.  Senos  julgarmos  fes». 
^/w/wi.  Naé>j.ulgui?is.,*  ^.,  paixaóanps,.  eiLvospror 
naQ.fereis  jul^tdos  :  =nam  t  meto,  que  tenha  bios  tantoé. 
condeneis  j  ôc  naó  fereis  .  que  merySí  tanto  qucpa^- 
conden^dqs.,  .Sabeis  porr    mar  ^qii*.  naó  no&£que >  > 
quem;ui,t^3  veze^r  fomo^  ,  nem  t^tiapo.  vnern:  animo 
julgados^  &  taô  injuftamé-    para  jdgar  a  òtiáreffv.  O 2^- 
te  julgados  ?^  Porque  tan-     Ghriftã<^j  por  reverenciai 
tas  vezes  famos Juizes  5  &     de  I>eos,pclo  que  deve-  ' 
injyftinimos  Juizes  :  .por-     mos^  a  Chrifto ,  pela  obri- 
qjuJgaifi  asobr^s  ^Iheas,     gacajoq^e  temos  a  n<Díras 
pof4irp:iíGp  iu-lgaõ  as  vof-  -  almas  „    que  íej^  o  fruto 
ft$|fti)|-á:^^;-  porque  julgais    defteSermaó  ÉQiner  muiro 
as  palavras  alheaA,  pofií^    hiamjiiizotemera:no  ,naò 
fo  .vos julgaó  as  voíTaspa^     Çíymco^  6m  qucfomos  juL- 
iavxas:  porque  juigaiçâtê'   gados»  queifíb  naô  he  euU 
os  penCiiuentos   a^lheo^!,/   panoíIÀjo^aío  jtiizo,  em 
poriírovoSÍulgiVÕ3.&,  vo^    quenòs^jtiJgamos,  que  hc 
condenag,  ate  o  que-BL^na,    a. laoíTa  condenação.  Inquo 
vo$  paíTbu  pelo  penfamé-  ;  alterum  jndicas  ,  te  ipfum  ^^  ^<>- 
to.    D;iz  S.  Tiago  na  fua     cendemnas,  diz  S.    Paulo  :  í', 
Canónica,,  que  S.  Miguel     Quando  julgamos  os  ou- 
fenaó  atrevco  a  julgar  a     tros,condcnamonos  a  nòs.- . 

Kquan- 


nun.>. 


E  qiiantos  condenados  ef-  ^es  tro|)eça .  a  charidade , 

.feô  hb]^ ãb  inferno fó  p©r  cm quctáó gravemente 'fe 

tu  juizo  Demerario !  Deos  cmbaraçâo'  tiS  confcica- 

pút.  liíâ.  tóiTcficox^diâ  àos  culs  ,  em  que  taó  perigofa- 

JOrviít'&eítim.efcandaloco-  áncntcfe^pcrde  a  graça^^c 
do  efte  raó  fac^ljôc  t^or-  ^^com^filifJi  Gloria, 
Aa^á^em^ctantaire-  '\^;^        _,      ^>i, 


>    ^. 


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...  *|j^' 


;^is 


'¥ 


SERMAM 

DA  TERCEIRA  DOMINGA 

DO 

ADVENTO- 


Tmquises?  quid dimdeteipfo>  Joaacap.i 


Ambem  hojç  te- 
mos juizo^,  3c  he.! 
íjà  eííe  o  tercét-'^ 
ro.  No  primetr^J 
Sermaó vimos  o  ]\irLo^dé 
Deospara  có  os  homens: 
no  fegundo  o  juizo  dos  ho- 
Jnens  huns   para  cora  os 
outros ;  nefte  hoje, que  he 
o  tcrceirojveremosojuizo 
de  cada  hum  para    comíl- 
go :  77/  quis  es?  quid  dicls  de 
{^/^?.. Contém  eítas.  pa- 


lavras  hila  propoíla  ,  ou 
emhaixada,  que  fizeraó  ao 
Baútiftaos  Sacerdotes^  & 
ITévitas  5  mandados  pelo. 
fupremo  Concelho  Ecclc- 
fiâíiico    de  Hieru falem  : 
quéfèm  dizer:  Tu  quis  es  y 
Vòs  quem  fois  ?  Qutddicis 
deteipfoyQaç:  dizeis  de  vòs 
mefmo?  Eíla  queftáo  de- 
termino   tratar   >  porque 
fendo  matéria  gravillima , 
&  ác  grande  importância 
cm  qualquer  parte  do  mú* 
do,  em  Portugal  he  ainda 
ao 


Sermão  daurceirà  dominga  do  Advento,         h9 
aoprefente  mais  grave  5  &     o  gue  faó,&  outca  coufa  hé 

G  que  dizem  *  Ninguém  ha 
neíle  mundo  ,  qire  fe  def- 
creva  com  à  fua  definição : 
todos  fe  enganaó  no  ge- 


mais importante 


S2''T^Uquises  Prfmddí- 
X  dsdeteípfo^Apri' 
meira  coufa,  em  querepá- 
rOjhejqueefte^  Embaixa- 
dores de  híia  pergunta  íi-     que  fois !  E  opeor  he,  que 


nero5&  também  násdiíFe^' 
renças.  Que  diíFérentes 
cóufas  faó  drdinariamen^ 
te  o  que  dizeis  de  vòsj&  o 


zerao  duas.  'queftocns  : 
Hiaó  perguntarão  Bauti- 
lta,quemera5  &:  para  iíto 
parece  que  liaftava  ^ízer, 
Vòs  quem  fois?  E  eííes  dif- 
feraó,  Vós  quem  fois  ,& 
Vòs  quem  dizeis  que  fois? 


muitas  vezes  naó  £ió  cóu- 
fas differentes  :  porque  o 
qucíbijSjhe  nenhua  coufa  5. 
êf  o  que  dizeisj  faó  infini- 
ta^ coufa  s.  Neíla  matéria 
deves  quem  fois  ,  todo  0 
Homem  mente  duas  vè- 


Tu  quis  es?  qmd  dicis  de  te  zes ,  húa  vez  iti enteie  a  fy, 
'^  ^  ,  .  ,  &ou^a  "v^^:  mentenos  a 
Víòs :  mentefe  a  fyjporque 
fempre  cuida  mais  do  que 
he :  &  mentenos  a  nos  , 
porque  fempre  diz  mais 
do  que  ciíí da .  Bem  diílih- 
guiraõ  íogo  os  Embaixa- 
dores o  Tu  ^uis  es-iácy^id 
grandes  noticias  do  mun-  dkisdeteiffq  j  &  quando 
do.  Quandç>hiaô  faber  do  Hiaó  perguntar  ao  Bàuti- 
Bautifl:a,;quem  era,,  per-  fta  o  que  era ,  perguntarão 
guntaóihe.  Vos  quem  fois,  o  que  era,  &  o  que  dizia  ^ 
gc  Vos  quem  dizeis   que    porque  ninguém'  ha  ta6 


tpj  o  r  Ora  os  E  m  baixadp- 
res  naó  eraó  homens  de  ca- 
pa, &  efpada ,  fenaó  cà  do 
foro  da  igreja:  Sacerdotes^ 
•ir  Levitas^  mas  el  1  es  fáí- 
láraó  muito  difcretamen- 
te,  &  entenderão  o  nego- 
cio ,    coráo  quem  tinha 


fois  j  porque  qs  .  homens , 
quando  teftemunhaó  de 
iymefnaos^  h&  CQuía  he 


re£to  jmz  de  fy  mefmo  , 
qiieyoiidiga  o  que  he,  eia 
fej^arO  que  di2:. .   , 


m 


T-lÍM 


Tob.y. 
1$. 


Ibid. 


.  83  .  Encrpu  cx  Anjo  Ra-    jos  naó  ha  geração  jlcíios 


fàel  xfaliar  com  p  velho 
Tobias  cm  trajo  de  ca^- 
nhancci  ou  ainda  de  çarai- 
aheiro;&  antes  de/Tobias 
entregar  o  ■  fijlio  ao  Anjo 
para  aqneila  peregrinação 
taó  fabida,  fezihe  cfta  per- 
gunta: Rogo  te^ndica  mihiy 
de  qua  domo^&  de  qua  tribu 
es  /í^  ?  Por  V  ida  vofla ,  que 
me  digais,  de  que  famiJia , 
&  de  que  triòu  íqís,  A 


Anjos  náóhi^;,  nçnjpódc 
haver  pay  ,  &  fiiho  •,  co- 
mo  dizo  4njpRafael,que 
he  filho  do  grande  Ana- 
niás  ?  Apoôpeu^  que  elta- 
yaagpni^çuidílndo  algué, 
que  para  c|içarccimento 
do  meu  ariíimpto  havia  cu 
de  dizer,  que  em  .matéria 
devòyqiieih  fcis,  ate  os 
Anjos  mentem.  Naó  digo 
eu  eíres.arrpjamentpSyCÍte 


pçr^nta  verdadeiramen-     lugar  he  de  verdades  foií- 
teeraparaembaraçarhujm     das. Os  Anjos náò  podem 


Anjo  >  mas  a  reppfta  foi 
notável :  Ego  [um  Azarias 
.  Anani^  magni  filius.  Eu 
íou  Azarias  fiiho  de  Ana- 
nias  oMagno.Como  í^^dif- 
leflèmos  de  Carlos  Mag- 
^o,  dePompcpMagnOjdc 
Alexandre  Magno.  Ha  tal 
repoUadehum  Anjoi  Èçi 
Peosha  pay^.ôc  filho  ;  nos 
jhomens,&  nos  animais  ha 
pays,&  filhos ;  nas  meíinas 


mentir,  ne 01  errar  (^Fallo 
dos  bons. }  Masagora  ^ca 
a  diificúldade  mais  aper- 
tada. Pois íe os  Anjos  naó 
podem  entender  5  nem  di- 
zer contra  a  verdade,  co- 
mo diz  p,  Anjo  Rafael,  quç 
he  filho  do  grande  Ana- 
nia5?  Variamente  rcfpon- 
dem  os  Doutores  à  duvi- 
da j  eu  o  farei  .com  huipa 
comparação.  Entra  hum 


plantas  ha  feu  modo  tde  comediaqte  no  teatro  rç- 
gcraçaó  :fó  nos  Anjos ,  de  prefentando  a  Lúcifer  j  & 
todos  os  viventes  do  mun- 
do Q  entrando  o  cr  ca  do,  âc 
pincrcado^fó  nos  Anjos 
naó  ha  geração  » nem  pay , 
nem  filho.  Poi&iènosAn- 


'4 


batendo  com  o  Tridente, 
começa  a  fulminar  blasfé- 
mias contra  Deos;  Entra 
outro  reprefcnrád©  a  Ne- 
ro >  ,(5f  UnMido  íi  ^,ípada%| 
mah- 


çãs,&"quc  cóSraõ'  rios^  de  ^^mofeôfork^    ^ 
fangue  Cliríftãô  pòr  Ro-  i  "   8^      Séjã^^ráímilnícr 
ma  :  Sae  oittro  "réprefèíi-     fiador  dcíla  minha  repo-: 
randohum  Gentia^y  &  eri-í    fta7    Aparecerão  a^  Abrá- 
cônf rahdo  IMà  eftktita  cíé     hàrri  no  viiíe de  Mambré^ 
J qpiteri  próftrafc  pOr  tèr^ '   três  AnjóSr Mmí  de  íítòior 
ra,  t>àte  hòs  péiMs,  Ôc  oífe-     authofidade5a  quem  elW 
réce  ificfenfo.    Pergàrt to     adorou, &  outros  dotis  me- 
âgora  :  ^qfuélíè primeiro     noreS,<jueo  acompanha* 
homeiii  hè  'tílasfèníò.^a-     váÕ.È  conto  Sara  mulher;. 
queíleTeguiidòhòniemhè    de  Abraharii  foífe  eííeril, 
tfrannò  ?  àqueíie  terceiífo    pròm^teolhe  o  A njo  priít-  ' 
homem he idolatra? Cíaro^    cipal, que  datli  a  hum aít^ 
ertá  qiiè  não  :   o  primeiro^    noíj  pbf  aquellc  mefmo  té- 
líáóhe  Wasfefiio,aindaq-ue    pòtorriafia  3  fe  Deos  lhe 
ífiibíasTcmias  jporq^àe  el-    déiíe  vida,  &  que  jàeTitaó 
IchaõhéLuciftírifazíígu?*  ^  teria  Sara  hurn  fflho  :Í?<?-^ 
ra  de  Lúcifer  :   ò  icguncfo'    vértens  vemam  adie  Sem- Os^cC, 
rtíphetyrannó',  ainda  que-  pohijioy  vitOrComitè^  ò^hd-^^^]^' 
míinda  matar  Chriftáos  5     bebitftlhim  Sara  uxor  tuà. 
porque  èífe  háío  hé  Mero ,    Que m  averà,  que  naó  rê- ' 
fa^  figura  d^'N^rB:Ò  ter-     pareMquelle,^///«r^?;z»/f(f3 
céírò líao héldolatra,  ain-     íe eu  ft>r  vivo^j  dito  por  hu^^ 
da  <5[uc  fè  á^oeffia  dilte:d4     Ah}o  ?  E  nao  lo  fallou;^  ^ 
e^atuii  dejupiterjpvorqiie   ,  Anjo  por  eftes  termos  hya 


elfènao  be  tíéhtiç,  íitê 
gura  dè  Gentio,  Ó  mermo 
3i|odionoffocar0;  05lh- 
jo  naom èritio ,  nem  pôde 
men  tiriainda  que  diíTehu  - 


veíz,  fenaó  duas  :  porque '^  ■ 
pondo  Safa  duvida  àprò*- 
meíTa  5  tornou  élle  á  fatifi*  \ 
car  a  fua  palavra, dizendo:  J 
Juptta  rondiãum  revertar 


ma  coúfa  ,  ^  P^^^Ç^  ^^ ^^^^    ^^  tehoc  eódem  tentggreyvi 

da  verdade;  porque   elle  _  /^rí?;»//^.PQÍsíe  os  Anjos 

naÒ  era  íiomemjfozià^fígu-    por  natureza  Ía6  immor- 

taesí 


í  M 


":\ 


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'••i! 


„í 


)*^M' 


$ii:      .    ,   .    Sermão daièfceira  H^omingâ 
taes,  5f  a  Tua  vida  por  ne-     o  Anjo  Rafael  iia  repofta, 
nhum  acontecimento  po*     que  deo  a  Tobias. Fazia  íi- 
de  faltar  ^porque  promete  -   gura  deíiomem,&'  para  fa- 
efte  AnjO)  naó  abfohita,     zer bem  afigura  j  hua vez 


íenaõ  condicionalmente, 
qiíè  tornará  dalli  a  hum 
annojfeforviyo,  vita  co- 
mité^ A  x^z^ò^  riaó  fó  hu- 
mana, mas  Angélica,  foi  ^ 


que  lhe  perguntarão  ,  A^ò^ 
qúemfois  ?  naó  havia  de 
dizer,o  que  eí"a ,  havia  de 
dizer,o  que  nam  era  j  Scaf-; 
Hm  o  fez ;  porque  nam  Iva; 


porque  eíle  Anjo,&:  os  ou-     propriedade  mais  própria 
tros  dous,  como  declara  o     dos  homens,  que  pergun- 


Texto  ,  aparecerão  a  A- 
braham  em  figura  de  ho- 
mens ,  apfaruerunt  et  três 
njiri :  &  elle  os  tratou, 8c  el- 
les  fe  deixarão  tratar  em 
tudo  como  homens,  acei- 
tando a  fua  raefa,&  os  ou- 
\  tros  agafalhos  da  hofpeda- 
gem.  E  porque  os  homens 
prudentes  na  cófideraçaó 
da  incerteza  ,  6c  contin- 
genciada morte  ,  quando 
prometem  algua  coufa  de 
futuro,  acrecétaó,  fe  Deos 
me  der  vida  j  por  iíTo  o  A  n- 
jo  acrecentou  a  mefma 
còáiQ^o  ^  vít a  com  te-^ipov- 
que  naó  fallava  como  An- 
jo, que  era,  fena  6  como  ho- 
mem,cuia  figura  reprcfcn- 
tava.  Do  mefmo  modo,  & 
com  "a  mcfma  ,  &:  amda 
maior  propriedade  faliou 


tadosoque  íàó  ,  dizerem; 
hiia  coufa,  6c  ferem  outra. 
E  notai,  que  vindo  o  Anjo 
veílidoemhum  pelote,  6C; 
reprefentando  hum  cami-  ^ 
nheiro  ,  parece  que  era 
mais  natural  dizer,que  era 
filho  de  hum  lavrador,  ou , 
de  hum  paftor  daquelles 
campos  íôc  com  tudo  naó 
diíTefenaó  ,  que  era  filho 
de  Ananias  o  grande  5  por- , 
que  naó  ha  homem  de  pè  . 
taó  de  pè,  nem  caminhei- 
ro taó  caminheiro,  que  fe 
lhe  perguntarem   donde, 
vem,  naõ'diga  que  vem  là . 
do  grande  Ananias  :  Ego 
fum  AnaniíC  r^ãgnifdius.*  < ;  r 
8+    Allim  como  To- ' 
biasao  Anjo,  aílim  pcrgú- 
táraò  hoje  os  Sacerdotes, 
6c  Lcv itãs  ao  ilaun íTa :  'lu 
quis 


uis  es  ?  E  que  refpon  deria     naó  o  podia  dizer  em  conf- 


aquelle  grande  Varaó  ?  ^í 
confeffus  eft^&  non  nega-vit\ 
■  ^  confeffus  eft:  quta  non 
fum  ego  Chnfttis :  E  confef- 
fou, 8c  náo  negou,  8c  con- 
féílbu,  que  naó  eraelle  o 
JMeíIias.  Em  coda  a  fagra- 
da  Efcritura  naó  ha  tal 
modo  de  falíar  como  efte, 
Repetio  o  E vágelifta  três 
vezesamefma  affirmaçáo 


ciência^  porque  feria  pec- 
car  na  mais  grave  matéria^ 
que  ouve  nunca  no  mun- 
do. Pois  porque  repetem 
tanto  os  Evangeliílas  ,& 
porque  exageraó  tanto  to- 
dos os  Santos,  &  Doutores 
da  Igreja  efta  acção  do 
Bautiftra  >  Porque  he  ta6 
naturai  aos  homens  cuida- 
rem mais  de  fy-jdo  que  faó^^ 


("dizem  os  Doutares^por-     &  dizerem  mais  de  íy ,  do 
que  lhe  pareceo ,  que  fora    jque  cuidaó,  que  não  negar 


taó  grande  coufa  confef- 
fàr  o  Bautifta  ,  que  nam 
era  o  Meíllas,  quefeodif- 
fera  menos  vezes,nem  elle 
fe  acabara  de  explicar,  nê 
nòs  acabáramos  de  o  crer. 
Ora  a  mim  nunca  me  pa- 
receo efta  acçaó  do  Bauti- 
fta taó  grande  como  a  fa- 
zem .  Que  havia  de  fazer 
o  Bautifta,  havia  de  dizer, 
que  era  Meíllas?  o  Bauti- 
fta nem  o  podia  cuidar  có 
razaó,  nem  o  podia  dizer 
emconfciencia:naóo  po- 
dia cuidar  com  razaó^por- 
que  elle  íabía  mui  bem, 
que  era  do  Tribu  de  \ut\'\ , 
&queo  Meíllas  havia  de 
fer  do  Tribu  Real  de  Jiidà: 


o  Bautifta  a  razaó,  8cnan^ 
atropeiiar  a  confciencia, 
nefte  cafo,  íè  tem  pela  ma- 
ior de  todas  as  façanhas 
humanas.  Que  lhe  pergu- 
taftem  a  hum  homem  .Tu 
quis  es  ?  E  que  eftiveíTe:  em 
ília  mio  dizer,  que  era  o 
Meíllas,  &  que  o  naó  fizeA 
fe !  diga-o  três  vezes  o  E- 
vangeiifta,  para  que  acabe 
de  o  crer  a  fé:  Et  confeffus 
eftyò'  nonmgãvit :  &  con* 
feffus  eft:  quia  non  fum  ego 
Chriftus, 


8f 


E 


§.  IIL 

Míimos  Embai- 
xadores fe  torm- 
ra6 


m 


I 


'■■■'l 


m 
('•' 


;*•'' 


Ifaice 
3Í-4- 


ífaise 
9.6. 


Mala- 

3. 


94*  ,  Sermão datercciraT>ommga 

raó  do  deferto  fem  acha-    pennisejus.    Outro 
quem  lhe  diíTeíTe, 


rem 

que  era  o  Meílias.  Mas  po- 
voado fci  eu  donde  elles 
iiãohaviáo  delev^r  a  em- 
baixada de  balde.  Se  os  Sa- 
cerdotes ,  6c  Levitas  de- 
fembarcáraó    em    outras 
prayas,  ôcvierão  pelas  ca- 
ias mais  altas  perguntan- 
do, Tu  quis  es  ?  como  he 
certo^que  a  poucos  paílbs 
havião  de  achar  o  Meílias. 
E  aonde  ?  húa  legoa  de  Be^ 
lem,  íem  fer  em  Paleílina. 
Hum  havia  de  dizer,  que 
elle  he  o  Meíliasj  porque  a 
ellefedevea  noíTa  redêp- 
cão :  Ipfeveniet^&falvabit 
nos.  Outro  havia  de  dizer, 
que  clle  he  o  Meílias  5  por- 
que fobre  feus   hombros 
carrega  todo   o  pcfo   da 
Monarchia  :  Cujus  impe^ 
rium  Juper   hnmerum  ejus. 
Outro  havia  de  dizer,  que 
elleheoMeíHas  i  porque 
ofeu  confelho  he  o  noííb 
Anjo  da  guarda:  Et  voca- 
biturmagni  confilij  Ange- 
íus.  Outro  havia  de  dizer, 
que  clle  he  o  Mcíliasipor- 
quen-ifua  pcnna  cóíiítca 
noíTafaude  :  Etfanitasin 


havia 
de  dizer ,  q  çiút  hc  o  Mef- 
fias  5  porque  a  paz,  que  ef- 
tes  annos  fe  gozou  ,  foi 
fruto  da  vara  defuajufti- 
ça :  Erit  in  diebus  ejus  ju*  Pfai. 
Jtitiiiy  &  abundmtta  paris.  ^' 
Outro  havia  de  dizer,  que 
he  o  Meílias  5  porque  ellc 
heoDeosdas  armas,  que 
comfeu  valor  nosfuílen- 
ta :   Vocabitur  nomen  ejus 
^eusfortis.  Só  naó  havia 
de  haver  quem   diíTeíTe, 
que  era  o  Meílias,  por  fe 
apreflar  aceleradamente  a 
vencer,  Ôc  tirar  defpojos^ 
Voe  a  nomen  ejits^accelera ,  8^.3.'*' 
feftina  ^fpolia  detrahere } 
porque  ainda  que  às  guer- 
ras nos  inclinamos  com 
grande  valor ,  àsvidorias 
caminhamos  com  grande 
madureza. 

8^  Por  todas  eílas  ra- 
zoensme  parece,  que  ha- 
via de  haver  maior  demã- 
da  na  noíTa  Corte  fobre  o 
MeíHado ,  do  que  a  ouve 
entre  os  A  poíloíos  fobre  a 
maioria.  E  vcrdadeiramé- 
te,  que  fc  vem  hoje  muitas 
couías  daquellas  ,  que  os 
Profetas  antigamente  de-^ 
ra6 


7í 


ão  Advento^  pf 

raopor  linais  dos  tempos     queíeílzerão  para  ferir^fe 


Ifaiaí 


doMeíTias.  O  Meílias,  di 
zem  osProfetas^que  hayia 
de  dar  olhos  a  cegos,  pès 
a  mancos  5  limpeza  a  Ic- 
profos,  &  vida  a  mortos  : 
Túc faliet  pcut  cervus  clau- 
dus  5  ò*  aperta  erit  lingua 
mutorumy&c.  E  todos  eP 
tts  milagres  vemos  em 
iioílbs  dias.  Quantos  ce- 
gos vemos  íioje  có  olhos ; 
quantos  mancos  5  &  para- 
líticos poftos  em  pés  j  quã-í 
tos  aleijados  com  mãos,  & 
com  muita  mão  j  quantos 
leprofoslimposj  &  quan- 
tos mortos,  ou  que  deve- 
rão eílar  mortos ,  &  íepul- 
tados,  rerufcitados,&:  com 
vida  ?  Pois  o  poder,em  cu- 
ja virtude  fe  fazem  eíles 
milagres  ,  como  fe  ha  de 


ocupão  em  fegar  :  em  tè- 
po,  que  as  caixas  tocáo  a 
marchar,  &  as  tropas  mar- 
chão  a  recolher  -,  &  em  que 
os  defpajos,  que  havião  de 
ornar  os  templos,  &  armar 
os  aimazens  comuns  >  en- 
chem os  celleiros  particu- 
lares i  como  não  ha  de  ha- 
ver quem  fe  jadbede  Mef- 
íias  >  Dizem  mais  os  Pro- 
fetas ,  que  no  tempo  do 
MeíHas,  os  montes  fe  hu- 
miiharião,  &fe  enciíeriaó 
os  valles :  Omrús  valUsini'  rraiaj 
plebitur^é*  omnismonr^Ò''^^''^ 
callis  humiliabitur.  Oh 
quantos  montes,  que  em 
tempos  paííados  tocavam? 
com  o  cume  as  Eílrellasjfe 
vem  hoje,  ou  já  fenão  vem 
de  humilhados  ,  &  abati- 


negar  de  Meílias  ?  Dizem     dos !  E  quantos  valles  pelo 
mais  os  Profetas  ,  que  no    contrario  pouco  ha  taò  hu- 


tempo  do  Meílias  as  lan 
ças,8c  as  efpadas  fe  fcó ver- 
ifais  2.  teráó  em  fouces  :  Confia- 
*  bunt  gládios  fuos  in  vame^ 
res^éy  lanceasfuas  inf alces. 
E  em  tempo  ,  que  ou  por 
beneficio  da  paz  prefente, 
ou  por  efquecimento  da 
guerra  futura  a  as  armas. 


mildes,  hoje  tao  levanta- 
dos3&  táo  cheos  í  E  a  for- 
tuna,que  fez  eftes  altibai^ 
xos,oufeja  deíigualdade^ 
ou  fe  chame  juíliça,  como 
fenão  ha  de  ter  por  fortu- 
na de  Meílias  ?  Dizé  mais 
osProfetas,  qtie  no  tempo 
doMeíilasvivirião  os  lo» 
bes 


W 


<?  (>  Sermão  ãa  terceira  T>ominga 

bos  juntos  com  oscordei-     muita  femelhanca  mal  en-^ 


"'11 


'ii- 


^  !l!  !í 

•  t ;    u.-I 


ros,&queoleáo,  &  o  boy 
feruílentaríaó  do  mefmo 
mantimento  :  H^bitabit 
u^lz  II.  Inpus  cum  agno^  &  Is  o  qnàfi, 
bos  comedet  paleas.  Se  os 
lobos  náo   foílem  tão  fa- 


6.7 


tendida  acertara  de  fe  nos 
converterem  tentação.  E 
porque  naÓ  íio  tanto  de 
noíTa  modeftia ,  como  da 
de  S  Joaò  Bautifta  y  faiba 
cada  hum5&  defenganefe, 


gazes  em  defpintai;  a  pel-     por  mais  que  fe  pinte  ma- 
k,  com  os  olhos  fe  podéra     raviihofonofeu  conceito, 


provar  hoje  o  comprimé- 
todefla  profecia.  Ainda 
mais  que  dos  lobos,  me  te- 
mera eu  dos  leoens  com 
palhas  na  boca.  Mas  quan  - 
doharquem  domeílique 
leoens  a  que  fejaó  animais 
de  prefepio  ,  os  authores 
deílas  induftriasjou  deíles 
milagres,  porque  náo  pre- 
fumirião  de  Melllas  P 


87 


§.  IV. 

Am  ha  duvi- 


da ,  que  tem 


N  ._ 

grande  analogia  a  noífa 
era  com  a  do  Mellias  ,  & 
que  parece  podem  com- 
petir os  milagres  Q  náo  di- 
go os  vicios  3  dos  noflbs 
tempos  com  as  felicidades 
dos  feus.  Mas  pelo  mefmo 
cafo,  que  fc  parecem  tan- 
to, não  quizera  cu,  que  a 


que  lhe  falta  para  MeiTias 
a  condição  principal.  E 
qual  he  a  principal  condi- 
ção de  MeíTias  ^  He  aquel- 
la,  com  que  o  deíinio,&  íi- 
nalou  Deos,quando  o  pro- 
meteoa  Abraham  :  In  fe-  Gcnef. 
mine  Uio  benedicentnr  om-  ^^•'^* 
n^s.  No  Meíllas,  que  naf- 
cerdevós  ,  feráóabendi- 
çoados  todos.  Se  tendes 
benção  para  todos  ,  dou- 
vos  licença,que  entreis  em 
prefumpção  de  Mellias: 
mas  fe  tendes  benção  para 
huns,&:  para  outros  não, 
defpedivos  delle  penía- 
mento. 

88  Qiiandoo  Anjo 
anunciou  à  Senhora,  que 
haviadefcr  mãy  do  Mef- 
fias,  acrefceutou  cilas  pa- 
lavras :  T>a,yit  illi  T)o7ni'  f^"c  1. 
nus ''Deus  fedem  'Danjídpa-  ''' 
íris  ejns  ,  à'  regr.  avit  m  do- 


ão  Advento'. 


mo  lacoh  m  aternum.  Dar- 
llieha   o  Senhor   Deos  o 
trono  de  David  feu  Pay,  & 
reinara  na   caía  de  Jacob 
para  fempre.  Neíta  ultima 
claufula  reparaó  com  ra- 
zão todos  os  Interpretes, 
porque  diz  o  Anjo  ,  que 
reinará  o  Meífias  na  cafa 
de  Jacob,6c  naó  na  cafa  de 
Abraham  ,  ou  na  cafa  de 
Ifac  ?  Se  Abraham,  &  Ifac 
naó  foraó  Reys  5  também 
Jacob  naó  teve  Cetro,  nê 
Coroaj  antes  Abraham  foi 
vencedor  famofo  de  cinco 
Reys ,  que  em  certo  mo- 
do he  mais  que  fer  Rey. 
Ifac,&  Abrahaó  eraó  mais 
antigos  que  Jacob   :  &  a 
promeíla  do  MeíHas   foi 
feita  a  Abraham  ,  quando 
acabava  de  embainhar  a 
cfpada  daquella  grande  fa- 
çanha    do    facrifício   de 
Ifac  :  pois  porque  naó  diz 
o  Anjo,que  reinará  o  Mef- 
llasnacafade  Abraham  , 
ou  na  cafa  de  Ifac,fenaó  na 
cafa  de  Jacob  ?  Vede  a  ra- 
zaójque  he  altillima.   Na 
cafa  de    Abraham    ouve 
dous  íilhos,Ifac,&  Ifmael-, 
mas  para  Ifac  ouve  ben- 
. ,.     Tom./. 


9y 


çaó,  para  Ifmael  naô  ouve 
benção.  Na  cafa  de  Ifac 
ouve  outros  dous  filhos, 
Efau,&  Jacob  >  mas  ouve 
bençaõ  para  Jacob,  &  naó 
ouve   bençaó  para  Efau. 
Na  cafa  de  Jacob  pelo  cõ- 
trario  ouve  doze  íiihos;& 
foitaó  abédiçoada  aquel- 
la  cafa,  que  para  todos  os 
doze  filhos  ouve  bençam. 
Por  iílb  pois  diz  o  Anjo , 
que  reinará  o  Meílias  na 
cafa  de  Jacob,  &  naó  na  ca- 
fa de  Ifac ,  nem  na  cafa  de 
Abraham  5  porque  o  Mef- 
íias  naó  he  como  Abra- 
ham, nem  como  Ifac,  que 
tem  bençaó   para   huns, 
6c  para  outros  naó :  he  co- 
mo Jacob,  filho  de  hum, 
&  neto  do  outro,  no  qual 
fecomprio  a  profecia,  & 
teve  bençaó  para  todos : 
Infemine  ttio  benedicentur 
ííwwí-í.  Soquem  teve  ben- 
çaó para  todos  os  domuu- 
ao,foi  verdadeiro  Meílias 
do  mundo :  &  fó  quem  ti- 
ver bençaó  para   todos  os. 
de  hum  Reyno,  fera  ver- 
dadeiro Meílias  àú\ç.. 

8p       Se. lançarmos  os 
olhos  pelo  noíTo  na  muda- 


.1- 

,,  >  ',v  í  : 

-'$ 

Geneí. 

49  9. 

17-21. 

■  fi- 

i427- 

í  S  Sermão  da  terceira  T>ominga 

ça,ou  fortuna  prcfente,     hum  bençaò   de  Leão,  a 

iiaó  me  atreverei  eu  a  pro-     outro  de  Lobo,a  outro  de 


var,  que  todos  tem  ben 
çaó,  mas  que  tem  bençaó 
muitos  mais  daquelles , 
queocuidaó  j  as  mefmas 
bençoeiís  de  Jacob  nolo 
faraó  evidente.  Chamou 
Jacob  a  feus  filhos  para  lhe 
deitara  béçaóa  todos  an- 
tes demo  rrer  5  &:  he  nota 


Jumento  ?  Sim :  &  era  pay 
quem  as  dava,  &:  eraó  fi- 
lhos os  que  as  recebiaó: 
para  que  fe  entenda,  que  a 
diverfidade  das  bcnçoens 
naó  argue  deíigualdade  de 
amor  em  quem  as  dá,  fe- 
naó  diíFerença  de  mereci- 
mentos em  quem  as  rece- 


vel  a  difFerença   de  pala-     be.  7\  Judas,que  tinha  va 
vras,&:  comparaçoens,  có     lor,  &: generofidade,  dafe 


que  ícz  efta  ultima cere- 
monia.  Chegou  Judas  ,  & 
deolhe  bençaó  de  Leaó : 
Sedens  aecubutfti  ut  Leo\ 
chegou  l<lQ^t2M  y  Sc  deo- 
lhe bençaó  de  Cervo ;  Ne- 
phthaliCervtis  emiJJus:c\\Q- 


lhe  béçaó  de  Leaó :  a  NepH 
tali,  que  tinha  preíleza, 
mas  naó  tinha  valor ,  da- 
felhe  bençaó  de  Cervo  :  zt 
Dan,  que  tinha  prudência, 
mas  tinha  peçonha,  dafe- 
Ihe  benção  de  Serpente :  a 


gou  I>an,&  deolhe  bençaò  Ifachar ,  q  tinha  forcas,& 
de  Serpente:  iv^/^^D^^jiCí?-  naó  tinha  juizo,  dafelhe 
kiber  in  ma-,  chegou  Jfa-  bençaó  de  Jumento:  a  Bé- 
ehar,&  deolhe  bençaó  de  jamin,  que  tinha  oufadia, 
JnaiQnto:  IJJ achar  Afinas  mas  junta  com  voracida- 
fortts:  chegou  Benjamin,  de,  dafelhe  bençaó  deLo- 
&  deolhe  bençaó  de  Lo-  bo.  Náoeílãomuibemre- 
boi^í^?^'^;?^/»  Lupiis  rapax.  partidas  as  bençoens?  Que 
Valhanie  Deos ,  que  deíi-  haverá  que  o  negue  ?  Mas 


gualdade  de  bençoens , 
húas  a  huns  taõ  altas,  & 
outras  a  outros  taõ  baixasf' 
A  hum  benção  de  Serpen- 
tCjôca  outro  dcCcryo?A 


fabeis  porque  ninguém  ef- 
tà  contente  com  a  fua  ben- 
çaó ?  Porque  a  todos  Falta 
oconhecimcto  do  Tu  quis- 
fj.Conheçafc  cada  hum, & 
c;íta- 


ão  Advento.  99 

eftaràó  -contentes  todos,     ior  bença5,qiie  poder  mo- 


Conheça  o  Leão,  que  he 
Leaó:  conheça  o  Cervo, 
que  he  Cervo  :  conheça  a 
Serpente,  que  he  Serpen- 
te: conheça  o  Lobo,  que 
he  Lobo  :  conheça  o  Ju- 
mento, que  heJumento,&: 
logo    eftaràó    contentes. 


rar  nos  Palácios  dos  Reys? 
No  mar  contenteíe  a  Ré^ 
mora,  com  fer  Rémora;  & 
que  maior  fortuna  ,  que 
fendo  tamanina,  poder  ter 
mão  em  húa  nao  da  índia? 
Na  terra  contêtefea  For- 
miga, com  fer  Formiga:  & 


Mas  como  todos  fe  cegaó  que  maior  fehcidade ,  que 
no  juizo  de  fy  mefmos,  to-  ter  o  ceileiro  provido  para 
dos  querem  bençaó  fora     o  Veraó ,  &  para  o  Inver- 


Cenef 

X.22 


da  fua  efpecie. 

po  No  principio  do 
mundo  deitou  o  Creador 
a  fua  bençaó  aos  animais, 
&  às  plantas:  Benedixit  eis. 
'■^  Diífelhesatodos,  quecre- 
ceíTem :  Crefcite^  &  multi- 
pite amirâi  mis  ViQX.2.  a  Ef- 
critura,  que  tudo  iíto  foi 
Sectindumfpecies fuás :  ca- 
da creatura  conforme  a 
fua  efpecie.  Contentefe 
cada  hum  de  crecer  den- 
tro de  fua  efpecie ;  conten- 
tefe cada  hum  de  crecer 
dentro  da  esfera  do  talcn- 
to,que  Deos  lhe  deo;  &  lo- 
go conhecerão  todos ,  que 
tem  bençaó,  cada  hum  no 
feu  elemento.  No  ar  con- 
tentefe a  Andorinha,  com 
fer  Andorinha :  &;  que  ma- 


no ^.  Mas  por  todos  os  ele- 
mentos  fe  adoece  de  ma» 
lencolia  5  porque  nenhum 
fe  contenta  com  crecer 
dentro  da  fua  efpecie  :  a 
Andorinha  quer  fobir  a 
Águia  :  a  Rémora  quer 
crecer  a  Balea:  a  Formiga 
quer  inchar  a  Elefante. 
Porque  as  Formigas  fe  fa- 
zem Elefantes ,  naó  baila 
toda  a  terra  para  hum  for- 
migueiro. Nas  plantas  te- 
mos iguaes  exemplos  de- 
flre  engano,  &  deita  verda- 
de; A  arvore  mais  anãa  he 
maior  que  a  erva  gigante.- 
&  com  tudo  de  quantas 
coufasaquentao  Sol,  ne- 
nhiia  lhe  he  mais  agrade- 
cida, que  eíla  erva.  £it£àQ 
que  o  Sol  naíce,  atè  que  fe 
G  ij  põem. 


( 


"00  Sermão  dateneiraT>bminga 

põem,  vai  fempre  a  erva     em  tanta  aJcura  !Se  o  Ci- 

dlir/^'°'"Pr"'''"^°°  Preftelàdecima  olhara 
r^m  .  í"."'/eg"'"do-o  para  o  vulgo  das  plantas, 
com  tanta  inclinação  ,  &     &  ainda   p^ara  a  nobreza 


adorando-o  com  tanta  re- 
verencia ,  como  vemos. 
Poiservaílnhado  campo, 
4  agradecimentos  ao  Sol 
faó  eaes  ?  NaÓ  vedes  tan- 
tas  arvores,&  tantas  plan- 
tas, que  recebem  do  Sol 
tanto  mais,  quevòs  >  pois 


das  arvores,  que  lhe  íicaó 
abaixo  5  elle  vivera  naó  fó 
contente,  fenaó  ainda  fo- 
berbo.  Mas  o  Ciprefte  lá 
do  alto  deícobre  os  Ce- 
dros do  monte  Libano,  & 
comove,  que  a  natureza 
os  fez  torres,  vive  elle  def- 


-porque  lhe  haveis  vós  de  contente  de  fer  pyrami- 

ler  a- mais  agradecida  de  de.  Como  cada  hum  fenaó 

todas?  Forque  me  meço  mete,&  fenaó  mede  den- 

dentro  da  minha   esfera,  tro  da  fua  esfera,ainda  que 

Conheço,quefouerva,&  fejaCipreí^e,  que   tantas 

acho  que  ninguém  deve  vezes  vè  feus  troncos  fo- 

maisaoboi,  que  eu,  por-  bre  os  altares,  nam  pôde 

que  me  fez  gigante  das  er-  viver  contente.  Naó  digo, 

vas.  Se  cada  hum  fe  medi-  quenaó  trate  cada  hum  de 

racom   os   compaíTos  da  crecer,  mas  conheça  cada 

fua  esfera,  ô  quantos  fe  ha-  hum  o  que  he :  Tu  quis  es  > 

viaade    achar  gigantes!  &  depois  creça  conforme 

Porqtie  vos  haveis  de  d^Ç,  a  fua  efpecie   :  Secundum 

contentar   da  voíTa  ben-  fpeciem  fuam 
çaó, porque  haveis  de  fer         pi     Defenganemonos, 

ingrato  ao  Sol,  fe  vos  fez  que  o  crecer  fora  da  pro- 

gigante  das  ervas  >  Nam  pria efpecie,  naó  he  Íur- 

digo  bem :  fe  das  ervas  vos  mento,  he  monílruoílda- 

tez  gigante  .í>  Oh  quantos  dej  ao  menos  bença-Q  nam 

gigantes  ha  defagradeci-  he.  Húadascoufi"  áx^nrxs 

dos !  Muito  he  de  notar  a  de  reparo,  que  tiveram  as 

triíteza  de  hum  Ciprefte  bençocns  dejacob  a  feus 

filhos, 


iô  Advento'', 
filhos,  foi  a  bençaô  de  Ru-  podeis 
ben,&:  dejofeph.  A  Jofeph 
deoihe Jacob  por  bençaó, 
que  creceíTe :  mlhts  accref- 
cens  Jofeph  ^filhis  accref  cê s\ 
a  Ruben  deoihe  Jacob 
por  bençaó,  que  naó  cre- 
ceíTe ;  Ruben  primogenitus 
^^'^^'meusnoncrefcas.  He  poíli 


Gènef 


101 

crecer  por  creci- 
nlento,  crecei  cora  a  ben- 
ção de  Deos  :  Filius  accref* 
cens  :  mas  fenaó  podeis 
crecer,  fenaó  por  crecen^ 
ça,  tende  por  benção  o  naó 
crecer  :  Kon  crefcas.  Co- 
nheça cada  hum  a  fua  esfe- 
ra ;  Tu  quis  es  5    &  acharáé 


vel,  que  também  hum  non    todos,  ou  quafi  todos,  que 
crefcas^ç^ál  porbençaó!     ttmhç:viçpib:lnfeminetu0 


HepolIivel,que  também 
pòdefer  bençaó  o  naó  cre- 
cer !  Diga-o  a  Lua  j  ne- 
nhúa  bençaó  fe  podia  dar 
à  Lua  mais  vcnturofa,  que 
o  naó  crecer.  Porque  fe- 
naó crecéra,  naó  mingua- 
ra. A  quantos  tem  fervido 
o  demaíiado  crecer ,  nam 
de  bençaó,  fenaó  de  mal- 
dição !  Mas  porque  razaó 
em  Jofeph  he  bençaó  o 
crecer  ,  &  em  Ruben  hc 
bençaó  o  naó  crecer  ?  Os 
procedimentos,  &  as  ac* 
çoens  do  mefmo  Ruben  3 
&do  mefmo  Jofeph  o  di- 
gaó.  O  crecer  nos  que  o 
merecem,  he  crecimento  5 
o  crecer  nos  que  o  naó  me- 
Tecem,  he  crecença  :  6c  o 
crecimento  he  grandeza,  a 


benedicentur  omnes.  Com 
efte  conhecimento  acaba- 
rão de  entender ,  que  tem 
entre  fy  o  verdadeiro  Mef- 
íias ,  como  diíTe  o  Bautiíla: 
Medtusveftrumfietit  quem  ^^^^""'^ 
vos  nefcitis :  Sc  deixaráó  de 
o  ir  bufcar  aos  defertos, 
onde  o  não  ha :  Et  confef" 
fuseft^&non  íiegavit^  quiã 
nonfuntegoÇhriffus, 


'Pt 


"I  "\  Efejiganados 


os  Embaixa- 
dores ,  de  que  o  Bautifta 
naó  era  o  MeíHas  3  foram 
por  diante  com  a  queílaó 
do  Tu  quis  es :  Sc  pergunta-  íoannii 
raó  fe  era  ao  menos  í^lias ;  ^*' 
Elias  es  tu  ?  Sois  vós  por 


crecença  he  fealdade.  Se    ventura  Elias  íAíj  vezes  as 


i 


'  •■'■li II 

ti; 
•■f. 

II' 


tf 


J^: 


a>id.28 


^^2  Serma$daterceira^ominga 

menores  tentaçoens,prin-  ninguém  he  Elias  como 
cipalmentc  em  gente  ef-  cu.Ao  menos  na  prefump- 
crupulofa  ,  faó  maisdiífi-  çaõeu  volo  concedo  Sò 
cultofas  de  vencer,  que  as  iíTo  me  parece,  que  tendes 
maiores ;  mas  a  conftancia     de  Elias :  cuidar  que  nam 


do  Bautifta  de  todos  os 
modos  era  invencivel.  Af- 
íim  como  à  primeira  per- 
gunta refpondeo,  que  naó 
crsíMciTias:  Non/um  ego 


ha  outro  Elias,  fenaó  vos. 
Dizia  Elias  antigamente: 
Ze/o  zelatus  fum  pro  'Do- 
mino T>eo  exercituum  ,  é* 
reliõíusfum  egofolus.  Eu  fó 


'9  »4- 


Chnjius-,  alTim  refpondeo     fou  o  que  zelo  a  honra  de 


àfegunda,  que  naó  era  fi- 
lias :  Nonfum.  Que  tem 
iremfe  bufcar  as  coufas 
onde  as  naó  ha!  Diz  o  Tex- 
to que  :  Hac  faãa  funt 
trans  lor danem  :  que  iílo 
aconteceo  da  banda  da- 
lém do Jordaó.  Se  vieram 
os  Embaixadores  da  ban- 
da daquem  do  Tejo  ,  eu 
vos  prometo  ,  que  elles 
acháraó  a  Elias.  Tu  quis  es> 
Vòs  quem  fois  >  Elias  es 
tu:  Sois  por  ventura  Elias  ? 
Por  ventura?&  diíTo  íe  du- 
vida  ?  pois  quem  he  o  E- 
lias  fenaó  eu?  O  meu  zelo 
do  bem  comum;  o  meu  ze- 
lo da  Fé,&  da  Chriílanda- 
de ;  o  meu  zelo  do  ferviço 
do  Rey ;  o  meu  zelo  da  có- 
fervaçáo  ,&augmento  da 
pacria.  Se  fer  Elias  he  iílo. 


Deos,  todos  os  outros  faó 
idolatras,  &  naó  tem  Deos 
no  mundo  mais  q  a  mim. 
No  mefmo  dia,  em  que  fi- 
lias diíTc  ifto,  lhe  moílrou 
Deos,  que  tinha  na  mefma 
terra  fetemil,  que  nam 
dobravãoo  joelho  diante 
de  Baal:  Tierelmquam  mihi 
tnlfraelfeptemmillia  viro-  j^^^fg^ 
runty  quorum genuanonfunt  *'*  *  * 
tncurvataanteBaal.  Quã- 
do  Elias  cuida,  que  naó  ha 
outro  filias  no  mundo,  co- 
mo clle,  ha  quando  menos 
fetemil.  Cuidais  que  fois 
hum  homem  unico;  &na6 
lo  fois  homem  de  dúzias, 
fenaó  de  milhares,  ou  de 
milheiros :  ha  fete  mil  co- 
mo vòs,  &  pôde  fer  que 
melhores. 

í?3     Naó  fe  queixará 
Elias 


j 


do  Advento,  i«5 

E'íasdelhe  medifffios  o    ]^roho2im  ^,  Ecce  ega  fcin- 
feuefpiritopelafua  capa,     damRegnum  de  mcmu  Sa^^^^^^ 
poiselle  aíHm  o  fez.  Ora     lomoníSy&  dabo  tibi  decem 

Tribus,    Affim   ò  diíTc 


cotejemos  a  capa  de  Elias 
com  outra  doutro  Profe- 
ta, quaíi  do  mefmo  nome, 
CAhias}5c  verá  Elias,  o 
quefe  reputa  por  único, 
quanto  vai  de  capa  a  capa, 
dcefpirito  a  cfpirito  ,  & 
de  zelo  a  zelo.  Encontrou- 
fehúavez  Ahias  comje- 


o 

Profeta,  &:aílim  foi  \  por- 
que o  Reyno  áos  doze 
Tribus  fe  dividio  em  Rey- 
no de  Ifrael,  &  Reyno  de 
Judà.  Mas  vamos  àcapa. 
De  maneira  que  Ahias  an- 
tes da  divifaò  dos  Rey  nos 
tinha  a  fua  capa  muito  no- 


roboamCentaóera  criado  va,  &  muito  fáa  ,  depois 
de  Salamaô ,  &  não  Rey)  que  os  Reynos  fc  dividi' 
&  trazia  o  Profeta  naquel-     raó  anda  com  a  capa  feita 


lesdias  húa  capa  nova  ; 
Tallium  fuum  novum ,  diz 
o  Texto  Para  que  naõ  cui- 
deis, que  he  malicia  repa- 
rar íia  novidade  das  capas^ 
o  mefmo  Elpirito  Santo 
Author  das  Efcrituras, re- 
para nertas  novidades. 
Emíim  Ahias  tirou  a  fua 


cm  retalhos.  Oh  quantos 
vemos  veftidos  hoje  coin 
o  aveço  da  capa  de  Ahias  í 
antes  da  divifaô  dos  Rey- 
nos traziaó  a  capa  em  re- 
talhos, depois  que  os  Rey- 
nos fe  dividirão  ,  trazem 
húa  capa  muito  nova  ,  & 
muito  íaa.  Pois  por  certo 


capa  nova  dos  hombros ,  que  efta  era  a  occaíiaó,  em 

puxou  logo  de  hãas  tifou-  que  as  capas  fe  haviaó  de 

ras,  cortou  húa  vez  ,  cor-  fazerem  retalhos:  hum  rc- 

tou  outra,  atè  onze  vezes ,  talho  para  cobrir  o  folda- 

com  que  ficou  a  capa  divi-  do,  que  anda  defpido  5  ou- 

dida  cm  doze  partes  :  &  tro  retalho  para  veftir  o 


diíTe,  que  do  mefmo  modo 
fe  dividiria  o  Reyno  de 
Salamáoem  doze  7  ribus, 
dos  quaes  os  dez  feriaó  de 


orfaó,cu  jo  pay  morreo  pe- 
lejando na  campanha  j  ou- 
tro retalho  para  fazer  híía 
mantilha  à  viuva,  que  por 
G  iiij  zelo 


i 


lí 


1»fal.68 


^^4*  ^    Sermão  da  ter  cetra  dominga 

zelo  da  pátria  chegou  a  ti-  dtme !  Vos  cftareis  comi- 
raro  manto,  por  naó  faltar  dos  do  zelo  ,  ma»  eftais 
à  decima.  Que  diz  agora  muito  bem  comidos.  Ha 
^\i^s>  ^áddicis  deteipfo>  huns  a  quem  o  zelo  come, 
Cortaftes  algú  dia  algum     &:  ha  outros,  que   comem 


retalho  da  voíla  capa  .?  Ti- 
raftes  algum  fio  deIla?Cal- 
iar.  Eis  ahi  os  voíTos  zelos. 
Mas  vamos  aos  noílbs. 

5>4  Jà  eu  me  conten- 
tara com  que  os  noílbs  ze- 
lofos  5  ou  zeladores  foíTem 
como  Elias. Todos  dizem, 
ciaremos  as  capas,  mas  o 
menos  avarento  he  o  que 
guarda  fó  a  fua.  Quando 
Elias  fe  partio  para  o  ou- 
tro mundo,  naó  teve  de 
que  teílar  mais,  que  da  fua 


do  zelo.  E  por  onde  fe  hao 
de  conhecer  huns,  &  ou- 
tros ^  Tomandolhe  as  me- 
didas pela  cintura. Se  o  ze- 
lo vos  come  a  vòs,  a  voílà 
fuftancia  convertefe  era 
zelo  5  &  fe  vòs  comeis  do 
zelo,  o  voílb  zelo  conver* 
tefevos  em  fuftancia.  Oh 
quantos  zelofos  ha  ,  que 
todo  o  feu  zelo  fe  lhe  con- 
verte em  fuftancia  .'  To«» 
memfe  as  medidas,  como 
dizia  Roboamj  &  acharfc- 


capa,  que  deixou  a  Elifeo.  ha,  que  fois  mais  groíTo 

SeDeos  hoje  quizeííe  le-  hoje  pelo  dedo  meminho, 

varpara  o  Paraifo -terreal  do  que  éreis  antigamente 

alguns  dos  valentes  Elias  pela  cintura.  Bomí  provei- 

do  noíTo  Carmelo  ,  para  to  vos  faça  o  zelo ,  quetaó 

depois  pelejarem   com  o  bemfevoslof^ra  :  final  he 


Ante-Chrifto  >  eu  vos  pro- 
meto, que  fe  quizeíTem  fa- 
zer bem  ,  &  verdadeira- 
mente feu  teftameato,que 
haviaó  de  teftar  de  ameta- 
de  das  capas  do  lugar.  E 
entaó  muito  comidos  ,  & 
muito  carcomidos  do  ze- 
lo :  Z^his  domuj^  tm  come- 


que  o  comeis  vòs  a  elle,  6c 
náoelleavòs.  Mas,  ou  o 
voífo  zelo  coma  ,  oujejue 
(^  que  me  naó  quero  meter 
niílbj  3^o  menos  vcnha-»^ 
mos  a  hum  partido.  Se  o 
zelo  naó  ha  de  comer,  je- 
jue cm  todos,  U  fe  ha  de 
comer  ,  coma  de  todos : 
feia 


,.-^< 


porque 
Deos  lhe  entregara  na  mao 
as  chaves  das  nuvensj  mas 
hiaorigor  por  diante.Tu- 
doedavafeco,  mas  as  en- 
tranhas de  Elias  mais  que 


fejao  voíTo  zelo  com  vof-     diar  facilmente 
co,&  com  os  voíTos  ,  como 
com  os  demais,  &  naó  ha- 
verá quem  fe  queixe  del- 

le. 

Pf    Zelofo  Elias  con-  . 

tra  ospeccadosdo  povo,  tudo.  Que  fe  portaíTe  com 

chegou  a  tal  extremo,  que  efte  rigor  hum   Profeta^ 

dLÍTe  eftas  palavras :  Ftvit  naó  me  efpanto  5  que  a  que 

^omims,incujusconfpe5fu  conhece  bem    a  graveza 

3-^^§-   (loSieritTos  ,  aut  pluvia.  dospeccados,  todo  o  ca- 

-^•'"    Vive  Deos,  em  cuja    pre-  ftigo,  que  nao  he  o  eterno, 

fençaeílou  ,  que  nam  ha  lhe  parece  muito   pouco, 

de  chover  do  Ceo,  nem  Oqueme  efpanta  he>que 
cair  húa  ^ota  de  orvalho 


/ 


íbbreeftamà  terra.  Aííim 
o  jurou  Elias  ,  &:  aíTim  o 
Gomprio,  porque  tresan- 
jios  inteiros  eííiveram  os 
Ceos  como  Te  foíTcm  de 
bronze,  fem  os  abranda- 
rem, nem  os  clamores  dos 
homens,  nem  os  balidos , 
£c  mugidos  dos  animais  in- 
fiocentes,que  paftavaó  pe- 
los campos,  &  pereciaó  de 
íede.  Secáraofe  as  fontes , 
fecáraofe  os  rios ,  &  atè  as 
lagrimas  fe  fecáraò :  fendo 
circunftancia  cruel  de  ca- 
lamidade ,  naò  poderem 
chorar  o  mal  os  mefmos 


fofrefíemoshomens  a  E- 
lias.  He  pòíTivel,  que  fe  ha 
deeílarabrazando  o  mun- 
do,^:  que  tenha  Elias  em 
fuamaó  o  remédio,  &  que 
o  naó  queira  dar!  He  poíli-» 
veUquefe  eílejà  abrazan* 
doo  mundo,  &  que  naní 
querendo  Elias  dar  o  re- 
médio ,  que  tem  em  fua 
mao,  que  fofraó  os  homês 
a  Elias  .^  Sim  :  Sabeis  por- 
que o  fofriaò  ?  Porque  ain-'" 
daque  Elias  tinha  as  cha- 
ves, tanto  fechava  as  fon- 
tes para  íj  >  como  para  os 
demais.  Os  outros  eílavao' 
neceílItados,&:  Elias  anda- 


que  o  padeciaó.  Tudo  iílo     va  mendigando  j  os  outros 
ria EUaspodendo-o reme-    eílavaóa  pótodemorrer», 


9 


ioc>  ^'erma^  daterceiraT)õmingA 

&  Eliasvivía  de  milagre  j  decantodo  Ceo  ha  decó- 
os outros íccavaófeà fede,  pararfeao  Inferno?  Si m^ 
&  bhas  abrazavafc&mir-  náo  conheceis  as  virtudes 
rayafe.  Mo  fi in,que  hefer  do  Inferno.  Sabeis  porque 
zelofo.   Mas  que  na  voíTa     fe  compara  o  zeloao  In- 


cafa  corraó  as  fontes  ,  Sc 
qu e ,nas  ou  trás  fe  fequ em  í 
Que  fobre  as  voíTas  feáras 
chovão  as  nuvens  a  rios, 
&  que  fobre  as  outras  fira  o 
Solarayos  !   lílo  não  he 


ferno  >  Porque  o  Inferno 
he  hum  fogo,  que  a  nenhu 
bpmofFende,6ca  nenhum 
mio  perdoa  Mas  o  fogo 
do  voíTo  zelo  naó  he  a  íli  ni : 
entreosmáos  té  feus  pre- 


zelo.  Se  o  tempo  pede  que     dellinados,a  quem  nao  to 
haja  Sol,  fequ  em  fe  todos:     ça  ,  &  entre  os  bons  tem 


^ifolemfmim  oririfacit 
í^4j.^"  J^perbonos,&  maios.  E  fe 
herazaó  que  haja  chuva, 
moihemfe  todos:  Sluipluit 
fitp^rjuflosy  &  Jnjuflos.  E 
feo  mefmozelo  diclar  ,  q 
entre  os  máos,&  bons ,  en- 
tre os  juílos,  &osinjufl-os 
haja  differença  i  haja  diífe- 
rença,masfeja  qual  con- 
vém :  o  mal  carregue  para 
osmáos,  masfeja  p;>.ra  to- 
dos os  máos:  &  o  bem  in- 
cline para  os  bonsjmas  feja 
para  todos  os  bons.  Eíía 
he  a  cudiçaó  do  verdadei- 

Cant  8.  ^^  ^^'í^-    '■^^''rf  jlCUl  infcT- 

6.  VMS  £mul(itio :  d i z  b  E  fpiri- 
to  Santo  :  que  o  zelo  he  co- 
mo o  Inferno.  Notável  có- 


feus  precitos,a  quem  abra- 
za.  Ohri^ormais  que  in- 
fernai !  Não  vos  digojà  , 
que fejais como  os  Santos 
doParaifo:  ao  menos  nim 
íerciscomoofogo  áo  \n- 
ferno.^Eenrao  muito pre- 
fados  de  Elias  \  quando 
muito tereisafua  capa.  fi- 
lias foyfe  para  o  Ceo  ,  5c 
deixou  a  Elifco  a  fua  capa. 

0  zelo  foyfe,  5c  ficou  a  ca- 
pa do  zelo.  E  quantas  mal- 
dades fe  cometem  debai- 
xo deita  honrada  capai 

9í>     Levou  Dco.s  huoi 
diaemeípiritoao  Profeta 

1  zechiela  Hicrufa.em  ;  5c 
o  que  vio  o  Profeta  foi  húa 
parede,  ou  fach:ida,  em 


|>ara<jao!  O  zeio  hua  virtu-     que  cílaya  hum  ídolo  do 

zelo;^ 


^Pi^ 


2clo: Eteeceiâolum  zeliin    fa Ezcchiel  a  terceira  pa 


Ezeck  ipfo  tntroitu.  Cuidas  tu  E- 
'  ^"      zcchiel,  diz  Deos,  que  naó 
ha  aqui  mais,que  o  q  appa- 
rcce  j  ora  rompe  eíTa  pare- 
de ,  &  verás.   Rompeo  a 


rede :  Et  ecce  quafi  viginti  ibid>t# 
quinqueviri  dorfa  habentes 
contra  templum  'Domirú :  & 
vio  vinte  &  cinco  hom ens» 
que  eftavaó  com  as  coftas 


parede  Ezechiel,  entrou ,     viradas  para  o  Templo  do 
6c  vio  háa  cafa,  em  que  ef-     Senhor  :  Et  fácies  ad  Ori 


ta vaó  pintadas  pelas  pare- 
des cobrasj  lagartos ,  baíi- 
lilcos,  lerpentes,  &  outros 
monilroshorriveis,  &  no 
nieyo  fetenta  homens  de 
omturibulosna 


entem ,  &  adorabant  ad  or^ 
tumfolis :  E  todos  eftavam 
com  os  olhos  poftos  no  O- 
riente,  &  com  os  joelhos 
em  terra  adorando  ao  Sol, 
quenafcia.  Eis  aqui  o  que 
Deos  moílrou  a  Ezechiel , 


cans,  que 

maó  os  incenfavaó   :   Et 
feptuaginta  viri  defeniori-     &oque  paíTa  no  mundo, 
^^it.\.  bus domns  Ifrael ,  ftantmm     ainda  que fe  naó  veja.  Se 

antepiãarns^  Ò*  unufmif- 


te  habebati  thurthuívím  tn 
mariufim.  ,idiáre,diz  Deos 
a  Rzechiel.  PaíTa  Ezechiel 
outra  parede :  Et  ecce  fede- 
bant  rttidier^s  plangentes 
Adonidem  &  vio  muitas 
mui  heres  aílentadas ,  que 
cílavaó  chorado  por  Adó- 
nis. Sabida  he  a  fabula,  ou 
ahiíloriade  Adónis^  &  as 
gentilidades,que  nafcéraó 
de  Aia  gentileza :  &  por  ef- 
teefta vão  chorando  verti- 
das de  luto ,  &  defgrenha- 
das.  Por  diante,  Ezechiel, 
diz  Deos  terceira  vez.Paf- 


olhares  aos  homens  para 
as  primeiras  paredes,  nam 
vereis  mais,  que  hum  Ído- 
lo do  zelo :  taô  zelofos,  & 
taó  zeladores  ,  que  pare- 
cem huns  idolatras  do  ze- 
lo :  mas  detrás  deíla  pare- 
de do  zelo,  que  he  o  que  fe 
faz. ^ Huns  eílaó  chorando 
por  Adónis  :  outros  eftao 
adorando  o  Soi,que  nafce : 
outros  eílaó  incenfando 
Altares  prohibidos  5  êc 
muitos  ainda  mal  com  as 
coftas  viradas  para  o  Tem- 
plo de  Deos.  Por  fora  nam 
ha  mais  que  zelo;  mas  àtw-' 

tXQ 


i 


tro  ha  cobras ,  &  lagartos ;     voífos  diícurfos  fao  vatí- 


W^ 


loànn. 

I.2I. 


ha  baíiliícos,  &  ferpentes ; 
ha  monftros,  &  monftruo- 
Hdades ;  ha  coufas ,  que  cf 
taó  fechadas  a  três  pare- 
des. Elias  por  fora,  idola- 
trias por  dentro.  Se  ouvef- 
íe  quem  rompcíTe  pare- 
des,© quantas  coufas  havia 
de  ver  o  mundo  í  Efte  hc  o 
zelo,  eíles  fao  os  zelofos , 
eílesfaó  os  Elias  :  Elias  es 
tu. 

§•  VI. 

f  P7  /"^U  vida  a  repo- 
V-Zíla  do  Bauti- 
íla,quenaó  era  Elias,  in- 
flarão terceira  vez  os  Em- 
baixadores ,  6c  pergunta- 
rão :  Tropheta  es  tu  .^  Jà  que 
náo  fois  Elias,  ao  menos 
fois  Profeta  >  A  efta  per- 
gunta refpondeo  o  Bauti- 
lla  ainda  mais  feca,&  mais 
abreviadamente  :  Kon  : 
Naó.  Jàfabeis,  que  have- 
mos de  fazer  a  mcfma  per- 
gunta nano  íla  terra,  ^tro^ 
pheta  es  tu  ?  quiddicis  de  te 
ipfo  ?  Vos,  que  tantas  cou- 
fas dizeis  de  nòs^  fois  tam- 
bém Profeta  ?  -Frophetajé* 
flusquam    '^ropheta.    0$ 


cimos:  as  voíTaspropoíI- 
çoens  faó  revelaçoens  :  os 
voíTosdiííramesjfaó  profe- 
cias :  os  voflbs  futuros  na6 
tem  contingência  :  o  que 
fucede  depois  he  tudo  o 
que  diíTeftes  antes :  tendes 
intelligencias  na  fecreta- 
ria  do  Efpirito  Santo :  naò 
fe  decreta  la  coufa  jque  fe 
naó  regifte  primeiro  com 
vofco.  Baila  iílo  ?  Ainda 
tendes  mais.  Se  fe  tratam 
matérias  de  efl-ado,  fois  hú 
Profeta  Daniel :  fe  fe  tra- 
ta5  matérias  de  guerra, 
fois  hum  Profeta  líaias :  fe 
fe  tratáo  matérias  dé  mar  , 
fois  hum  Profeta  Jonas :  íe 
fetrataó  matérias  Eccle-^ 
fiaílicas,  fois  hum  Profeta 
Ezechiel:  fe  fazeis  adver- 
tências aos  Reysjfois  hum 
Profeta  Nathan  :  fc  cho-» 
rais  as  calamidades  do  po< 
vo,  fois  hum  Profeta  Jere-» 
mias :  fe  pedis  focorros  ap 
Cco,  fois  hum  Profeta  Ba- 
ruc :  &-fe  tendes  algum  ia* 
tereíIe,como  tendes  mui- 
tos ,  fois  hum  Profeta  Ba-» 
Iam.  Muitas  graças  fcjam 
dadas  a  Dcos;  que  nos  dea 


táiitos  Profetas 
idade.  Nao  debalde  efbão 
pronofticadas  tantas  feli- 
cidades ao  noílo  Reyno. 
Não  poderá  elle  deixar  de 
fer  muito  gloriofo  ,  tendo 
dentro  em  fy  tantos  ,  & 
taes  Profetas.  Chriílo  Se- 
nhor noíTo  nafceo  entre 
dous  animais,  morreo  en- 
tre dous  ladroens5&:  trans- 
figuroufe  entre  dous  Pro- 
fetas :  entre  dous  animais 
efteve  pobre  ;  entre  dous 
ladroens  efteve  cruciíica- 
do  }  entre  dous  Profetas 
efteve  gloriofo.Tenhaó  os 
Rey s,  Profetas  ao  lado ,  & 
elles  teráó  feguras  as  fuás 
glorias.  Mas  que  Profetas? 
Moyfes5&  Elias :  hu  mor- 
to, outro  vivo,  mas  ambos 
do  outro  mundo.  Ora  jà 
que  importa  tá  to  ao  Rey- 
no o  ter  Profetas  ;  exami- 
nemos o  TrophetaestUy  & 
vejamos  por  onde  fe  haó 
de  conhecer  os  veriáadei- 
ros  Profetas. 

p8  Primeiramente  ad- 
virto, quje  os  Profetas  naó 
fe  haó  de  conhecer  ,  nem 
avaliar  pelo  numero.  Ain- 
da que  íejão   mais  os  que 


ão  Advento]  lop 

na  noíTa  dizernhúacoufa,  nempor 
iíTo  fe  haó  de  ter  por  Pro- 
fetas. Ouvi  húa  grande  hi- 
ftoria  do  terceiro  livro  dos 
Reys.  Havêdo  três  annosj 
que  ElRey  Acab  eftava 
em  paz  com  todas  as  na- 
çoens  viíinhas ,  entrou  em 
penfamento  fe  iria  fazer 
guerra  a  ElRey  de  Siria,o 
qual  lhe  tinha  tomado  a 
Gidade,  &  terras  de  Ra- 
moth  Galaad.  Para  ifto 
chamou  Confelho  dePro- 
fetas,&:  diz  o  Texto  fagra- 
do,que  fe  ajuntarão  qua» 
trocentos  Profetas  :  Con- 
gregavit  Rex  IfraelTro-  ?•  Re^ 
pbetas ^quãdrmgêtos  circi-^^  ' 
ter  vir  os.  A  propoftafoi  ef- 
ta:  Ire  debeo  in  Ramoth  Ga- 
laadadbellandum ,  an  qui^ 
efeere  ?  Devo  ir  fazer  guer- 
ra a  Ramoth  Galaad  ,  ou 
aquietarme.^  E  a  razão  da 
propofta  era  .*  ^n  ignora-  ^^^  ^ 
tisquòdnojira  fit  Ramoth 
Galaad:,^  negligimus  tolle^ 
reeam  de  manu  Regis  Sy-* 
r/>.?Queas  terras  de  Ra- 
moth erão  daquella  Co- 
roa,&que  parecia  negli- 
gencia naó  as  recuperaré 
da  mão  dos  Sírios.  Ouvi- 
da 


Mi 


TIO  Sermão  Ja  terceira  dominga 

da^propofta,   &   a  razão     Ihcaconfelhavaõaguerrat 


d^lía ,  refpondéráo  todos 
os  Profetas  a  hCia  yqz^  que 
fe  fizeíTe  :i  guerra ,  q  Deos 
daria  a  Sua  Mageftade  vi- 
toria :  Afceme  ,  &:  dahit 
ibid.ó.  eam^ominusin  mamitua. 
Com  eíle  boai  anuncio 
dos  Profetas  refolveo  A- 
cab  de  fazer  a  guerra  j.mas 
para  entrar  neila  com  ven 


quefoíTe  eile  também  cia 
mefma  opinião,  &:  que  fal 
laífe  ao  goílo  :  Sn  f ermo-  'bid.i^; 
tuusflmUís  eorum-i  ò*  loque-  ''^* 
rebona.  Que  refponderia 
Micheas  ?  (.)  que  deve  fa- 
zer em  femelhantes  cafos 
todo  homem  de  bem  :  A^/- 
iJit T>om'muSy qum  quodcu^ 
que  mtht  dlxerit  T>ominus , 


Ibid.  8. 


tagem,  pedioa  KlReyJo-     h^cloquar.  Vive  DeoSjque 
faphat  leu   confederado,     não  hey  de  dizer  outra 


que  o  quizeíTe  ajudar  na 
emprefa.  DiíTeJ  o  faphat, 
queíim:  mas  que  fe  ou- 
veíTe  algum  Profeta  do  Se- 
nhor, folgaria  queocon- 
fultaíTem  também.  Ref- 
pondeo  Acab,  que  alli  ha- 
via hum  Micheasjhomem, 
a  quê  elle  aborrecia  mui- 
to, porque  fempre  lhe  fah 
lava  contra  o  gofto,  6c  nu- 
ca lhe  profetizara  bem : 
Remanjit  vir  uniis  ^fed  ego 
adi  eum-,  qtiia  nonprophetat 
mihi  bonum  ,  fed  maltim. 
Levoufe  logo  recado  aMi- 
cheas,  qucvieííe,  &:diz  o 
Texto, que  oqncdeoo  re- 
cado didca  Micheas,  que 


coufa,  fenamoque  omef- 
mo  Deos  me  inlpirar,  &  o 
que  entender  em  minha 
confciencia. 

^9  Finalmente  che- 
gou Micheas  à  prefença 
dos  Reys  :  propozfelhe  o 
cafo :  relpondco,  q  fe  nam 
fizeíFe  a  guerra,  porque  fe 
havia  de  perder  o  Rey,  & 
o  exercito.  Notável  eiicó- 
tro  de  Profetas  !  Qiie  \os 
parece ,  que  devia  fizer 
Acabnefle  cafo,  por  húa 
parte  qiiatrocentos  Profe- 
tas,qae  aconfeJiavaó,  que 
íizeífe  a  guerra,  &:  por  ou- 
tra hum  Profeta,  dizcnda 
queanaóíizeíre  ?   Keíbi- 


fuppolto  que  ElRey  tinha     vco  ElRey  Acabo  que  cu 

q^u a trocécoi)  Profetas,  que     Ihcaconfclhára  nas  circu- 

^  ,  Ihincias 


do  Advento]  iii 

ftancias  prefentes,  ainda     formem  os  Reys,  quanta 


que  fora  da  opinião  de  Mi 
cheas.  Mandou,  que  fe  ii- 
zeíTe  a  guerra  j  &:  iílo  por 
três  razoens.  Primeira, 
porque  havia  muitos  an- 
nos,  que  eílava  em  paz 
com  todos  os  Principes 
viíinhos:  &:  quando  as  ar- 
mas eftaó  defembaraça- 
das,  Sc  ociofasjhe  bem  que 
íè  empreguem  nas  glorio- 
fàs  emprefas.  Segunda, 
porque  as  terras  de  Ra- 
moth  Galaadpertenciaóà 
fua  Coroa :  &  as  terras  da 
Coroa   haõ   de  fazer   os 


puder  fer,  com  o  fcncimê- 
to  comum.  Sòpor  eíla  ul- 
tima razáo  (^  quando  nafn 
ou  vera  outras  3  aconfelhâ- 
ra  eu  a  Acab ,  que  nas  cir- 
cunítancias  prefentes  fí- 
zeíTe  a  guerra:  &  iftoain^ 
da  depois  de  ouvir  a  Mi- 
cheasjem  cujo  parecer  nao 
aviarifcoj  porque  os  di- 
dames  práticos  devemfé 
mudar  todas  as  yQztS:>  que 
fe  miidaó  as  circunftan- 
cias.  O  Medico,  conforme 
ôs  preceitos  da  arte ,  man- 
da que  íe  corte  o  braço  en:^l 
Reys  o  poíílvei^&o  impoP  cànceràdo ,  porque  fe  fál^^ 
fivel,  porque  naó  eftejaó     veocorpo  j  mas  fe  o  en- 


em  mãos  de  inimigos.  Ca- 
da torraó  das  terras  con- 
quiftadas,  ÇqÇ^  eípremer, 
ha  de  deitar  muito  fangue 
de  vaíTallos,  ôco  que  cu- 
ítou  eíle  preço  ,  naôfeha 
de  dar  por  nenhum  preço 


fermo  repugna,  &  nam  fe 
acomoda,  tem  a  medicina 
outro  didtainé  pratico,,  eo 
que  manda  aplicar  remé- 
dios menos  violentos,  ain- 
da que  fejaó  menos  íegu- 
ros .  Conforme  a  eííe  ái^ 


Terceira,  &  principal  ra-     <^arriefcguioElRey  Acâb 
zaó,  porque  ainda  que  as     o  parecer  dos  quatrocen- 


razoens  de  Micheas  fof- 
íem  boas,  eílavaó  pela  ou- 
tra parte  quatrocétos  Pro- 
fetas, a  quem  parecia  o  có- 
trario :  &  nas  matérias  pu- 


tos Profetas,  refolveo  que 
fe  fizeífe  a  guerra ;  tocaoíc' 
as  trombetas  ,  marcha  o 
exercito  ,  dáfe  a  batalha 
fobre  Ramoth :  mas  a  pou- 


blieas  he  bem, que  fe  eon-    cas  horas  de  peleja  ficou  o 

exer 


ml 


Sermão  da  terceira  l^omlngà 
desbaratado  ,  & 


V  li 

t 


1,1 


í.  VIL 

100  ÇUppoftopois  q 

^os    Profetas  fe 

naóhaóde  conhecer  pelo 

numero,  por  ondefehao 

de  conhecer?  Por  três  cou- 


112 

exercito 

Acab  perdido.  Notável 
cafo!  Vede  como  faó  áx- 
verfos  os  fuceíTos  ,  &  os 
juizos  humanos  j  Ôc  adif- 
ferença  que  vai  de  Profe- 
tas a  Profetas.  De  húa  par- 
te eílavao  quatrocentos 
Profetasjda  outra  parte  ef-  fas  :  pelos  olhos  -,  pelo  co- 
tava hum  fó  Profeta:  o 
Rey  inclinou  para  a  parte, 
onde  eftavão  quatrocen- 
tos, &  o  fuceíTo  cahio  pa- 
ra a  parte,  onde  eftava  hú. 
Por  iíTo  digo ,  que  as  pro- 
fecias não  fe  haó  de  julgar 
pelo  numero.  As  profecias 
chamãofe  na  Efcritura  pe- 
fo :  Ónus  Ninive^  Ónus  Af- 
lyrtte^Onus  <iyEgyptL  Pefo 
de  Ninive,quer  dizer,pro- 
fecia  de  Ninivc  j  pefo  de 
Aíliria,quer  dizer,  profe- 
cia de  A  íllria -,  pefo  deE- 
gypto,  quer  dizer,  profe- 
cia de  Egypto.  Os  Profe- 
tas haofe  de  pefar ,  náo  fc 
hão  de  contar.  Os  quatro- 
centos Profetas  contados 
eraó  mais  que  Micheas  , 
Micheas  pefado  era  mais 
que  os  quatrocentos. 


ração  i  &  pelos  fuceíTos. 
Conhecemfeos  verdadei- 
ros Profetas  pelos  olhos  > 
porque  o  ver  heo  funda- 
mento do  profetizar.  Os 
Profetas  na  Efcritura  cha- 
mãofe Videntes  :  os  que 
vem.  Sò  os  que  vem  faó 
Profetas.  Aílim  como  a 
mais  nobre  profecia  fo- 
brenatural  coníiíle  na  vi- 
íaó:  aílim  a  mais  certa  pro- 
fecia natural  confifte  na 
vifta.  Sò  quem  vio  pôde 
profetizar  naturalmente, 
com  certeza.  E  a  razaó  he 
muito  clara.  A  profecia 
humana  conliíte  no  verda- 
deiro difcurfo  5  o  difcuríb 
verdadeiro  naó  fe  pôde  fa- 
zer fem  todas  as  noticias  j 
&  todas  as  noticias  fó  as 
pôde  ter  quem  vio  comos 
olhos.  Nenhfia  coufa  ouve 
mais  aílcntada  na  antigui- 
dade. 


T  •  ão  Advento^. 

dade,que  fer  inhabitavel  a 
Zona  corrida :  ficas razoêS) 
com  que  os  Filofofos  o 
provavaó,  erão  ao  parecer 
tão  evidentes,  que  ninguê 
havia,  qiiôo  negaííè.  Def- 
cobriraó  finalmente  os  Pi- 
lotos, &  marinheiros  Por- 
tuguezes  as  coftas  da  Afri- 
cajSc  da  America,  &  fou- 
bérão  mais  ,  &  fílofofáraó 
melhor  fobre  hum  fó  dia 
dê  viíla,  que  todos  os  Sa- 
biossôc  Filofofos  do  mun- 
do em  cinco  mil  annos  de 
efpeculação.  Os  difcurfos 
de  quem  não  vio,  faõ  dif- 
çuríbs :  os  di^bames  de  que 
TÍo,faó  profecias, 

loi  O  outro  final  da 
profecia  he  o  coração  5 
porque  conforme  cada 
hum  tem  o  coração,  aífim 
profetiza.  Os  antigos  quã- 


naó  pronoftica  melhor 
quemmelhor  entende,  fe- 
não  quem  mais  ama. E  eftc 
coftume  era  geral  em  toda 
Europa  antes  da  vinda  ds 
Chrifto  ,  &  os  Portugue- 
zestinhãohíia  grande  fin-? 
gul aridade  nelle  entre  os 
outros  gentios.  Os  outros 
confultaváo  as  entranhas 
do  s  animais,  os  Fortugue- 
zes  confultavão  as  entra- 
nhas dos  homens.  Afiim  o 
diz  S  tra  b  o  no  livro  tercei- 
ro: Lufit  anis 'vetus  mos  erat 
exintejiinis  hominum  ^^^^iib.y 
f  rofpicerey  atque  inde  omu 
na^iirdivinationes  captare. 
Era  coílume  dos  antigos 
Portuguezes  (diz  Strabo  } 
confultar  as  entranhas  dos 
homens,  quefacrificavãoi 
&■  delias  conjeiturar  ,  & 
adevinhar  os  futuros.  A 


do  querião  pronofticar  o  fuperfliçaó  era  falfa ,  mas 

futuro,  facri  fica  vão  os  ani-  aallegoría  era  muito  ver- 

mais  ,   confultavãolhe  as  dadeira.  Não  ha  lume  de 

entranhas,  &  conforme  o  profecia  mais    certo  no 

que  viáo  nellas ,  allim  pro-  mundo ,  que  confultar  as 

npfticavaó.Nãoconfulta-  entranhas  dos  homens.  E 

vão  a  cabeça,  que  he  o  af-  de  quehomens  .^  De  todos? 


fento  do   entendimento, 
íenão  as  entranhas,  que  he 
o  lugar  do  amor  ;  porque 
Tom./. 


Não :  Dos  facrificados.  As 

entranhas  dos  facrificados 

eraó  as  que  coníiiltavaó  os 

H  aa^ 


i;;>?íi 


Dear; 

lb.2I. 


I  í  4  Sermão  da  t  efe  eira  T>omtnga 

nnn>o5f  •  primeiro  faziam     deiro  Profeta  •  mas  fe  ò 

quçelle  di j3er 


ofacriíicio,  então  conful- 
tavaó  as  entranhas. Se  queb- 
reis profetizar  os  futuros, 
confultai  as  entranhas  dos 
homens  facriíicados:  con* 
fultemfe  as  entranhas  dos 
que  fefacrificárão ,  6c  dos 
que  fe  facriíicáo  •,  &  o  que 
ellas  diíTerem,  iíTo  fe  tenha 
por  profecia.  Porem  con- 


nao  fuce-f 
der,  tende-o  por  Profeta 
falfo.  Náopóde  haver  íi- 
nal,  nem  mais  fácil ,  nem 
mais  certo.  Sabeis  a  quaes 
haveis  de  ter  por  Profetas? 
Sabeis  de  quaes  haveis  de 
cuidar,  que  acertarão  com 
os  futuros  ?  aquelles  de 
quem  tiveres  experiência. 


fultar  entranhas  de  quem     quetudo,ouquafi  tudo,  o 

que  diíTeraó  antes  5  veyo  a 
íucceder  depois.  Eíle  di- 
dtame  feguio  Faraó  com 
Jofeph  j  Nabucodonofor 
com  Daniel  ,  &  todos  os 
Principes  prudentes  com 
feusconfelheiros.  Mas  af- 
íim  como  ha  Profetas  de 
antes ,  aíTim  ha  Profetas  de 
depois.  Ha  muitos  mui 
prezados  de  Profet.Jí-^,  que 
depois  de  acontecerem  os 
máosfuceílbs,  então  pro- 
fetiza© pelo  arrependi- 
mento, o  que  fora  melhor 
ter  profetizado  antes  pelo 
difcurfo.  Efte  foi  hum  dos 
tormentos  da  Payxão  de 
Chriílo.  i\tãraóaChriílo 
hum  pano  pelos  olhos, da- 
vaólhe,comas  mãosfi- 
crílcgas  na  lagrada  cabc- 


iiaó  fe  facriíicou,nem  fe  fa 
criíica,  nem  fe  ha  de  facri- 
ficar  i  he  naó  querer  profe- 
:  cias  verdadeiras  :  he  que- 
rer cegar  o  prefenre,  <Sc  não 
acertar  o  futuro. 
;  102  Oultimo-fmalde 
conhecer  os  Profetas,  faó 
osfuceíTos.  No  Deutero- 
nomio  prometeo  Deos  a 
feu  Povo  ,  que  lhe  daria 
Profetas  >  &:  o  final  que  lhe 
dcopara  os  conhecer,  foi 
fó  cíle :  Hoc  vobisjignum : 
quodTrv-pheta  pradixerit , 
Ò  non  evenerit^  hoc  Dorní- 
nusnoneftlocutus'.  Quando 
duvidares  de  algum  fe  he 
Profeta,  ou  não  ,  obferva- 
reisefta  regra  :  Se  o  que 
cUediíTcr  antes,  fuccdcr 
depois,tcnde-o  por  vcrda- 


ca 


ss f)H^ !ííVí.í  ^do  Advento ..  iSiWTiêi  i  r  f 

çaj&diziaôpor  efcarneo,     cUmmtis  In  deferto  \  Eu 

que  profetizaíTe  quem  lhe     íbu  liúa  voz,  que  cia  ma  no 

dera   :  Trophetiza  ^  nobis     deferto.  Verdadeiramen- 

Matth.  Çhrift esquis  eft  qiã  te  per-    tenaó  entendo  eíla  repo- 

*'^*^^'  cuffit.  Profetizar  depois  de    fta.    Se  os  Embaixadores 


levar  na  cabeça  ^he  profe- 
cia de  quem  tem  os  olhos 
tapados  :  heefcarneo  da 
Payxáo  de  Chriílo.  Naõ 
haveis  de  profetizar  quem 
vosdco,  fenaó  quem  vos 
pode  dar  j  porque  he  me- 
lhor reparar  os  golpes, 
que  curalos :  &  fe  o  fuceílb 
nioftrarjquea  profecia  foi 
certa,  a  quem  a  diíTer  ten- 
de-o  por  Vto^ztx.Tropheta 
es  tu, 

'a®3   /^Ançados  íínaíi 


perguntarão ,  ao  Bau tiíta 
o  que  fazia,  entaó  eílava 
bem  refpondido  ,  com  a 
voz  ,  que  clamava  no  de-» 
fertoiporque  o  que  o  Bau* 
ti  fta  fazia  no  deíèrto,  era 
dar  vozes ,  Sc  clamar ;  mas 
íe  os  Embaixadores  perr 
guntavãoao  Bautiila  quê 
era,,como  ihe  refponde  el- 
le  o  que  fazia  ?R.efpondeo 
difcretiílimamente.Quan- 
do  lhe  pergunta vaó  quem 
era,  refpondeQ  o  que  fa^» 
zia  j  porque  cada  hum  he 
o  que  faz ,  &  não  he  outra 
,  ^  -  ^  coufa.  Ascoufasdeíinemf 
V«>  mente  os  Em-  fe  pela  eíTencia :  o  Bauti- 
baixadores  de  lhes  refpó-  íta  definiofe  pelas  acções : 
der  o  Bautifl:a,que  naó  era     porque  as  acçoens  de  cada 


Meílias,nem  Elias,  nem 
Profeta  >  pediraólhe  final- 
mente, que  pois  elíes  nam 
acerta  vaó  a  perguntar, 
lhes  diífeííc  cUg  quem  çíra. 
A  eíla  inftancia  naó  pode 
xieixarde  deferir  o  Bau* 


hum  faó  a  ília  eíTencia.  De- 
finiofe pelo  que  fazia ,  pa- 
ra declarar  o  que  era. 

104,  Daqui  fe  enten- 
dera hu  a  grande  duvida., 
que  deixámos  atras  de  pó^ 
derar.  O  Bautiíla pergun- 
tado fe  era  Elias  ,  refpon- 


tiíla.E  que  vos  parecejque 
joan.  i.  refponderia  ^  B^ojum  vox     deo,que  não  era  Elias: AV» 
''^  H  ij         ftm 


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•7 


Matt'-i. 
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íi^  ^       Sermão  da  ter  ceiraT^ominga 

y//^.  EChriftonoCapitu-  outracouíli.  Ohquegrari- 

loonzede  S.  Marheos  dif-  de  doutrina  cflra  para  olu- 

íè^queoBautiftaeraElias:  garemqueeflranios  í  Qiiá- 

Joannes  Baptifta  ipfe  eft  do  vos  perguntarem  quem 

Elias.  Pois  fe  Chrifto  diz ,  fois ,  náo  vades  revolver  o 

que  o  Bautiíla  era  Elias,  nobiliário  de  voíTos  avôs» 

como  diz  o  mefmo  Bauti-  ide  ver  a  matricola  de  vof- 

fta,  que  Hão  era  Elias  ?Né  fasacçoens.  O  que  fazeis, 

o  Bautiíla  podia  enganar,  iíTofolsj&nada  mais.Quã- 

nem^  Chníio  podia  enga-  do  ao  Bautiíla  lhe  pergun- 

naríe :  como  fe  hão  de  có-  táraó  quem  era ,  náo  ái^^z 


cordarlogoeftes  Textos? 
Muito  facilmente.  O  Bau- 
tiíla era  Elias  5  &  não  era 
Elias  .'náo era  Elias,  por- 
que as  peíibasdeEiias,6c 
do  Bautiíla  erão  diverfas : 
era  Elias  ,  porque  as  ac- 
^oens  de  Elias ,  &  do  Bau- 
ti  fia  erão  as  mefmas.  A 
modeília  do  Bautiíla  dif- 
fe,  que  não  era  Elias,  pela 
divcrfidade  das  peílbas  :  a 
verdade  de  Chrifto  aíHr- 
inou,que  era  Elias  ,  pela 
-uniformidade  das  acções^ 
•Era  Eiias  ,  porque  fazia 
acçoens  de  Elias.  Quem 
faz  acçocns  de  Elias  ,  he 
Elias: quem  íizer  acçoens 
de  Bautifta,  fera  Bautifta; 
&  quem  as  fizer  dejudas, 
fcràjudas.  Cada  hum  he 


que  fe  chamava  João,  nem 
que  era  filho  de  Zacharias: 
nãofe  definio  pelos  pays, 
nem  pelo  apelido.  Só  de 
fuás  acçoens  formou  a  fua 
definição  :  Ego  vox  cia- 
mantts, 

I  o  f  Muito  tempo  ha, 
que  tenho  dous  efcandalos 
contra  a  noíla  Gramática 
Portugueza  nos  vocábu- 
los do  nobiliário.  A  Fidal- 
guia chamãolhe  caíidade, 
&  chamãolhe  fangue.  A 
caíidade  he  hum  dos  dez 
predicamentos,  a  que  re- 
duzirão todtis  as  coufas  os 
Filofofos.  O  fangue  he  hú 
dos  quatro  humores  ,  de 
quefccompoem  o  tempe- 
ramento áo  corpo  huma- 
no. Digo  pois,  quca  cha- 


as  íuas acçoens,  ôc.nam.  he     mada  fidalguia  aam  he  fó- 

nien- 


ãoAd'vento.  iiy 

mente  calldade,  nem  fó-  certos  refpeitos:  ha  fidal- 
menteíanguej  mas  he  de  guia,  que  he  paixão  5  faó 
todos  os  dez  predicamen-  apaixonados  de  fidalguia: 
tos,  &  de  todos  os  quatro     ha  fidalguia  ,  que  he  ubí.^ 


humores.  Ha  fidalguia, 
qucheíangue,  &  por  iíTo 
ha  tantos  fanguinolentos : 
ha  fidalguia  ,  que  he  ma- 
lencolia ,  &  por  iílb  ha  tá- 
tos  deÍGontentes  :  ha  fi- 
dalguia, que  he  cólera ,  & 
poriíTo  ha  tantos  mal  fo* 
fridos,  &  infofriveis :  &  ha 


faó  fidalgos,  porque  occu* 
paó  grandes  lugares :  ha  fi- 
dalguia, que  he  íitio5&  de- 
ílacaílahea  dosTituIos, 
queeílão  aílentadossòcos 
outros  em  pè:  ha  fidalguia, 
que  he  habito  5  faó  fidal- 
gos ,  porque  andaó  mai^ 
bem  vertidos:  ha  íidalguiâj 


•fidalguia,  que  he  fleima,&     que  he  duração  >  fidalgos 


por  iífo  ha  tantos  que  pre- 
ílaòpara  taó  pouco.  De 
maneira,  que  os  que  adoe- 
cem de  fidalguia,  naó  fó 
•lhe  pecca  a  enfermidade 
no  fangue,  fenáó  em  todos 
GS  quatro  humores. O  mef- 


por  antiguidade.  E  qual 
deitas  he  a  verdadeira  fi- 
dalguia ?Nenhúa.  A  ver- 
dadeira fidalguia  he  Ac- 
ção. Ao  predicamento  da 
acçãp  he  que  pertence  a 
verdadeira  fidalguia.  Nam 


5    — ^^  j^. 
Fundador  de  Lisboa. 


As 


mo  paífa  nos  dez  predica-    gems^  ^froavos  ,  &  qu£ 
mentos.  Ha  fidalguia,  que     mnfecimusipfi^  vix  ea  no- 
hefuítancia  3  porque  algús    Jiravoco  •,    diífe  o  grande 
naó  tem   mais  fuílancia  > 
que  a  fua  fidalguia :  ha  fi- 
dalguia, que  he  quantida- 
de ;  faó  fidalgos  ,  porque 
tem  muito  de  feu :  ha  fidal- 
guia, que  he  qualidade  i 
porque  muitos  naó  fe  pô- 
de negar,  faó  muito  quali- 
ficados :  ha  fidalguia ,  que 
herelaçaó^faó  fidalgos  por 
Tom. 7. 


apuáO- 
vit  iuin 
Meçam. 


acçoens  generofas,  &:  nam 
os  pays  ilíuftres,  faó  os  que 
fazem  fidalgos.  Cada  hum 
he  fuás  acçoens,  &  naóhe 
mais,  nem  menos ,  como  o 
Bautifia :  Ego  vox  claman^ 
th  in  defino. 


Hiij      f.IX. 


■118 


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-irMi 


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106 


§•  IX. 

DEíla  doutri- 
na táo  verda- 
•deirâj&defta  ultima  con- 
clufaó  dó  Bautifta  ,  tiro 
dous  documentos  ,  co'-ú\ 
queacabo:  hum  politico, 
outro  efpiritual.  Digo  po- 
liticamente, que  nas  ac- 
çoensfchãode  fundaras 
eleiçoens :  Digo  eípiritu- 
almente,  quèíiasacçoens 
fe  devem  fegurar  as  prede- 
ílinaçoens.  As  eleiçoens 
ordinariamente  fundaófe 
nas  ger-açoens5&  por  iílb  fe 
acertaótaó  poucas  vezes. 
Não  nego,  que  a  nobreza , 
quando  eílà  junta  com  ta- 
lento, deve  íempre  prece- 
der a  tudo  5  mas  como  os 
talentos  Deos  he  o  que  os 


Sermão  da terceiroTíommga 


Profeta  Ezechiel  nò  pri- 
meiro  Capitulo  das  fuás 
reveíaçoens  aquelle  carro 
mifl:criofo,porque  tiravao 
quatro  animais,  Homem, 
Leão,  Boy ,  &  Águia  .•  no 
Capitulo  decimo  tornou  a 
ver  o  mefmo  carro  com  os 
mefmos  animais,  mas  com 
a  ordem  trocada  j  porque 
na  primeira  vifaó  tinha  o 
primeiro  lugar  o  Homem  j 
nafcgunda  vifaó  tinha  o 
primeiro  lugar  o  Boy.  No- 
tável mudança!  Que  o  Ho- 
mem na  primeira  viíaó  fe 
anteponha  ao  Leão,  ã  A- 
guia,  &  ao  Boy,  muito  ju- 
íto  5  porque  o  fez  Deos  fe- 
nhor  de  todos  os  animais : 
mas  que  o  Boy  ,  que  foi 
criado  para  o  trabalho ,  & 


dà,&naóos  paysj  naó  fe  para  o  arado,  fe  anteponha 

devem  fundar  as  eleiçoens  a  três  cabeças  coroadas:  ao 

nas  geraçoens,  fenão  nas  Homem, Rey do  mundo, 

acçocns.  £fte  didame  he  ao  Leão,  Rey  dos  animais, 

o  verdadeiro  em  todo  o  à  Águia,  Rainha  das  aves! 

tempo,  6c  muito  mais  no  Sim:  a  razão  literal  ,  &  a 

prefente.    No   tempo  da  melhor,quedão  os  Expo- 

pazpódefcfofrer,  que  fe  fitoresjhceíla.  Naprímei- 


dcm  os  lugares  às  gera- 
çoens >  mas  no  tempo  da 
guerra,  naó  íc  haó  de  dar 
fcnão  às  accocns.    Vio  o 


ra  vifaó  ellava  o  carro  dé 
tro  do  Templo 3  nafcgun- 
da vifió  fihio    o  carro  à 
campanha :  Egreffaeft glo- 
ria 


dô  Advento.  ii^ 

r'ía'T>omini de  limlneTem'  voíllis  acçoens.  Se  per- 
pli :  &  quando  o  carro  eftà  guntarem  a  hum  homem : 
quieto  ,  defe    embora  o     71?^  ^/j ^5?  Quanto  ao  tem- 


primeiro  lugar  a  quem 
melhor  he,  mas  quando  o 
carro  caminhajiafede  dar 
O  primeiro  lugar  a  quê  me- 


poral,  em  qualquer  maté- 
ria pôde  refponder  có  cer- 
teza :  fc  perguntarem  a  hú 
homem  \Tu  quis  í-j?  Quan^ 


Ihor  puxa:&  porque  o  Boj     to  aaefpiritual ,  ninguém 
puxava  melhor»  que  o  Ho-     ha  no  mundo  ,  que  pofíà 


Pctii 


mem,  por  iííò  fe  deo  0'pri- 
mciro  lugar  ao'Boy.  Quá- 
do  o  carro  eftiver  no  tem^ 
pio  da  paz,  demfe  emÍDrora^ 
Gs  ugares  a  quem  melhor 
for  j  mas  em  quanto  o  car- 
ita eíliver  na  campanha  5. 
Iiamfededar  os  lugares  a 
quem  melhor  puxar. 

107  E  aílim  como  po- 
liticamente he  bem,  que, 
nasacçoensfe  fundem  as; 
eleiçoens,  aílim  efpiritual- 
mente  digo  ,  que  nas  ac- 
çoens  fe  haó  de  fegurar  as- 
predeílinaçoens.  S.Pedro 
na  Epiftola  fegunda  .•  Fra- 
três  fat agite  ,  ut  per  bona 
opera  certam  veftram  voca^ 
tionem^&^  eleãionemfacia" 
tis.  Irmãos  meus  Ç  diz  S. 
Pedro)  trabalhai  có  gran- 
de diligencia  de  fazer  cer- 
ta a  voíía  vocação ,  &  pre- 
deftinaçaó  por  meyo  das 


Ireíponder  a  eíla  pergunta^ 
Cada  hum  de  nós  efpiri? 
tualmemteheo  queha  de 
íer :  o  que  ha  de  fer  cada 
hum,  ninguém  o  fabe :  &e 
aíTim  ninguém  ha,que  po^ 
fa  refponder  com  certeza 
ã  pergunta  iTfá^ííii-^í  ?  A* 
maior  mifema  ,    a  maLOí 
perplexidade,  a  maior  a£« 
íÍi:ção  de  efpirito  ,  que  ha 
na  vi  da  humana, he  faber^ 
hu m  ho  mem  ,  quse  ha.  dlc5 
fer,  ou  eternamente  ám^^^ 
fa,  ou  eternam  ente  iiafdá:-' 
ce3-&  naó  faber  qualdeftas? 
duas  ha  de  fer  ;  naó  íàber 
hum  homem  fe  he  preci- 
to, ou  fe  he  predeftinado. 
A  efte  maior  de  todos  os 
cuidados,  a  efta  maior  de 
todas    as    perplexidades 
acode  S.Pedro  com  o  úni- 
co remédio,  que  ella  pôde 
ter :  Satagite^  utper  'vefira 
H  iiij        y&m 


i 


m 


12  0  Sermão  da  terceira  "Dominga 

bma  opera  certam  veftram     çoens  ,  jà  que  nas   noíTas 
eleãwnemfaaatís.  Se  que-     obras  eftà  depofitado  hum 
reis  ter  fegurança  de  voíTa     thefouro  tão  grande,  não  o 
predeftinação,a  maior q  sê     percamos.  Sata^ite.u^bz^ 
revelação  fe  pode  terne-     Ihemos  por  fegurar  noíTa 
lia  vida^appellaipara  vof-     predeílinação.    Aplique- 
fasacçoens,  &  voíTas  boas     monos  muito  de  veras  à 
obras :  fazei  obras  boas,  &     obfervancia  dos  preceitos 
ellai  moralmente  feguros,     divinos  :  rompamos  por 
que    fois    predeftinados.     tudo  o  que  nos  pode  fer  ef- 
Eftehe  o  verdadeiro  en-     torvo,  &  impedimento: 
rendimento  das  palavras     conheçamonos,  &  conhe- 
deS.Pedro :  &  aílim  as  ex-     çamos  o  mundo  ,  &  feus 
plica  S.  Thomás,  &  todos     enganos :  quebremos  com 
osTheologos.  Oh  quefe-     húa  grande  refolução   os 
hcidade  tão  grande,  que     ]aços,&as  cadeas,que  nos 
tenhamos  nas  noíTas  obras     detém ,  quaefquer  que  fe- 
hum  feguro  de  noíTa  pre-     jão  ;  convertamonos  de 
deftmaçáo  í  Na  outra  vida     todo  coração  a  Deos :  dif- 
hanos  de  pagar  Deos  as     ponhamonos  com  todas  as 
boas  obras  com  a  poíTe  da     forças  para    receber   fua 
gloria:  neftavidajànolas     graça,  &  feguremos  para 
começa  a  pagar  com  a  fe-     fempre  o  premio  da  Glo- 
gurança  delia.  Ora  Chri-     ria. 
íláos,  jà  que  nas  noíTas  ac- 


ín4 


SER. 


121 


sfa  !2Í^  sfe  ©fí)  sta  sta  áfè  st5  sta 

ffffff^fi 

S  E  R  M  A  M 

DA  QUARTA  DOMINGA 

DO 

A  D  V  E  N  T  O. 


Faãum  eft  ver  bum  ^omini/uperjoannem,  &  venit  in 
:   omnemregionemjordanisypradicansbaptifmumpa- 
nitentia mremifflonem peccatorum,  Luc.3. 


§■  I. 

Em  que  eu  o  di- 
ga eftà  dito  por 
íy  mefmo ,  que 
avemos  de  ter 
hoje  o  quarto  juizo.  No 
primeiro  Sermão  vimos  o 
j^uizo  de  Deos  para  com  os 
homens  ;  no  íegundo  vi- 
mos o  juizo  dos  homens 
hunspara  com  os  outros: 
Bo  terceiro  vimos  o  juizo 


de  cada  hum  para  comíigd 
mefmo.  Mas  qual  fera  o 
quarto,  &  ultimo  juizo, 
que  nos  refta  hoje  para 
ver  ?  Nem  he  juizo  de  fy 
mefmo ,  nem  he  juizo  dos 
homens,  nem  he  juizo  de 
Deos :  he  o  juizo  deíles 
três  juízos.  Todos  os  três 
Íuizos,que  vimos, vem  ho- 
je chamados  a  juizo.  Le- 
vanta nefte  Evangelho  o 
Bautifta  0  tribunal  fupre- 
ma 


=1 


à 


1^2  2  Serrríãõ  ãa  quarta  T>ommgã 

mo  da  Penitencia :  ?*r^^/-  dcfprczado  :  o  juizo  á<z 

cans  baptifmtmpanitentids  Deos  revogado  :  he  o  que 

in  remijjionem  peccatoriim\  avemos  de  ver  hoje. 
&  afTenca-o  com   grande         109     Tenho  propoftó 

propriedade  ,  &  miílerio  Ccatholico,  &  nobililUmo 

nas  ribeiras  do Jordaó  :  In  Auditório)  a  matéria  de- 

omnem  regionem  lordanis-,  íle  ultimo  Sermão.    E  fe 

porquejordaó  quer  dizer;  nos  palfados  mereci  alaúa 

Fluvius  ludicij  \  o  Rio  do  coufaavoíTos  entendinié- 

Juizo.   A  verfe  nas  aguas  tosÇ  qmdfentia  quàm  fit 

deíle  rio,  a  prefentarfc  á:^-^  exiguum  }  quizera  que  mo 

ante  deíle   tribunal  vem  pagaíTem  hoje  voíTos  co- 

hoje os  três  juízos  5  cada  raçoens.    Aos    coraçoens 

hum  por  fuás  caufas.O  jui-  determino  prègaf  hoje,  & 

«odefymxOno  vçm  por  caó  aos  entendimento^. 


Ibfpeiçoensj  porque  o  da 
inosporfofpeito  :  o  juizo 
dos  homens  vem  por  ag- 
gravo  ;  porque  aggrava- 
mosdelle:  o  juizode  Deos 


Chriílo  foberano  exem- 
plar dos  que  prègaó  fua 
palavra, comparou  os  Prè* 
gadores  aos  que  lavraó,.& 
lemeão :  Exijt  quifeminat  luc.s. 


Ibid.ir. 


vempor  appellaçáo>por-  feminare :femen  eftverbum 

que  appeilamos  de  Deos  T>ei.  O  ultimo  Sermão  he 

para  a  noíTa.  penitencia,  o  Agoílodos  Prècradores- 

Todos  eftes  juizps  haó  de  fefe  colhe   aigmn  fruto  * 

ftr julgados  hoje,&erpero  neíle  Sermão   fe    colhe' 

que  haó  de  fair  bem  julga-  Masquandoeu  vejo, que 

(Íqs.  v  porque  debaixo  do  hoje  nos  torna  a  repetir  o 

jtiizo  da  Penitencia,  o  jui-  Bautifta,  que  clamava  em  r 

20  de  fy  mefmo  emenda-  deferto  :  l^ox clamantis  in 4""  ^' 

fei  o jiiizo  dos  homé^ def-  deferto.  >  que conliança  pó- 

prezafe •,  o  juízo  de  D^o.s  defícar  a  qualquer  outro 

revogafe.  Aílimqueojui-  Pregador  ,   que  naõ  def- 

zp  de  fy  melmo  emenda-  mave:  ou  que  palavras  pò- 

do:o  juuQ  dos^bomcíis.  ciem fertaó fortes,  &  eífi- 

cazes 


doAd^vento.  123 

câzes  às  fuás,  que  antes  de     meremos  de  vos  oífender. 


as  pronunciar  a  voz ,  nam 
cmmudeçaó  ?  Lembrame 
porém,  que  para  Chriílo 
converter  hum  homem, 
que  o  tinha  negado  três 
vezes  3  porque  fe  dignou 
de  lhe  por  os  olhos,  bailou 
a  voz  irracional, &  no£tur- 
nadehúa  Ave,  cujas  azas 


Afpexit^Ò'  diffolvit gentes :  Hab- $: 
oíhai  vós,  Senhorjque  ain-  ^' 
da  que  foíTemos  gentios 
íèmfé,&  não  Chriftãos, 
osnoíTos  coraçoens  fe  fa- 
raó de  cera  ,  Sc  fe  derrete- 
rão. Neíle  dia  pois,  em 
que  nos  naó  refta  outro, 
acendei  a  frieza  de  minhas 


apenas  a  levantaó  da  terra,     palavras,&  allumiai  as  tre- 
para o  reftituir  outra  vez     vas  de  noíTos  entendi men- 


ao  caminho  do  Ceo.  Tan- 
to pode  hum  refpexit  dos 
olhos  divinos.  Aílim  he , 
Senhor,  aífim  he.  E  pofto 
queefte  indigno  miniílro 
de  voífa  palavra   feja  taó 
defproporcionado  inftru- 
mento  para  obra  taó  gran- 
de: fe  os  olhos  de  vofía  pie- 
dade, ^  clemência  fe  pu- 
zerem  nos  que  me  ouvem, 
&  hum  rayo  de  voífa  vifta 
-lhes  ferir  as  almas  5  naó  de- 
fefpero,  antes  confio  de 
•voífa  graça,  que  as  fobera- 
nas  influencias  defua  luz 
faraó  o  que  podem,  &  o 
iô^.  3  2.  que  coílumão.  Quirefpicit 
terram-i  érfacit  eam  treme- 
rí»  rolhai  vós,  Senhor,  que 
ainda  que  fej amos  de  terra 
infeníiveljôc  dura,  nqs  tre- 


tos,  de  íortç:^ que  r efoluta- 
meiíte  defenganados ,  fa- 
çamos hoje  hum  inteiro,& 
perfeito  juizo, de  vós,  de 
iiòs,&  do  mundo :  de  vòs  ^ 
para  que  vos  conheçamos, 
&  vos  amemos :  de  nós,pa'- 
ra  que  nos  conheçamos,,S^ 
.nos  humilhemos:  do  mun- 
do ,  para  que  o  conheça^ 
mos, 6c  o  defprezemo^. 

í.  11. 


IIO 


Pfal 


O  Ra  venha^ 
entrando  OjS 
três  juizos,para  ferem  exa- 
minados ,  &  julgados  no 
tribunal  da  Penitencia :  o 
juizo  de  fy  mefmo,  para 
que  fe  emende,  o  juizo  dos 
homens ,  para  que  Xe  deí^ 
preze» 


i 


114.  Sermão  da  quarta  'Dominga 

preze,  o  juizo  de  Deos,pa-     nha  aigúa  vífta  ,  mas  efta 


i^ 


m 


li 


% 


Marc  8. 
^4. 


ra  que  fe  revogue  :  &  co- 
mecemos pelo  que  nos  fica 
mais  peito. 

No  tribunal  dos  Areo- 
pagitasem  Athenascoílu- 
mavaó  entrar  os  reos  com 
osroftos  cubertos.  Aíllm 
entra,&  fe  preíènta  diante 
do  tribunal  da  Penitencia, 
o  juizo  de  fy  mefmo.    En- 
tra com  os  olhos  tapados, 
porque  naó  ha  juizo  mais 
cego.  A  cegueira  do  juizo, 
&  amor  próprio  hc  muito 
maior,  que  a  cegueira  dos 
olhos:  a  cegueira  dos  olhos 
faz  que    naó   vejamos  as 
coufas,  a  cegueira  do  amor 
próprio  faz  que  as   veja- 
mos difrerêtes  do  que  faó : 
que  he  muito  maior  ce- 
gueira.   Trouxeraó  hum 
cego  a  Chriíio,  pira  que  o 
curaíTe :  pozlhe  o  Senhor 
as  mãos  nos  olhos  ,  &:  per- 
guntoulhe  fe  via  ?  Refpon- 
deo :  Vídeo  homines  velut 
ar  b  ores  mnbtdantes^qixQ,  via 
andar  os  homens  como  ar- 
vores. Pergunto,  &  quan- 
do cftava  eltc  home  mais 
cegOjngorLi,ou  antes?Ago- 
ra  naó  ha^  duvida ,  que  ti- 


vifta  era  maior  cegueira, 
que  a  que  dantes   tinha  j 
porque  dantes  naó  viana- 
dajagora  via  húa  coufa  por 
outra,  homens  por  arvo- 
res :  U  maior  cegueira  he 
ver  hiía  coufa   por  outra , 
que  naó  ver  nada.  Naó  ver 
nada  he  privação,  ver  húa 
coufa  por  outra  he  erro. 
Eis  aqui  porque  fempre 
erra  o  juizo  próprio  .•  çis 
aqui  porque  nunca  acaba- 
mos de  nos  conhecer.Por- 
que  olhamos  pára  nós  com 
os  olhos  de  hum  mais  cego 
que  os  cegos  ,  com  huns 
olhos  que  fempre  vem  húa 
coufa  por  outra,  &as  pe- 
quenas lhe  parecem  gran- 
des. Somos  pouco  maio- 
res que  as  ervas  ,  &  fíngi- 
monos  taó  grandes  como 
as  arvores:  íòmos  a  coufa 
mais  inconílante  do  mun- 
do, &  cuidamos,  que  te- 
mos raizes  :    fe  o  inverno 
nos  tirou  as  folhas ,  imagi- 
namos que  nolas  ha  de  tor- 
nar a  dar  o  veraó,  que  fem- 
pre avemos  de  ílorecer, 
queavemos  dcdurarpara 
fempre.  lílo  fomos,  Scifto 
cuidamos.  Eque 


doAd'Vento\ 


I2f 


Piai  Tl. 
49.21. 


III     E  que  faz  a  peni- 
tencia para  emendar  eíle 
iuizotaoíèmjuizo  ?  Que 
faz  a  penitencia  paraallu- 
miar  eíle  cego  tao  cego? 
Duas  cõufas.Tiralhe  o  veo 
dos  olhos :  &  metei  he  hum 
efpelhona  mao.  Tiralhe  o 
veo  dos  olhos,  como  pedia 
opeccadoraDeos  :  Í?í"i;í'- 
la oculosmeos :  mçtclhthú. 
118.18.  efpelhona  mao,  eomodi- 
-zia  DeosaopeccadorriS'/'^- 
tuam  te  cantrafaciem  t%am\ 
Porvoshei  a  vos  diante  de 
vòs.  Nenhúa  coufa  traze- 
mos os  homens  mais  ef- 
quecida,  &  defconhecida , 
nenhiia  trazemos  mais  de- 
trás denòs,  que  a  nòs  mef- 
mos.  E  que  faz  o  juizo  da 
peni tecia?  Poem-nos  a  nòs 
diante  de  nòs:  St  atuam  te 
€ontrafactem  tuam .  Põem  - 
nos  a  nòs  diante  de  nòs, co- 
mo a  reos  diante  do  tribu- 
nal, para  que  nos  julgue- 
mos: poem-nos  a  nòs  dian- 
te de  nòs  ,  como  obje6to 
diante  do   efpeiho  >para 
que  nos  vejamos.    Coufa 
difficultofa  he>  quehomés 
taó  derramados  nas  coufis 
exteriores^  cheguem  a  fe 


ver  interiormente ,  como 
convém.  Mas  iílb  faz  a  pe- 
nitencia por  hum  de  dous 
modos,  ambos  maravilho- 
fos  :  ou  voltandonos  os 
olhos  de  fora  para  dentro, 
para  que  nos  vejaõ^  ou  vi- 
randonos  a  nòs  mefmos  de 
dentro  para  fora,  para  que 
nos  vejamos. 

112       Quando  Deos 
quiz  converter  aquelie  taó 
defvanecido  Rey  Nabu- 
codonofor^para  que  fe  def- 
ceíie  de  feus  foberbiíHm os 
penfamentos^êc  conhecef- 
feo  que  era  ;  o  primeiro 
paffo  por  onde  o  encami- 
nhou à  penitencia  ,  foi 
transformalo    em    bruto. 
Sobre  o  modo  defta  trans- 
formação ha  variedade;  de 
pareceres  entre  os  Douto- 
res ;  huns  dizem,  que  foi 
imaginaria,  outroSjque  foi 
verdadeira  :  &:  pofto  que 
eílefegúdo  modo  he  mais 
conforme  ao  Texto  i   de 
ambos  podia  fer.    Se  foi 
trásformaçaó  imaginariaia 
voltou  Nabucodonofor  os 
olhos  para  dencra  de  fy 
mefrao5&  vio  taô  vivam  é- 
te  o  que  era ,  que  áeQi^ 
aquei- 


^26  Sermão  dãq\ 

âquellc  ponto  fenaó  teve 
mais  por  homem  ,  fenaò 
por  bruto,  &  como  tal  fe 
tratava. Se  foi  transforma^ 
çaóverdadeira,  converter 
Deos  em  bruto  a  Nabuco- 
donofor  ,  naó   foi   outra 
coufa,  que  viralio  de  den- 
tro para  fóra,para  que  mo- 
ftraíTe  por  fora  na  figura  o 
que  era  por  dentro  na  vi- 
da. Oh  quam  outro  fe  ima- 
ginava eíle  grande  Rey 
antes  do  que  agora  feviaí 
Dantes  naó  fe  contentava 
com  Ter  homem ,  &:  imagi- 
navafe  Deos:agora  conhe- 
cia que  era  muito  menos 
que  homem,  porque  fe  via 
bruto  entre  os  brutos.  Se 
voltarmos    os  olhos  para 
dentro  de  i\ò^ ,  ou  fe  Deos 
nos  virara  a  nòs  mefmos 
de  dentro  para  fora  ,  que 
diíFerente  conceito   avia 
de  fazer  cada  hum  defy , 
do    que   agora  fazemos! 
Mas  figuamos  os   paíTos 
deíle  novo  monílro,  Ã:  ve- 
lo-emos,6c   vernos-emos. 
Andou  pafcendo  aqueiie 
bruto  racional  o  primeiro 
dia  de  fua    transformação 
cncre  os  animais  :  là  peia 


UãrtaT>ordinga 
tarde  teve  fede :  foyíeche- 
gando  fobre  quatro  pès  à 
margem  de  hum  rio  ,  & 
quando  reconheceo  no  cfr 
pelho  das  aguas  a  deformi»- 
dade  horrenda  de  fua  fíir 
gura,  valhame  Deos  ,  que 
aíTombrado  ficaria  de  ij 
mefmo!  Provaria  primei* 
ro  a  fogir  defy ;  mas  como 
fe  vifi"e  atado  taó  forte- 
mente àqueile  tronco  bru* 
to,  remeteria  a  precipitar- 
fe  na  corrente  :  &  feDeos 
onaótiveíle  maó,  que  o 
queria  trazer  por  aquelles 
campos  de  Babilónia  para 
exemplo  eterno  de  fober- 
bos,alli  ficaria  fepukado, 
primeiro  em  fua  confufaó) 
6c  depois  na  profundida- 
de do  rio.  Que  rioheefie, 
fenaó  o  rio  J  ordaó,  Fluvins 
ludicij  :  Rio  do  juiz  o  .^  E 
quéhe  efic  Nabucodono- 
foraflim  transformado,  fe- 
naó o  peccador  ,  bruto  có 
razaó,  &  fcm  ufo  della,que 
anda  pafcendo   nos  cam- 
pos deíle  mundo  entre  os 
outros  animais,  maisani- 
malquccllcs  .^  Sò  húadif- 
fcrcnça  ha  entre  nos  ,  & 
Nabucodonofor,que  ellc 
quiz 


t'V 


ão  Advento, 
quiz  fogir  de  fy^j^c  naó  po*    o  que  imagináveis 
de,  nós  ainda  podemos,  fé 

Chega 


quizermos.  L^nega  emfim 
o  peccador  a  verfe  nas 
aguas  déíle  rio  ,  efpelhos 
naturaes5&  íem  aduiaçaó : 
vè  de  repente  o  que  nunca 
tinha  viílo :  vèfe  a  fy  mef- 
mo.  Oh  que  aílbmbro!  He 
poíli vel,  que  eíle  fou  eu  ? 
Tal  fealdade  ,  tal  horror, 
tal  brutefa  j  ta  es  deformi- 
dades ha  em  mim  ?  Sim :  & 
muito  maiores.  EíTe  fois, 
&  naò  o  que  vos  cuidáveis. 
Vede  fe  diz  eíTe  retrato 
coín  o  que  vos  tinheis  for- 
mado de  vós  mefmo  no 
voííb  penfamento  j  vede 
bem,&:  coníiderai  muito 
devagar  neíTe  eípelho  o 
rofto,^  âis  feiçoens  inte- 
riores da  voííà  alma :  vede 


127 

vede 

fe  vos  conheceis  :  vede  fc 

fois  eíTe,  ou  outro ;  Tu  quis^ 


113  Ç  Abeis  porque 
43  andarmos  ta6 
vangloriofos,  &  taó  defva« 
necidos  de  nos  mefmosf* 
Porque  trazemos  os  oihos 
por  fora ,  &  a  nós  por  den** 
tro  :  porque  não  nos  ve^ 
mos.  Se  nos  viramos  inte-, 
ri orm ente  como  fomos,  fe 
coníideraramos  bem  a  de- 
formidade de  noífos  pec-r. 
cados  5  oh  que  diíferentè, 
conceito  aviamos  formar 
denòs  l  Taó  defvaneci- 
dos  de  il luftres,  taó  defva- 
necidos  de  Senhores ,  taó 


bem  eífes  olhos,  quefaó  as     defvaneçidos  de  podero- 
voíTas  intençoens  :   eífes     fos,  taó  defvaneçidos  de 


cabellos  ,  que  faó  voífos 
penfamentos :  eíTa  boca , 
que  faó  as  voílas  palavras: 
eílas  mãos^  que  faó  as  vof- 
fas  acçoens  ,  &  as  voífas 
obras :  vede  bem  fe  diz  ef- 


difcretosí,  taó  def\^aneci- 
dos  de  gentis  homens,  taó 
defvaneçidos  de  fabios  , 
taó  defvaneçidos  de  vale- 
tes, taó  defvaneçidos  de 
tudo :  porque?  Porque  vos 
fa  imagem  com  a  que  ten-  naó  vedes  por  dentro.  Di- 
desnavoífaidèa  :  vede  fe  zeime  vos,  que  húa  vez 
fe  parece  o  que  vedes  coin     puzeíTei-s  bem  os  oihos  em 

-^^n  voífos 


TiS  Sermão  da qíi ar taTyomhga 

voíTos  péccadòs  :  oh  como     hiílorias  de  luas  façanhas 


Pralm. 
50.5- 


avieis  de  emendar  todos 
eftes  epitetos  í  Nenhum 
homem  ouve  no  mundo, 
que  mais  íe  podeíTe  prezar 
de  f^,  que  David  ;  porque 
nelle ajuntou  a  natureza, 
a  fortuna,  &:  a  graça ,  tudo 
o  que  repartio  pelos  gran- 
des homens  :&  com  tudo 
tienhum  homem  achareis 
mais  humilde,  nem  menos 
prezado  de  fy  mefmo  ,  an- 
tes mais  defprezador  de 
fy,  que  David.  E  donde 
cuidais,  que  lhe  vinha  if- 
to?  Teccatim  meum  contra 
meeftfemper.  eítava  David 
fempre  olhando  parafeus 


Chryf. 
ib. 


Naódeo  tanta,  matéria  as 
artes  Hercules  em  feus 
trabalhosjcomo  David  em 
fuás  vi6Vorias.  Mas  naó 
eraó  eftas  as  viftas,  em  que 
fe  entretinha  aquelle  grá* 
de  Rey ,  nem  eftas  as  ga- 
lariasjcm  que  hia  paífear. 
Em  contrapofiçaó  daquel- 
las  pinturas(^figamos  aíHrn 
a  confideraçaó  de  Chry- 
foftomo  3  mandou  fabri- 
car David  outra  galaria, 
chamada  de  fuás  fraque- 
zasj&nella  pintar  em  di- 
veríos  quadros,  naó  as  fa- 
mofas,  mas  as  laftimofas 
hiftorias  de  feus  peccados.- 


peccadosjôcvendo-os,  &  Aqui   vinha  paffear  Da- 

vcndofc  nelles.  §uafipec'  vid:  aqui  tinha  o  bom  Rey 

catoriim  itriagines  contem-  as  fuás  meditaçoens  :   6c 

plando  :  comenta  S.Joaó  aqui  alcançava  a  maior  de 

Chryfoftomo.  EftavaDa-  todas  fuás  viclorias  ,  que 

vid  contemplando  os  feus  "foio  conhecimento  de  fy 

peccados,  como  fe  eftive-  mefmo. 


ravendo5&:  confiderando 
as  imagens,  &  retratos  de 
fuasacçoens.  Naó  ha  du- 
vida, que  muitas  peças  do 
Palácio  de  David  peio  ve- 
rão nus  pinturas  ,  pelo  in- 
verno nos  tapizcs  cflariaó 
ornadas   com  as  famoías 


1 1 4  G)uaíipeccatornm 
imagines  contemplando-NTi' 
mos  com  David  conílde- 
rando  peccados ,  Sc  muda- 
do epítetos.  Punha  os 
oihos  David  cm  hum  qua- 
dro, via  a  hiftoria  de  Ber- 
íabcjôc dizia comíigo:  He 
poíli- 


h:.'!:; 


wm^^ 


fc-^^Vuv  do  Advento,  '^««wt-íí?^ 


j^6ílívêl,qúè  me  tenha  o 
mundo  por  Profeta5&  que 
naó  anteviíTeeu  ,  quede 
huaviílafeaviade  feguir 
humpeiifaínento,  de  hum 
penfamento  hum  defejo, 
6c  de  iium  defejo  liúa  exe- 
cução taó  indigna  de  mi- 
nha peíToa,  &  de  meu  eíla- 
do!  Naó  me  chamem  mais 
Profeta ,  cham  em- me  ce- 
go. He  poíIiveUque  fou  eu 
tido  no  mundo  pelo  valen- 
te da  fama,  &  que  bailou 
1i tia  mulher  para  me  ven- 
c^ei*^  &  para  que  eu  deixaf- 
ífe  a  guerra,  6c  náo  fahiíTe  à 
campanha  naquelle  tem- 
po í  em  que  coíiumavaó 
andar  os  Heys  armados 
diante  de  feus  exércitos: 
Eo  tempore^  quofolent  Re^ 
ges aã òelia procederei  Naó 
me  chame  ninguém  valé- 
tej  chamem- me  fraco. Da- 
va dous  paíTos  adiante  Da- 
vid, punha  os  olhos  nou- 
tro quadro,  via  a  hiíloria 
de  Uriasicomo  dava  a  car- 
ta a  Joab,&:  como  aparecia 
logo  morto  nos  primeiros 
efquadroens ,  ôc  vidorio- 
fos  os  inimigos.  He  poíH- 
yel ,  que  me  prezo  eu  de 
Tom./. 


I25> 

Principé  ^C^fdàdeirò  ,  & 
que  mandei  cometer  hfu 
aleivoíia  tao  grande  de- 
baixo de  minha  firma  y^ 
que  a  hum  vaíTaiio  taó  fíelj 
depois  de  lhe  tirar  a  hon- 
ra, lhe  tirei  também  a  vida 
enganofamente  l  iS  ao  me 
terei  mais  por  verdadeiro, 
fenaó  por  fémentido/.  He 
poííivèl,  que  me  fez  Deos 
Rey  do  feu  Povo,para  lho 
confervar,8c  defender,  & 
queconfoio  eu  a  nova  da 
rota  do  meu  exercito,  corri 
a  nova  da  morte  de  Urias  > 
6c  que  péfa  mais  na  minha 
eftimaçaó  a  liberdade  de 
humappetite,quea  perda 
de  taó  fieis  ,  èi.  valerofóS 
foldadosINaó  me  chamem 
Rey,  cham  em- me  tyran-^ 
no.  Hia  por  diante  David, 
contemplava  outro  qua- 
dro, via  o  cafo  de  Nabal 
Carmello :  como  mandara 
tirara  vida  a  tudo  o  que 
em  fua  cafa  a  úvcí^^Ç:^  6c  co- 
mo depois  lhe  concedia 
perdão  pelos  rogos  de  fiia 
mulher  Abigail.  Hepofli-^ 
vel,que  eu  fou  o  celebrado 
debenigno,6c  piadofo,  6c 
mando  tirara  vida  a  hum- 
I  ho- 


130  Sermão  da  quarta  Dominga 

homem  5  porque  naõ  quiz    pelo  dito  de  hum  criado^ 


^1» 


^H 


dar  fua  fazenda  aos  fogiti- 
vos,  que  me  feguem !  Eu 
fou  o  que  domei  os  Leões, 
6c  os  UíTos  no  deferto  ,& 
naó  pude  domar  hum  Ím- 
peto de  ira  dêtroem  mim 
mefmo .'  Naó  me  chama- 
rei mais  humano,  chamar- 
me-heifero.  HepoíIIveí, 
que  me  preze  eu  de  intei- 
rOj&  que  fendo  taó  juftiíi- 
cada  a  caufa  de  Nabal,  ao 
jnenos  naó  digna  de  caíli- 
go,  naó  baftaííe  para  me 
aplacar  a  fua  jufliça^patro- 
cmadafódcíy  mefma:  ôc 
que  depois  reprefentada 
por  Abigail,  pudeíTe  mais 
hum  memorial    acompa- 


fem  mais  informaçao,neni 
figura  de  juízo,  declaro  a 
Miíibofet,  filho  do  Rey 
meuanteceílbrjporreo  de 
lefa  Magefíade,&  Ihecon- 
fífco  afazenda,&:adouao 
mefmo  acufador !  Naó  me 
terei  mais  por  prudente, 
fenaó  por  temerário.  He 
poílivel,  que  tenho  eu  opi- 
nião de  redo  ,  &  que  de- 
pois de  averiguada  a  ca- 
himniajêc provada  ainno- 
cencia  ,  deixo  ao  traydor 
com  ametadedos  bens,& 
naó  mando  ,  que  fe  reílif 
tuaó  todos  ao  innocente  ! 
Naó  me  terei  mais  porre- 
â:o,  fenaó  por  injuílo.  líis 


nhado  do  íèu  roílo,  que  da     aqui  como  David  pelos  re 
fua  razaóí  Não  me  chama-     tratos  de  feus  peccados  hia 


rei  inteiro,  chamarme-hei 
refpedivo.Dava  mais  paf- 
fos  adiante  David  ,  via 
noutro  quadro  a  hiftoria 
deSiba  :  como  acufava  a 
Mifibofetfeu  Senhor, co- 
mo tomava  poíTe  da  fazé- 
da,&  como  depois  de  pro- 
vada a  cakimnia,  lhe  man- 
dirarcílituir  fó  ametade. 
He  poílivel,  que  me  prezo 
eu  de  coaíiderado,  &  que 


mudando  os  feus  epítetos, 
&  emendando  o  juízo  de 
fy  meímo ;  &  tendo  em  fy 
tanta  matéria  para  a  vai- 
dade, achava  tanta  para  os 
defenganos. 

1 1  f  Chriíláos  [&  naó 
digo  Senhores ,  porq  qui- 
zera  que  vos  prezaíleis 
mais  de  Chriíláosjponha- 
fe  cada  hum  diante  á2s 
imagens  dç  feus  peccados , 
Tec 


doAd^enfo\  i^t 

¥^eccatorum  imagines  con-    fouoque  me  prezo  de  en- 


templando :  cuide,&  coníi- 
derenellas  hum  pouco,  & 
verá  como  as  idèas  anti- 
gas, que  tinha  na  fantaíia, 
íelhevaó  deípintando,  & 
como  muda,  &  emenda  o 
juizo  errado ,  que  de  íy 
mefmo  fazia.  Todos  vos 
prezais  de  honradosjtodos 
vos  prezais  de  valeroíos. 


tendido  j&  cometi  tantas 
vezes  húa  ignorância  taõ 
fea,como  anteporá  crea- 
tura  ao  Creador,  afumma 
miferiaao  fummo,  &  infi- 
nito bem !  Naó  fou  enten- 
dido, fou  nefçio.  Eu  fou  o 
que  me  prezo  de  feíudo ; 
&  cometi  tantas  vezes  húa 
locura  taó  rematada ,  co^ 


todos  vos  prezais  de  ente*  mo  arriícar  por  hurn  appeí- 

didos,  todos  vos  prezais  tite leve,  por  hum  inftan- 

de  fefudos :  quereis  emen-  te  de  gofto  húa  eternidade 

dar  cffQS  epitctos?  Virar  os  de  gloria ,  ou  de  Inferno  í 

olhos  para  dentro  aos  pec-  Naó  fou  fefudo,  fou  louco. 

c2idos.  Eu  fou  o  que  me  Deita  maneira  emenda  q 

tenho  por  honradoj  &  co-  juizo  da  penitencia  os  er- 

meti  tantas  vezes  húa  vi-  roSjSc  as  cegueiras  donof* 

leza  taó  grande ,  como  fer  íb.  Em  lugar  de  fefudo, 

ingrato,&  infiel  a  meu  Se-  põem  louco  i  em  lugar  de 

nhor,&ameu  Deos,  que  difcreto,  nefcio  j  em  lugar 

mecreou,  8c  meremio  có  devalerofo,  covardej  em 

feufangueíNaófou  hon-  lugar  de  honrado  ,  vil:  82^^ 

rado,  fou  vil .  Eu  fou  o  que  aquillo  era  o  que  cuida va- 


me  tenho  por  valeroío  v  8ç 
cometi  tantas  vezes huma 
fraqueza  taé  baixa  ,  como 
deixarme  vencer  de  qual- 
quer tentação,  6c  virar  as 
coitas  aChriáojfem  refi- 
flirporfeu  amor,  nem  a 
hum  penfamentoíNaó  fou 
ralerofoa  fou  covarde.  Eu 


mos  ,  iíto  o  que  fomos. 
Ninguém  nos  diz  melhor 
o  que  fomos,  que  os  noíFos 
peccados. 

§.  IV. 

116     A  Inda  os  nof- 

jfj^fos  peccados 

li)        po- 


1^  ; 
li?'! 


V1J.J 


;;;J 


.:í.Reg. 


132  Sermão  da 

poílos  diante  dos  olhos  té 
outro  modo  de  côvencer, 
&  emendar  mais   aperta- 
do, 6c  mais  forçofo :  que  he 
convencemos  a  nòs  com- 
nofcoj  &  emendar  o  noíTo 
juizocomo  noíTo  próprio 
juizo.  Cada  hum  em  feu 
juizo  naó  fe  deve  eílimar 
mais,  queaquilio  em  que 
eile  mefmo  fe  avalia. E  co- 
mo fe  avalia,  cada  hum  de 
nòs?  lílo  naó  fe  vè  nos  nof- 
fos  penía mentos,  vefe nos 
noíFospeccados.  Todas  as 
vezes  ,  que  hum  homefií 
pecca  ,  vencLeíe  pelo  feu 
peccado  :  Venimdatus  efí'^ 
mfaceret makmyáiz2.  Éf-' 
cntiirafagrada.  Ora  veja 
cada  hum  de  nos  o  preço 
porque  fe  vcnácy  &c  á^hv 
julgará  o  queiíe.  Prezais- > 
vos  muito,  &  eftimais-vos 
rnuico   5   defvaneceis-vos 
muito  ;  quereis    faber   o 
que  fois  por  voíTa  niefiria 
avaliação:?.  Vede  o  preço* 
porque  vos  dais  5  vede  os 
voífos  peccados.  Daif-vos 
por  hum  rcfpcito,daif  vos 
por  hu  m  intcreíIc,daif-vos 
por  hum  appctite,  porhCi 
penfiinenco,por  hum  aílc- 


quarta  Dominga 

no :  muito  pouco  he  o  que 
por  taó  pouco  fe  dà.  Se  noS 
rendemos  por  taó  pouco, 
como  nos  prezamos  tan- 
to ?  Filhos  de  Adam  em- 
fím..Quem  yííTq  a  Adam 
no  Paraifo  cx>m.tanta5  pre- 
fumpçoens  de  divino ,  mal 
cuidaria ,  que  em  todo   o 
mundo  podeífe  aver  pre- 
ço, porque  fe  ouveíFe  de 
dar.  E  que  fucedeo?  Deo- 
ÍGÚlQy  &:  deoatodosíeu^ 
filhos  por  hua  maçãa.    Se 
nos  vendemos  taó  baratos, 
porque  nos  avaliamos  taó 
caros?  Jà que  vos  ^ílxmais- 
tanto,  naó  vos  deis  por  taò 
pouco  j  &  pois  vos     dais 
por  taó  pouco,  naó  vos  te- 
nhais por  mais.  Naó  he. 
razaó,  quefe  avalie  taó  aln 
to  no    feu  peníamento  , 
quem  fe  vende  taó  baixo: 
no  feu  peccado. 
y  liX^^..  i  Agor3<;catende* 
reis  abfpirito,ôc  a  pruden-> 
cia  de  David,  em  pór  di^. 
ante  dos  olhos  as  imagens 
de  feus  peccados  :    Tecca^ 
torum  ímtigines  cõntempia^ 
<^í?,:  quando  para  íc  excitar 
a  contrição,  ^  conheci- 
mento de  fua  miferia  ^  pa- 
rece 


do  Advento',  ^  133 

rece  que  como  Profeta    vendo  pelos  iíadas  do  mu- 


pudera  reprefentar  diante 
de fy outra  imagem,  que 
mais  o  movera.  Naò  mo- 
vera mais  a  David  huma 
imagem  de  Chriílo  cruci- 
ficado 5  pois  elle  fabia  mui 
bem,  que  Deos  havia  de 
morrerem  hua  Cruz  por 
aquelles  mefmos  pecça- 
dos?  Digo  que  naó:  leve- 
de a  razaó  porque  o  digo. 
Muito  melhor  me  conhe- 
ço eu  diante  da  imagem 
de  hum  peccadojque  dian» 
te  da  imagem  de  hú  Chri- 
ílo crucificado.  Quando 
eftou  diante  da  imagem 
de  Chriílo  crucificado , 
parece  que  tenho  razoens 
de  me  enfoberbecer ,  por- 
que vejo  o  preço  ,  porque 
Deos  me  comprou  ;  mas 
quando  me  ponho  diante 
da  imagem  de  hum  pec-  dadosjcomoojuizo  de  fy 
cado,  naó  tenho  fenaó  ra-     mefmo  j  mas  com  todos  os 


do,  naó  poílb deixar  de 
crer  que  fou  nada.  Eis 
aqui  a  que  fe  reduz ,  &  co- 
mo fe  defengana  o  juízo 
de  fy  mefmojquando  fe  vè 
como  em  efpeiho  na  ima- 
gem de  feus  peccados :  & 
aíllm  o  muda,aíllm  o  eme- 
da  o  juizo  da  penitencia : 
Tradicans  ba^tifmum  fce- 
nitentia. 

$.    V. 

118  /^  Juízo  de  ff 
V^  mefmo  [co- 
mo acabámos  de  ver  J 
emendafe:&  o  juizo  dos 
homens?  defprezafe.  En- 
tra pois  o  juizo  doshomés: 
a  prefentarfe  diante  do 
tribunal  da  Penitencia :  ôc 
naó  vem  com  os  olhos  vê- 


zoens  de  me  humilhar , 
porque  vejo  o  preço,  por- 
que eu  me  vendi.  Quando 
vejo,  que  Deos  me  com- 
pra com  todo  o  íeu  íàngue, 
naó  poílb  deixar  de  cui- 
dar, que  fou  muito  i  mas 
quando  vejo  ,  que  eu  me 
Tom.  7. 


fentidos,  Sc  com  todas  as 
potencias  livres,  6c  muito 
livres  j  porque  com  todas 
julga  a  todos.  Traz  livres 
os  olhos,  porque  julga  tu- 
do o  que  vé :  traz  livres  es 
ouvidos,  porque  julga  tu- 
do o  que  ouve :  traz  livre  a 
I  iij  lia- 


'vi 


Manh. 


134  Sermão  da  quarta  dominga 

lingua  ,  porque  publica  ,  peccados  noílbs,  que  fize- 
tudo  o  que  julga;  Sc  traz  li-  ra  feus ;  Sc  quem  era  ta  de 
vre  mais  que  tudo  a  ima-  fatisfazera  Deos  porpec- 
ginaçaój  porque  Julga,  5c  cacos,  náo  tem  ouvidos 
condena  tudo  o  que  ima-  para  aque  contra  elle  di- 
gina.  .  ,       zemos  homens  :  E^o  attr^ 

iip     Mas. que  faz  a  pe-     tám  tanquam  Jurdns  nonviúm. 
nitencia  para   defprezar-     aiidkbarn.    Digaó  os   ho- 37  «4- 

mens,  julguem  os  homens, 
condenem   os  homens  a 


mos  eíle  idolo  taõ  adora- 
doj  taó  temido  >  &  taó  ref- 
peitado  no  mundo  ?  Que 
faz  5  ou  q  pode  fazer  a  pe- 
nitencia 3  para  que  naó  fa- 
çamos cafojfendo  homens, 
dojuizo  dos  homens  ?C6 
abrir, ou  fechar  hum  {tn- 
tido  faz  a  penitencia  tudo 
iílo.  Para  o  juizo  de  fy 
mefmo  abrenos  os  olhos  r 
para  o  juizo  dos  homens , 
fechanos  os  ouvidos.  No 
dia  da  Payxaó  choviao  te- 
ftemunhos  ,  6c  blasfémias 
eontraChrifto  ;  &  o  Se- 
nhor^como  fe  nada  ouvira. 
Aífim  lho  diíTe  admirado 
Pilatos;  A^í?;^  aiidts quanta 
adverjum  tedicuntteftimo- 
»/4?Naó  ouves  quantos  te- 
ílemunhos  dizem  contra 
ti  ?  Naò  ouvia  Chriílo, 
porque  ouviajcomo  fe  naó 
ouvira.  O  Senliornaqucl- 
ledia  hia  fatisfazcr  pelos 


os 

que  quizerem  ,  &  quan- 
to quizerem  i  que  quem 

trata  de  veras  da  íluisfiçaó 
de  feus  peccados ,  quê  tra- 
ta de  veras  de  fer  bcmji'1- 
gadodeDeos,  naó  fe  lhe 
dà  do  juizo  dos  homens. 
Sabeis  porque  dizemos 
tanto  cafo  dos  juizos  hu- 
manos, porque  naó  fomos 
verdadeiros  penirentes.Sc 
a  noílli  penitencia  ,  fe  o 
noííb  arrependimento  fo- 
ra verdadeiro ,  que  pouco 
cafo  havíamos  deflizcrdc 
todas  as  opinioens  do  mu- 
do! 

120  Peccou  David  o 
peccado  àc  Berfabè,  &  U- 
fias :  ao  cabo  de  algum  té- 
poveyo  o  Profeta  Nata  m 
a  adv^crtillo  do  grande  mal 
que  tinha  feito  :  reconhe- 
ccoPavid  fua  cu.pa-.diife: 
'Pccca- 


m 


do  Advento.  i^f 

2  Reg  ^etcavt  5  Pequei ;  &  no     i;/báfta  a  David  ,  a  Saui, 

''^"'^"    mefmo  ponto  por  parte  dé     porquelhe  naô  bailou  hu 

Dcos  o  abfolveo  o  Profeta     Teccavi  ?  A  razaá  literal , 

úoipQcc3.áo:^omimisquo-     que daó  todos  os  Douto- 

^^-     que    transtuUt  ^  peccatum     reSjhej  que  o  Teccavi  de 


ruum.Feccou  Saul  opec- 
<:íido  de  deíobedienciajre- 
fervando  do  derpojo  de 
Amalec  para  o  facriíicio : 
veyo  também  o  Profeta 
Samuel  advertillo  déqua- 
to  Deos  fentira  aqueila 
culpa  :  conheceo-a  Saui: 
diíTe  :  Teccavi  >  Pequei  i 
mas  nem  o  Profeta  ref- 


David  foi  dito  de  todo  o 
coraçaójO "Pf  <rr^.i;/ de  Saui 
foi  dito  fomente  de  boca.: 
a  penitencia  de  David,  foi 
penitencia  verdadeira  >  a 
penitencia  de  Saul  foi  pe- 
nitencia falfa.  Muito  bem 
dito :  mas  donde  fe  prova  > 
Donde  fe  prova  ,  que  foi 
falfa  a  penitencia  de  Saul  * 


pondeo  ,  queeftavaper-  donde  fe  prova, que  o  feu 
doado,  nem  Deos  ihe  con- 
cedeo  perdaô.  He  efte  hú 
dos  notáveis  cafos ,  que  té 
aEfcritura,  coníiderada  a 
femeihança  de  todas  as 
'cifcunílancias  delie.  Da- 
vid era  Rey,  Saul  também 
eráRey"}   David  peccou. 


Teccavi  foi  dito  de  boca , 
Sc  naò  de  coracaó  ?  Naó  o 
dizemos  Doutores  ,. mas 
eu  o  direi,  ou  ò  dirá  o  Tejt- 
to.  Quando  David  diífe .' 
^eccavi-,  naó  failou  mais 
nada.  Quando  Saul  diííe : 
Teccavi  j  acrecentou  eflas 


Saul  peccouj  a  David  veyo    palavras  vTeccarui  '.Jedho- 
amoedar  hum  Profeta,  a     nora  me  c&ramfenwribus 


!.  Reg. 
1^.30. 


Saul  veyo  amoeftar  outro 
Profeta  •,  David  diíTe;  'Pec^ 
^•i^v/ ,  Pequei  •,  Saul  diíTe: 
SP^rf^w,  Pequei.  Pois  íe  os 
cafos  em  tudo  foraó  taõ  fe^ 


pof  uli  meu  &  coram  Ifrael. 
Pequei :  mas  vòs  Samuel 
tratai  de  minha  reputa- 
ção, &  honraim^  com  os 
grandes,  &  povo  de  meu 


melhantes  ,  como  perdoa  Reyno,  Ah  fim  Saul, &  vòs 
Deos  íw  David ,  8c  naó  per-  depois  de  dizer  Tecca-vi , 
doaa Saul ? Se IwxmTccc^-    depois  de  vos    pores  em 

liiij  cila- 


156 


Sermão  da  qitarta  T>omin^a 
eftado  de  penitente,  ainda     executo  o  caíligo  ?  Quem 


vm 


ii 


vos  lembra  reputação  , 
ainda  fazeis  cafo  do  que 
diráõ,  ou  naó  diráó  de  vos 
os  homens  ?  Sinal  he  logo , 
que  naó  he  verdadeira  a 
voíTa  penitencia  ,  &  que 
aquelle  Teccavi  nafceo  na 
boca,  &:  naó  no  coraçam. 
Quem  chega  a  eftar  verda- 
deiramente penitente  , 
quem  chega  a  eílar  verda- 
deiramente arrependido, 
como  eftava  David ,  nam 
lhe  lembraó  mais,  que  os 
feus  peccados  :  Teceavi: 
naófc  lhe  dado  quejul- 
gaó,  nem  do  que  dizem  os 
homens. 

§.  VI. 
121     AS  razoes  de- 
JTx.^^    verdade 
£ió  muitas, &  grandes,  ou- 
vi as  da  minha  tibieza,que 
a  quem  tiver  mel  hor  efpi- 
ritolhe  occorreráó  outras 
mais,&  maiores.  O  verda- 
deiro penitente,  elle  mef- 
mo  fe  açufa,&  fe  condena : 
que  fe  lhe  dà  logo,  que  di- 
gaó  outros  o  que  elle  con- 
;  fefla  de  fy  ?  Que  importa , 
que  outros  levem  o  prc 


fe  confeíía  por  Reo,  nam 
lhe  fazem  aggravo  as  te- 
ílemunhas.  Se  hum  ho- 
mem eílà  verdadeiramen- 
te arrependido ,  fe  conhe- 
ce vercLideira,  &  profun- 
da mxente  fuás  culpas ,  nun- 
ca ninguém  dirá  delle  tan- 
to mal,  que  elle  fenaó  jul- 
gue por  muito  peor.E  que 
fe  vè  julgado  mais  benig- 
namente do  que  fuás  cul- 
pas merecem  ,  antes  tem 
razaó  de  agradecer, que  de 
queixarfe.  Por  iílb  os  grá~ 
des penitentes  naó  fe  quei- 
xavaó  das  injurias  Julgue-, 
&  diga  o  mudo  o  quequi- 
zer,  que  nunca  poderá  di- 
zer tanto  mal  ,  quanto  eu 
fei  decerto  ,  que  ha  ei"a 
mim. 

12  2  Nenhúa  coufi  de- 
fejamais  hum  verdadeiro 
penitente,  que  tomar  vin- 
gança em  fy  das  injurias  de 
Deos :  6c  como  o  juizo  dos 
homens  fe  põem  da  parte 
deíla  vinííanca ,  a  ntes  nos 
ajuda  ,  que  nos  ofícnde. 
Quem  fenaó  aborrece  a 
fy,  diz  Chriílo  ,  naó  me 


gaó  ,  quando  eu  mcfmo     pòdcfcrviraiuim.Ohco- 

mo 


ão  Advento.  \^j 

mo  fc  aborrece  a  fy ,  &  co-     máos,  nem  bons  ,  que  cafo 


mofe  aborrece  de  fy,  hu  in 
verdadeiro  penitente  !  E 
que  fe  meda  a  mim  ,  que 
fejabemjou  mal  julgado, 
quem  eu  aborreço  ?  Se  eu 
conheço  verdadeiramen- 
te a  deformidade  de  mi- 
nhas culpas  5  naó  hey  de 
aborrecer  mais  a  quem  as 
fez,  que  a  quem  as  diz? 

123  O  verdadeiro  pe- 
nitente fó  hua  coufa  eíli- 
ma,&  fô  hua  coufa  teme 
nefta  vida :  fó  eftima  o  que 
pode  dar  graça  de  DeoSjSc 


ha  de  fazer  deíle  juizo  o 
verdadeiro  penitente  ,  o 
qual  fó  hua  coufa  defeja  j 
queheferbom  -,  ^íó  ào, 
húa  coufa  lhe  pefa ,  que  he 
ter  lido  máo. 

124  Feche  todas  eílas 
razoens  hua  maior  que  to* 
das.  O  juizo  dos  homens 
por  mais  que  vos  co-ndc 
nem,  pódevos  impedir  o 
Ceoj  ou  ievarvos  ao  Infer- 
no ?  Naó.  Ponde  agora  de 
hua  parte  todos  os  juízos 
dos  homensj  &  da  outra  os 


fó  teme  o  que  a  pôde  tirar,  voífospeccados  ,  ^  per- 

E  como  o  juizo  dos  ho-  guntai-vos  a  vós  mefmo  , 

mensnaô  pôde  dar  ,  nem  quaes  deíles  deveis  mais 

tirar  graça  de  Deos,  que  fe  temer.  Os  juizos^  àas  ho- 

Ihe  dà  ao  penitente  do  jui-  mens,  ainda  que  façaó  to- 

zo  dos  homens  ?   O  j uizo  do  o  mal,  que  pò demjnemi 

dos  homens,  quando  mui-  podem  dar  Inferno,  neni 

to  lhe  demos,poderà  fazer  tirar  Paraifo:  os  peccados^ 


mal,  mas  naó  pode  fazer 
máos.  Seeufou  bom,  por 
mais  que  me  julguem  mal 
os  homens,naó  me  podem 
fazer  máo.  Seeufou  máo, 
por  mais  que  me  julguem 
bem  os  homens  ,  naó  me 
podem  fazer  bom  •,  &  co- 
mo o  juizo  dos  homens 
naó  tein  poder  para  fazer 


ainda  que  acheis  nelíes 
todos  os  falfos  bens  ,  que 
vos  prometem,  fó  ú\qs  ti- 
rão Paraifo,  &  daó  Infer- 
no. E  como  o  verdadeiro 
penitente  eftà  vendo,  que 
ioosfeus  peccados  o  po- 
dem tirar  do  Paiaifo,  êc  ie- 
vallo  ao  Inferno  j  que  cafo 
ha  de  fazer  dos  juizes  dos> 


.A\ 


'íí 

'1 

1 

1 

n 


158 

homens  ? 
íirn,  &  fó  dospeccados, 
porque  fó  por  clics  o  pôde 
condenar  Ocos.  E  quem 
teme,  que  o  pôde  cõdenar 
Deos,naófclIiedàj  que  o 
condenem  os  homens. 


i2f 


Sermão  da  quar  ta  dominga 
Dos  peccados     tes:  tal  hia  David  naquelle 
paííb  dcfcalço ,  &  choran- 
do feus  peccados.   QLiem 
conhece,que  temoíYendi- 
do  a  Deos,  nenhúa  coufa  o 
ofFende.  Aílim  dei  prezava 
Davido  juízo  dos  homés. 
126       DaMagdalena 
§.  VII.  quem  o  poderá  explicar  c5 

a  ponderaçaójque  merecei* 

SUppofta  a  ver-  HQa  fenhora  taó  principal 
dadedeíladou-  enijerufaiem^taò  fervida, 
trina,  que  poucos,  &  que  taóeílimada  ,ta6  dada  à 
poucas  penitentes  verda-  vaidade,& gaias  >  quem  a 
deiras  deve  haver  hoje  no  viíTe  com  o  toucado  def- 
mundo,  onde  tanto  fe  tra-  prendido  ,  com  o  veílido 
ta  fó  de  agradar,&  conten-  fem  concertOjpela  rua  fem 
tar  aos  homens! Vejam-no  companhia,  em  caía  do 
OS  homens  em  David,  Ôc  Fariíeofem  reparo  ,  toda 
as  mulheres  na  Magdale-  fora  de  fy  (^  ou  toda  dentro 
na.  David,  que  pouco  cafo  em  fy,  porque  toda  era  co- 
fez  das  injurias  de  Semey!  raçaó  naquella  hora  }  os 
DiífeSemey  a  ElRcyDa-  cabellos  dcfcompoílos,  (3 
vid  em  feu  próprio  roílo  as     alabaftró  quebrado   ,    os 


injurias,  que  fenaó  pode 
raó  dizer  ao  mais  vil  ho- 
mem :  quizeraô  remeter 
logoaelleos  queacompa- 
nhavaóao  Rcy,  para  lhe 
tirarem  a  lingua,&:  a  vida : 
&qvic  fez  David  ?  Teve 
m a ó  n cl  1  es, pa ra  que  o  d ei- 
xaílem  dizer.   As  injurias 


olhos  feitos  dous  rios,  lan- 
çada aos  pês  dcChriílo, 
abraçando-os,  &  abraçan- 
dofecomcllcsj  que  diria? 
Valhame  Deos,  Senhora, 
que  mudança  hc  eíla.^Naó 
vedes  quem  íbis  ?  Naó  ve- 
des o  que  fazeis  ^  Naó  vc- 
dcs  o  que  dinió  os  ho'"!!! és  ? 


faô  a  muíic?.  dos  pcnitcn-     Não ;  nada  vejo^quc  quem 

vio 


do  Adwnto.  i^^ 

vio  feiís  peccados,  naó  lhe     rar,  os  irmãos.  Nos  Fari- 


íicaó  olhos  para  ver  outra 
coiiHi.  Naó  vejo  o  que  fou> 
porque  vi  o  que  fui  ^  naó 
vejo  o  que  faço ,  porque  vi 
o  que  fazia.  Jâ  vi  tudo  o 
q  havia  de  ver  nefta  vida, 
&  prouvera  a  Deos  -,  que 
naó  tivera  vifl:o  t^nto.  Jà 
naó  faço  cafo  dos  homens, 
nem  dos  feus  juízos ;  digaó 
oquequizerem. 

127  Três  vezes  foi  a 
Magdaíena  julgada,  &  eó- 
denada  dos  homens.  Jul- 
gou-a,Sc  condenou-a  o  Fa- 


feos  condeneme  a  malícia, 
nos  Apoílolos  condeneme 
a  virtude,  na  irmãa  conde- 
neme a  meí ma  natureza ; 
que  a  quem  tem  maiores 
caufas  para  fentir,naó  lhe 
daó  cuidadoeíras.QuandO' 
as  dores  íàó  iguais,fentem- 
fe  todas  ,  quando  liúa  he 
maior,  fufpende  as  outras. 
A  dor  dos  peccados,  fe  hb 
verdadeira, hc  a  maior  dor 
de  todas,  porque  tem  ma- 
iores caufas,  &  a  quem  ver- 
dadeiramente lhe    doem 


Luc.7. 


Matcb. 
2(5.8. 


Lucu), 


rifeojcham  andolhe  pecca-    feus  peccados,  nenhua  ou- 
dora:  ^uUpeccatrix  efti     tracoufalhe  doe.    Afetta 


Juigaraó-iia ,  &  condena- 
raó-na  as  Apoílolos ,  cha- 
mandolhe  eTperdiçada:  Vt 
qíãdperdítiab£r.]\i\^Q\x-2y 
&condenòu-a  fua  irmãa, 
chamandolhe  ocí®fa :  Re- 
Uqtíít  me  folam  mmiftrare. 
Tudoifto  ou  vio  fempre  a 
Magdaíena,  mas  nunca  fe 
lhe  ouvio  húa  palavra: 
como  fe  refpondèra  com 
o  feu  íliencio:  Condenem 
me  embora  os  Farifeos, 
condenem- me  os  Apoíto- 
íos ,  condenem -me  os  de 
que  meãos  fe  podia  efpe- 


que  ferio  o  coraçaó,defen- 
de  de  todas  as  fettas  >  por- 
queainda  que  achem  cor- 
po>jà  naó  achaó  fentimeii-^ 
to_:  faça  os  tiros  que  qui^en 
o  juizo  dos  hòm.ensí  <iUe  fej 
o  coração  eílà  ferido  áè 
Ekos,  ou  naó  oíl endem,! 
óu  naó  magoaó.  O  amoá 
he  hum  fentimento  ,  que 
faz  íttíenfíveis  :  poriílb  íe^ 
compara  à  morte.  A  mor- 
te faz  infèníi  vela  que  ma- 
ta, o  amor  iníèniivel  a  quê 
ama.  Q«em  trata  fó  de 
amar  a  Deos  ,fó  fente  ha- 
vei!^ 


vcllooífendido :  a  tudo 
maisheinfenfivel. 

127  Exemplos  tinha 
cmfymefma  a  Magdale- 
naj&:  poderafe  argiimen- 
rarafy  coníigo.  Que  im- 
porta parecer  mal  aos  ho- 
mens, fe  eu  parecer  bem  a 
Deos?  Que  importa  pare- 
cer mal  aos  demaisj  íe  eu 
parecer  bem  a  quem  amo  ? 
Quantas  vezes  nas  minhas 
locuras  fegui  os  defprezos 
deite  di£lame?  E  fera  bem, 
quefeja  agora  menos  ani- 
niofo  meu  amor,  &  menos 
refoluto?  Se  eu  naó  repa- 
rei no  que  diriaó  os  homés 


Sermão  ãa  quarta  dominga 


cres  vezes  eftava  a  Mig- 
dalenaaospés  de  Chrjíío, 
Oh  que  grande  remédio 
íaó  ospèsdehumChriílo 
para  hum  homem  fe  lhe 
naódardosjuizos  dos  ho- 
mens í  E  fe  ifto  faziaó  os 
pès  de  Chrifto  vivo ,  quã- 
tomaisospèsdehú  Chri- 
fto morto,  &  crucificado ! 
He  poíUvel,  Senhor  ,  que 
eftejaisneíla  Cruz  julga- 
do, &:  condenado,  fendo  a 
mefma  innocencia,6c  eu 
naó  fofrerei  fer  juIgado,8c 
condenado,  fendo  pecca- 
dor!  Se  a  vós  vos  julgaój 
&  condenaó  pelos  meus 
paraoffender  a  Deos>  re-  peccados,  porque  hei  de 
pararei  agora  no  que  di-     íentir  eu,  que  me  julguem, 


zem,  ou  no  que  diráó  para 
obuícar?  Naó  reparei  em 
que  diffeílem,  que  era  pec- 
cadora  ,  &  repararei  em  q 
digaó,  que  fou  arrependi- 
da ? Jà  que  fofri,  que  mur- 
muraíTem  o  peccado ,  naó 
he  menos,  que  calumniem 
a  emenda? 

128  Ifto  dizia  o  filen- 
cioda  Magdalena  as  três 
vezes,  que  a  condenarão 
os  homens.  Ehe  muito  de 
notar,  que  de  todas  cftas 


&  me  condenem  pelos 
meus?  Emvòs  eftou ado- 
rando as  injurias  ,  &  as 
afrontas 5  &  em  mim  naó 
as  hei  de  fofrer  ?  Para  vos 
oíi"cndcr,6c  me  perder5naõ 
reparei  no  que  diriaó  os 
homensi  &:  para  vos  amar, 
ôcmefalvar,  repararei  no 
quediraó?Naó  he  ifto  o 
que  vós  me  cnílnais  nefia 
Cruz. 

129     Ouvi    húa  coufi 

grande,  cm  que  parece, 

que 


Exod. 


dô  Advento.  i^j 

que  mudou  de   condição  Quereis  ir  ao  mudo  ?  Que- 

Deos.  Quando  Deosquiz  reis  aparecer  entre  os  lio- 

caftigar  o  poyonodefer-  mens?   E  não  reparais  no 

to,  allegoulhe  Moyfes  o  que diráó, &  he  certo,  que 

quediriaó  os   Egypcios:  haó  de  dizer  de  vos  ?  Haõ 

Nequ£fo  dicãt  <:j)Egyptij  i  dè  dizeri,  que  fois  hum  Sa*-' 

^deixou  ó  Senhor  de  os  màritano,  &  endemoni- 


Jofu 
9- 


Pftlm. 
78.10. 


caíligar.  Quando  Jofue  te 
ve  a  primeira  rota  na  terra 
de  PromiíTaô  ,  allegou  a 
Deosoquc  diriaó  os  Ca- 
naneos:  ^id fades  mag- 
no nomimtuo;Sc  continuou 
o  Senhor  a  favoreceJo. 
Quando  o  Rey no  de  Ifrael 


nhado :  Samaritanus es  tUy^^^^  g, 
&  T)/emomum  babes ;  ha54S.  "  '' 
de  dizer,  quefoís  hú  blas- 
femo ;  Blasphemavit  3  haó  fô!^^; 
de  dizer,  que  fois  humeri- 
ganador :  Sedutor  tile  5  haó  ^^"^^ 
de  dizerjquefoishum  per-  *^"^^* 

^_ j ._ ... ^.^.     turbador  da   Republica : 

eílava  mais  .afli£to ,  repre-     Subvertentem  gentem  no-  ^^^''^^'^ 
íentouDayidaDeosoqiíe    firam  •  haó  de  dizer,  que 

ttnàç,s  padlo  cóo  Demó- 
nio :  InBeelzebub  Trincipe  lucúj 
^amoniorum  ejicit  ^^-  'f- 
nionia  3  haó  de  ^áizer,  que 
TOS  naó  podeis  íalvar  :  Se^^^: 
ipfum  non  poteftfalvumfa  - 

x„  '  o —     ^^^^  ;  haó   de  dizer iiíial- 

NedicdnfyO que  diráó  os     mêteiníinitos  opprobrio^ 
homens.  Determina  Deos     contra  vos  :    SuturabãiM^^'^^ 

oppTobrijs,  MáiiHaíe  díe^^^"^ 
levantar  hum  Arrio,  que> 
ha  de  dizer,  que  naó  fois- 
confuftancial  ao  Padr^^i 
haíède^íev^anta]:-  hum  MÁ 
líMieoyqueha  de  dizérs 
que  naó  fois  horaemj  hafe 
de  levantar  hum  Nefto„^* 
rio-» 


diriaó  as  Gentes ;  Ne  forte 
dicant  inGentibus-i^  ceííbu 
a  aflição.  De  maneira,que 
o  remédio ,  que  tinhaó  os 
Patriarcas  antigos  para 
alcançar  dé  Deos  o  que 
queriaó ,  era  alíegarlhe  hu 


de  vira  terra  a  remir  ,  & 
falvar  o  mundo  3  6c  fe  alli 
feachaíle  Moyfes, Jofue, 
ou  David  com  o  efpirito 
profético,  que  tinhaó,  pa- 
rece quíe  poderão  íazet*^ 
Deos  a  mefma  replica. 
Como  aíFím  ,  Sçnhor  ? 


,VÍi'i 


l^t  Sermão 

rio,  que  ha  de  dizer  ,  que 
naófoisDeos;  hafe  de  le- 
vantar hum  Cal  vino,  que 
ha  de  dizer,  que  nãò  eftais 
no  Santiííimo   Sacramen- 
to j  haofe  de  levantar  infi- 
nitos  Hereílarcas  outros, 
que  haó  de  dizer  contra 
VoíTa  Divindade,  6c Hu- 
manidade infinitas  blasfé- 
mias. Pois  fe  Deos  eftava 
prevendo  tudo  iílo  j  &  le 
antigamente  podia  tanto 
com  Deos  o  que  diriaó  os 
homensi  porque  agora  faz 
taò  pouco  cafo  do  que  di- 
rão? Porque  antigamente 
cncontravafe  oquediràò 
dos  homens  com  o  noílo 
caftigo  ,  agora  encontra- 
vafecomo  noíTo  remédio: 
&  quando  o  que  diráó  dos 
homens  fe  encontra  com 
o  noíTo  caftigo   ,    deixa 
Deos  de  caftigar  pelo  que 
diráó :  mas  quando  o  que 
diráó  dos  homens  fe  en- 
contra com  o  noílb  remé- 
dio, pelo  que  diráó  os  ho- 
mens, naõ  deixa  Deos  de 
faivar.  Và  por  diante  o  ne- 
gocio da  faivaçaój&digaó 
os  homens  o  que  quizeré. 
Çljriftãos  ,  ha  alguns  de 


'arta^omínxà 
nós  tao  pufillanimes,  que 
por  medo  do  que  diráó  os 
homens  deixamos  de  fa- 
zer muitas  coufasjque  im- 
por taó  à  noífa  falvaçaó. 
Deos  nos  livre  de  hua  co- 
vardia como  efta.  Faça- 
mos por  noíTa  falvaçaó,  o 
que  Deos  fez  pela  noíla. 
Deos  por  me  faivar  a  mim, 
naófez  cafo  dojuizo  dos 
homens,  &ferá  bem  que  o 
faça  eu  ?  Façafe  tudo  o  que 
forneceífario  à  falvaçaó, 
êcdigaó  os  homens  o  que 
quizerem.  Que  importa 
fer  bem  julgado  dos  ho- 
mens ,  fe  vós  naó  vos  faU 
vais  ?  £  fe  vos  vos  falvais , 
que  importa  fer  mal  jul- 
gado dos  homés?  Eis  aqui 
comoojuizo  dos  homens 
fe  defpreza  no  juizo  da  Pe- 
nitencia: Tradicans  bap^ 
tí/mum  'Panitenti^e. 


C  Mendado    no 


^5^  - 

juizo  da  Peni- 
tencia o  juizo  de  fy  mef- 
mo,&dcfprezado  o  juizo 
dos  homens  •,  refta  fó  por 
julgar  o  juizo  de  Dcos,quc 

CO- 


w 


BééMI 


ào  Advento^.       v,  145 

como  temos  dito  ha  de  fair    grandeza,&temerofa  Ma- 


revogado  nelle  juízo.  Os 
outros  dous  juízos  entra- 
rão a  fer  julgados,  &  apa- 
recerão diante  do  tribunal 
da  Penitencia.  Do  juízo  de 
Deos  naõ  fei  como  me 
atreva  a  dizer  outro  tanto. 
Naó  he  o  juízo  de  Deos 
aquelle juízo  fupremo ,  q 
naó  fó  naó  reconhece  fu- 


geftade,  que  no  ultimo  ài% 
do  mundo  o  fará  horrível  j 
&  tremendo.  Naó  traz  di- 
ante as  varas ,  &  fecures 
Romanas ,  iníignias  da  fu« 
premajuftiça,  &  authori- 
dadejmastraz  aquellaeí^ 
pada  de  dous  gumes :  Gla-  k^oci2 
díus exutrat^ue  parte  àcu-'^^'^'^'^^- 
tus :  que  ligniíicaó  as  duas 


perior,  mas  nem  pôde  ter  penas  de  dano,  &  de  fenti 

igual  no  Ceo,  nem  na  ter-  do,  a  que  fó  o  juízo  de 

ra  .?  Náo  he  o  juízo  de  Deos>& nenhum  humano, 

Deos  3  de  que  falíamos,  pôde  condenar  naó  fô  os 

aquelle  ultimo,  &  univer-  corpos,  mas  também  os  ef- 

fal  juízo,  onde  fem  appel-  pintos.   Oh  que  authori- 

laçaó,iiem  aggravo  ,  fe  dadetaó   fevera  í  oh  que 


iaó  de  abjíbIver,ou  conde- 
nar  para  toda  a  eternidade 
aquelies,  que  nelle  forem 


jurdiçáo  taó  horrenda  \  oh 
que  inílru  m entos  taó  for- 
midáveis !  Se  aílim  faz  tre- 


julgados,  que  haó  de  fer  mer  o  juizo  de  Deos  quá- 

todos  os  homens  ?  Pois  co-  do  aparece  a  fer  julgado , 

mo  pode  fer,  que  haja  ou-  que   fera  quando  vier  a 

trotribunaljQomundo,em  julgar] 


queafentença  defte  juizo 
fe  revogue  5  ou  como  pôde 
fer  revogarfe  > 

131  O  como  veremos 
logo :  agora  vejamos  en- 
trar o  juizo  de  Deos ,  & 
prefentarfe  diante  do  tri- 
bunal da  Penitencia,  acõ- 


132  Mas  qu  e  faz  a  PèV 
nitencia,  ou  que  pôde  fa-r 
zerpara  revogar  efte  tao 
abíblu  to,&  taó  indepêdenr 
te  juizo  >  Faz  quafi  o  mef. 
mo  que  para  os  demais. 
Para  emendar  o  juizo  de 
^y  mefmo  ,    abrenos   os 


panhado  de  toda  aquefía    olhos  ;  para  deiprezar  q 


loel.2. 

IO. 


Í44  Sermão  da quarfa^ominga 

juizo  dos  homens5tapanos  ftinebit  enml  conclue  com 

òs  ouvidos:  para  revogar  o  eílas  palavras :  'Ktmc  ergo , 

juízo  de  DeoSj  vokanos  o  dicit  T>ommus  y  converti- 

coração.  Em   dando    húa  mini  ad  me  in  totó  cor  deve- 

volta  o  coração,  eílà  o  jui-  ftro.  Vedes  todos  eftes  ap- 

zo  de  Deos  revogado.  Fal-  paratos ,  todos  eftes  rigo- 


Ibid. 1 ; 


la  o  Profeta  Joel  à  letra  do 
juizoíinalde  Deos  :  à^í- 
creve  o  Sol,a  LuajSc  as  Ef- 
trellas  efcurecidas  ,  &  o 
Ceo,&:aterra  tremendo  à 
íua  vifta ;  Afacieejus  con- 
tr  emiti  t  terra^motifimt  Ca- 
li :  SoUér  Luna  obtenebrati 
funty&  StelU  retraxerunt 
fplendoremfuíim :  defcreve 
os  exércitos  innum craveis 
de  Anjos  armados  de  ri- 
gorjSc  obediência,  de  que 
o  Senhor  fahirà  acompa- 
nhado  como  executores 


reSj  todos  eftes  afibmbros 
de  ira,  de  juftiça  ,  de  vin- 
gança .^  com  dar  húa  volta 
ao  coração  eftà  tudo  aca- 
bado. Voltai  o  coração  a 
mim,ou  voltaivos  a  mim 
com  o  coração  ,  diz  Deos , 
&  toda  a  íentença  que  efti- 
verfuhninada  contra  vos 
nefte  meu  juizo,  ficará'  re- 
vogada :  Nunc  ergo ,  dicit 
T^ominus^  convertimini  ad 
me  intoto  corde  vejiro.  No^ 
t^io  nunc  ergo  :  pelo  que 
agora :  de  maneira  que  a 


de  fua  juftiça,6c  vingança  :     penitencia  ha  de  fer  ago 
Seminus dedit  "vocemjuam     ra,&o  juizo  ha  de  fer  de 


antefaciem  exercitus  fui^ 
qitia  multafunt  nimiscafira 
ejusy  quiafortía ,  érfacien- 
ttaverbumejus  :  defcreve 
finalmente  a  grandeza,  & 
terribilidade  daquelle  te- 
merofo  dia :  Magnus  enim 
dies  Thmini ,  ò'  terribilis 
íbiJ  i^.  «jalde:  &  perguntando  que 
haverá  no  mundo,  que  o 


pois.  Efta  dift<:rença  ha 
entre  o  juizo  de  Dcos,&:  o 
juizo  dcs  homens:  no  jui- 
zo dos  homens  appellafe 
depois,  no  juizo  de  Deos 
appellafe  :^ntcs.  Nunc  ergo: 
Agora, agora,  Chriftáos; 
que  agora  he  o  tempo  -,  & 
porque  agora  fim  ,  &  de- 
pois naó  ?  Porque  depois 


poffa  foportar :  Et  qtusfu^    luò  pôde  haver  pcniten» 

cia. 


1- '■      doAd^ventd.  145- 

Ati  ficin.  Se  depois  do  dia  do    defmedidamente  grande^ 
.'juizo  pudera  haver  peni-     que   naó  pode    chegar  à 


tencia,  poderafe  revogar  a 
íentença  do  juizo  de  Deos: 
mas  a  razaó  porque  aqueí- 
lafentença  fenaó  poderá 
revogar  entaó  >  he  porque 
náó  ha  tribunal  da  Peni- 
tencia fenaó  agora  :  Kunc 
ergo.  Mas  vejamos  jà  os 
poderes   defte    tribunal. 


praça,  onde  eflava  o  Paço, 
menos  que  ao  cabo  de  crés 
dias.  Soou  a  fentença  nos 
ouvidos  do  Rey,  &  que 
vos  parece,  que  faria  ?  De- 
cefe  do  tronoReal  em  que 
fe  aílentavaó  fcmpre  os 
ReySy  conforme  o  coftu- 
me  daquelles  tempos ;  raf- 


por  hum  exempio>  &  fej  a  o  ga  a  Purpura,  veftefe  de  hu 
iiiãior,  que  ouve  nomun-  afpero  cilicio  ^  tira  a  Co- 
do-idaimç  áttençaó,         >     roaj  lança  da  mão  o  CetrOi 

cobre  a  cabeça  de  cinza:  &: 
malida  que  vaó  feguindo  a 
Jonas  com  outro  pregão, 
em  q  íedigãi  que  faça  to- 
da a  Cidade  o  que  ElRey 
fazia.  Ò  pregaó  de  Deos 
hia  diante  ,  o  pregaó  do 
Rey  hia  atraz :  o  pregaó  de 
Deos  para  fe  executar  dal- 
li  a  quarenta  dias  ,  p  pre- 
gaó do  Rey  para  que  fe 
£xecucaíre  Ipgo,  &  alllm  fe 
fez.  Veftiofe  de  cilicio  a 
Rainha ,  veíliraófe  de  ci- 
licio as  Damas,  veíliraófe 
de  cilicio  os  Cortefaós,  ve- 
íliofe  de  cilicio  todo  o  Po- 
vo 5  &o  que  fenão  poderá 
crer,  fe  o  naó  differa  a  Ri- 
çritura,  veíliraófe,  &  cu- 
K         brifaòfe 


^.  IX. 

Oi' j  .  •.  -  .  -  .  ...  .  ■:.■  _  i  .:\ 
^.  ^f  331  CNcraô  Profe- 
•il^íii-.  -  JCLca  Jonas:  :prê- 
gandò,ou  apregoando  pe^ 
Ja  Cidade  de  Ninive:^'<3^- 
huc  quadragmta  dies  ,  á* 
Mtnive fubvertetur:  Daqui 
a  quarenta  dias  fe  ha  de  fo? 
verter  Ninive.  Era  eíla;  á 
fentença,  que  eílava  dada 
no  tribunal  da  divina  juíli- 
ça  pelos  peccados  daquel- 
Ja  Cidade,&:  o  Profeta  naò 
fazia  mais ,  que  officio  de 
hum  notário  de  Deos,  que 
a  publicava. Com  eíle  pre- 
gaó andou  Jonas  por  toda 
a  Cidade ,  a  qual  era  taa 
Tom.  7.^ 


1 46  Sermão  da  (quarta  T^ominga 

briraõfe  também  de  cili-     mento algu m.  PaíTouaíllm 


cio,  para  horror,  &  aíTom- 
bro  dos  homens  ,  atè  os 
mefmos  animais.  Defta 
maneira  foi  paífando  a  Ci- 
dade todos  aquelles  qua- 
renta dias  em  continuo  je- 
jum, em  continua  oraçaó, 
em  continuas  lagrimas,  & 
clamores  ao  Ceo.  Chega- 
do o  ultimo  dia,  retirouíe 
Jonas  a  hum  monte,  para 
ver  como  Ninive  fe  fover- 
tia:  Aportara  elle  às  prayas 
de  Ninive,  fupponhamos, 
que  às  nove  horas  da  ma- 
nháa ,  &  quando  ou  vio  dar 
as  oito  daquelle  dia  :  Ab 
mifera  Cidade,  quejánaó 
tereftamaisquehúa  hora 
de  duração !  Jà  fe  vè  a  fuf- 
penfaóem  que  paíTaria  o 
Profeta  toda  aquella  hora. 
Tocãoásnovc  :  eis  lá  vai 
Ninive.  Aílimfe  lhe  figu- 
rou a  Jonas  quafi  deflum- 
bnido  entre  o  lume  dos 
olhos,&o  da  profecia;mas 
Ninive  ainda  Ic  tinha 
mão.  As  fuás  torres  eíla- 
vaó  mui  direitas  :  os  mu- 
ros eítavão  muito  firmes: 
&:  nem  a  cafa  que  dantes 
citava  para  cair  fez  movi- 


a  primeira  hora  ,paííbu  a 
fegunda,paírou  o  dia  todo, 
&:Jonas  a  benzerfe  ,  &  a 
pafmar.  Queheiílo  ,  Se- 
nhor ^  Que  he  da  fé  de  vof- 
fas  palavras  ?  Que  he  dá 
verdade  de  voíTos  Profe- 
tas >  Náo  eftava  determi- 
nado no  tribunal  de  voílà 
divina  juítiça,  que  Ninive 
foíTe  fovertida  por  feus 
enormes  peccados  ?  Não 
eftava  alUnado  o  termo 
precifode  quarenta  dias, 
para  a  execuçaó.^Não  efta- 
va  notificada  por  voílb 
mandido  efta  fentenca  ? 
Nãoíbueuo  que  apubli- 
quei.<^Pois  como  agora  fal- 
ta tudo  ifto  ^  Como  paíTaó 
os  quarenta  dias  >  Como 
fica  a  minha  profecia  fem 
comprimento  ^  Como  fica 
Ninive  em  pè  ,  &  a  vofla 
palavra  por  terra?  Se  o  dif- 
feílesjfoi  porque  otinheis 
decretado-,  6c  fe  o  tinheis 
decretado,  porque  naó  fe 
executou  ?  Porque  o  Rey, 
&  Povo  de  Ninive  foraó 
táodifcretos,  que  fcndo- 
Ihc  notificada  a  fentenca 
do  juízo  de  Deos,  apocllá- 
raó 


34 


ãúAãtíentê.  147 

f  áo  para  o  tri bunal  da  Pe-     dere  excldkm  >  quiafejpon^ 
nitencía.  E  he  táo  fupo  .      ^  ^  • 


rior  a  jnrdiçáo  do  tribunal 
da  Penitencia  ,  que  o  que 
nojuizode  Deos  fe  fen- 
tencea,  nojuizo  da  Peni- 
tencia fe  revoga.  DiíTefu- 
perior  ,  porque  fe  eíles 
dous  juízos  foraóiguaes, 
aílim  como  no  juizo  da 
Penitencia  fe  abfolve  ,  o 
que  no  juizo  de  Dcos  fe 
condena  j  aílím  nojuizo 
de  Deos  íe  podéra  conde- 


tanets  luBibus  cruciando 
dívinamfententia-m  prave- 
neruntfua.  Os  Ninivitas , 
diz  S.  Paulino ,  impedirão 
a  execução  do  caíligOjque 
jàlhe  eílava  denunciado , 
porque  condenandofe  a 
voluntária  penitêcia ,  pre- 
1'^eniraó  a  fentéça  de  Deos 
com  a  fua.De  maneirajque 
por  beneficio  da  Peniten- 
cia pode  mais  a  fentença, 
que  os   Ninivitas  deraó 


narjO  que  no  juizo  da  Pe-     contra  fy,  que  a  fentença , 


nitencía  fe  abfoiveíTe:  mas 
he  taó  fuperior  o  juízo  da 
Penitencia  febre  o  mefmo 
juizo  de  Deos  [  por  excef- 
íb  de  mifericordia  fiia  ] 
q  o  que  no  juizo  de  Deos 
fc  condenajno  juizo  da  Pe 


que  Deos  tinha  dado  con- 
tra elles;  ^  ivinamjent  en- 
fiam pravenerunt  Jua.  Oh 
grande  dignidade !  oh  gra- 
de foberania  da  Penitéciaí 
No  juizo  íínal  de  Deos 
C  ide  notando  comigo  grã- 


nitencia  pòdefe  abfolver  5  des  diferenças,  &  grandes 
mas  o  que  no  juizo  da  Pe-  excellencias  do  juizo  da 
riitenciafeabíolvòínojui-  Penitencia  fobre  o  juizo 
zo  de  Deos  naó  fe  pôde  de  Deos.  )  No  juizo  final 
condenar.  Bemdito  feja  de  Deos,  não  he  licito  ap- 
elle:  §lui  dedit  fotejtatem     pellar  de   huni  attributo 

divino  para  outro  atf ribu- 
to.  Não  he  licito  appellar 
da  jufl-iça  de  Deos  para  fua 
mifericordia :  no  juizo  da 
Penitencia  ,  he  Ikito  ap- 
pellar da  juíliça  de  Deos, 
K  ij         para 


talem  kommibu^y^^i  ^í 
-  1 3  f  Tu  do  o  qbè  tenh  o 
dito  he  literal  •,  mas  ouça- 
mospara  maior  confirma- 
ção a  S.Paulino :  Niniijit£ 
meruerunt  denunttatú  eva- 


i 


II* 


^  4^  ■  Sermão  da  -quarta  T>07ntnga 

para  alminha  juííiça.  No     Deos  huns  fahcm   abfol- 


juizofinaJ  de  Deos  naó  fe 
pôde  appellar  do  Fiiho 
para  o  Padre,  nem  do  Pa- 
dre para  oFilho,neaido 
Padre,  &  áo  Filho  para  o 
EfpiritoSãtOj  emfumnia^ 
no  juizo  de  Deos  naó  fe 
pode  appellar  de  Deospa- 
ra  Deos:  no  juizo  da  Pe- 
nitencia pojfTo  appellar  de 
Deos  para  mim.  No  juizo 
final  de  Deos  íaô  condena- 
dos os  peccadores  a  nani 
vera  Deos  j  no  juizo  da 
Penitencia  faó  condena 


tos,  outros  fahem  conde- 
nados j  no  juizo  da  Z^eni- 
tencia  ninguém  fe  conde- 
na, todos  fahem  abfoltos. 
No  juizo  final  de  Deo^j 
manifeílãofe  os  peccados; 
a  todos  os  homens  \  no  jui- 
zo da  Penitencia  maiúfe- 
ftaófc  a  hum  fó4i£)mem. 
Finalmente  no  juizo  final 
de  Deos,  Chriílo  ha  de  fer 
ojuiz*,  no  juizo  da  Peni- 
tencia ,  Chrifto  he  oavo- 
gado:  Si  quis peccaverit^ad- 
iJocatU  habemtts  apnd  Ta-  loana.; 


dos  os  peccadores  a  naô  trem  Jeftm  Chrifium  ju 

o  ofFenderrque  fuaveco-  7?«;^.  Vede  com  tal  avoga4 

denaçáo!  No  juizo  final  de  do  no  tribunal  da  Penité- 

Deos  naó   aproveitão  ia-  cia,quedifferença  haVerà. 

grimas,  nem  prantos  ;  no  doavogarao  revogarlCo- 

juizo  da  Penitencia  baila  mo  naó  fera  revogado  o 

húa  fó  lagrima  para  todos  juizo,  aonde  he  avogado  o 

os  peccados  do    mundo.  Juiz !  aífimfe  revoga  o  jui- 


2.1. 


No  juizo  finai  de  Deos 
não  yalem  interceíToens  > 
no  juizo  da  Penitêcianaó 
faó  neceíla rias.  No  juizo 
.final  de  Deos  condenaófe 
os  peccadores  pelos  pec- 
cados j  no  juizo  da  Peni- 
tencia condenaófe  os  pec- 
cados, &■  falvaôfe  os  pec- 
cadores. No  juizo  final  de 


zo  de  Deos  no  juizo  da 
Penitécia :  Tradicansbap- 
tifmuín  panitenti/e.  E  te- 
mos o  juizo  de  Deos  revo- 
gado,o  juizo  dos  homens 
deíj>rezado  ,  &:  o  juizo  de 
fy  mefmo  emendado. 


5.x; 


^ 


eílãoin Ditos  tem  chega- 
do i  para  os  que  eíláo  mor- 
rendo ckega^  para  os  que 
élláo  YÍ¥0s' V èm  chegado ) 
A  huíis  checará  mais íedoi 
a  outros  n\ :: is  tarde,  mas  a 
todoj»inuito  brevemente: 
Efta  he  a  cófideraçãamais 
nitenciai&  fuppoílo  que  poderjofa  de  todas  ,  para- 
elles  faô  taó  grandes ,  que     rios  mover'  à  penitencia 


í.  X. 

iOliíi  o:íí>    ,.  ?Àcjq 

fuppofto  que 
todos  os  m2 !  ^^ ,  6c  perigos 
que  temos  viíi^  neílesjui 
zos  tem  o  remédio  lui 


^.^re-f 


abração  todos  os  bens  da 
vida,  &  todos  os  da  eter- 
nidade i  que  refta  a  quem 
tem  fé,  ^  a  quem  tem  ef- 
perança ,  fenaó  tratar  de 
fezer  penitencii  ?  y^gite 
píenitétiam  approp^nqu  i'va\ 
mim  Regnmn  dekrvin :  fa-i 


Zêi  peniten c  i  i,  p.orqr e  h'iá 
chegado  o  ReyrK^-uí)  Ceíi^v 
Ha  mil  5c  fciíi.  "'>.ros 
nos, que  o  Brj„.r:  ■  ^.i8b 
eftas  palavras ,  5r  nó^  cita-^ 
mos  dizêdo  todos  os  dias : 
Adveniat  Regmim  tuum. 
Pois  fe  o  Rcyno  jà  entaó 
era  chegado,  como  pedi- 
mos nós  ainda  agora,  que 


Façaníos  penitêcía ,  C  hri- 
ftáos,  não  nos  ache  a  mor- 
te impenitentes.  Nenhum 
Chriftão  ha,  que  não  digi» 
que  ha  àc  fazer  peniten- 
cia ,  m?.3  nenhum  a  queií 
co.acç?i '  jgo,  todos  a  dei-» 
ySxo  pai.  o  fím  da  vida: 
"Ei'£dií.:KS  baptífmum p^r 
....  iici:ntíi€m  rjmJJIonem pAC". 
agi:  ,íç'S^ír]?/35%:íiÊb£atóíla  prèás 
givabautifmo  de  penité- 
€Í:-  para  remiíTaó  dos  pee- 
cados.  Se  queremos  remií- 
feòdepeccados,  tomemos 
a  penitencia  como  bautiA 
mo.  Todos  queremos  a 
penitencia  como    Extre- 


venha?0  Reyno  dos  Ceos     ma-unção,  là  para  o  fím  da 
emtodos  os  tempos, teni     vida :  naq  fe  .ha  de  tomar 


tit:s  eftados :  hum  em  que 
tem  chegado,  outro  em q 
chega ,  outro  em  que  vem, 
chegando.  Para  os  que 
Tom./. 


íènaócómo  bautirmojque 
náo  he  licito  dilatallo  a 
quem  tem  fé.  Se  tendes  fé 
como  naõ  fazeis  peniten- 
K  iij        cia? 


i 


V7^'1 


Tf  O  Sermão  da quarta  T>omhiga 

cia?E  fe  tendes  propofico     Que  motivos  de  vos  con- 


de  a  fazer,  6c  de  vos  con- 
verter a  Deos,  para  quan- 
do a  dilatais  ?  St  aliquando 
curnon  modò^  dizia  S.  Ago- 
llinho.  Se  me  hey  de  con- 
verter em  alg4jm  tempo, 


verter  haveis  de  ter  de- 
pois ,  que  agora  naó  te- 
nhais ?Se  depois  haveis  de 
fazer  verdadeira  peniten- 
cia, a  qual  naó  pode  fer 
verdadeira,  fem  verdadei- 


eíTe  tempo  porque  náo  fe-     ra  contriçãojha-vos  de  pê- 
ra hojer  Efta  pergunta  naó     far  de  ter  oiFendido  a  Deos 


temrepoíia.  Nem  o  mef- 
mo  Santo  Agoftinho  lha 
achou j nem  os  Ariíloteles, 
nem  os  Platoens,  nem  os 
Anjos  do  CeOíneniomef- 
mo  Demónio  do  Inferno 
lha  pode  achar  jamais  pa- 
ra nos  enganar. 
;  137  Chriíláos  da  mi- 
fíhà  alma,  fobre  t3ntos  jui- 
zos>bem  he  que  venhamos 
a  contaSv  Se  me  ouve  algu, 
que  efteja  refoluto  de  nam 
fe  converter  jà  mais  5  naó 
fal:ocomeilej  mas  fe  ten- 
des propoíitos  de  vos  con- 


por  fer  elle  quem  he ;  pois 
Deos  hoje  não  he  o  meí^ 
mo,  que  ha  de  fer  depois? 
Náo  he  a  mefma  Magefta- 
de,  náo  he  a  mefma  gran- 
deza^ náo  he  a  mefraa  om- 
nipotência /  Náo  he  táo 
bom,  não  he  táo  amável, 
como  ha  de  fer  entáo  ? 
Pois  fe  entáo  o  haveis  de 
amar,  porque  o  náo  amais 
agora?  De  maneirajpecca- 
dorjque  Deos  então  ha  de 
fer  digno  de  ícr  amado  fo- 
bre todas  as  coufas,&  ago- 
ra he  digno  de  fer  otFendi- 


verter.\S>  ãltquarJo  cur  non  do  em  todas  /  Si  ah  quando 

modo  ?  Se  tendes  propofi-  cur  non  modo  ?  Mais :  fc  de- 

tos,&  dizeis  ,  que  vos  ha-  pois  vos  haveis  de  arrepê- 

veis de  converter  depois,  der  bem,  &    verdadeira- 

porqueonaó  fazeis  agora.^  mente  ,  he  força  que  vos 

Que  motivos  haveis  de  ter  pczedetodoo  coração  de 

depois,  que  agora  náo  te-  vos  não  haveres   arrcpen- 

nhais.^  Apertemos  bem  ef-  dido  agora  :  pois  que  locu- 

te  ponto  :   cílai  '       '                    '       ' 


comigo. 


ra  hc  eílares  agora  fazédo 
ror 


por  voíTo  gofto  ,  &  por  eííaidadeimasfcao  Infer- 

voíTa  vótade  aquillo  mef-  no  fe  vai  de,  fete  annos, 

mo,  que , nefta  hora  eílais  porque feha de  guardar  a 

propondo  de  vos  pefar  de-  emenda  para  os  íecenta? 


pois 


de  todo  coração  ?  Ou  Pois  fe  as  meímas  razoes, 

entaó  vos  ha  de  pefar  >  ou  &  os  mefmos  motivos,que 

naó  :  fe  vos  ha  depefar,  havemo»  de  ter  depois,  te- 

condenais-vosj&  fe  vos  ha  mos  agora,  fe  entaò  nam 

de  pefar,  6c  propondes  de  havemos  de  ter  neníium^ 

vos  pefar,  porque  o  fazeis?  coufa  mais>  que  agora,  fal- 

Se  vos  ha  de  pefar  depois  vò  mais  peccados  q  cho- 

do  prefente  ,  porque  vos  rar^Sc  mais  culpas  de  que 

naó  pefa  agora  do  paífado?  nos  arrepender  :Sí  aliqu^ 

Si  ali  quando  ciir  non  modo  ?  do  cur  non  modo  7 


Mais  :  fe  os  motivos  dç 
voíTo  arrependimento  naò 
haó  de  fer  contrição  per- 
feita, nem  amor  de  Deos 
fobre  codas  as  coufas,fenaó 
temor  das  penas  do  Infer 


do  cur  non  modo  ? 

138  Mas  atègora  hi- 
mos  argumentando  en^ 
húa  fuppoíiçaó,que  eu  naò 
quero  conceder  daqui  por 
diante  ,  porque  vos  quero 
defenganar  de  todo.Quem 


no  fomente:  Si  aliquando  á\z\  Si  aliqttando  cur  non 

cur  non  modo  ?  Se  por  tei-  modo  :  fe  vos  haveis  decó- 

mor  do  Inferno  voshaveis  verter  depois,  porque  vos 

de  arrepender  entaò',  por-  naò  converteis  agoraj  fup- 

quevos  naó  arrependeis  põem  que  fe  vos  naó  con- 

agora  por  temor  do  Infer-  verteres  agora  ,  que  vos 

no  ?  Por  ventura  foftes  jà  haveis  de  cóverter  depois, 

ao  Infernojôc  perguntares  Eu  naó  quero  admitir  tal 

pela  idade  dos  que  là  eílaó  fuppofiçaó  5  porque  quero 

ardendo  ?  Se  no  Inferno  rnoftrar  o  contrario.  G hri- 


naó  ardem  fenaó  os  ho- 
mens defetenta,  &  de  oi^ 
tenta  annos  ,  guardai  em- 
t)oraa  volla  emenda  para 


ftáosj  fe  vos  não  converte- 
res agora ,  ordinariamente 
faIlando,naó  vos  haveis  de 
converter  depois.  Deme 
K  iiii         li- 


i': 


Nfii 


'^1f. 


ml 


MS 


r,u 


^*^  .  Serniâõ  da  quarta  T)ommgà 

licenças.  Agoftinho  para  defefperara  ningiiem,né 

trocara  fua  pergunta  ,  &  quero  dizer,  que  a  falvacaó 

apertar  mais  a  difficulda-  naó  he  poílivel  em  todo 

de.  S.  Agoílmho  diz  :  Si  tempo :  o  que  fô  vos  quero 

atiquandocnrnonmodÒ-.Ãt  perruadir,he  oque  dizem 

nos  havemos  de   conver-  todas  as  Efcrituras,  &:  to- 

ter  depois,porque  naÓ  nos  dos  os  S^intos.  Que  os  que 

convertemos  agora  ?  Eu  deixão  a  penitencia  para  a 

digo :  Si  non  modo  cur  ali"  hora  da  morte  ,  ou  para  o 

quando  /  Senão  nos  cóver-  fím  da  vida,  tem  muito  ar- 

temos  agora ,  porque  cui-  rifcada  fua  falvacaÓ,  por- 

damos,  que  nos  havemos  que  raramente  fe  falváo: 

de  converter  depois  ?   As  Si  non  modo  cur  aliquando? 

razoens,  que  haveis  de  ter  Senaó  vos  converteis  ago- 

depois  para  vos  converter,  ra,  que  tendes  vida ,  como 

todas  eífas,  &  muito  maio^  vos  haveis   de  converter 

'retendes  agora    :  pois  fe  depois,  quando  pode  fer, 

■eítasi-;?âzoens  naÓ  baftaó  que  a  não  tenhais?  Dizeis, 

♦pafa-v<)S converter  agora:  que   vos   não   convertei^ 

comohaõ  de  bailar  huma-  agora,  mas  que  vos  haveis 

namentepara  vos  conver-  de  converter  depois-  acíe 

terdepois?  Aforra  defta  o  depois  fora  o;ora?Sem-or- 

razaó  fez  enforcar  ajudas,  reres  no  eftado  prcfcntc, 

-Fez/udas  confígo  eíte  dif-  fe  naô  chegares  a  eíTe  de- 

-<:urro :  maiores  miotivos  do  pois,  que  ha  de  fer  de  vós  ^ 

que  eu  tive  para  me  con-  Quantos  amanhecerão,.^ 

•vercerínão  faó  poíTiveis,  naó  anoitecerão  IQiiantos 

a^orq  tive  o  meímo  Chn-  fedeitáraóà  noite,  &  nam 

i-l^/f^"^   P^^  :  pois  fe  JelevãtáraÕpekmenhãa! 

Chriítoameuspèsnaófoi  Qiiantospoítos  i  meíli  OjS 

-baftante  motivo  para  me  -  afogou  hum  bocado!  Quá- 

converter,  naó  me  íica  que  tos  indo  por  húa  rua  os  fe- 

efpcrar  ,  venha  hiim  laço.  pulrou  húa  ruína  !  A  quã- 

••  Chriíláosj  cu>  nani  quero  ..  tos  levou  húa  baila  naó  ef- 

t ^*  *'  perada! 


do  Advento.  if^ 

perada!   Quintos  endou-    deixar  com  o  juizOjSc  com 


ciecéraó  de  repente  !  A 
quantos  veio  a  febre  junta 
como  dilírio  !  A  quantos 
hum  efpafmo,  a  quantos 
liua  apoplexia ;  a  quantos 
infinitos  accidêtes  outros, 


a  liberdade  ,  que  pede  a 
matéria  de  maior  impor- 
tância: quando  jà  aspotê- 
ciasefbaráófórade  feu  lu- 
garj&vós  mefmo  não  ef- 
tareis  em  vós  ,  como  cui- 


que  ou  tiraó  o  ufoda  ra-     dais,  que  vos  podereis  có 
záo,oua  vida!  Todosef-     verter entaó? 
tescuidavaò,  que  haviam 


de  morrer  húa  morte  ordi- 
nária 5  como  vos  cuidais : 
&  quem  vos  deo  a  vòs  fe- 
guro,  de  que  vos  naó  ha  de 
í  u ceder  o  mefmo  ?   Si . nan 
modo  ciir  aliquído  ?  Se  ago- 
ra que  eftais  faòs  c5  o  ufo 
livre  de  voíTos  fentidos^Sc 
potencias,vosnaó  conver- 
teis, como  cuidais  que  vos 
haveis  de    converter  na 
hora  da  morte,  cercado  de 
tantas  anguftias,  &  de  tan- 
tos ellior  vos,  a  mulher  .V  os 
filhos,  os  criados,  o  íeíla- 
mento,  as  dividas,  os  acre- 
dores,  o  Confeíror50s  Me- 
dicQS>afebre,  as  dores,  os 
remédios,  a  vidapaílada, 
a  conta    quaíi    prefente. 
Quando  todas  eílas  couías 
juntas ,  &  cada  huà  delias 
baftaráo  pa  ra  perturbar, & 
,pafmar  húa  alma  j  &  naó  a 


verter  então; 

139     Mas  eu  vos  dou 
de  barato  ávida,  &  aíau- 
de,  &o  vigor  das  poten- 
cias,&:dosfentidos  5  mais 
ha  que  ifto.   Para  hum  ho- 
mem  fe  converter,  naó  ba- 
ila fó  vida,  &raude,  &jui- 
zo,  mas  he  principalmen- 
te neceíTaria    a    graça  de 
Deos.  Voisfinonmodò  cur 
aliqufindo  ?  Se  agora  que 
tendes  oítendido  menos  a 
Deos  ,  Deos   vos  naó  dà 
graça  eíiicaz  para  vos  con- 
verteres, que  fera  quando 
;o  tiverdes  oífendido  mais? 
Parecevos  que  he  boa  di- 
ligencia multiplicar  as  of- 
fenfas  de  Deos  para  gran- 
gearagraça  de  Deos  ?  Se 
ides  contmuando    aíHm, 
não  ha  duvida,  que  depois 
haveis  de  fer  m u i to  peor , 
ainda  do  que  fois   agora: 
pois  fe  agora  que  fois  me- 
Ihor^ 


If 


Jfíil 


i 


'si.  ^; 


1 5'4'»                      SerMao  da  quarta  dominga 
lhor,ou  menos  máo  ,  vos  para  vencer    eíles  inimi-- 
naó converteisjcomo o  ha-  gos fomos  taó  loucos,  que 
veis  de  fazer  depois,  quá-  efperamos,queelles  fe  fa- 
do fordes  peor  ?  Os  pecca-  ção  Gigantes  ?  Se  agora , 
dos  quanto  mais  cótinua-  queospeccados  eftáome 
dos,  tanto  mais  endurece ,  nos  robnílos ,  &  crecidos , 
&obítináo  ao  peccador:  &  a  alma  tem  ainda  algum 
^cÀsfinonmodò  cur  aliquâ*  vigor  ,  os  não  podemos 
do   ?  Se  agora  quando  o  derribar,  éc  vencer  5  que 
voííb  coração  naòeflàain-  fera  quando  os  peccados 
da  taó  endurecido  ,  &  tao  eíliverem  Gigantes,  &  a 
obftinado,  na6  ha  prega-  triílealma  taó  envelheci- 
çoens,  nem  infpiraçoens ,  da  nelles ,  &  táo  enfraque • 
nem  exemplos ,  nem  mor-  cida,  que  fenáo  poíTa  mo- 


tes repentinas,  &  defaftra- 
das  ,  que  vos  abrendem, 
que  fera  quando  eítiver 
feito  de  mármore  j  &  de 
diamante  ?  Os  peccados 
com  a  continuaçaó,&  com 
os  hábitos  tomão  cada  vez 
mais  forças,  &:  fazem  fe  ca- 
da dia  mais  robuílos  ,  &a 
alma  pelo  contrario  com  o 
coílumemais  fraca: pois/i 
non  ínodo  ciir  ali  quando  ? 


ver?  Finalmente,  Chri- 
ílãos,  naó  vamos  mais  lon-* 
ge:  fe  Deos  neíla  mefma 
hora  vos  eílà  chamando,& 
vos  eílà  dando  golpes  ao 
coraçáo  ,  &  vòs  não  lhe 
quereis  abrir)  nem  o  que- 
reis ouvir-,  como  efperais 
que  Deos  vos  chame  de- 
pois, ou  que  vos  ouça  quá^ 
do  o  chamares  5  ou  que  o 
poflais  chamar  como  con- 
vém ?  Si  non  modo  cur  ali- 


^r  1      diz  a  Efcritura :  Beatus  qui 

136.9.   occidtt párvulos j lios  ad pe^  quando  !   O  mefmo  Deos 

tram  :  bemaventurado  o  por  fuás  palavras   quero 

que  quebra  a  cabeça  a  feus  que  vos  dcfcngane  deíla 

peccados,  quando  peque-  váa  efperança,  cm  que  vos 

nos.Eí/z/jdizS.Bachiario,  confiais,6c  vos  precipitais 

cxpeãas     doncc    inimicus  ao  inferno  :  ouvi  a  Deos 

tms gigas  ejjlciatur  ?  h  nòs  no  Capitulo  primeiro  dos 

Pro- 


Tro;. 


do  Advento.  i  ff 

Provérbios :  Vocavi^  ér  re-  que  o  peccador  o  cbaniar 
nuiftis  j  chamei  vos,  fie  não  de  todofeu  coração  ,  o  ha 
^xcoáiíkcs'.  Extendi  manum  de  ouvir:  mas  não  tepro- 
Mí'/?;»,^'"?^^?^////^^///  afpi-  metido,  que  todas  as  ve- 
ceret^cí\.cnái  a  minha  mão,     zes,  que  o  peccador  qui- 


^não  ouve  quem  fizeíTe 

Ib:d  2  c,         ^      ^~T^    r'         -n  ■  *-> 

c2iiorDeJpexijtis  omneco- 
Jilhimmeum ,  deíprezaíies 
todos  os  meus  confelhos: 
&  que  fe  feguirà  daqui? 
Jbici.25.  Bgoquoque  in  inter itu  ve- 
Br  o  riâeboy  ú/uhfannabo: 
eu  tambem^diz  Deosjquá- 
do  vier  a  Jiora  de  voíía 
morte  zombarei  5  &  nam 
farei  çaío  de  vòs,  &  allim 
como  agora  euvos  cha- 
mo, &  vòs  não  me  ouvis, 
aíllm  então  eu  não  ouvirei 
ainda^q  vòs  me  chameis: 
Tanc  invocabunt  me  ^  ò" 
7ion  exaudiam.  C  h  riftãos, 
nos  fiamonos  em  q  Deos 
tem  prqmetido,que  todas 
as  vezes  ,  que  o  peccador 
o  chamar  de  todo  o  cora- 
ção, o  ha  de  ouvir  :  &  efta 
promêíTa  anda  muito  mal 
entendida  entre  os  homes. 
He  neceííario  advertir  o 
que  Deos  tem  prometido 
nelJa5&oque  não  té  pro- 
metido. Deos  tem  prome- 


zer,  o  ha  de  chamar  de  to- 
do o  feu  coração.Yai  mui- 
todehuacoufaa  outra.  Se 
chamardes  a  Deos  de  to- 
do o  coração  ,  ha-vos  de 
ouvir  Deos:  mas  fe  vòs  a^^ 
gora  não  ouvirdes  a  Deos  j 
depois  não  o  haveis  de 
chamar  de  todo  o  coração. 
O  chamar  de  todo  o  cora- 
ção não  depende  fó  de  noí^ 
íò alvedrio,  depende  de 
noíTo  alvedrio,  &  mais  da 
graça  de  Deos:  &  tê  Deos 
decretado  conforme  os 
juízos  altiílimos  defua  ju- 
lliça,  que  o  não  poíTa  cha- 
mar de  coração  na  morte, 
quem  lhe  não  quiz  dar  o 
coração  na  vida.  Que  faz 
Deos  em  toda  a  vida ,  fe- 
não  eílarnos  pedindo  o  co-  Prov: 
ração:  Filipr£be  miht  cor^^-^^' 
tuum\  6c  como  vòs  agora 
negais  a  Deos  o  coraçam  ^ 
que  vos  pede,  aílim  Deos 
então  vos  negará  juíliíli- 
mamente  ,  que  lhe  peçais 


tidoj  que  todas  as  vexes  ^     de  todo  o  coração.  B&qs 


I  <;6  Sermão  dn  quarta  'Dominga 

agora  bufcanos,  &  não  nos     pois.  Sevos  haveis  de  có- 


acha  5  então  bufca remos 
nósaDeos,  &  nãoo  acha- 
remos. O  mefmo  Deos  o 
prometeo,  &  ameaçou  af- 
íim :  Sluícritis^ò'  no?i  Í7ive- 
nietisme^  érinpeccato  ve- 
firomoriemini  :  bufcarme- 
heis,&  não  me  achareis,  &: 
morrereis  em  voílb  pecca- 
do.  Não  diz  menos  que 
ifto. 

140  Ora,Chrifl:ãos,pe- 
las  Chagas  de  Chrifto,  & 
pelo  que  deveis  a  voíTas 
•ahiias,  que  não  queirais, 
que  vos  aconteça  táo  gra- 
de infeliciciade.  Defenda- 
naivos  ,  6c  feja  eíle  o  ulti- 
mo defengano  5  que  fevos 
não  converteis  defde  lo- 
go, &  continuais  pelo  ca- 
minho que  ides  ,  vos  ha- 
veis de  perder,&:condenar 
fem  remédio.  O  remédio 
he :  Baptifmnmpr^ntentia'' 
húa  contrição  de  coraçam 
muito  verdadeira  ,  huma 
couíifFaó  mui  inteira  ,  6c 
mui  apoílada  com  iirme 
reíòluçáodc  não  oífendcr 
mais  a  Deos.  Emíim  fazei 
agora  aqui  11  o,  que  dizeis, 
que  haveis  de  fazer  dc- 


verter  no  fim  da  vida, ima- 
ginai ,  que  chegou  ]^  eíTç 
fim ,  que  naó  he  imagina- 
rão. MasqueimportaySer 
nhor,  que  eu  o  diga,  fe  a 
volTa  graça  não  ajuda  a  ti- 
bieza de  minhas  palavras  ? 
Soccorreinos,Sen'nor,com 
o  auxilio  efficaZ  deíles 
olhos  de  mifericordia,  & 
piedade^allumiai  eíics  en- 
tendimentos,  acendei  cA 
tas  vontades ,  abrazai  ,  & 
abrandai  eíles  endureci^ 
dos  coraçoens  ,  para  que 
vosnãoíejão  ingratos,  & 
reaproveitem  nelles  o« 
merecimentos  infinitos  de 
yoíTa  encarjiaçáo :  Ter  ad- 
*uentnmtnumy  Senhor,pelo 
amor  com  que  vieíles  ao 
mundo  a  falvar  as  almas, 
que íalveis  hoje  no íTas  al- 
mas: ao  menoijhúa  alma. 
Senhor,  à  honra  de  vpílb 
fantiílimo  nafcimento:  Per 
nativitatcm  tiiam  :  pelo 
amor,&  pela  mifericordia 
c6  q  nacelics  em  hú  Preíc- 
pio,por  aquelles  defempa- 
ros, poraquclle  frio,  por 
aquellas  palhinlias  ,  por 
aqucllas  lagiimas  ,  por 
aquella 


do  Advento.  \^y, 

aquella  ellremada  pobre-  fas  almas.   Convertei  os 

za,  &  por  aquelle  aíFeíto  fufpirosem  infpiraçoens  ,1; 

ardentilTiinocom  que  tu-  pedi  a  voíTo  querido  EÇ. 

do    ifto   padeceftes  por  pofo,o  EfpiritoSantOjtrcfc 

amor  de  nòs.  Virgem  San-  paíTe  noíTos  coraçoens  ca- 

tiífima,  hoje  heo  dia  dos  hum  rayo  efficaz  de  fua 

encêdidiílimos  defejos  de  luz,  para  que  o  amemos.^' 

voíTa  Expeítaçaó  ,  parti  para  que  ofirvamoSj&j^^-j 

com nofco, Senhora,  def-  ra  que   mereçamos  a  fua 

íesaffeíbos,  para  que naça  graça^  &  por  meio  delia  a 

também  Chrifto  em  nof-  gloria. 


-lO  3 


n?^yi 


í:iíB-í3 


SEil4 


TS9 


MàMà  •■ààMàààààMàêÈm' 

•m^i^-^^-^^  -h^  ■'t^.  ■i^-'(^-i^^^  .f^  .&í>?  -i^  .&í>3  .í<^.  •£<í^  •£<?>'  •sííTj^  .^  ■ 

•i^-^^'e^  -fí^Tíc^  ^>>Ç<-^-?^  -S^  -S^  -Ç*^  -Ç^  -^c^-^^  .&$>?  .Wf^  .Wô3  .ÇoV:  .r-r.-.  ma 

f  f  f  ^%"4í^f  Wf =f  f  tf  f  f  ^f  i  v# 

Sa  S.:M  a  M^ 

^.fiiieb  0A9fnic  DA 

CONCEIÇAM 

IMMACULADA  DA  VIRGEM  MARIA  SN. 


Maria,eíe qua natus  eft  Jefus.  Matth. 


§.  V 

Orno  em  todas 
as  matérias  có- 
troverfas  dizer 
o  jà  dito  he  fu- 
perfluo  5  aíllm  na  de  que 
hoje  fou  obrigado  a  fallar, 
dizer  o  que  aindi  naóef- 
teja  dito,  he  difficultofo. 
Entre  os  myltcrios,  todos 
foberanos,  de  Maria  Mãy 
de  Deos  ,  o  que  hoie  cele- 
bra a  Igreja,  &  todos  dcfe- 
jaò"  ouvir  cítabclccidocó 


algua  novidade  ,  he  o  de 
fua  Conceição  im macula- 
da. Mas  todas  aquellasef- 
tradas,  por  onde  fe  pôde 
caminhar  fegurr.mence,ou 
ao  templo  defta  adoração, 
ou  ao  callello  deíla  dcícn- 
fli,  elláo  taó  batidas,  &  de- 
batidas,que  como  bem  ái^ 
zia  ha  muitos  annos  hú  dos 
maiores  Oradores  de  HeA 
panha ,  ninguém  podepòr 
opc,  fenaó  íbbre  pegada 
alhea.  Boa  fatisfiiçaò  para 
a  defculpa,  mas  muito  def- 
confo- 


ãa  Virgem  Marta  S.  N.  i  f  9 

confolada  para  o   defcjo.  neca.    Muito    fízeraõ  os 

Defta  mefma fe  valeo  Te-  que  vieraó  antes  de   nós» 

rencio,  aquelle  taò    ceie-  masnaóperíizeraõ.  Entre 

bradoComicOjO  quaipe-  ofazer  ,  &  o  perfazer  ha 

dia  perdaó  ao  theatro  Ro-  grandes  inter  vallos  :  Mui- 

manodelhereprefentar  o  tum  autem  reftat  operis^ 

que  jà  tinha  ouvido,  &al-  multumquereftabit.  AíBm 

legava  em  feu  abono ,  que  como   elles  acrecentáraó 


o  mefmo  tinhaó  feito  os 
velhos,  &  aíTim  o  faziaô  os 
modernos; 

Mullum efijãtn  diBu^quod 
non  díãumfitprms. 

^areaquum  eft  vos  cog" 
nofcere-i  ò"  ignofcere : 


fobre  o  que  tinhaó  dito  os 
mais  antigos-, aííim  nós  po- 
demos acreccntar^  &  deC- 
cobrir  de  novo  o  que  elies 
naóaçháraó  ,  como  tam- 
bém fobre  nós  os  que  de- 
pois vierem.  lílo  efcreveo 
animofamente  o  maior  gí- 


Sluod  weteres  faãitarunt ,     piri  to  dos  E  ftoicos .  E  nem 


Séneca 


ficfaciuntnovi 

-^^E  fe  Hfo  #tifâváría  c^L 
í)eça  do  mundo  ha  mais 
de  mil  annoSí  cjue  fera  ho- 
je entrenós,  onde  não  he 
^áo  fácil  inventar  iiovos 
argumentos, tíomo  novos 
trajos? 

142  Eu  porém  naó  me 
acabo  de  fogeitar  a  efte  di- 
-^amej  porque  ainda  que 
'^os  antigos  bebéraó  pri- 
meiro nas  fontes,  nem  por 
iílb  as  efgotáraô :  Multum 
egerunt  qiii  ante  nosfueruty 
fednonj^^eregenmt  y  diz  Se- 


a  mim  me  metejmedo  di- 
zer Salamaó,  que  naó  ha 
coufa  nova  debaixo  do 
Sol :  Nihilfub  Sole  novurn-,  ecI.  n 
porque  a  matéria  de  que  i°i 
hoje  hei  de  tratar,  naó  he 
de  debaixo  do  Sol ,  íènaó 
do  mefmo  Sol  ,  &  acima 
delle. 

143  Duvidofo  pois 
entre  o  que  tem  de  verda- 
deiro húa  deftas  {GniGn- 
ças  ,  &oqueoppoem  de 
diííicultofo  a  outra  5  o  me- 
yo  que  determino,  8c  devo 
tomar,  he  o  que  eníinou  o 
Meftre  divino  ,, em  que 
am- 


'4 

A 


I 


i<^o  Sermão  daConmçao  mníaculada 

ambas  fe  concilião,  &  fe  ria  da  Conceição  imma- 

Matth.  concordaó  :     Ideo  omnis  culada  feja  mais  facii  de 

«i  f z.  y^;.^^^  doãusfimilíseH  Ta-  prometer  ,  q de  defempc- 

trifamilíãs  ,  qui proferi  de  nharj  comecemos  brevif- 

thefaurofuonova^&vctera'.  íimamente  pelas  fuppofi- 

PoriíTotodoo   eftudiofo  çoeiís.    Supponho   como 
douto  nas    Efcrituras  hc 


femelhante  Çáiz  Chrifto} 
aoPaydeFamilias  rico,  o 
qual  tira  do  feu  thefouro  o 
iiovoi&maiso  velho.  Af- 
lim  ofareieuhoje,pofto 
que  reconheço  a  minha 
Thien.  pobreza  ;  Ego  vir  videns 
fmpertatem  meam.  Dos 
thefouros  da  Theologia, 
&  da  Efcritura  fupporei 
na  matéria  prefente  o  ve- 
llio,&  verei  fe  poíTo  dizer 
o  novo.  A  Virgem  imma- 
culada,  cuja  graça  fempre 


i  » 


certas  três  coufas  geral- 
mente recebidas  ,  cada 
qual  porém  dentro  do  feu 
grão  de  certeza ;  a  primei- 
ra cientifica  ,  a  fegunda 
mais  que  provável  ,  a  ter- 
ceira expreíTamente  de  fç. 
A  primeira,  6c  cientifica 
he,  que  ha  dous  modos  de 
remir,  ou  de  redempçaô  > 
húaque  tarda,  6c  remedea 
o  cativeiro  >  outra  que  Te 
anticipa ,  ^  preferva  del- 
le.  A  fegunda ,  6c  taó  pro-- 
vaveljquejà  fe  naõ  pode 


foi  antiga,6cíempre  nova,     afiirmarem  publico  o  co- 
me afllíla  com  a  fua.  trario ,  he,que  pela  redép- 
Ave  Maria,             çaó  que  remedea,  rcmio 
Chrífto  a  todo  o  género 
§'   II-  humano,5c  pela  que  fe  an- 
ticipa, 6c  preferva  ,  remio 
a  fua  fantiífima   Mãy.   A 
terceira,  ^  expreíFamente 
de  fé,  he,que  o  preço  de 
^++    P  Rometi  fup-     húa,  ^  outra  redenipção 
1     por   o  velho     foi  o  merecimento,  &  va- 
para  dizer  o  novo.  Epofto     lor  infinito  do  Tangue  do 
que efta  propoíta  na  mate-     Filho de^  Deos  oHcrccido, 

6cderra- 


Maria^de  efua  natas  eft 
lefusM2Xx}sx.\,\6. 


da  Virgem  Maria  S.N.  i6i 

&  derramado   por  todos,  lho  da  Virgem  Maria  em 

Lfte  fangLie  pois,  &  o  mo-  quanto  Jefu,  &  em  quanta 

do  com  que  Chriftoo  der-  Redemptor,em  obrequio, 

ramou  íingularmentepor  &  beneficio   íingular  da 

fua  Máy,  com  muitoíi  pri-  mefma Senhora deo  o  fan^ 

mores  de  redempçaò  atè-  guCjque  de  Tuas  puriíHmas 

gora  naó  ponderados,  fera  entranhas  tinha  recebido : 

a  novidade,  que  para  ma-  de  qua  natits  íy^jfejaoprir 

iorgIoriadaMáy  ,  &  do  meiro,&:  maísgeraI,como 


Filho  defejo  provar.  A  tu- 
do me  daó  fundamento 
as  palavras  do  Evangelho^ 
que  tomei  por  Thema: 
Maria^  de  qua  iiatus  eft  le- 
fus.  Em  Maria  temos  a 
Remida>&  prefervadaino 


fundamento  de  todos,  fer 
a  mefma  Senhora  prefer- 
vada  do  cativeiro  do  pec 
cado  de  Adam  por  valor,' 
&  virtude  do  mefmo  fan-í. 
gue. 
\â^6 


Mandando  Deos 


nome  dejefu,que quer di-  aMoyfes,  que  dos  defer-* 
^erRcdemptor,  temos  a  tosdeMadian  onde  vivia 
redempçaò:  &  nas  duas  foíTe  ao  Egyptorefgatar, o 
palavras,  de  qua  natus  eft ,  feu  Povo,  que  là  eílava  ca- 
temos o  preço,  que  foi  o  tivo,  levou  Moy fes  em  fua 
íànguci  porque  encarnan»  companhia  a  Sephora  fua 
do,  &  nafcendo  Jefu  de  Efpofa.  E  foi  eíla  acçaó 
Mariajdella  o  recebeo  pa-  do  feu  Enviado  táo  eílra- 
ra  o  dar   univerfalmente  nhada  ,&  abominada   do 


por  nos ,  &  muito  particu- 
larmétepela mefma  Máy. 


í.    ni. 


14.5- 


ENtrando  pois 
nas  confidera- 
çoens,&  modos  particula- 
res com  que  o  bemdito  Fi- 
Tom.7. 


mefmo  Dcos,  que  antes  de 
chegarão  Egypto,lhe  tor- 
nou a  aparecer  taó  indig- 
nado contra  elle,  que  que- 
ria naó  mcnosjquetirarjhe 
a  vida  :  Cumque  effet  in  iti- 
vere^in  di-verforio ,  occtirrit 
ei'Dominus^  &  njokbãt  oc~ 
ciàere  eum,  Pa r e mos, &  r e- 
L         paremos 


<od  4." 


-4 


i 


■■■■■4' 


; 


■íi. 


i^i  SermaÕ  da  Conceição  immaculada 

paremosaquicomS.Ago-     conformarcom  o  queho- 


ítinho,  Theodoreco,  Eu- 
febioCefarienfe,  ErniíTe- 
nO;,&  outrosj  os  quaes  co- 
lhem do  mefmo  Texto , 
queeíla,&  naó  outra  foi  a 
caufadehúa  taó  notável, 
&  impenfada    demoftra 


je  pregamos  ,  fepor  ven- 
tura ha  ainda  algum.  Se 
Deos  quiz  matar  a  Moy- 
fes^porque  naó  fofreo^que 
ellemeteíTe  no  cativeiro 
do  Egypto  com  os  outros 
cativos  a  Efpofa   que  era 


çaó.  Pois,  Senhor,  a  Moy^  de  Moyfes  ;"   fe  a  Efpofa 

ícs,  a  quem  acabais  de  ele-  foíTe  do  mefmo  Deos ,  co- 

ger  por  Redemptor  do  ca-  mo  o  fofreria  ?  Sendo  pois 

tiveirodovoíToPovOjtaò  verdadeiramente    Efpofa 

de  repente  quereis  privar,  fua  a  Virgem  Maria  ,  co- 

naófódoofficio,fenaôda  mo   fofreri    aos   quelha 

vida  ?Taô  grande  culpa ,  querem  cativar ,  &  meter 

&  taó  malfofrida  de  vòs ,  com  os  demais  no  mefma 

foi  querer  levarfua  Efpo-  cativeiro  >  Mas  advertido 

faconfigo?  Sim.   Porque  ifto  depaíTagem  ,  vamos 

quandoeumandoa  Moy-  por  diante  com  a  hiíloria 

fes,que  và  libertar  aos  que  ao  noíTo  ponto, 

cftaó  cativos  no  Egypto  >  14,7     Poftos  Moyfes,& 

que  queira  ellc  meter  no  Sephora  em  termos   tam 

mefmo  cativeiro  a  fua  Ef-  apertados,&  perigofos  co- 

pofa ,  que  taó  livre  eflava  mo  vimos:  eile  debaixo  da 

delle, quanto  vai  do  Egyp-  efpada  de  Deos  condena- 

toaMadianjnio  fofroeu  do à morte,  &  ella  cami- 


tal  deslumbramento,&:  tal 
erro  em  hum  homem,  que 
fiz  Redemptor  univerfal 
do  meu  Povo  ,  &  por  iíTo 


nhando  para  o  Egypto, 
onde  todos  eraó  cativos  j 
que  fucedeo  >  Levavaó 
ambos  hum  filhinho  cort- 


reprefentador  de  meu  Fi-  íigo,  ao  qual  naquelle  efta- 
Iho.  Reparem  neílejuizo  do  circuncidou  a  Máy,di- 
de  Deos  os  que  interior-  zcndoaoPay,  qelieeraa 
mente  fe  náo  acabáo    de     caufa  de  lhe  derramar  o  sá- 

,gue: 


da  Vtrgm 
Eíoa.4  gue :  Sponfus fanguinum  tu 
mihi  es:&cno  mefmo  pon- 
to, aplacado  Deos,a  Moy- 
les  lhe  foi  perdoada  a  cul- 
pa,&  Sephora  ficou  livre 
deiraoEgypto  )  aparcan- 
ideii^*^*  dofedelle:  Etdimtfit  mm. 
Sephora  Quem  íe  naó  admira  iiefte 
iraTy-  caíò  do  modo  taõ  fácil ,  6c 
^^-     táo  breve  com  que  dous 
nòs  taó  fortemente  aper* 
cados  fe  defatáraó,  &  doua 
perigos  taó  grandes  fe  re^ 
Ibl  véraó  ?  De  fortejque  em 
fe  derramado  o  fangue  do 
filho,  o  Pay  ficou  abfolto 
da  culpa,&  a  Máy  livre  do 
cativeiro  ?  Com  razão  dif- 
fe  S.  Paulo,que  tudo  o  que 
naquelle  tempo  fucedia, 
craó  figuras,  &  húa  como 
comedia  do  que  depois 
havia  defer:  Omnia  in figu- 
ra contingebantillis.  O  fi- 
lho innocête  era  figura  de 
Chrifto :  o  Pay  era  figura 
de  Adaój  de  quem  tomou 
a  natureza:  a  Máy  era  figu^ 
rada  Virgem  Maria,  de 
quemnafceo,  E  tanto  que 
o  fangue  do  filho  fe  derra- 
mou, o  Pay  ficou  livre  da 
culpa,pela  qual  eftava  có- 
denadoà  morte  :&  a  Máy 


f.Cor, 
10.11. 


Maria  S.N.  •    i<>j 

ficou  livre  do  cativeiro  pa- 
ra onde  a  levava  o  mefmo 
Pay.  Pôde  haver  repre- 
fentaçâo  por  todas  fuás 
circunftancias  mais  pró- 
pria ?  Mas  ainda  faltaõ  por 
advertir  duas  para  maior 
gala  do  myfterio.  A  pri- 
meira, que  a  Máy  foi  livre 
do  cativeiro  não  depois  de 
ir  ao  Egypto,  &  eftar  cati- 
va, fenaò  antes,  &  preíer* 
vada,  para  que  o  naó  fofi^e* 
A  fegunda ,  que  o  mefmo 
cativeiro  do  Egypto  na* 
quella  occafiaó  jà  eftava 
acabando,&  havia  de  du- 
rar muito  pouco:  mas  co- 
mo o  filho  de  Sephora  re* 
prefentava  o  Filho  de  Ma- 
ria,naó  permitio  o  feu  fan* 
gue,  que  fua  Máy  eftivef- 
fe  cativa,  nem  por  hum  fó 
inftante. 

14.8  Parece  que  de- 
pois de  tal  figura  naó  pôde 
haver  prova  real ,  que  a 
iguale :  mas  íerà  tanto  ma- 
ior, 8c  melhor,  quanto  vai 
daluzàfombra.  Quando 
o  mefmo  Chrifto  na  ulti- 
ma Cea  confagrou  o  feu 
preciofillimo  fangue  no 
Caliz,  foi  com  eftas  pala- 
Lij  yra^: 


f 


fá! 


■fi;: 


11 


2.  Cor. 


'i(>4,  Sermão  daConceiç  ao  immacíilada 

vr^svUicefl  Calixfangui'     qui  eílà  a   diíferença.  O 


w/J"  met,  quipro  vobis  ,  eè^ 
fro  multis  ejfimdetíir ;  Efte 
he  o  Caliz  de  meu  fanguc, 
o  qual  fe  derramará  por 
vósj&por  muitos.  Terrí- 
vel palavra  foi  efl:a  ultima! 
O  fangue  de  Chrifto he  de 


fanguede  Chriílo  abfolu- 
tamcntederramoufe  nim 
fó  por  muitos,  fenam  por 
todos :  mas  em  remiíTao  de 
peccados  ^  naó  fe  derra- 
mou por  todos,  fenam  por 
muitos ;  porque  do  nume- 


fé,  que  fe  derramou  por  ro  dos  todos  foi  exceptua- 
todos, porque  por  todos  daa  Máy,que  lhe  dea  o 
morreo,  de  que  temos  có-     mefmofangue.  Portodos 


tra  o  Herege  moderno  o 
texto  exprelfo  de  S.Paulo: 
Tro  omnibiis  morttius  eft 
Chriftus.  Pois  feomefmo 
Chriílo  havia  de  derra- 
mar, &:  derramou  o  fangue 
por  todos,porque  naó  diz, 
Eíte  he  o  Caliz  do  meu 
fangue,  o  qual  fe  derrama- 
ra por  vos, &  por  todos,  fe- 
rjaóporvòs,  &  por  mui- 
toSipro  vobis^&pro  multis> 
Lede  as  palavras  feguin- 
t^St  <Sc  vereis  quam  admi- 
ravelméte  refolvem  a  du- 
vida. Quipro  vobisy&  pro 
multis  effiindetur  in  remij- 
fanem peccatoru  :  Será  der- 
ramado ,  diz  o  Senhor ,  o 
meu  fingue  por  vòs,&  por 
muitos: mas  como  ^  inre- 
mi/Ji 0)107)2  pí-ccatonun ,  em 
rcmiílaó  de  peccados.  A- 


os  mais  foi  derramado  o 
fangue  de  Chriílo,  &  em 
remiíTaó  de  peccados  :  fò 
por  fua  Máy  foi  também 
derramado ,  íim  ,  mas  em 
remiíTaó  de  peccados, naó; 
porque  naó  tevepeccado. 
Oh  bemdito  Filho  de  Ma- 
ria,que  bem  moílraíles  fer 
juntamête Filho  deDeos, 
pois  taó  altamente  acodi- 
fles  pela  honra  de  voíla 
Mãy  /  Havia  de  dizer  S. 
Paulo,  que  todos  peccáraó 
em  Adam  :  &  que  o  fangue 
de  Chriílo  fe  derramou 
por  todos.  Mas  para  que  o 
mundo  fe  naó  enganaíTe, 
&  foubeíTcque  no  contra- 
híropcccadoouvc  cxcci- 
çaó,&: no  derramar  o  fan- 
gue, differcnca  -  por  lílo 
declarou  o  Senhor  có  duas 
li- 


da  Virgem  Mana  S.  N.  ^  i6y 

limitaçocnstãoexpreíTas,  gne,  que  Chrin-o  derra- 
que o  feiT  ílingue  fe  derra-  mou, para  remir  fingular- 
mariapor  muitos  ,  &  em  mentea  fua  Máyj&aprc- 
remiílaódepeccados.  Por  fervardopeccado  }  íaiba- 
muitos,  &  não  por  todos,     mosquandojonde,  &  co- 


para excluir  a  fua  Mãy:  & 
em  remiífaó  de  pecca- 
dosj&naó  por  outro  mo- 
do, para  a  eximir  de  toda 
a  culpa,  da  qual  nam  foi 
perdoada  por  remiííaó,  fe- 
naò  prevenida,  &:  prefer- 
vada  por  graça.  Aílim  o 
diíTe,  &  proteftou  em  tal 
hora,  em  tal  a£l:o,&  com  o 
Caliz  do  fangue  que  havia 
de  derramar  nas  mãos,  co- 
mo Filho  emíim  ,  &  Re- 
dempror  ,  que  era  da  Mãy 
de  quem  recebera  o  mef- 
m  o  fangue:  ^Deqtia  natus 
eji  lefus. 


T49 


í.  IV. 

ri  Stabelicido  ef. 


geral,  em  que  fícão  taóbê 
proVadas('&náo  fei  fecó 
algúa  novidade}  as  fuppó- 
fiçoensdoque  chamei  ve- 
lho :  para  entrarmos  no 
que  mais  propriamente  he 
novo,&tudo  fobre.ofan- 
Tom./. 


mo  obrou  o  bemdito  Fi- 
lho eíle  grandcSç  occulto 
myílerio,&  nunca  atègora 
diílintamente  examina- 
do, 

ifo     S.  Bernardino  Se^p^,.^^^^ 
nenfe  diz,queremio  Chri-  dm  ser. 
lio  a  fua  Mãy   com  o  pri-  ^^^^ 
meiro  fangue,  que  derra- 
mou na  Cruz,&  com  gran- 
de preferencia  a  todos  os 
que  nella  foraó  remidos. 
Fundafe  naquellas   pafla:- 
vras  dos  Cânticos :  Vulne-  cant  4* 
raífi  cor  meum  ,  foror  mea  9- 
fpo nja ,  ijulnerafti  cor  meu : 
nas  quaes  reconhece  ó  Sá- 
to primeiras,  &:  fegundas 
feridas ,  ^  diz  que  as  pri- 
meiras oífereceo  Chriílo 
na  Cruz  pela  redempçam 
de  fua  Mãy,  paraq  a  mef- 
ma  Senhora,  fendo  remida 
primeiro  que  todos,  foíTè  a 
Primogénita  do  Redemp- 
tor.  As  palavras  dodevo- 
tiíUmo,  (Sc  dou tiíli mo  Pa- 
dre faó  efías:  Vulnerafticor 
meumyforor  meafiJonfa>,vul' 
L  iii         mr.ajil 


/ 


m 

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■^ 

-'1' 

1 

f 

Luc  2. 
7- 


1 66  Sermão  da  Conceição  tmmactdada 

neralii  cor  meum  :  pro  tuo  fentença  quâro  ella  o  per- 
amore  carnemfumpfi  ,  é^'  mite.  É  verdadeiramente, 
vulnenms  primis  in  cruce  que  quando  o  Santo  diíTe , 
vukerajií  cor  meum  ;  nam     vtilnenbus  primis ,  íe  nam 


Trimogenita  Redemptoris 
Filijfuilefiípfi:  virgo  Bea- 
ta. Altofentir,  &  digno 
defeuAuthor.  De  forte, 
que  aílim  como  o  Filho 
foi  o  Primogénito  da  Máy 


acrefcentàra  in  Cruce  ,  na 
Cruz  ,  não  tinha  eu  mais 
quedefejar,  &  dera  o  pa- 
rabém ao  meu  penfamen- 
to  de  fe  encontrar  com  o 
de  taó  ai lu miado,  &  fubli- 


em  quanto  Homem,  Tepe-     me  efpirito.   Mas  porque 
rithzlium [uumTrimogeni-     tenho  outras    Efcrituras 


tum  5  aííl  m  a  IMáy  foi  a  Pri- 
mogenita  do  Filho  em 
quanto  Redempcor,  Tri^ 
mogenita  Redemptoris  Fi- 
lijfiii.  E  efta  foi  a  primei- 
ra fineza  ,  ou  primorofa 
correfpoiídencia  com  que 
oFilhoJeíu  ,  em  quanto 


mais  ciaras,  que  citarei, 
conformandome  em  que 
ofiiague,queo  Red  em  p- 
tor  derramou  por  fua 
Máy,  foi  o  primeiro,  di- 
go que  naò  foi  na  Cruz,fe- 
naó  no  Horto.  Abranos  o 
caminhoàprova  deíla  no- 


Jefu  ,  &  Redempror  da  vidade  o  grande  Doutor 

Máy,dequem  nafceo,lhe  dalgrejaS.  Ambroíio  ,  o 

pagou  o  benefício  do  fer,  quaíílorecendo  mil  annos 

naó  que  delia  ti veíTejà  re-  antes,  jà  entaó  deixou  ef- 

cebido,fenaó  que  havia  de  crito,  que  dando  o  Filho 

receber.  O  Filho  Primo-  deDeos  principio  à  obra 


genitodaMãy,  &  a  Máy 
Primogénita  do  Filho  :  o 
Filho  Primogénita^  da 
Máy  no  nafciméro,  a  Máy 
Primogénita  do  Filho  na 
Conceição. 

ifi     Atè  aqui  S.  Ber- 
nardino, declarada   a  Ília 


dauniverfú  Redempçaó, 
começou  por  fua  Máy. 
Nec  mirumji  T>ominus  re^ 
tíempturus  mundum  ,  opera- 
tionem  fuam  hrhoavit  à  ^'f^" 
Matrty  ut per  qtiaynfalus  Uxcc.v 
ornnibusparabatur  ,  eautm 
primajruttíimfalktis  hau- 
riret 


da  Virgem 
riretex  pignore.  Elegante, 
&  eloquentemente,  como 
fempre,  Ambrofio.  Qiier 
dizer,  que  ningiiem  fe  de- 
ve maravilhar  de  que  ha- 
vendo de  dar  principio  o 
Redemptoràobra  da  re- 
dempçaódo  mundo,  co- 
meçaíle  por  fua  Máy,  para 
queella  ,  que  o  havia  de 
ajudar  na  redempçam  de 
todos,foíre  a  primeira,que 
namermaredempçaó  co- 
IheíTe  os  frutos  do  fruto 
do  feu  ventre. 

15-2  lílopofto,fe  aU 
guemperguntaííèao  mef- 
moFilho,&;à  meAna  Máy, 
onde  colherão  eftes  pri- 
meiros frutos  da  redemp- 
çaó,naó  ha  duvida,  que 
ambos  ha vião  de  refpon- 
der,que  no  Horto:  &  aílim 
o  dizem  expreílamente  a 
Mãy,&:  mais  o  Filho.  He 
paíTo,  que  fe  naó  podia  de- 
fejar,  nem  inventar  me- 
lhor :&  foi  hum  dialogo, 
que  tiveraó  entre  íy  o  Ef- 
poíò,  que  he  Chriíto,  &  a 
Erpoía,que  he  a  Virgem, 
no  mefmo  livro  dos  Cân- 
ticos. Veniãt  díleãusmetis 
in  hortumfuunhÇdiz  alli  a 


Maria  SM.  i^7 

Senhora  3  c^  Cúmedat  fru- 
ãum pomorunifuorum :  Ve- 
nha o  meu  amado   ao  íeu 
Horto, &:  colha  o  fruto  dos 
feus  frutos  j  iílo  he, os  pri- 
meiros ,  &  as  primicias 
delles.  Ifto  diíle  a  Efpofa  : 
&logo  tendo  fatisfeito  o 
Filho  ao  defejo  da  Mãy, 
diz  aílim :  Feni  in  hortum 
meiím^foror  meafponfa ,  & 
mejjui  myrrham  me  a :  Vim 
ao  meu  Horto,  irmâã,  8c 
Efpofa  minha,  &  o  que  alli 
colhi,  foi  a  minha  myrrha. 
A  mirrha    propriamente 
naó  he  fruto,  íènaó  hú  li- 
cor, que  fe  fua,&  eftila  das 
arvores  do  mefmo  nome. 
Pois  fe  a  Efpofa  tinha  con- 
vidado o  Efpofo,  para  que 
fofleaofeu  Horto   colher 
os  primeiros  ÇrntoSyVeniat 
in  hortum  faum^ér  com^dat 
fruEtum  pomorum  fuorum : 
como  indo  o  Efpofo   ao 
mefmo  Horto,  em  vez  de 
colher  frutosjcolheo  myr- 
rha :  Veni  in  hortum  meum^ 
^meJJui  myrrham  meam? 
Aífimo  diífe  ,  porque  af- 
fim  foi ,  nem  fe  podia  de- 
clarar melhor.   Como  a 
myrrha  he  aquelle  licor 
L  iiij         aro- 


bidem. 


I 

i 


til 


,ió8  SermaS  daConceição  immaculada 

aromatico,que  fuaóasar-  porque  a  rcdempcaÓ  ,  que 

vorcs,  o  fruto  que  Chrifto  obrou  no  Calvário,  era  re- 

colheo  no  Horto  ,  fatisfa-  dempcaódepeccado  ,  & 

zendo   ao   defejo  de  fua  depeccadores;  para  quea 

May,foioíangue,quepor  defuaMãyde  nenhú  mo- 

anior  delia  fuou  na  oraçaó  do  fe  envo! veíTe,  &  miftu- 


ao  mefmoHorto.Expref- 
ía,&:  concordemente  S. 
Cyrillo  Jerofolymitano  , 
Sf  PhiloCarpacio,6cRuper. 
Carp.  to .  Chrisíus  enim  in  Horto 
I^^P^"  orans,  myrrham  mefuit,  cu 
fan^uinerd  fné.vit .  Pode 
haver  coufa  mais  clara  , 
mais  breve,&-  mais  exada: 
em  que  fe  exprima  como 
deícjavamos,  o  onde,  o 
CO  mo,  &  o  quando?  O  on- 
de 5  no  Horto ,  in  Horto :  o 
eomo5orando,í?r^?2j-:o  quã- 
do,  quando  fuou  o  Tangue, 
cumfangninem  fudavh  ^ 


raíTe  com  ella,  a  dividio,& 
feparou  no  tempo,  no  lu- 
gar, no  fangue,&  no  modo 
de  o  derramar,  fazendo  no 
Horto  hum  novo  Calvá- 
rio fem  monte,  &  no  fuor 
húa  nova  Cruz  fem  cra- 
vos? AíHmo  cantou  ele- 
gontemente  Hildeberto 
Turonenfe;  ^^?;;^.'/;,vn/j77/- 
dorCitixfmt  c.nte  criicem. 
Mas  ouçamos  a  S.  Paulo. 
S.  Paulo  parece  que  faz 
diíl:inçáoentrehum,&:  ou- 
tro fangue,  attnbuindo  a 


redempçaó  univerfal  fó  ao 
if3     Aviílapoisdeíla     fangue  da  Cru2:-P^r//r.?7?j 
primeira   conclufíò     raó    pcrfangumtm  Cnxis  ej^^íf' 
iiova,&taÓ  provada,  que    fivequainterris,fivequ£ in 
diremos?  Diremos  por  ve-     Cdis;  &  eílcs  faó  os  ter- 
mos geraes  com  que  com- 
mummenre  fallaó  os  San- 
tos Padres.    Donde  fe  fe- 
giie  ,  que   fco  fangue  da 
Cruz  foi  íò  o  preço  da  re- 
dempçaó univcría! ,  r.o  tal 
caio  todo  o  sãguc  do  Hor- 
to foi  unicamente  aplica- 
do 


tura,  que  andou  taõ  fina- 
mente primorofo  o  fobe- 
rano  Redcmptor  na  re- 
dempçaó de  fiaa  Máy,  que 
naólò  quiz  que  foífe  im- 
maculada  a  Remida  ,  fe- 
na  6  ta  m  bem  i  m  ni  a  c  u  1  a  da 
a  mcfina  redempçaó  ?  E 


da  Virgem  Maria  S.N.  169 

do  pelo  Filho  à  redemp-  macula.  Em  tudo  quanto 
çaò  da  Máy  ,  &  por  ilTb  digo,  fallo  pela  boca  da 
propriamente  naõ  fó  Pri-  mefma  Máy,  &:  do  mefmo 
mogenita,  como  queria  S.  Filho :  &  neíle  ponto  com 
Bernardino,mas  Vnigeni- 
ta ;  porque  a  Primogénita 
tem  fegundos,  6ca  Vnige- 
nitaheíiagular,  &  única. 
Mas  eíla  fineza  de  nenhú 
modo fe deve, nem  pôde 
entender  com  exciufaodo 
fangueda  Cruz  ,  porque 
he  certo,  que  o  Filho  da 
Virgem  também  morreo 
pelaAdáyjde  quem  naf- 
ceo  •,  que  foi  nova  corref- 
pondencia  de  reconheci- 
mento, c*^  gratidão,  pagan- 
dolhe o naí cimento  coma 
morte.  Qiie diremos  logo 
àvilla  deites  dons  thea- 
tros,  ou  amateatros-,  am- 
bos fanguinolentos  y  hum 
do  Horto ,  outro  do  Cal- 
vário ?  Digo,que  em  hum, 
6c  outro  obrou  o  Filho  de 
Maria  comojefu,  &  como 
Rederaptor  a  fua  redemp- 
ção  i  mas  no  Calvário  co« 
mo  univerfalmente  Re- 
mida i  no  Horto  ,  como 
fmgularmente  preíerva- 
da,  &  em  hum  ,  &  outro , 
como  puriílinu  ,  6c  íem 


texto  miiagrofamentefei- 
tofóparaelle. 

154,     Hum  dos   mais 
notáveis  Textos  da  Efcri- 
turanoquediz,  6c  na  or- 
dem,6c  confequencia  com 
que  o  diz ,  faó  aquellas  pa- 
lavras do  Efpofo  Divino , 
fallando  primeiro  comíi- 
go,6c  depois  com  a  Efpo- 
ía :  Vadam  ad  montem  myr^  cant.4 
r/j^,  éy  ^d  CO  liem  thurts:^-^' 
totapulchraes  arnica  mea^ 
érmâculanoneftinte.  Ea 
[  diz  o  Efpofo  }   irei  ao; 
monte  da  myrrha, 6c  ao  oi- 
teirodo  incenfo:   6c  ^os-s^ 
Efpofa,  ^  amiga  minha, 
todaíbis  fermoía,  ^  toda 
pura  fem  macula.    Supér- 
fluo he  repetir ,  que  a  Ef-^ 
pofahe  a  Virgem  Maria,: 
6c  o  Efpofo   Chriilo    fen 
Filho.  Masque  correfpô- 
dencia  tem  dizer  o  Filha ^ 
que  ha  de  ir  ao  monte  da. 
myrrha  ,  6c  ao  oiteiro  éx> 
inceníb :  6c  logo  inferir,  6c 
concluir, que  a  Mãy  toda. 
he  fermoía,  6c  toda  pura 
íem 


í 


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•I 70  Sertnao  da  Conceição  immactdada 

fem  macula  ?   ^^^^;;/  ad    ra  Chrifro  remiro  género 


montem  myrrha ,  é*  adcol- 
lem  thtiris :  &  logo  de  re- 
pente fem  outro  motivo: 
Totapulchra  es  arnica  me  a , 
&  macula  non  eft  in  te  ?  Pa- 
ra entendimento  deíía  no- 


humano  depois  do  pecca- 
do,  bailava  o  fangue,  que 
derramou  na  Cruz  5  mas 
para  remir  ,  òc  prefervar  a 
fua  Máy  fem  macula  de 
peccadojquizelle  por  fi- 


tavci  coníequencia  em  q  neza  particular  acrecen- 

fe  infere  com  tanta  clare-  tarao  fangue    da  Cruz  o 

za,  &:  expreíTaó  a  pureza  fangue,  que  derramou  na 

immaculada  da  Virgem,  oraçaódo  Horto.  lílo  he 

he neceíTario  faber  ,  que  irão  monte  da   myrrha  : 


montCj&queoiteiro,  que 
myrrhaj&  que  incenfohe 
eíle  ?  A  myrrha  íignifíca  a 
morte,oincenfo  íigniíica 
a  oraçaó :  &  neíle  fentido. 


Vadam  ad  montem  myrrh^^ 
&  juntamente  ao  oitciro 
doincenfo  ,  à*  íid  colUm 
t buris.  E  tanto  que  fe  uni- 
rão os  eífeitos  deílas  duas 


j  -j         Av*^  ^^  ~..  wxvwK^     vj.wii«k,  viuaa 

que  he  de  todos  os  Santos     jornadas,  &:fe  ajuntou  hu 
Padres,  omonte  da  myr-     íanguecom  outro  fangue, 


rha  he  o  Calvário  ,  onde 
Chriílo  morreo,6cooitei- 
ro  do  incenfo,  he  o  Horto 
de  Getfemani,  onde  orou : 
(^porque  Getfemani  eíla- 
vaíituado  em  hum  tezo 


entaò  exclamou,  6c  decla- 
rou a  vozes  o  Filho  5  que 
fua  ÍViãy  era  toda  pura,  & 
fem  macula  :  Tutãptdchra 
es^  arnica  mea  ,  &  macula 
noncft  intci  porque  o  cf- 


fobreoValledeCedron.}     feito  gerai  do  fangue  da 
E  de  Chriílo   morrer  na     Cruz,foiremir,&:  oparti- 


Cruz,  &:orar  no  Horto, 
tira  por  confequcncia  ,  & 
conclue  o  mcfmo  Senhor, 
que  fua  Máy  toda  he  pura, 
&  fem  macula :  có  razaó,& 
confequcncia ,  torno  a  di- 


culardofinguedo  Horto, 
remir  prefcrvando. 

j  5-5-  Comparemos  hu 
fangue  com  outro  ,  o  da 
Cruz  com  o  do  Horto,  & 

, ^ , ^,-     veremos  com  os  olhos  eíla 

zer,miíagrofai  porque  pa-     mefma  differciiça.  Quan- 
do 


da  Virgem  Maria  S.N.  171 

do  na  Cruz  deraó  a  lança-    jangiús:,ut  redimeret.  A ílim 


da  a  Ghriftojfahio  Tangue, 
ioan.19.  _,  _,  '    ,   ^        P  j 

3 }.       &  agua  :  Extvttjangms^& 

aquaim.is  quando  o  Se- 
nhor íiiou  no  Horto,  fo- 
mente fahioíangue  :  Fa^ 
Luc.21.  ^^^j.  eftfudorejusfictitgut- 
t^fanguinis.  Parece,  que 
naó  havia   de  fer    aííim. 


44 


os  demais.  Ecomo  ofan- 
gue  da  Cruz  era  para  re- 
mir, &  a  agua  para  lavar  as 
manchas  do  peccado  de 
ikdam  i  poriíTo  íahio  na 
Cruzo  fangue  juntamen- 
te com  agua  :  Exivit  faur 
guiS)  &aqua.   Porem  no 


Mais  próprio  era  do  fan-  Horto,como  o  fangue  era 
gue  do  Horto,  que  do  fan-  para  remir  naó  lavando  , 
guedaCruz  ,  fair  junta-     íenaôprefervandodamef- 


mente  com  agua.  Porque 
depois  de  exhauílo  o  fuor 
natural ,  que  he  humor 
aqueo ,  entaõ  fe  feguia  o 
preternatural  ,  &  prodi- 


ma mancha  .-porque fó ha- 
via de  remir,  &  naó  tinha 
que  lavar^  por  iííb  o  fuor 
naó  foi  de  fangue  j  unto  c6 
agua,  fenaó  de  fangue  fó- 


giofo,  que  he  o  de  fangue.  mente :  Siçiit guttafangui- 

Qual  foi  logo  o  myílerio,  ms,  Efca  he  a  razáo  ,  Sc 

porque  o  fangue  da  Cruz  propriedade  porque  oSe- 

fahio  juntamente  c6  agua,  nhor  quando  diífejque  ha- 

&  o  à.o  Horto  naó  .^  Todos  via  de  ir  ao  Calvário,  Va- 

os  Padres  uniformemente  dam  ad  moyitem   myrrh^y 

diluem  5  que  o  fangue  da  naó  faliou  palavra  na  pu- 

Cruz  íigíiiíicava  a  redép-  reza  da  May  ;  mas  tanto 

çâo,  &  a  agua  o  bautifmo  que  ajuntou,  que  havia  de 


primariamente  inílituido 
para  lavar  o  peccado  ori- 

Athan.    ginal.  S.  kXX^d.Vi-3iÇíO\ExÍVÍt 

^trm  à^ jãnguisy&  aquay  ut  íta  re- 
Amb  ?'  demptio  &  immudatío pria- 
iib.de    ris  Ada:  dimanaret,     E  S. 
cap.  .    K\nhTo£vo'.Exivit  aq.uayò'     virtude,  produzir  por   íj 
Jangms :  a^ua^ut  mundaret^    ío  eíle  eff eito  3  mas  como  a 

re-» 


ir  também  ao  Horto,c^  ad 
colkmthuris^  iogoapubli- 
cou,&  canonizou  porim« 
maculada^id?"  macula  mn^efi 
in te.  Bem  podéra  o  íangue 
da  Cruz,  como  de  infinita 


i 


Um 


^ 

m 


"172  Sermão  da  Conceição  hnmactílítJa 

redempçaõda  Máy  eratá-     No  fanguedeCíirifl-otan- 


tomais  nobre,  tanto  mais 
alta  5  &  tanto  maisprecio- 
fajque  a  de  todos  ,  tam- 
bém era  credito  da  merma 
redempçaó,  que  foílema- 
ior^Scmaisfubido  o  preço 


to  valor  tem  húa  gota  co- 
mo todo:  &  feno  todo  fe 
quizefreefpecular  alguma 
coníideraçaó  de  exceíTo, 
ou  ventagem,  o  todo. foi  o 
da  Cruz,  &  as  gotas  ò  do 


que  fe  át^^  por  elía.  Por  Horto ;  Stcutguttafanmi- 

líTo  os  empenhos  fempre  7Íts.  Que  razaó  de  prero- 

mais,  &  mais  primorofos  gativa  teve  logo  o  Tangue 

do  Filho  não  íe  contentaó  do  Horto ,  para  fer  eAç^  o 

com  menos,  que  com  do-  preferido   neíle  myílerio 

brarapaga  ,acrecentando  ao  da  Cruz  ?   Refpondo, 

hum   preço    fobre    outro  que  a 
preço,  6c  hum  fangue  fobre 
outro  fangue  ,  como  Re- 


que  a  razão  ,  conveniên- 
cia, &  primor  deíi;a  pre- 
ferencia, foi  5  para  quefnaó 
demptoremíim,ôcJefuda  fó  oRedemptor,  &  a  re- 
Mãy,de  quemotomou,&:  dempção,  fenaó  também 
nafceo  :  'JJe  qua  natus  efi     o  preço  delia, que  foi  o  fan- 


lefu 


us. 


1^6 


§.  V. 

TE  mos  prova- 
do a  preroga- 
tlva  do  fangue ,  que  Chri- 
fto  fuou  no  Horto  em  ref- 
peito  do  que  derramou  na 
Cruz,  Sc  como  foi  parti- 
cularmente aplicado  pelo 
mefmo  Filho  à  redempçaó 
im maculada  de  fua  Máy: 
mas  ainda  naó  temos  da- 
do^nem  inquirido  a  razaó. 


gue,  feuniífem  no  mefmo 
modo  fingular,  &  extraor- 
dinário de  remir,  com  que 
o  Filhoremioa  Máy,  & 
el Ia  foi  rem ida.  Como  Foi 
remida  a  Virgem  Mana  ? 
Não  depois,  lònaó  antici- 
padamenre,  quciífohefer 
remida  por  prefervaçam. 
Pois  eífa  foi  a  razaó,  o  pri- 
mor, &  afneza  ,  porque 
naó  fó  o  Redem  ptor  ,  &■  a 
redempçaó ,  fenaó tambe 
o  p rcço d c  11  a  í c  anti c i pou . 
O  Rcdcmptor  apreílbufe , 
^adi- 


da  Virgem  Maria  S.  N.  1 73 

&  adiantoufe  à  redêpçaó :     as  mefmas.  St  tanto  podia 


a  redempçaó  apreírou(e5&: 
adiantoufe  ao  peccado :  Sc 
para  que  o  preço,que  era  o 
fangLiejfe  apreíraire5&:  adi- 
anta íTe  também  ,  antici- 
poufeo  fangue  do  Horto 
ao  da  Cruz. 

1 5-7  Caminhando  o 
Pay ,  Sc  May  de  Samfam 
por  hua  eítrada  deferta 
cerrada  de  bofques,  adian- 
toufe o  filho,  que  os  acom- 
panhava 5  &  faindolhe  ao: 
encontro  hum  Leaó  tao 
feroz  na  catadura,  como 
foberbonos  bramidos,  ar- 
remeteo  a  elle  o  valente 
moçOjfem  mais  armas,que 
as  próprias  mãos,  Sc  afFo- 
gando-o  entre  ellas,  o  lan- 
çou morto  no  bofque. 
Grã  façanha,  Sc  mais  quê 
humanai  Allimonotaafa- 
grada  Efcritura, dizendo, 
queiílo  fez  Samfam  mo- 
vido do  Efpirito  divino. 
Mas  o  primeiro  movimê- 
to  com  que  fe  adiantou , 
deixando  atraz  fea  Pay,  Sc 
fua  Máy  ,  parece  que  nem 
foi  neceíTariOjnem  conve- 
niente. Neceífario  naó  •, 
porque  as  fuás  forças  eraó 


matar  o  Leaó  adiantan- 
dofe,  como  indo  ao  lado 
dos  Pays :  conveniente  tã* 
bem  naó,  &  niuito menos  j> 
porque  acompanhando  os 
mefmosPays  ,  os  aíTegu- 
rava  melhordo  perigo  da- 
quella,  ou  de  outra  fera  do 
bofque.  Qual  foi  logo  o 
fim  ^que  naó  podia  deixar  ; 
de  fer  grande,  ôcmyfterio- 
fo  ]  porq  o  moveo  o  mef- 
moeípirito a  que  íe  adiar í 
taíie.^O  fim  grande, &  my^; 
íleriofo  foi,  como  jà  no- 
tarão   alguns    Efcritores 
modernos^  porque  nefta 
hiftoria  de  Samfam  fe  re- 
prefentava    maraviihoíà- 
mente,&com  todas  fuás 
circunftancias  o  myílerio 
da  Conceição  immacula- 
da.  Aeftradapor  onde  ca- 
minha vão  o  Pay,  &  a  Máy, 
heaqueila   por  onde  def- 
cendemos  de  Adam  todos 
os  que  recebemos  o  fer  por 
geração  natural  :   o  Leão 
feroz,&íòberbohe  o  pec- 
cado original,  que  naquel- 
la  paíTagem    efpera  a  to- 
dos os  homens,&:  antes  de 
nafcidos  lhe  naó  perdoa,& 
os 


i 


i 


I  /4«  Sermão  da  ConcelçaS  Immaculada 

os  mata;  oSamfam,  que  o     o  figurado,  antes  desfaz,  <Sc 

matoua  elle  ,  he  Chrifto  defcompoem  toda  a  glo- 
por  natureza     izento  de     ria,&  privilegio  da  Con- 

peccadoj&quefô  tem  po-  ceiçaójqueconíllieemfer 

der, &f(3r^'as  para  vencer,  a  Senhora  unicaméte  pre- 

&  deílrmr  naô  fô  o  origi-  fervada  >  Mas  que  feria  fe 

nal,  mas  todos.  AíTim  pois  eudiíFeíTe,  que  nefta  que 

como  Samfam  fe  adiátou ,  parece  impropriedade  da 

&anticipou  para  livrar  do  hiíloria,  confiftioamaior 

Leão  a  feu  Pay,&  fua  Mãy,  energia ,  &  gala  do  myfte- 

antes  que  elie  os  encon-  rio?  AíHm  o  digo.  Porque 

traífeiaílImCliriílofeadi-  Samfim  livrou  daqueila 

antoujScanticipou  a  prc-  fera,  que  reprefentava  o 

fervar   do  peccado  origi-  peccado  original ,  naó  fô  a 

nalafuaMáy,antesqueel-  fuaMáy,fenaó  também  a 

laoencorreífe.  feuPayj   poriífomefmo 

158     Atè  aqui  os  Dou.  foi  perfeitilTima  figura  de 

tores  allegados,naó  repa-  Chrifto  no    myfterio  da 

rando  nenhum  delles,nem  Conceição.  Mas  de  que 

acodindoahúa  circunftã-  modo.^  Por  iílb  mefmo. 

cia,6c  impropriedade,  que  Porque Chrifto  foi  Filho 

fendo  efta  figura  taó  natu-  da  Virgem  Maria  :  &  a 

ral  do  myfterio  ,  naó  fô  a  Mãy  que  he  Virgem,  nam 


fô  he  Máy,  fenaó  Máy .  & 
Pay  de  feu  Filho  ,  porque 
naó  tem  outro  Pay.  Logo 
para  Samfam  fer  perfeitif- 


desluftra,&:  afea,mas  a  ne« 
ga,  ou  põem  em  duvida. 
Samfam  livrou  das  garras 

do  Leaó  a  feu  Pay,  &:afua     ^ ,^,  ^/v.iiv.itii- 

Máy :  Chrifto  naó  prefer-  fima  figura  de  Chrifto  no 

vou  do  peccado  original  a  myfterio  da  Conceiçam, 

homemalgum,fenaóahúa  naó  fô  havia  de  livrar  do 

mulher  fomente,  que  foi  a  Leaóafua  Mãy,  fcnaó  a 

Virgem  immaculada  :  Io-  fua  Máy,&  a  feu  Pay  jun- 

goa  hiftoria  naó  diz  com  tamente.  Efteheofunda- 

o  myfterio,nem  a  figura  có  mento  porq  graves  Theo- 

logos 


da  Virgem  Marta  S.N.  17^ 

logos  ti veraó  para  fy ,  que  que  depois  de  muitos  dias 
a  Virgem  Maria  em  ref-  fe  manifellou^que  o  inten- 
peito  de  feu  Filho  fe  ha-  to  de  Samfam  fora  formar, 
via,  ou  podia  chamar  nam     como  formou,da  íiia  meA 


íò  Mater  como  as  outras 
Aiiys,  fenaó  Matripater^ 
que  quer  dizer  Máy  ,  & 
Pay.  E  pela  mefma  razaó 
lemos  em  muitos  Santos 
Padres  ,  que  o  amor  da 
Virgem  em  rcfpeito  do 
mefmoChriftofoi  dobra- 
do ;  porque  o  amor  dos 
outros  filhos  naturalmen- 


ma  hiíloria  aqueile  famor 
fo  enigma,  que  propoz,  & 
cxpozaojuizodos  homés 
com  nome  de  problema : 
Troponam  vobis  problema,  jjdid 
Jàeftouvendo,qttenenhÚ  '^'^ 
entendimento  haverá  tam 
rude  5  que  heíla  íingular 
circunílancia  naõ  reco- 
nheça mais,  &  melhor  a 


te  gerados,  dividefe  entre     hiíloria  da  Conceiçam  de 
opay,&amãyj  porém  na     Maria  ,  que  a  do  mefmo 


Máy  Virgem  ,  como  em 

Máy,^ Pay,  eftava  todo 

unido. 

\    1 5p     Ainda  tem  a  meí^ 

ma  hiftoria    de  Samfam 

outra  admirável  proprie- 


Samfam.  Adiátoufe  Chri- 
ílo  a  vécer,  &  matar  o  pec- 
cado  original  antes  da  Gó- 
ceiçaó  defua  Máy :  &  eftá- 
do  por  muito  tempo  oc- 
culta  aquella  íingular  fa- 


dade  em  confirmação  do  canha  do  Filho  -,  que  fez  o 

mefmo  myílrerio.  Jà  vimos  mefmo  Filho  ?  Da  mefma 

como  Samfam,  quãdo  ma-  façanha  occulta  ,  &  do 

touoLeaó,oláçou,&:efcó.  mefmo  fegredo  fó  a  elle 

deo  no  bofque.  E  declara  a  manifefto,  fez  o  mais  celc- 

Efcritura,q  nem  a  feu  Pay,  bre,  &  mais  altercado  prò- 

nem  a  fua  Máy,nê  a  outrê  blema,que  nunca  ouve  no 

defcobrio  aquella  façanha,  mundo,  difputádo  as  mais 


fendo  de  tanta  honra  fua , 
&taó  bizarra.  Aílimefte- 
veocculto  o  myfferiodé- 
fte  filencio,  &  fegredo,  atè 


doutas  Efcolas  da  Theo- 
logia,  fe  Maria  fora  conce- 
bida em  peccado  original, 
ou  naõ.  QaeEfcrituras  fe 

naó 


mk 


1 

Ih         tjl    tZ 


176  Sermão  da,  Conceição  immàculada 

nãotem  defenterrado,  &     da,  Scfcíf-ejadadctodos. 
defentranhadoPQiie  livros         160     Tornando  ao  fio 
fe  naó  tem  mandado  à  ef-     do  noífo  dircurfojafiim  co- 
tampa  >  Que  difcurfos,  &     mo  o  Filho  fe  adiantou,  <Sc 
argumentos  fenaô  tem  iii-     ancicipouà  redempçaòda 


ventado  ?  E  em  quantas 
difputas  publicas  ,  &  fe- 
cretas  fe  não  tê  cótrover- 
tidoefte  mefmo  ponto,  íe- 
guindo  huns  Doutores  a 
parte  aííirmativa  ,  &  ou- 
tros com  maior  applaufoa 
negativa  ?  Mas  todos  atè- 
gora  problematicamente  j 
porque  aíllm  oquiz  para 
maior  celebridade,  &  glo- 
ria do  mefmo  myíierio  o 
foberano  Author  do  mef- 
mo problema :  Troponam 
^ohis problema,  E  fera  fem- 
pre  problema?  Naó.  Por- 
que da  mefmahiftoria  có- 


Mãy  5  aíHm  a  mefma  rc- 
dempçaó  fe  adiantou,  ^' 
anticipouao  peccado  ,  &: 
com  nova  ,  ôc  admirável 
correfpondencia.  Foi  tam 
admirável  a  preíla  coque 
o  peccado  original  fe  adi- 
antou ,&:anticipou  a  ma- 
tar os  homens  -,  que  fendo 
todos  filhos  de  Adam,  pri- 
meiro os  matou  feu  Pav 
com  o  peccado,  do  que  el- 
les  naceífem.  E  para  que  /e 
veja, que  a  redempçamda 
Virgem  Maria  nam  foi 
menos apreíTada, nem  feu 
Filho  fe  adiantou  ,  &■  anti- 


lta,que  Samíam  revelou  o     cipou  menos  em  preíervar 
enigma  a  fua  Efpoíli.  E  af-     a  Mãy,  do  que  Adam  fe  ú- 


ílmcomo  Samfimo  reve- 
lou a  fua  Eípofa,&  por  me- 
yo  delia  o  entenderão  to- 
dos •,  aílim  Chrifto  final- 
mente acabara  de  o  reve- 
la r  a  fu a  F fpo fa  a  Igr ej a , 
como  játcm  começadoj  &: 
como  for  deli  n  ida  porei  la 
r^ive-rdadc,  ccílarà  a  coii- 
trovcrfia,  6clerà  conheci- 


nha  adiantado,&  anticipa- 
doem  matar  os  íilhos-,per- 
gunto,QLraifoiprimciro,o 
nafci mento  do  Filho,  ou  a 
Conceição  da  Mãy?  Naó 
ha  duvida  ,quca  Concei- 
ção da  Mãy  Ibi  muito  pri- 
meiro, queo  nalbimento 
do  Filho^  Pois  fe  o  Filho 
ainda  nao  era  naícido ,  co- 
mo 


ãa  Virgem  Maria  S.N.  i  yy 

mo  prefervoírdopeccado     meiro.   Todos  os  Santos 

Padres  reconhecem  neíle 
cafo  grande  myílerio  ,  & 
concordaó  em.  que  aquel- 
le  fio  de  purpura  foi  íinaí 
dofanguede  Chriílo.  S. 
dopode-os  Adam  matar  Cyriliocomentãdo  aspa- 
com  o  peccado  antes  de     lavras  do  Texto, /^^j/?rí7- 


a  Mãy  antes  de  nafcer  ? 
Refpondo  tornando  a  per- 
guntar. EquandoAdam 
peccou,  eraó  jà  nafcidos 
léus  filhos  ?  Não :  &:  có  tu- 


nafcerem.  Pois  feria  bem, 
que  os  filhos  de  Adam  os 
mataíFe  íeu  Pay  c6  o  pec- 
cado antes  de  nafcerenijSc 
o  Filho  de  Maria  naópre^ 
fervaíTedo  mefmo  pecca- 
do a  fua  Mãy  antes  de  naf- 
cer? He  verdade,  que  eíla 
redempçaó  taó  anticipa- 
da  foieíFeito  do  fangue 
da  Mãy  j,  que  elle  ainda 
naó  tinha  recebido.  Mas 
eíTahe  a  virtude  do  fan- 
gue de  Chriftojcomo  ago- 
ra veremos. 

1(3 1  Quando  ouveraô 
de  nafcer  Zaraò ,  &  Pha- 
resdous  filhos  gémeos  de 
Thamar  j  Zaraó  lançou 
primeiro  fora  hum  braço, 
no  qual  a  que  aíTifl-ia  ao 
parto  lhe  atou  hum  fio  de 
purpura ,  entendédo  q  elle 
leria  o  primogénito-,  mas 
enganoufe,  porque  Phares 
fe  adiantou>&:  nafceo  pri- 
Tom./. 


ttiUt  maniim^  m  qua  obfte- 
trix  Ugavit  coccinum^  àiz , 
ÇocciniimfanUiJJimu  Chri- 
fii  fanguinem  pgnat,  E  o 
mefmo  dizem  S.  Ambro- 
fíO,  S.  Bernardo ,  &  outros 
Padres,  Foi  pois  o  cafo, 
que  os  dous  gémeos  Za- 
raó 5  ti  Phares  cada  hum 
procurava  nafcer  primei- 
ro, 6c  fer  o  primogénito, 
para  que  do  feu  fangue 
nafceíTe  o  Meílias,  que  era 
toda  a  ambição,  &  emula^ 
çaódaquelletempo.E  que 
fez  o  mefmo  Meflias  .'*  A 
Phares  concedeo ,  que  re- 
ceberia delle  o  fangucj&a 
Zaraó,  que  com  o  mefmo 
fangue  o  aílinalaria :  &  af- 
fim  foi.  Mas  a  Zaraó  deo- 
Ihe  logo  a  purpura  ^  &  o 
final  do  fangue,  Sc  de  Pha- 
res naó  o  recebeo  fenam 
muito  tempo  depois.  E 
porque  .^  Porque  he  virtu- 
M  de 


GeneO 

38.27. 

;^pi:riLi- 
pnmiriú 
Am':r. 
ilernar. 


W'- 


178  Sermão  da  Conceição  immaculaia 

de  própria  do  Tangue  de  Redemptor  foi  Redcmp^ 

Chriftopoderfe  dar  antes  toranticipado,  porque  fe 

de  fe  receber.  O  Tangue  de  adiantou  ,  &  anticipou  à 

Phares    naó   o    recebeo  redempçaór&aíTimcomo 

Chrifto  fenaó  quando  naf-  a  redempçaó  foi  anticipa- 

ceo  o  mefrao  Chrifto,  &  o  da,porque  fe  adiantou ,  & 


ílnal,&  eíFeito  áo  feufan- 
gue  recebeo-o  Zaraó  an- 
tes de  nafcer  o  mefmoZa- 
raó :  &  ifto  foi,  nem  mais, 
nem  menos  o  que  fe  veri- 
ficou na  Conceiçam  de 
Maria  ,  &  no  nafcimento 
de  feu  Filho.  O  Filho  re- 
cebeo o  Tangue  da  Mãy, 
quando  delia  nafceo ,  que 
foi  no  dia  do  Teu  naTcimé- 
to :  Sc  a  May  recebeo  o  cf- 
f eito  do  langue  ,  que  deo 
aoFiJja^antesde  naTcer  a 


anticipou  ao  peccado  •,  aT- 
íimfoi  conveniente  para 
maior  luftre,  &  gloria  do 
myflerio,  que  o  preço  da 
mefma  redempçaó  ,  que 
era  o  Tanguc,foíre  também 
anticipado  ,  &  poriífo  o 
Tangue  do  Horto  fe  adian- 
tou ,  &  anticipou  ao  Tan- 
gue da  Cruz.  Aílim  o  no- 
tou, &  celebrou  com  ad- 
miráveis propriedades  a 
me  Tm  a  Virgem  taó  pri- 
moroTamente  remida. De- 


anéfma  Máy  ,  que  foi  no  pois  de  dizer  Teu  bemdito 
dia  da  fiia  Conceição.  De  Filhojqueofruto,  queco« 
Torte,que  o  Filho  foi  Re- 
demptor da  Mãy  por  me- 
yodoTangue,qiie  delia  re- 
cebeo,antes  de  o  receber : 
&a  Mãy  foi  remida  ,  & 
prefervada  por  meyo  do 
Tangue ,  que  deo  ao  Filho, 
antes  de  iho  dar.  E  temos 
fiindada,8c  declarada  a  ra- 
zão, porque  eRe  Tangue 
foi  o  do  Horto. 

162      Aílim   como   o 


Iheo  no  Horto,  foi  a  Tua 
myrrha :  Veni  in  Hortum 
meiím  ,  meffíá  myrrham  ^^"^  <s 
meam-.Ti  qual  myrrha  ,  co- 
mo vimos  ,  he  o  Tangue 
q  no  meTmo  Horto  Tuou  i 
diz  logo  a  Senhora,  fal- 
landocom  o  meTmo  Fi- 
lho, que  eíTa  myrrha  a  que 
chamaprimeirajfoiocltii- 
ladode  Tua  Tigrada  boca:^^.^ 
Lahiaejus dtjtillantia  myr- 
rham 


^3^ 


-^ 


JJLJLMJU^ 


da  Virgem  Maria  S.N.  179 

rhamprimâ.  Mas  fe  aquel-  Senhora  ,  que  da  mefma 
lefangue,  que  o  Senhor 
fuou,rahio,&:  brotou  por 
todos  os  poros  do  fagrado 
corpo,  como  diz  a  Senho- 
ra, quefoieftillado  de  fua 
boca  ?  Agora  fe  verá  com 
quanta  propriedade  inter- 


hocafeeítillava  a  myrrha 
primeira  :  Labta  ejus  di" 
fiillantia  myrrhampnmam. 
163  K^^-útl^itl  diftiUâ- 
f/^hea  mefma  com  que  o 
texto  Arábico  explica  o 
fuor  do  Horto:  Et  faãus 


pretamos  do  Horto ,  &  da  ejifudor  ejus  velutfanguis 

oraçaó  do  meímo  Horto  o  diftillans.  Mas  porque  ra- 

nome    de  collem   thiiris,  zaó  chama  a  Senhora  nas 

Chamafe  o  ságue  do  Hor-  mefrnas  palavras  ao   fan- 

to   eftillado  da  boca   de  gue  do  fuor  do  Horto  nam. 

Çhrifto  •,  porque  a  força,&  fó  myrrha  ,  fenaó  myrrha 

efíicacia  da  oraçaó  do  mef-  primeira ,  myrrhamprimã^ 

mo  Senhor  no  Horto,  co-  nome  taó  íingular ,  que  fó 


nefte Texto  fe  acha  em  to- 
da a  Efcritura  fagrada? 
Toda  a  myrrha  nam  he 
aquelle  licor  ,  ou  humor 
preciofo,&  aromaticojquc 
feeftilla  da  arvore  onde 
nafce?  Sim.  Pois  porque 


mo  taó  fervorofa5&  arden- 
te, foi  a  que  acendeo  ,  & 

futilizouofanguenas  ve- 

as  ,  &  o  fez   manar  em 

fuor.  Aílimodizcóamef- 

ma  confequencia  o  Evan- 

gelifta  S.  Lucas :  TroUxius 
Ltíc.22.  f^j.al;at  yérfaãus  eíffudor  fe  chama  particular,&  fm- 
'^^^^  ejiisficut  guttafanguinis:  gularinente  o  fangue  ,  & 
filias  E  Elias  Cretenfe  comen-  fuor  do  HortOjnaó  myrrha 
^'^^  '^'  tando  o  mefmo  Texto:yf r- 

dentt  r  orat^  acfudor  gutta^ 

rum  fanguinearum   ah  ipfo 

f.uit.  E  comoaopaííbjque 

da  boca  fahia  a  oração,  das 

veas  rebentava,  &  corria 

o  fangue ,    efta  foi  a  pro- 
priedade com  que  diíle  a 


dequalquermodojfenam 
myrrha  primeira  :  2>////7- 
lantia  myrrham  priifiãm? 
Náofe  poderá  mais  pró- 
pria, &  eruditamente  de- 
clarar o  myfterio  de  fer 
sãgue  anticipado.  A  myr- 
rha, como  defere  7e  fii- 
M  ij  niOí 


i 


'  id 


I  «►f' 


180  SermaodaConcelçaoímmaculada 

Myniv  "^^'  colhefe  da  arvore  on- 
de fe  cria  por  dous  modos. 


O  primeiro  he/uádo  a  ar 
vore  por  fy  mefma  aquelle 
licor  mais  futii  eílillado 
naturalmente,  8c  fem  vio- 
lência :  &  efta  fe  chama 
myrrha  primeira.  O  fegu- 
do  he  ,  picando  primeiro 
aarvore5&  dandolhe  gol- 
pes, pelos  quaes  fae ,  òc  fe 
defcarrega  o  licor  mais 
groíFo  :  &  eíla  fe  chama 
myrrha  fegunda.  E  quem 
naó  vè  que  tal  foi  com  ad- 
mirável    propriedade    a 


myrrna primeira:  Myrrha 
primam.  E  fiz  tanto  ciifo  a 
Virgem  puriíllma  dcfta 
circunílancia  5&  celebra, 
&  louva  tanto  a  feu  Filho 
por  ella ;  porque  confiílin- 
do  naó  lo  a  prerogativa 
maior,  fenaõ  a  mefma  ef- 
fencia  da  fua  prefervaçao 
em  fer  redempçaó  antici- 
pada-,  que  mais  primorofa, 
&  elegante  fineza  fe  podia 
efperar  ,  ou  imaginar  do 
mefmo  Redemptor  ,  do 
que  querer  feu  amor  ,  & 
inventar  fua  fabedoria  , 


myrrha,  &fangue  do  Hor-     queaílim  comoa  redemp- 
tojcomparadocoma  myr-     çaódefuaMãy  foi  antici- 


rha,&:  fangue  da  Cruz  ?  O 
fanguG  da  Cruz  naó  fahio 
fenaó  depois  de  ferido,  & 
aberto  o  corpo  do  Redêp- 
tor  com  os  cravos,  &  com 
a  lança :  o  do  Horto  porem 
anricipandofe  a  todos  os 
infhu mentos  da  violên- 
cia, elle  fahio,  &  fe  eílillou 
por  fy   mefmo   das  veas 


pada,  allim  foífe  anticipa- 
do  o  preço  da  mefma  re- 
dempçaó, &  o  fangue  com 
que  a  remio,  também  an- 
ticipado  ^  Aílim  provou 
finalmente  fer  fangue  áà- 
quellejefus  ,  5c  daquelle 
Redemptor:  daquelle  Re- 
demptor, que  o  foi  de  lua 
May  antes  de  fer  homem. 


emfuor,&:efpontaneamé-     &  daquelle  Jefus  ,  que  o 
te.  O  fangue  da  Cruz  tira-     foi  de  Mana  antes  de  fer 


doa  força  do  ferro,  como     Filho 
myrrha  fegunda  :  o  fmgue     Jefus. 
do  r-í  jrco  íu:ido  fcm  força 
mais  que  a  do  amor,  como 


'JL)e  qua  7iatus  eji 


í.vi. 


dãVirgem  Maria  S.U.  ^    ^^^ 

foi  o  mefmo  i  que  na  En- 
carnação   tinha  recebido 
de  fua  fantiíTi ma  Mãy . 
1 6  f  A  ptimeira,  &  na- 
obrigaçoens  de     tural  razão   em   que   me 


§.  VI. 


i6j^  ta  parece  que  as 


Redemptor juntas  comas  fundo,  he  tirada  do  peito 

de  Filho  fe  devéraó  dar  do  mefmo  Verbo  encar- 

por  fatisfeitas  nos  primo-  nado,ac  dos  archivos  de 

res^Ôc  finezas  taó  repeti-  feu  entendimento, &  von- 

dascomque  fmgularizá-  tade,&naóem  correfpon- 

raò  a  redempçaó  da  purif-  dencia  de  outro  myílerio, 

íima  Máy  j  mas  ainda  refta  feiíaó  do  mefmo  da  Encar- 

a  mais  primorofa,&  a  mais  naçaõ.  Duas  coufas  rece- 

fina  detodas.  Foifenten-  beodenòso  mefmo  Ver- 

ça  de  alguns  Padres  anti-  bo  naquelle  myfterio,  que 

gos,  como  hoiehe  comum  foraóacarne,  &ofangue. 

entre  osTheologos,  que  E  que  he  o  que  fez  delias, 

o  fangue,  que  o  Verbo  en-  6c  porque  razaó  ?  De  am- 

carnado  tomou  daVirgê  basinítituío  o  Santiílimo 

fantiífima,  fempre  o  con-  Sacramento  da   Euchari- 

fervou  unido  à Divindade,  ília  ^  &   a  razaó  foi,  diz  S. 

fem  permitir  ao  calor  na-  Thomás^para  que  tudo  o 

tural,  que  o  aiteraífe ,  mu-  que  tinha    recebido  dos 

daíTe  ,  ou  diminuiíTe.  O  homens,o  empregafle  em 

mefmo  conferva  hoje  glo-  faudedosmefmos  homês: 

Auguíi.  ^'^qÇq  no  Ceo,  como  diz  S,  ^otum  quodde  nojiro  acce-  n  th. 

AfíSnp.  Agoftinho  i  &  o  mefmo  pit.totumnobiscontuhtadovmmi 


^''^-    còmunsramos    no  Sacra- 
mento,  como  diz  b.rearo 


Ser 


4f- 


Damiaó.lílo  fuppofto,naó 
me  julgará  por  temerário 
a  piedade  Chriftãa  ,  fe  eu 
diírer,que  o  fangue,  que 
Chriílo  fuou  no  Horto, 
Tom./. 


falutem.  Lembremonos  ^^" 
agora ,  que  do  Cenáculo 
onde  o  Senhor  tinha  iníli- 
tuido  o  Sacramento,fe  pac- 
tioim  mediata  mente  para 
o  Horto  ,  onde  a  mefma 
carnejque  tinha  facramé- 
M  iij         tado 


Jr 


ll^ 


1  J 


182  Sermão  da  Conceição  immaculaãa 

tado/uoupartenáodeou-     tão  devida,  &  primofofa 
tro,  fenão  do  meímo  fan-     occafiaó. 
gue     E   haverá  quem  fe         16G    Ifto  he  o  que  di- 
perfuadajqueem  tão  pou-     go,&:náofó  ,  &  fem  Au- 
coefpaçodetempo^&de     thor.    Eufebio  EmiíTeno 
lugar  mudaíTe  de  penfa-     (que alguns  querem  foíTc 
jnento.&aífedoo  mefmo     Eucherio, ambos  antigos 
entendimentoj&amefma     Padres  da  Igreja  ,  6c  de 
vontade  de  Chrifto,  &  fe     grande  authoridade  }  ou 
tiveíTc  efquecido  daquel-     ambos ,  ou  qualquer  del- 
le  mefmo  diétame  da  fua     les  dizem  eílas   notáveis 
bondade,  &  daquella  mef.     palavras.  "D^  carne  Maria 
ma  correfpódencia  de  feu     coagulatus ,  de  ejiisforma^ 
amor  ?  Claro  eílà,  q  quem     tus  njtfceri  us,  de  tjus  Jub-  ^:^^\ 
talimaginaíle ,  feria  com    ftant  ia  confim  matus  ,  fan-  hõmii'. 
manifefta  inj uria  tanto  do    gumem  quem  etiampro  Ma-  ^"^ .  ^'^ 
•Filho,como  da  Mãy.  Lo-     tre obtulit,  dejangiáne Ma^  Domifi. 
?^Í£,^^9"^^^?' ^  ^"^or    trisaccepit.    Querem    di- 
zer :  Chriílo   gerado  da 
carne  de  Maria  ,  formado 
das  entranhas  de  Maria, & 
dafuílancia  de  Maria  fei- 
to homem  confumado,o 


de  Chriílo  tinha  julgado, 
que  devia  empregar  em 
faudedos  homens  tudo  o 
que  tintia   recebido   dos 

homens :  havendo  de  ap*     .,^,,, 

plicar  algiia  parte  de  feu  fingue  que  nmben7offe" 
langue  para  a  anticipada  recco  porredempçam  de 
redempçaô  de  fua  Mãy ;  fua  Mãy,  foi  o  que  do  fan- 
porque  naÓ  feria  aquella     gue    da  mefma  Mãy    ti- 


mefmaparte,quc  de  fuás 
entranhas  tinha  recebido? 
Quemtaô  inteiramente  o 
tinha  confervado,  aguar- 
dado trinta  ôc  três  annos, 
fcm  duvida,  que  não  feria 
fenão  para  o  empregarem 


nha  recebido  :  Sangmnem 
(juem  etiampro  Matre  obtu^ 
///,  defanguine  Matris  ac- 
cepit.  Notemfe  muito ne- 
ílas  admiráveis  palavras 
aquelle  fanguinem  defan- 
guine Matris  ^  de  aqucfe 
et  iam. 


daVirgem  Maria  SM.  1S3 
etiam.  De  forte  que  o  fan-  x^S.çtiam ;  foi  efpcciaimé- 
oiie  de  que  fe  falia  naó  he  te  applicada,  como  dizja- 
rodo  o  fangue  de  Chrifto,  mos,  à  redempçaó  da  mef- 
fenaó  parte  delle  ,  &  eífa  ma  Máy:  Sluem  ettam  pro 
parte  não  outra  >  fenaó  Matre  obttilit . 
aquella  mefma  parte ,  que  i  (>/  E  para  queo  mef- 
recebeo  do  fangue  de  fua  mo  fangue  nos  coníirmç 
Máy:  Sanguinem  quem  de  altamente efte  penfamen- 
fanguine  Matrts acceftt.  E  to,  yamos  ao  mefmo  Hor- 
aquelle  etiam  ,  etiam  pro  to,&  ao  mefmo  paífo  ,  & 
Matre ehtulit ^^Ç.Ví0X.2.Q^Ç.  modo  com  que  fe  derra^ 
foi  paga ,  &  preço  particu-  mou.  Quando  Chrifto  Se- 
Jar ,  offerecido  particular-  nhor  noífo  entrou ,  &  per- 
iTiente  fó  pela  redempçáo  fe verou  na  oraçaó  do  Hor- 
da Máy,alèm  do  preço  ge-  to  tantas  vezes  repetida , 
ral  offerecido  por  todos,  o  as  anciãs  da  mefma  oraçaó 
qual  naó  foi  fó  parte  do  eraó  fundadas  no  temor 
fansuede  Chrifto  ,  fenaó  natural  da  morte  ,  &  dos 
todoofanguej&naófóa  tormentos,  tendo  dado 
parte  que  tinha  recebido  licença  o  Senhor  aparte 
do  íangue  da  Máy  na  En-  fenfitiva  da  fagrada  huma- 
carnaçaó,fenaótodooque  nidade^aífim  para  prova 
acquirioemtodootempo  da  verdade  delia  ,  como 
da  vida.  Efte  fangue  todo  para  mais  padecer  por 
foi  o  preço  da  redempçaó  nos  3  a  que  fe  fogeitafíe  a 
univerfal  do  género  hu-  todos  os  effeitos  da  natu- 


mano:  mas  aquella  parte 
recebida  do  fangue  da 
Máy,pofto  que  foi  parte 
defte  todo  ,  também  em 
quanto  parte    feparada  , 


reza,  ainda  com  íinaes  de 
temerofa,8c  fraca.    Nefte 
fentido  difte  S.  Marcos: 
Capitpavere^  &t adere-,  o  ^.^^^ 
que  entendem  todos  os  -í-  '^3- 


^//^;^5tambem,&-pormo-     Padres  de  próprio  ,verda 

doparticularjí^íi^w^*,  tam-     deiro,  6c  natural  temor. 

bem,&  fobre  opreçoge-    Mas  efte   mefmo  temor 

M  iiij         pa- 


mmmmm 


1 8 4.  SermaÕ  da  Conceição  imm acidada 

parece  que  faz  diffiçultofo     que  o  Verbo  encarnado 


ofuor  defangue  y  porque 
naófóaFilofofía,  fenaóa 
experiência  nos  enílna, 
que  com  o  temor  fe  reco- 
lhe o  Tangue,  &  acode  ao 
coração ,  &  por  iíTo  íicaó 
pallidos  os  que  temem. 
Fois  fe  Chriíío  verdadei- 
ramente temia  ,&■  aílim  o 
temor  como  o  íuor  defan- 


conrervava,&:  tinha  rece- 
bido do  Tangue  de  Tua 
Máy.  Provo.  Quando  o 
Anjo  deo  a  embaixada  à 
Senhora,  turbouTe  hú  pou- 
co o  animo  humiiinimo,&: 
modeílilíimoda  Virgem, 
como  taó  alheo^o  que  ou-  ^c 
via :  Tiirbataeft  infcrmone  -9. 
ejus.  Entaóo  meTmo  An- 


gue,  pofto  que  extraordi-     jo  lhe  Tocegou  o  cuidado , 


nano,  Toi  natural  •,  como 
em  vez  de  Te  recolher  o 
íãngue  para  dentro,  Tihio , 
&  brotou  para  Tora?  A  ra- 
zão também  natural  he^ 
porque  no  meTmo  Tangue 
havia  os  impulTos,  &  cau- 
Tas  deíles  dilFerentes  eíFei- 
tos, aílim  como  eraó  dif- 
f crentes  os  aíFedos  ,  que 
entaó  combatiaó  o  cora- 
ção do  meTmo  Senhor. 
Húa  parte  do  Tangue,  Te- 
guindo  o  aífeílo  do  temor, 
era  tímido ,  outra  parte  do 


&  lhe  tirou  o  temor  5  dizê- 
do :  Netimeas,  Maria\M7í'  ^'''^^^ 
ria,naó  temas.  Socegado 
pois  o  temor,  então  acei- 
tou a  Senhora    animoTa- 
mente  a  embaixada,  &  ài- 
zcnd.o:Fiat  mihi  fecundum  ^^ 
verbumtuum,cnVàòcnc2Lr*    ' 
nou  o  Verbo  em  Tuas  en- 
tranhas. E  como  o  Tangue, 
que  o  Verbo  tomou  do 
Tingue  de  Tua  Máy  ,  era 
Tangue  actualmente   ani- 
moíb,iVí^  tímeas  Mar/a,ci\€ 
foi  o  Tangue,   quenoHor- 


langue,Teguindo  o  aíTcaro  to  naó  acodio  ao  coração , 

contrario,  era  animoTo  :  o  como  tímido  ,  mas  como 

ti  mído  acodio  ao  coração,  animoío  íhhio,&:  Taltou  fó- 

oanimoTolaltou  ,  &  Tihio  ra  das   vcas:  baãus^Jtfu^ 

fora  ;  &  efl:a  parte  do  Tan-  dorcjusjicut  guttafnvgui^ 

giieanimoTo,queTdcou,&:  nis.    Aílim  Te  portou  era. 

íahio  tora ,  foi  o  Tangue ,  Ihardo ,  &:  gcncroTo  o  íau- 

gue 


da  Virgem  Maria  S.N.  ^      i8> 

gue  do  Horto,  Gomolem-  fode  amor,  gratidão,  & 

brandofe  naó  fó  de   quem  primorofiíTima  correfpon- 

era,  mas  de  quem  tinha  fi-  dcncia,  que  a  parte  aiiti- 

do,  para  acodir  na  caufa  cipada  do  Tangue,  que  ef- 

originai  pela  honra  de  fua  peciahnente  appUcou,  & 

própria  origem  :    Sangtii-  dedicou  à  fua  preíervaçaô, 

nem  quem  eúam  pro  Matre  foíTeaquella  mefma,  que 


obtuíit-i  defdvguine  Matris 
accepit.   â^- 

i68  Émfimj&cmfum- 
ina,que  Jefujque  nafceo  de 
Maria,para  íe  moílrar  per- 


de fuás  puriffimas  entra- 
nhas tinha  recebido  ,  8ç 
guardado.  Eu  naôfei  pon- 
derar, nem  admirar  efte 
extremo  de  fineza  5  ma& 


feito,&:  perfeitiírimojefu,     darei  por  mim  outros  ad 
&  perfeito,  &  perfeitiíTi-     miradores  de  mais  alta  es.- 


mo  Redemptor  de  fua 
Máy,  naó  fó  a  préfervou 
fem  macula  em  fua  purilli- 
maConceiçãOj  que  he  o 
mais  perfeito  modo  de  re- 
mir-, mas  para  que  ella  fof- 
fe  a  primeira  entre  todos 
osremidos,&  a  Primoge- 


fera,  que  todos  os  huma- 
nos. 

169  Quando  Chriílo 
como  Redemptor  univer- 
fal  noífo ,  &  como  Redêp- 
tor  particular  de  fua  Máy 
ílibio  triunfante  ao  Ceo, 
admirados    perguntavam 


nita,  ou  Unigénita  da  re-     todos  os  Efpiritos  Angeli- 
dempçaó  do  mefmo   Fi-     cos^Sluiseft  ifte^quUjenit^ 


lho  •,  antes  de  eile  derramar 
todo  o  fangue  por  todos 
na  Cruz,  o  começou  a  der- 
ramar no  Horto,ou  única, 
-OU  particularmente  por 
ella,  anticipando  o  preço 
-da fua  redempçaó  ,  alllm 
como  a  mefma  redem  p.;aó 
foi  anticipada  }  mas  quiz 
também  por  ultimo  excef- 


de  Edom^  tinBis  veHibus  ? 
Quem  he  efte,  que  vem  da 
terra  de  Edomcom  as  ve- 
íliduras  tintas  em  fangue  ? 
IJle  formofus  in  Jiola  jiia^ 
gr  díensinmultitudinefor-^ 
titiidinisfu^.  Vem  acom- 
panhado da  multidão  dos 
que  libertou  com  a  forta- 
leza de  feu  braço:  6c  quana 
ferr 


\{^uex\ 


mm^ 


1 8  6  Sermão  da  Conceição  immacuUdji 

fermofo  elle,&:  quam  ^^n-     achareis  que  o  ílinc^uc  de 
til-homem  nofeu  veílido! 
Ninguém  haverá,  quenaó 
repare  muito  neílas   ulti- 
maspaiavras:  &  fer  ove- 
ftido  do  triunfador  o  prin- 
cipal motivo  da  admira- 
ção dos  Anjos ,  &  fundarê 
no  mefmo  veftido  todos 
os  encarecimentos  de  fua 
fermofura :  Ifteformofus  in 
ftolafua  ?  Se  era  pela  tintu- 
ra do  Tangue  ,  tinãis  vejii- 
bus-i  naó  levava  o  Senhor 
no  mefmo  triunfo  as  fuás 
Chagas  abertas?  Pois  por- 
que paflaó  em  fdcncio  as 
feridas  do  corpo ,  &  fó  ad- 
miraòo  fangue  do   vefti- 
do? O  que  manou  das  Cha- 
gas, &:  na  cor  viva,  &  bri- 


que  fe  im^^io  o  veíiido 
próprio  de  Chriílo,  foifó 
o  do  Horto.  Nos  açoutes 
eftava  o  Senhor  total  men- 
te defpidoj&o  fangue  que 
dellescorreo  ficou  no  pa- 
vimento do  Pretório.  Na 
coroação  de  efpinhos,  o 
fangue  que  ellestiráraó  da 
fagrada  cabeça,  também 
cahio,&  ferecebeo  na  pur- 
pura, de  que  Ihefingioa 
Opa  real  a  jocofa  impie- 
dade dos  foldados.  Na 
Cruz  tambemeílavadef- 
pido,  &  o  fangue  das  qua* 
troC  hagas,&da  quinta  to- 
do regou  a  terra  do  Calva» 
rio.  h\^\\\\  que  o  fangue  de 
que  fe tingio a  túnica,  & 
Ihante,  com  que  neílas  fe  veíliduras próprias  doSe- 
via  ,  naó  era  o  mefmo?  nhor,  foi  o  fangue  que  por 
Pois  porque  fe  celebra  tá-  todos  os  poros  do  corpo 
too  do  veílido  ,  &  naó  o     fuou  no  Horto.  E  comoeí- 


das  Chagas  ?  Porque  as 
Chagas  eraó  recebidas  na 
Cruz  pela  redempçáo  uni- 
vcrfal  de  todos,6c  o  fiingue 
doveflidoera  o  fuado  no 
Horto  pela  redempçam 
particular,  &  prefervaçaó 
de  fua  Máy. Notai  bem  to- 
da a  hiítona  da  Pay  xão,& 


te  langue  fe  fingularizou 
nos  extremos  tantos ,  & 
taò  admiráveis  ,  que  vi- 
mos,na  prefervaçaó  de  fua 
Máyi  por  iífo  oYoberano 
Redemptor  o  veflio  pela 
melhor,  &  maisricagala 
de  feu  triunfo :  &  por  lííb 
como  tal  a  admirarão  os 
An- 


ãa  Virgem  Marta  S.  N.  187 

Anjos,&:  a  celebrarão  pela  vando-a,  &  defcndendo-a 

maior  gentileza  do  mefmo  do  peccado^falvou-a,  fa- 

Redemptor:  IHeformofits  tisfazendo  também  deju- 

inftola  fua.  íliçaàs  obrigaçoens^  que 

170     Tudo  o  mais  que  como  Filho  devia   a  fua 
fucedeo  no  mefmo  triun- 


fo, cóíirma  fer  efte  fangue 
taóadmirado,o  que  parti- 
cularmente fe  applicou  à 
Cóceiçaó  immaculada  da 
Virgem  fantiílima.  Per- 
guntarão os  Anjos  5  quem 
era  o  foberano  triunfador : 

ifai  6^  ^^^  ^fi  ^fi^ '  ^  ^^^^  mefmo 
.1.     ^'TCÍpondcoiEgo^quíloquor 

jufiitiam  ,  é^  propugnator 
fumadfalvandum\  Eu  fou 
o  que  faço  juíliça  ,  &:  fou 
defenfor  para  falvar.  A  to  - 
d:js  falvou  Chrifto  5  mas 
fó  a  fua  Máy  propriamen- 
te como  defenfor  5  propug' 
w<2í(?rj  porque  aos  outros 
falvou,  livrádo-os  do  pec- 
cado  i  porém  a  fua  Mãy 
defendendo-a,queo  nam 
encorreíle.  EeÔahea  ái- 
ftinçaó  dajuíHça,  de  que 
falia :  Ego^qíú  loquor  jufti- 
tiam-j  porque  aos  outros 
depois  do  peccado  falvou- 
os/atisfazendo  de  juíliça 
à  lefa  Mageftade  do  Payj 
porém  a  Senliora  prefer- 


Mãy .  Inftáraó  mais  os  An- 
jos :  ^are  ergo  rubrum  eft 
indumentum  tmim-i  &  'veCtt-  „ . ,     , 

r  1  •         Ibid.j;  ] 

menta  tuajmit  calcanUum 
in  torculari^  E  que  cor  ver- 
melha he  a  deíle  veftido 
femelhante  à  dos  que  pi- 
zão  no  lagar  ?  Co  a  mefma 
comparação  tinhaójà  di- 
to acima ,  tinõíis  veftibus 
deBofra  •,  porque  Bofra, 
quer  dizer  vindemia ,  vin- 
dima.  Refpondeo  o  Se- 
nhor :  Tor  calar  calcavi  fo-  ^^  -^^^ 
/»/,  &  de  gfntíbus  non  eft 
*vr  mecum  Tporque  o  lagar 
cmquefe  me  tingirão  os 
veftidos,  eu  fó  o  pizeijfem 
eftar  ninguém  comigo. 
Donde  fevè  a  differença 
do  fangue  derramado  na 
Cruz,  em  que  a  mefma 
Mãy  o  acompanhou  como 
Corredemptora,  &:  efteve 
cercado  de  tantos,  aílim 
feuscomo  eftranhosjà  do 
fangue  fuado  no  Horto, 
em  que  eíieve  fó,  &  foHta- 
rio,5c  atè  os  que  tinha  dei- 
xado 


<   i! 


Thren. 


xado  mais  perto,  dormin- 
do. E  porque  efte  Tangue 
do  Horto  na  metáfora  de 
lagar  foi  o  applicado  par- 
ticularmente à  redem.pçaó 
da  Virgem  :  aqui  vem 
caindo  quando  menos  o 
fom  das  palavras  de  Jere- 
mias :  Torciílar  calcavit 
U)omirms  Vir gini  filia  ht- 
^a:quG  o  mefmo  Senhor 
foi  o  que  pizou  o  lagar  pa 
ra  a  Virgem,  filha  deju  " 
Finalmente conclue  oDi- 


Sermaoda  Conceição  mmaculada 


da. 


Sanguis  eorum.  Mas  fc 
Chriíloremio  os  homens 
comofangue,  que  tinha 
recebido  dos  mefmos  ho- 
mens, aqui  fe  cófirma  mais 
o  que  dizia  mos,  que  o  Tan- 
gue com  que  remio  aMãy, 
foi  o  que  tinha  recebido 
da  meTma  Mãy.  E  para  q 
acabemos  com  as  primei- 
ras palavras:  ^lis  eft  ifte^  ^,°["^^' 
qiii  veyiit  de Edom^  Edom , 
6c  AdamheomeTmOjpor- 
quehum,  &  outro  nome 
temomeTmo  íignificado. 


vmo  triunfador  com  húas 

palavras,  que  parece  àts-  E  diz  a  admiração  dos  An- 
fazem  quanto  temos  ditoi  jos  em  figura  de  Edom, 
porque  diz  que  aquelle  que  o  Toberano  triunfador 
ílinguede  queeílavaó  tin-  vinha  de  Adam,  porque  a 
tasasTuasveíliduras  ,  era  gloria  deíle  triunfo,  ou  a 
dos  que  na  Tua  batalha  ú-  parte  mais  gloriofa  delle 
nha  vencido :  ^^r///j  eft  toda  pertencei  à  Virgem 
Y^-^ifangms  eorum ftiper  vefti-  immaculada.  O  reílo  do 
meíita  mea :  logo  Te  o  Tan- 
gue era  dos  vencidos,  nam 

era  leu ,  como  Tuppomos  ?     de  Adam ,  que  heo  ori 
Antes  por  ifib  Teu ,  porque 
dos  vencidos.    Deos  nam 


humano     remio 
Chriílo  naó  To  do  peccado 


tinha  Tangue  ,  Sc  para  ter 
ílingue  com  que  remir  os 
homens ,  tomou  o  Tangue 
dosmeTmos  homens  ,  &c 
por  iíTo  diz,  que  o  Tinguc , 
que  derramoujcra  dcllcs: 


iial,  Tenáo  dos  peccados 
aduaes  de  todos,  &  de  ca- 
da hum  :  porem  a  V^irgcni 
M  a  ri  a ,  qu  e  n  aò  te  v  e  p  ec  - 
cado  ad-u:il ,  Tó  a  remio ,  Sc 
prcTcrvou  do  original  de 
Ad.:m  ;  &:  porque  de  là  co- 
meçou o  tnúfo,  dcià  vcyo 
otri- 


da  virgem  Maria  S.N.  \^9 

o  triunfante:  §lutsejtijte^     damos,&às  tentaçoens^^c 


qiú  venit  de  Edom  ? 
§.  VII. 

171  T7  Ste  Foi  o  Famo- 
Ljfiílimo  triunFo 
de  Jefu  em  quanto Redêp- 
tor,primeiro  de  fua  Máy, 
&  depois  do  mundoimais 
admirado  dos  Anjos  pela 
gaia  do  veílido ,  que  pela 
própria  PeíToa  j  &  mais 
galhardo  pelas  gotas  de 
fangue  do  Horto  5  de  que 
vinha  matizado,que  pelos 
rios  que  derramou  na 
Cruz  5  &  regáraó  o  Cal- 
vário. Para  os  devotos  da 
Conceição  im  maculada 
naónosíica  mais  que  de- 
fejar,  nem  que  fazer,  fe- 
naó  acompanhar  com  as 
vozes-,  affeâros ,  &  júbilos 
do  coração  as  admirações, 
ôcapplaufos  dos  Aajos,^ 
dar  aiil parabéns  ,  Ôc'  mil 
vivas  a  tal  Filho,  ôc  a  tal 
Máy.  E  poílo  que  todos 
peia  graça  do  Bautifmo  ef- 
tamos  livres  do  peccado 
original,  como  ficamos  ío- 
geitos  à  corrupção,  &  fra- 
queza,que  com  elle  her- 


perigo    dos    peccados  a- 
£buaes  5  o  que  muito  nos 
convém ,  &  de  que  muito 
neceílitamos,  he  ,  que  por 
meyo  da  interceílaó  pode- 
rofillima  da  mefma  Máy 
nos  valhamos  da  eíficacia 
do  mefmo  Tangue  do  Fi- 
lho. Alleguemosaambos, 
que  a  virtude    daquelle 
preciofiífimo  Tangue,  nam 
To  he  remir  ,  8c  livrar  dos 
peccados  jà  cometidos,Te- 
naó  preTervar  anticipada- 
mête  delles  j  &  digamos  ao 
míTericordioíiílimo     Re- 
demptor  o  que  tantas  ve- 
zes repete  a  Igreja  :  Cito 
antícipent  nos  mijericordÍ£. 
tu£:qu.e  não  To  nos  livre 
Tua  infinita   miTericordia 
dos  peccados  com   que  o 
temos  oíFendido  ,  mas  Te 
anticipe  a  nos    preTervar 
dos  futuros,  para  que  nun- 
ca mais  o  oíFenda mos,  Na- 
quella  noite  fatal,  em  que 
Deos  tinha  decretado  ma- 
tar os  Primogénitos  do  E- 
í^ypto,  mandou  aos  íilhos 
deíTracl,  que  anticipada- 
mente  T^crifícaíTem  hum 
Cordeiro  ,  &  que  com  o 
Tau-. 


i 


T  90  Sermão  da  Concetçao  mmaculaãa 

fanguc  delletingiíTem,  &  do  de  nos  tentar.  E  flhal- 
rubricaíTcm  todas  as  por-  mente,  para  que  ninguém 
tas  defuascafas^paraque  duWde5queo  meímo  fan- 
oAnjoaqueni  eílava  en-     gLieanticipado  foi  fi^^ura 


comendada  aquella   exe- 
cução 5  onde  vi^Q,   o  Hm- 
gue,  paíTaíTe,  Sc  deixaíTc  li- 
vres os  que   eílaváo  den- 
tro, &  onde  o  naó  viíle,  en^ 
traíTe,  8c   mataíTe  a  todos 
os  Primogénitos.  Eíle  An- 
jo he  mais  provável,    que 
naó  era  Anjo  bom  ,  fenam 
Demónio,  &  aflim  diz  a 
Igreja,  que  por  medo  do 
meílnoíingue  naó  fe  atre- 
via nem  a  olhar  para  as 
cafas,  que  elle  defendia; 
Sfarfum  cruorem  poftibus 
vaftator  horret  Avgeíus.St 
as   portas    exteriores  de 
noíla  alma,  que  faó  os  fen- 
tidos,8cas  interiores,  que 
faó  a  noííli  memoria,  ente- 
dimento,  &  vontade ,  efti- 
verem  (inaladas  com  o  ca* 
radter,  &:  armadas  com  a 
protecção  daquejle  Tangue 
taóanticipado  deftruidor 
do  peccadojnãofó  defcon- 
fiarà  o  Demónio   de  nos 
vencer,  mas  ainda  terá  me- 


do Tangue  do  Horto  ,  & 
naó  do  da  Cruz:  o  da  Cruz 
derramou  Te    doze    horas 
depoisjao  meyo  dia:  &  o 
do  Horto  jà  Te  tinha  der- 
ramado doze  horas  antes, 
à  meya  noite :&  eftaToi  a 
hora  em  que  o  Tingue  tri- 
unfador   obrou    aquelles 
prodigioTos  eíFeitos  :  Fa^ 
ãmn  eft  autem^in  no6fis  me  ^  ^, 
dio  perciijjit  ^ominus  om-  10.29^ 
ne  primagenitum  in  terra 
(iyEgyptí.    Aílim    livrou 
Deos  aos  filhos  de  ITrael  do 
cativeiro  do  Egypto  por 
meyo  do  Tangue  do  Cor- 
deiro,&aílim  nos  livrará 
do  cativeiro  do  pcccado 
por  virtude  do  Teu  Tangue 
o  Cordeiro  ,  que  tira  os 
pcccados  do  mundo,  pre- 
Tervandonos    anticipada- 
mente  dos  aduaes  ,  como 
a  n  ti ci  pada  mente    preTer- 
vou  do  originai  a  Mãy  de 
qucmnakco:  'De^uana- 
tuseft  Icjus. 


SER 


10t 


SERMAM 

DA 

D  O  M  I  N  G  A 

DECIMASEXTA  POST  PENTECOSTEN. 


ReciimbeinnoviJJimoUco.  Luc.14. 


Odas  as  vezes, 
que  o  Filho  de 
Deos  fe  aíTen- 
tou  à  m€ fados 
Jiomeas,  íempre  foi  o  me- 
lhor prato  a  fua  doutrina. 
Comia  o  que  regulava  a 
temperança,  &enfinava  o 
que  didtava  a  prudência. 
A  matéria  era  a  que  lhe 
davaaoccaíiaó,  &  elle  fo- 
breaoccaíiaõ  eftendia,  il- 
iiiílrava^fic  definia  a  ma- 


téria. Os  documentos  to- 
dos eraó  divinos,  &  naô  fó 
moraes ,  fenaó  ainda  poli- 
ticos.  E  digo  moraes,  & 
politicos  i  porque  tal  foi  a 
doutrina  do  prefente  E- 
vangelho.  Os  que  entaó 
com  nome  authorizado,& 
hoje  com  íignifícaçam 
odiofa  fe  chamaó  Fari- 
feos  ,  eraó  os  Religiofos 
daquelle  tempo.  Diz  pois 
o  Evangeliíla  S.Luças>que 
convidando  hum  Princi- 
pe  dos  Farifeos  j  ifto  he, 
lium 


I 

i 


■■s 


191 

hum    Prelado    daquelles 
Religiofos,  a  Chriílo  Re- 
demptor  noíTojpara  que 
quizeíTe  honrar  a  fua  mefa 
e m  hu  m  dia  de  feita  ,  qu  e 
era  o  fabbado  ,  aceitou  o 
benigíiiílimo  Senhor  o  cõ- 
vite.  Aceitou  >  poílo  que 
naó  faltava  quem  murmu- 
raíTe  o  aceitar.  Pareciaihe 
aos  murmuradoresjquefe- 
melhantes  convites  eram 
jnends  conformes à  auíle- 
ridade  da  vida,  6c  à  autho- 
ridade,  &  proíiílaó  de  hu 
Meílre  decido   do    Ceo. 


Sermão  da  decima fext a  T>ommga 


ícrvaçao:naoa  obfervan- 
ciadodia,  mas  a  obferva- 
çaó  do   cóvidado.  E  q  fez 
o  Senhor,  que  lhe  conhe- 
cia os  coraçoens  ?  Aceitou 
a  meia  como  homem ,  dif- 
íimailou  a  malicia  como 
Deos  :6c  no  que  obrou  co- 
mo Deos,  ^  reprehendeo, 
Ôcenfinou  com.o  Meftre, 
moílrou  que  era  Deos,  6c 
homem.   Curou  ao  Vi^- 
dropico,  6c  depois  tratou 
deoscuraraelles:  aoHy- 
dropico,  tocando-o  com  a 
máo,6c  aeiles  pondolheas 


Mas  a  razaó,que  o  Senhor     máos,6cmuito  bem  poílas*. 
tinha  para  fenaó  efcufar ,     Náo  ha  vicio  mais  defcor- 


moílravaó  depois  os  eftei- 
tos  muito  âi\N^i'íos  y  Sc  de 
outra  mais  levantada  es- 
fera, como  também  fevio 
no  cafo  prefente. 

173  Atenção  dos Fa* 
rifeosera  farifaica  ;  porq 
Ihearmáraó  a  Chrifto  có 
hum  Hydropico,  a  ver  fe 
o  curava  naquelle  dia,  pa- 
ra o  poderem  calumniar 
de  qucbrantador  do  fab- 
bado :  Sabbato  manda c are 
fanem ,  O'  tpfi  obfervabant 
€um.  Náo  os  Icvcu  a  IH  a 
obfervancia  jlciuió  a  ob- 


tez,  que  a  foberba  ^  nem 
mais  defcom edido,  que  a 
ambição.  Como  carece  da 
modeftia  por  dentro,  tam- 
bém lhe  f-Jtaa  urbanida- 
de  por  fora.  Naô  diz  o  E- 
va  ngciifra  o  lugar,que  déí*- 
fem  na  mefa  a  Chriíioj 
mas  diz,  que  os  convida- 
dos fem  corteíia ,  nem  ur- 
banidade,  todos  procura- 
vaó  5  &  ainda  contendiam 
íbbre  os  primeiros  luga- 
res. Eíla  foiaoccafiaó,Sc 
effcoponto  da  doutrina, 
por iílo  moral  ,  6c  junta- 
mente 


mente  politico. 

174  Fez  Deos  efte 
mundo  em  forma  circular, 
como  a  mefajou  tabola  re- 
donda dos  Pares  de  Fran- 
ça, para  evitar  a  contenda 
dos  lugares,  naó  fendo  ju- 
llo,quedeíigualaíre  o  lu- 
gar os  q  tinha  feito  iguaes 
a  natureza.  Mas  como  a 
foberba  ,  Sc  ambição  pre- 
verteíle  a  igualdade  defta 
ordem ,  com  outra  ordem 
defordenada  de  primei- 
ros, fegundos  atè  últimos 
lugares,  Sc  os  Farifeos  na 
mefa  affedbaífem  os  pri- 
meiros 5  efte  foi  o  vicio,  q 
o  Senhor  obfervou  nos 
feus  obfervadores.  Inten- 
dens  quomodo  primos  accu 


pfíftTentecofien.  ^      ipg 

CO  rteíia.  Na  eleição  dos  lu- 
gares notava-os  o  Senhor 
de  pouco  juizo ,  &  no  mo- 
do de  cada  hum  fe  prefe- 
rir,& antepor  aos  outros, 
de  pouca  urbanidade  :  &: 
eftes   dous    defprimores 
nafcidos  ambos  do  mefmo 
vicio  da  ambição,  Sc  fober- 
ba, reprehendeo,  &  emen- 
dou o   foberano   Meftre 
também  com  hum  fò  do- 
cumento :    Cum  njocatus 
fuerisad  nuptias  ,  recumbe 
in  novijjimo  loco  :  Quando 
fores  convidado  à  cafa ,  Sc 
àmefaalhea  ,  naó  deveis 
tomar  os  primeiros  luga- 
res, fenaó  o  ultimo. E  por- 
que? Porque  naó  fucedwi 
vir  o  fenhor  da  cafa,  a  que 


Ibid.i 


tóus  eligerent:  01hava[diz  pertence  a  repartição  dos 
oEvangelifta}comparti-  lugares  ,&:  vos  mande  le- 
cularattençaó  para  o  que 
faziaô  os  convidados  ,  & 
para  o  modo  com  que  o  fa- 
ziaô :  o  que  faziaó,  era  to- 
marem por  própria  elei- 
ção os  primeiros  lugares: 


vantar  do  que  tomaftes,  & 
o  dè  a  outro   melhor  ,  Sc 
mais  honrado  que  vos.  En- 
tão vos  achareis  có  afron- 
ta no  ultimo  lugarjporque 
foftes   taó  defcomedido, 
f  rimos  accubitus :  &  o  mo-     que  vos  atreveftes  a  tomar 
do  com  que  o  faziaó,  quo-     o  primeiro:^?  incipiâs  cum  ibfd.9. 
'     '    '   "      rubòre  noviffimum    locum 
tenére. 

17  s     Eftafoiahiftoria 
N  da- 


modo,  era  introduzindofe 
nellesfem  nenhum  modo 
de  modeftia,  refpeito,nem 
Tom./. 


i 


ÍW 


■m 


194  Sermão  daTíomingadecimarexta 

daquellecafo,  &  daqudle  defeja  melhorar  de  luMr 

du,aqueo  mefmoEvan-  ,E  nenhum  fe  acha  em  tai 

^Í1^  '^  T  """""^  P?-  P°^°'  P°r  levantado  ,   & 

rabola :  Htcebat  autem  ò-  acomodado  que  feia,  qne 

ad  tnvttatos  paraholam.  naó  procure  fubir  a  outro 

Mas feerahiftoria,  como  melhor.  He  própria  efta 


era  parábola?  Tudo  era. 
Era  hiftoria  quanto  ao 
fuceíTo  ,  &  era  parábola 
quanto á  doutrina.  Quan- 
to ao  luceflb  ,  era  hiftoria 


inclinação  da  natureza  ra- 
cional, como  fe  fora  ra- 
zaó,&  naõ  appetite.  Pri- 
meiro nafceo  no  Ceo  com 
os  primeiros  racionaes,  q 


-.-^..^  ,  v,xc*  xixiLuiid  os  primeiros  racionaes,  q 
particuiarpara  os  prefen-  faò  os  Anjos,&  depois  fe 
!!!  L^^^^^^^Jí^o  a  doutrina ,     propagou  na  terra  com  os 


era  parábola  univerfal  pa- 
ra todos.  A  todoS:,  &  a  ca- 
da hum  prega  hoje  Chri- 
fto :  Recumbe  in  novifjimo 
loco.  E  haverá  nefte  mun 


fegundos  ,  que  fomos  os 
homens.  Lúcifer  no  Ceo 
tendo  a  fuprema  cadeira 
entre  as  Gerarchias  ,  nam 
';■""  ""-»--"v..Lt  uiuii-     aquietou  naquelie  lu^ar, 
do  quem  efcolha  por  pro-     &  quiz  igualar  o  feu  coní 
pria  eleiçao,&  fe  contente     o  do  mefmo  Deos  •  ExaU 


cultofo  ponto  para  fe  en- 
tender, &  muito  mais  ^i^' 
cultofo  parafe  perfuadir. 
Por  iífo  tomei  por  Them  a 
eíla  única  ,  &  admirável 


ero  AltiCimo.  Adam  na  ter 
ratendooabfoluto  domi- 
nio  de  todas  as  creaturas 
dos  três  elementos  j    nam 

«v^uiiiavci     coube,   nem  fe  contentou 

íentença,ôc  ella  fo  íerà  to-     com  hum  Império  taó  va- 
^.^^fria  do  meu  dif-     ílo  ,  &  em  hua  Corte  taó 
curfo.  Ave  Maria,  deliciofa  como  o  Paraifo, 

r>         /    •  ^.  também  quiz  melhorarde 

Kecumbe  m  novifjmo  loco.    lugar :  Emisficut  dij.  E  q  ^^^^ 

^--^^  ,  ^í^io  íia    deíle   piJjnciro 

^^^  T^Odo  o  home     Pay,  de  que  todos  naíle- 

X  neíle  mundo    mos,  que  iiaó  hcrdafle  dei- 

k 


Ic  a  altiveza  fempre  m- 
quieta  defta  mefma  pai- 
xão ?  O  Letrado ,  o  Solda- 
do, o  Fidalgo,  o  Titulo ,  o 
de  grande  nome,  6c  o  que 
naó  tem  nome ,  com  o  cui- 
dado, &  defejo  nunca  jà 
mais  fatisfeito ,  nem  foce- 
gado,  todos  trabalhão,  & 


poJtTentecoften. 


19S 


ponto  contenderão  todos 
fobre  a  maioria  j  porque 
logoafpirou  cada  hum  a 
lhe  fuceder  no  lugar.  Do 
Emperador  Trajano  difíè 
Plinio,  que  ninguém  o  co- 
nhecia taò  pouco  a  elle, 
nem  fe  conhecia  taó  pou- 

^c^^Kjy  twvtw  .x«-« ,^     có a  fy,  que  ti vefíeoufadia 

fe  defvelaò  por  ac}iantar,&    de  lhe  fuceder  :  Nma  eji 
melhorar  de  lugar.  Sò  pa      tam  tui ,  quàm  ignarusfui ,  pj,,,:,, 
rece  ,  que  deviaò  viver    utlocumipfumpoft  te  r<?»- imane» 
izentos  de  femelhante  fo-    cupfiat,  E  tiveraó  atrevi-  ^^'' 
geiçaó  os  que  deixarão  o     mento  doze  pefcadores, 
mundo,&  profeíTaÕ  o  def-     para  quererem  fuceder  ao 
prezo  delle  5  mas  là  os  fe-     mefmo  Filho  de  Deos ,  & 
gue,  &fogeitao   mefmo    lhe  pleitear  o  lugar  ainda 
mundo  a  que  lhe  paguem     em  vida. 
&  voíi 


efte  duro  ,  &  voluntário 
tributo. 

177  Coufa  foi  digna 
de  admiração,  que  osDií^ 
cipulos  de  Chrifto  ,  antes 
de  decer  fobre  elles  o  Ef- 
pirito  Santo  ,  contendef- 
fem  fobre  qual  era  o  ma« 
ior :  ê^is  eorum  videretur 
ttic.22.  gíT^  fnaior  ?  A  occaíiaò  po- 
rèm,&o  motivo  delta  co- 
tenda  ainda  he  muito  mais 


§.     III. 

1.  convencer  ef- 
te abufo  univerfal ,  naó  fò 
dasguerras,&  competên- 
cias, m  as  ainda  das  pertê- 
çoens  pacificas  do  melhor 
lugar  j  naô  deixarei  de  re- 
ferir primeiro  três  opi- 

vwii^cv  ccxxx^^  x.v, .. . nioens,ou  fuppofiçoens  ti- 

admiravel.Equal  foi?  A-  radas  da  fagrada  Çfcritu^ 
cabava  o  Senhor  de  lhes  ra,  as  quaes  naó  fô  içonde- 
revelar,  que  hiaa  Jerufa-  naóefta  ambição  taô  pro- 
iem  a  morrerjSc  no  mefmo    fundamente  arraigada  nos 

N  ij  cp- 


i 


196  Sermão  daTiommgadedmafext  a 

coraçoenshumanos,  mas  ftermuuo  tempo.  Naó  o 

totalmente  cortaó  as  rai-  ^clxov^,  à-nonerat,^oZl 

zes  a  toda  a  noíTa  queftaó.  ou  tinha  cah.do  àLk^ò, 

A  pnmewa  nega  abfoluta-  ou  tinha  acabado  a  vida  • 

menteoquefuppomos,&  masque  naó  achaíTe   Dal 

diz,quenao  ha  lugares:  vido  lugar  onde  o  tinha 

que  no  mundo  fe  chama  ejus .?  Sim  ,  refponde  Car- 

lugar,  por  alto,  &  levanta-  thufiano ,  &  o  prova  com 

do,quepareça,  bem  exa-  ^rmote/es.  Jr^ILS 


pfai. 35.  minado,  he  nada :  Viditm- 
Sf.jó.  pumfufjerexaltatim  ,  ér 
eievatiimficut  cedros  Liba- 
ni:  tranfivt^&ecce  non  erat^ 
&noneft  invenUis  locus 
^V/j:  Viaoambicioro,  diz 
Da vid^  levantado  fobre  os 
outros  homens,  como  os 
cedros  do  Libano  fobre  as 
outras  arvores  :  dei  dous 


locatumfmt  fimul,  fccun- 
dum  Tbilofophuyfubtraão 
ergo  locato,&  locus  non  ma^ 
net.  O  Iugar,&:  quem  eftà 
nelIe,regundoa  verdadei- 
ra Filofo  fia,  Çixo  taó  reci- 
procamente dependentes 
hum  do  outro,  que  faltan- 
do oqueeílava  no  lugar, 
nemelle  ,  nem  o  mefmo 


^^fT^r.   A-  « 7       "'-"ivn».  5  nem  o  meimo 

paflosadiante,  &  quando     lugarpodem  fubíiílir  •  & 
voltei  os  olhos  para  o  tor-     poriífodiífe  bem  David, 


naraver,jào  naó  achei  a 
clle,  nem  ao  feu  lugar.  A- 
^uieílàoponto  da  admi- 
ração :  Et  nonefl  inventas 
locus  ejus, Que  David  a  taó 
poucos  paíTos  naó  achaíTe 
aoambiciofo  ,  que  tinha 
viílo  taó  levantado  ,  a  nin- 
guém deve  admirar  ,  por- 
que para  fazer  femelhan- 
tcs  mudanças,  nem  a  mor- 
te, nem  a  fortuna  h,ió  mi- 


que  tanto  que  defipareceo 
o  ambicioíb,  &:poderoíò, 
nemaeIleopodever,nem 
achar  o  lugar  onde  eíHve- 
ra:£'^  non  e/t  mventus  locus 
ejus. 

179  Efeeftaconfe- 
quenciahe verdadeira  no 
lugar  que  chamaó  filico, 
no  lugar  moral,  de  que  fil- 
iamos, ainda  hc  mais  cor- 
ta, fcgundo  a  deliniçaó  do 
md- 


poft^entecoftetf.  ^97 
mefmo  Filofofo.  Arifto-  cair,naQhe  o  mefmo  que 
teles  definindo  o  lugar,  herdou,  ou  pertendeo  an- 
dizqueheafuperfícieam-  resdeooccupar  ?  Simta- 
bientedo  queeílà  nelle.  E  bem :  pois  íe  pertendido, 
quando  o  lugar  naó  he  o  occupado,  &:  deixado,  era 
ambiente  do  homem ,  fe-  o  mefmo  lugar ,  porque  o 
naóo  homem  o  ambiente  naó  achou  David  depois 
do  lugar,  como  no  noíTo  de  deixado  >  Porque  de- 
caio 5  muito  melhor  fe  fe-  pois  de  deixado,era  o  nief- 
gue,  que  faltando  a  fu-  mo  que  dantes  tinha  fido, 
perficie  ao  chamado  lu-  &per tendido,  poífu ido, & 
gar,  nem  he  lugar,  nem  deixado,  fempre  foi  nada. 
coufa  algúa.  E  fe  nam  he  Elegan^ ,  &  doutamente 


Hu  go  C  ardeal;  Non  eft  in- 
rventus  locus  ejus :  quodfua 
dignitas  nullaerat ,  &fuum 
effenoneffe  erat.  Nam  fe 
achou  o  lugar  do  que  efta- 
valevantado  como  os  ce- 
dros do  Libâno ;  porque  o 


-coufa algúa,  como  o  havia 

xie  achar  David  ?  Mas  tor- 
nemos a  apertar  mais  eíla 

propofiçaó,  pois  o  mefmo 

David  no  mefrpo  Pfalmo 

a  repete  duas  vezes ,  huma 

vez  dizendo  que  bufcou,     ^    .      . 

^  naó  achou  o  lugar:  ^^-  fer  dos  que  nefte  mundo  íe 
fi,íá  .6  rivu&mn  ejt  in-ventus  lo-  -c  ha  mão  lugares  ,  nam  he 
^''    mi^us^  &  outra  vez  di^  fer,henaó  fer  :  Smm  effe 
zendo,  que  fe  nos  o  buf-  non  effe  erat.  E  fe  os  mel- 
carmos  ,  também  o  nam  mos  chamados  lugares,  ou 
acharemos :  ^£res  íocum  pertendidos,  ou  poíTuidos, 
o.^ms,&  non  inventes.   Per-  ^ou  deixados,  nao  fao  cou- 
eunto-.Efte mefmo  lugar,  faalgÚa-,bem  fe  conclue, 
que  David  bufcou,  &  naó  que  nefte  mundo  nam  lia: 
achou,  naó  he  o  mefmo,  q  -lugares.  E  iílo  quenao  he„ 
oambiciofo  occupou  an-  nem  ha,  he  o  que  com  tan- 
tesde  morrer   ,  ou  cair?  todefveloamao,&burcao 
-Sim.  E  eHe  lugar ,  que  oc  os  pertendentes  da  vaida- 
cupouantesdemorrcr^ou  de 5 &^a mentira:  Vtqntd^- 
^      Tom.;.  ^''^            ^'' 


Ibid 


{ 


m 


19^  S^maÕ  daT>omlngadecimarexta 

Pídm.  dtltgituvmttatem.&qu^-     faóosquedaóa  bondade. 

180  Afeguda  fuppo- 
íição,  feguindo  o  fentimé- 
to vulgar, &  comum,  ad- 
mite, que  no  mundo  ha 


ou  melhoria  aos  lugares  , 
&naó  os  lugares  aos  ho- 
mens.  Se  fores  bom,  ainda 
que  a  cadeira  feja  dos  Ef- 
cribasj&Farireos,  feràbó 


lugares;  mas  nega  queha-     o  voíTo  lugar  ;  &  fe  fores 
ja  lugar  n^elhoE  porque?     mao,  aind!  quea  caSa 

í(?irol  ^  ""r^""''^  "'^  íejadeMoyfes,  nem  por 
efta  no  lugar,  fenao  na  pef-  líTo  o  voíTo  lugar  fera  bom. 
foaqueooccupa.Poralto,  Que  melhor  lugar,  que  o 
ou  baxxoquefejao  lugar,  CSo,&oParaifl  >Tn^^ 
le  fois  bom,rerà  o  voíTo  lu-  ~ 
garbom  5&  fe  fois  me- 
lhor, fera  melhor:  mas  fe 
fores  mao,  &  peôr  ,  tam- 
bém fera  mao,  &  mais  que 
mao  o  voííb  lugar.     Diz 


oCeofezboma  Lúcifer, 
nem  o  Paraifo  ^^z  bom  a 
Adam.  Jeremias  raó  bom 
era  no  cárcere  ,  como  no 
púlpito:  &  Job  taó  bom  no 
muladar,comono  feuPa- 


r^í.,.;A^c     u   ^  ^  J^^ui^uar,comono  leufa- 

ChriftoSenhornoíro,  que  lacio.  Meilior  lugar  era  no 

fobrea  cadeira  de  Moy-  maronavio,queo  ventre 

h'/lt'"^''^  ?^^^^^^-  cIaBalea,&Jonasforme' 

bas,acFarxreos:%.r  ca^  Ihorno  ventre  da  lídea 


thedram  MoyfifederÚtScri. 
Manh.  b^.é^Thanf^r.  £  quem 
foi  Moyfes,  &  quem  eram 
os  Efcribas  ,  &  Fariíeos.? 
Moyfesfoio  maior  Santo 
dofeu  tempo,  &os  Efcri- 
bas, &  Farifeos  eram  os 
mais  mãos  homens  do  feu. 


que  no  navio.  Aílim  que 
os  lugares  por  fy  mefmos 
naófaó mãos,  nem  bons, 
nem  ha  lugar  melhor,  ou 
peor.  O  lugar  que  hoje  tê 
S.Mathias,naófoi  o  mef- 
mo  dejudas?  O  mefmo,& 
naô  outro.  Se  fores  como 


Pois  fe  pftn,.7'    7r        j  ri  ''"^^^'  ^^  ^^^^^  ^'omo 

roís  le  eítavao  aífentados  Judas,  naó  vos  ha  de  fizer 

na  melma  cadeira  deMoy.  bomolugardeS  Mathns 

fe,  porque  não  eraô  como  &fe  fores  como   SM  - 

cllc  ?  Porque  os  homens  thus,  nag  vos  ha  de  fa7;r 


mao 


;  } 


poflTentecofien.  ipp 

mão  o  lugar  Me  Judas.  Se  res,netn  peores :  para  que 

quereis  ter  o  melhor  lu-  ninguém   fe  defcontente 

gar  de  todos,  fazei  por  fer  do  feu,  fenaó  de  fy. 

omelhordetodos,&Iogo  181     A  terceira fuppo- 

ovoíTo  lugar,  qualquer q  ííçaò  admitemelhoreslu- 

feja,rerà  também  o  me-  gares  •,  mas  diz  que  eílesfó 


181 


Ihor.  Mas  todos  querem 
melhorar  de  lugar>  &  nin- 
guém quer  melhorar  de 
vida.  Sucedelhe  aos  ambi- 
eioros,o  que  aos  peregri 


oshanoCeo,  &:  nam  na 
terra.  E  porque  ?  Porque 
todos  os  lugares  da  terra , 
por  melhores  que  fejaójou 
pareçaó,  mais  faó  alhcos. 


/pud 
€i.necá 


nos,  diz  Sócrates.  O  pere-  que  noíTos  ,  mais  par^  os 

grinofempreanda  muda-  deixar,queparaospoíruir, 

dode  lugar  cm  lugar,  &r  maisparaos  perder,  que 

nunca  melhora  ,  porque  para  os  lograr.  Os  lugares 

fempre  fe  leva  a  fy  comfi-.  da  terra  fao  paíTagem,  fo  o 

^.ueca  20   kuid  mirarisnihilti'  do Ceo  he  aíTeiito  :  os  da. 

e' à  «  bipeTeznnationesprodeí[e ,  terra  faó  de  poucos  dias,o 

'    '  €km tf circumferas> Como  doCeo  ha  de  durar  para 

duereis  melhorar  de  lu-  fempre.  Ceando  Chrifto 

Sar,  fe  vos  levais  a  vós  cÓ  Senhor  noíTo  partio  deite 

vofco  >  Deixai- vos  a  vós ,  mundo  para  o  Ceo  ,  a  ra- 

&  como  VÓS  fordes  outro,  zaô  com  que  confolou  aos 

logo  o  voíTo  lugar  fera  Apoílolosfaudofosde  fua 

melhor.  Se  fois  o  mefmo ,  aufencia,  foi,  dizendo,que 

ainda  que  fubais  ao  pina-  hia  diante  a  prepararlhe  o 

culo  do  Templo  ,  nunca  lugar:    Vado  par  are  vobts  ]^ 

fahireis  do  lugar  onde  ef-  locum :  fendo  porem  o  mo- 
tais  •  &  fe  fordes  outro ,  &  tivo  defta  coníolaçao  o  lu- 
muito  outro ,  fem  íair  do  gar,  mais  perto  eitavaó  os 
lugar  onde  eílais  ,  vos  ve-  lugares  em  que  o  Senhor 
reis  fubido  ao  mais  alto  do  os  deixava  ,  que  o  lugar 
Templo.  Em  conclufaó,  que  lhes  havia  de  prepa- 
Quenaóhalugaresmelho-  rar: porque  fendo  eíte  fu. 
^                  ^  N 111)        t*ir9í 


i 


2  00  SermaÕ  da  T>ominga  decimafexta 

turo,  &diílante  ,  parece     menorJerufalem.&ameA 

que  vinha  a  íer  confolar  majudea  ,  de  que  era  ca 

hua  auíencia  com  outra.  beça.  Poisfeeraó  taóim- 

ÍMaquelIaultimahoraem  menfamente   grandes  os 

que  Jacob    morrerrdo   fe  lugares  em   que  Chrifto 

apartou  de  feusfilhos(;que  deixava  aos  feus  Apoílo- 

também  eraó  dozej  a con-  los  ,  &  com  taó  fuprema 

foiaçao  com  que  lhes   en-  dignidade,  &;urdicaó  fo- 

xugou  as  lagrimas  ,  foi  a  bre  todos eiles ^  porque  os 

repartição  das  terras    em  naÓ  confola  o  Senhor  com 

que  os  deixava  acomoda-  a  confideraçaó  á^^^s  \\x- 

dos  a  todos.  Efe  para  os  gares  prefentes^fenaó  com 

doze  1  atriarcas  eraó  mo-  oJugarfuturo.queiheshia 


tivo  de  confolaçaó  na  au- 
fencia  de  feu  Pay  taó  pe- 
quenos lugares  da  terra , 
quaespodiaócabera  cada 
hum  dividida  a  Judea  em 
doze  partes3quanto  maior 
podia  fer  para  os  Apoílo- 
lostodoo  mundo  ,  quam 
grande  he  repartido  entre 
elles  ?  Diga  pois  Chriílo  a 
Pedro,  que  lhe  deixa  Ro- 
ina5<5c  a  Itália  ;  diga  a  Ja- 
Gobo  ,  que  lhe   deixa  as 
Hefpanhas ,  a Joaó a  Afia, 


preparar? Porque  efteera 
lugar  no  Ceo,  os  outros  na 
terra.  E  neíla  fó  palavra  fc 
encerraó  ambas  as  razoes, 
que  no  principio  aponta- 
mos. Os  lugares  da  terra 
faó  paíTagem,  o  do  Ceo  he 
aíTento.  Por  iíFo  quando S. 
Pedro  perguntou  a  Chri- 
fto :  èluidergo  ent  noòis  ?  o  ^^: 
á  o  Senhor  lhe  refpódeo, 
foi  :   Sedebitis  fuper  fides  í.^,j.,g, 
duodecim.judicantes  auode- 
cimtribus Ifrael.  Naò  lhe 


a  André  a  Grécia,  a  Feiíp-     refpondeoàs  barcas,  &rc 
pe  a  Sythia,  a  Bartolomeu     des,  que  tinhaó  deixado, 

com  as  dignidades  que  ha- 
viaò  de  ter  neíí^e  mundo, 
fenaó  com  as  cadeiras  em 
quefe  haviaó  de  aílcntat 
jio  dia  do  JUJL20 :  porque  fó 
ode 


a  Arménia ,  a  Mattheus  a 
Etyopia  ,  aThomèa  Ín- 
dia, a  Simão  o  Egypro,  a 
Thadeoa  Arabia,6caPer- 
iia,  ôc  ao  outro  Jacobo  o 


poflTentecoften.  201 

o  de  que  fe  ha  de  tomar  o  que  tem  no  Inferno  en- 
poíTe  naquelle  dia,  tem  af-  ut  os  Demonios^eíTe  era  o 
fento,odecàtudo  hepaf-  feu  ,  porque  eíTe  he  o  que 
faaeai.    E   porque  mais?     ha  de   durar   por  toda  a 


^^3  Porque  fó  o  kigar,  queen 
taó  nos  couberjie  noííb,& 
os  deíla  vida  mais  faó 
aiheos, que  próprios,  por 


25. 


eternidade.  E  fe  ifto  fuce- 
deo  a  hum  homem  chama- 
do por  Deos,  &  eleito  por 
Chriílo  ',  onde  iráó  parar 


mais  larga  que  feja  a  mef-  asnegociaçoens,  osfobor 

ma  vida.  Nmguélo2;rou,  nos,as  adulaçoens,  &  as 

nem  ha  de  lograr  o  Ponti-  fimonías  com  que  fe  pro- 

íicado  mais  annos,  que   S.  curaÓ,&  alcançao  os  lusa- 


res,  que  haó  de  durar  pou- 
cos dias,  fem  memoria  da^ 
eternidade,  nem  temor  da 
conta? 

í.  IV. 


EStes  faó  os  três 


Pedro,&  com  tudo  jà  tem 
fucedidono  mefmo  lugar 
duzentos  Sc  trinta  &  ÍQZt 
Pontiíices,&  naó  fe  fabe 
quantos  viráó  depois ;  pa- 
ra que  vejais  fe  era  mais 
alheo,  quefeu.  Sòhe  nof- 
íb,  ou  feja  no  Ceo,  ou  fó; 
radelleo  lugar,  q  ouver- 
mos  de  ter  para  sépre.  Ef- 
le  foi  o  doeu  meto,  <Sc  ener- 
gia tremenda  com  que  o 
mefmo  Príncipe  dos  A- 
poílolos  diífe  ,  que  Judas 
perdera  o  Apoílolado :  pa« 
ra  que  ?  Vi  abiret  in  locam 
futtm :  para  ir  ao  lugar,  que 

era  feu.  O  que  teve  nefte 

mundo,  &  entre  os  Apo- 

ftoIos,era  alheo,  porque 

eradeS.Mathias,    &  dos     ^ 

que  lhe  haviaó  de  fuceder:    lugar,&:  meiliQr  lugar,mas 

nao 


Cl  fundamentos , 
ou  as  três  fuppofiçoens  ge- 
raes,com  que  naô  fó  fe  im- 
pugna aambição  dos  me- 
lhores lugares  j  mas  fe  cor- 
taô  as  raizes  a  quanto  ella 
defeja.  Porque  a  primeira, 
como  vimos,  diz  abfolu- 
ta  mente,  que  naó  há  luga- 
res: afegunda  concede  q 
ha  lugares,  mas  nega  ha^ 
ver  algú,  que  feja  melhor : 
a  terceira  defende  que  ha 


i 


i 


iiV. 


-li 


itmin 


%m^ 


2à2  Sermão  da  T>omhga  dedmafexta 

rTofidíd'?Í^  -'^^"^  '"'  ^confelha,  que  tomemos  o 
riolidade,  eílarao eiperan-  ultimo  lu^ar  •  Recnmbe  in 
do  todos,  qual  deftas  par^     novtjnmolco,  EpZnZ 

llt!.TV"  P''''"^^  aí-entençadeChK  Jor 
perfuadir.  Primeiramen-     fer  de Chriílo,  naô  fe  pó^ 


te,refpondo  que  nenhuma 
delias.  Porque  contra  a 
primeira,íigo  que  ha  luga- 
res :  contra  a  legunda,  qlie 
íia  lugar  melhor  i  5c  contra 
a  terceira,queefte  melhor 


decontraríar,&a  dos  Fa^ 
rifeos  ,  por  fer  dos  Fari- 
feos,  parece  que  jà  cílà  c6- 
vencida  ;  com  tudo  a  de 
Chrifto  todos  a  regei  taó, 
&  a  dos  Farifcos  todos  a 


.'X  z^ — '"'^^      oca  uus  rari: 

lugarnaoeitanoCecCde    feguem.    Aílim  o  vemos 
queagoranaó  fulloXenaô     hole,&  jàemfeu  tempo! 


na  terra.  Admitindo  pois 
com  o  comum  fentimen- 
to,  que  ha  lugares,  6c  huns 
melhores  que  outros  j  o 
que  pertendo  hoje  decía- 
rar,he:  Entre  todos  os  Li 


coiiifertaò  viiluho  ao  de 
Chriílo,  o  provava  com  a 
experiência  Tertulíiano: 
Adprwmm  locum  ctrtnmê 
omnmmcontendít  :  fccun^ 
dumfolamen  hahet ,  vião" 


gares  do  mundo,  qual  fe,a     naJno,,  habet.  O  d;fe  oVa 
omelhor.  Naopôde  ha-    pertençáo,&  a  vontade  de 


ver  matéria  mais  digna  de 
todaaattençaó  ,  &  tanto 
inais,quanto  jcà  cada  hum 
a  tem  refoluto  comilão, 8c 
lhe  parece  fem  controver- 
íia,  >  o  Evangelho  temos 
o  parecer  dos  Varifeos,  & 
o  confclhode  Chriílo.  Os 
Fariíèostem  para  Ty,  que 
o  melhor  lugar  do  mundo 
heo  primeiro  :  ^lomodo 


todos  os  homens  he  íbbre 
quem  ha  de  levar  o  pri- 
meiro lugar  :&taó  porfia- 
da ,  <Sc  unicamente  o  pri- 
meiro •,  que  o  fegundo  lu- 
gar, ainda  que  icja  aigua 
confolação  ,  de  nenhum 
modo  he  vidoria.  E  fe  nin- 
guém fe  contenta  com  o 
lègundo  lugar,porqucnaó 
he  o  primeiro  i  polto  que 
acima 


poftTmtecoHení 
acima  de  fy  veja  hum  fó,  de  Chrifto 
&  abaixo  de  fy  todos  os 
outros  >  quem  haverá,  que 
fe  contente  com  o  ultimo  ? 
Nosfamoíòs  jogos  Olim- 
picos  5  que  fe  celebravaó 
na  Grecia^Sc  eraó  provo- 
cados à  contenda  todos  os 
homens  do  mundo,  havia 
primeiros,  fegundos  ,  & 
terceiros  prémios :  &  com 


20^ 

para  que  o 
creamos.  Mas  efte  ponto  5 
que  naópcrfuadeaFè,co- 
mo  o  pcrfuadirà  a  razaó? 

1 8  f  Ora  efta  fera  hoje 
a  minha  emprefa  :  De  mo- 
ftrara  todos  os  homens, 
que  o  m  elhor  lugar  do  mu- 
do heo  ultimo.  E  naó  fò 
para  a  outra  vida  ,  fenam 
para  efta  5  nem  fó  para  a 


tudo  diz  S.PauIOyque  hum  virtude,  fenaõ  para  a  co- 
fó  levava  o  premio:  Ow»í'j'  modidade3  nem  fô  para  a 
infiadio  curnmt  -ifed  nuns  mortificação,  fenaó  para  o 
accipitbravium:  ^Qr(\\ico  goílo  j  nem  fó  para  a  hu- 
premio  a  que  todos  afpi-  mildadcjfenaó  para  a  hon- 
ra váo,  era  o  primeiro  ,  &  ra.  E  tudo  ifto  quer  dizer 


fó  os  que  fe  adiantavaó  na 
carreira  aos  demais ,  6c  có- 
feguiaó  o  primeiro  lugar , 
eraó  os  eftimados  por  vê- 
cedoreSjSc  laureados  com 
a  coroa.  E  fe  S.  Paulo  de- 
pois de  Chrifto,  &:  efcre^ 
vendo  a  Chriftáos,quaes 
eraó  os  Corinthios ,  lhe 
propõem  efte  exemplo, 
pofto  que  nafcido  entre  os 
Gentios;  quemfe  atreve- 
rá a  perfuadir  a  qualquer 
homem,  que  o  melhor  lu- 
gar heo  ultimo  ?  Digo  a 
perfuadir,  &  não  a  crer; 
fSoxque  bafta  fer  confelho 


Recumbein  novijjimo  loco. 


i%6 


A  Primeira  pre- 
rogativa  do 
ultimo  lugar  he  fer  muito 
fácil  de  confeguir.  Aos  ou- 
tros lugares,ain  da  que  naó 
fejaó  os  mais  altos  ,  che- 
gafe  tarde,  &  com  diíficul- 
dadejao  ultimo,  logo,  Sc 
facilmente.  Não  he  mais 
diíficultoíb  o  fubir,  que  o 
decer.^  Pois  efla  he  a  razaó 
ainda  natural  da  grande 
facilidade  com  que  o  ulti- 
mo 


fl 


4.Reg. 
20.  o. 


2  04  Sermão  da  dominga  ãecimafexta 

mo  lugar  feconfegue.  Aos     pondeo   em    continente 


outros  caminhafe  a  paíTo 
lento,  fubindo  j  ao  ultimo, 
quafi  fem  dar  paílb^decen- 
do.  Quando  £lRey  Eze- 
chias  defejou  ,  que  Deos 
lhe  confirmaíTe  os  annos 
devida, que  lhe  promete 


que naó  queria  que  deccl- 
fem  ,  fenaó  que  íubiíTem , 
dandoporrazão,queode- 
cer  era  fácil ;  Facile eftum- 
bramcrefcere  dccem  lineis\  íbid.ioi; 
nechoc^olo  titfiat  ,fed  ut 
rever  tatur  retrorfum  decein 


ra,com  algum  milagrerpoz    gradibus.  AíTim  refpondeo 
o  Profeta  Ifaias  na  eleição     Ezechias,  náo  como  Mar 


do  mefmo  Rey ,  que  eíco 
IheíTe  hum  de  dous,ou  que 
o  Sol  deceíTe  dez  linhas,ou 
que  fubiíTe  outras  tantas. 
E  porque   ellando   Eze- 


thematicojfegundoa  ob- 
fervação  particular  da- 
quelle  cafo  ,  mas  como 
prudente  Principe,  Sctaó 
amigo  da  fama,  como  da 


chias  na  cama,  nao  podia     vida^fegundo  as  regras ge- 
veroSoi,&:fó  podia  ver  a     raes  da  experiência:  Scdif- 


fombra  no  relógio  de  Pa 
lacio,que  defde  a  mefma 
cama  íe  defcobria  ,  foi  a 
propoíla  eíla ;  Fis  nt  aj'cen~ 
dat  timbra  de  cem  line.s  ,  an 
ut  revertãUir  totidcm  gra- 


febem.  O  feu  intento  era 
acreditar  o  milagre  pela 
diííiculdade  do  movimen- 
to do  Sol ,  &  por  ifib  diíle 
com  tantareíblução ,  que 
não  queria  que  deceíTcfe- 


dibus?Q\\^Y  VoíTaMage-     náo  que  fubiííb  -,  porque 


ílade,  que  a  fombra  fubá  , 
ou  que  dcça  dez  linhas  ?  A 
mefma  propoíla  ,  confor- 
me o  fitio  em  que  o  Sol  fe 
achava naquciía  hora,  mo- 
fl:ravabem,que  naó  feria 
menos  milagre  o  de  decc- 
rcmasfombras,  que  o  de 
fubirem.  Cótudo  oRcy, 
fcm  maisefpeculação,  rcf- 


naturai,&exprimcntaJmé- 
tetaódifficultofo  he  fem- 
pieofubir  ,  como  lacil  o 
decer.  A  fettapara  fubir, 
fegue  violentamente  as 
forças  do  arco  ,  &:  do  im- 
pulfo ;  mas  para  decer,não 
tcmncccílidade  de  braço 
aihco ,  a  mefma  natureza  a 
leva  fcm  violência  ao  bai- 
xo, 


poftTentecoflen. 
xo,&: quanto  mais  baixo,     fa mente  fubiraó. 
deoreíHi.    A 


tanto  mais  aepre 
barquinha  poda  na  vea 
do  R.ÍJ,  CO  n  i  vela  toma- 
da, ác  os  remos  recoihidos, 
le\^ada  fó  do  impeto  da 
corrente  como  em  hom- 
bros  allieos,  taó  defeança- 
damente  dece  ,  como 
apreíTada.  Pelo  contrario 
ao  fubir  pelo  meímo  Rio 
acima,  feja  o  vento  em  bo- 


20  f 

Afetta 
nos  deo  o  exemplo  no  ar, 
a  barquinha  na  agua  ,  & 
nòs  mefmos na  terra-,  mas 
nas  Cortes,  que  faó  outro 
quarto  elemento  mais 
cheo  de  impedimentos,  & 
difficuldades  ,  ainda  he 
mais  trabalhofo  o  fubir. 
Também  o  podem  dizer 
os  que  cançados  da  mef- 
ma  fubida  tomáraó  por 


ra  taó  forte,  que  quafi  re-     melhor  confelho  o  parar  : 
bente  as  velas,  &:  os  re-     &  muito  mais  os  que  de- 


meirostaõ  robuílos,  que 
quebrem  os  remos  ,  mais 
he  aaguaquefaaó,  que  a 
que  vence  m.  M  jS  mefmos 
para  fubir  a  huin  monte, 
he  com  tanta  dificuldade, 
&  moleília ,  que  a  própria 
refpiraçaò  fe  cança  ,  8c  fe 
aperta :  mas  para  decer  ao 
fundo  do  valle,  o  mefmo 
pefo  do  corpo  o  ajuda,  ali- 
geira,&  move :  &  mais  le- 
vados, que  andando,  che- 
gamos fem  cançar  ao  lu- 
gar mais  baixo,  &:  ultimo. 
Taó  facii  he  o  decer,&  taó 
diiiicuítofoo  fubir. 

187  Digaó  agora  os 
que  fubirao  aos  primeiros 
lugares,  quam  aifílculto- 


pois  dos  trabalhos,  &  mo- 
leftias  do  fubir,  em  vez  de 
confeguir  o  lugar ,  fó  alcã- 
çáraó,6c  tarde ,  o  defenga- 
no.  Naó  aílim  o  perten- 
dente  do  que  ninguê  per- 
tende,  &:  o  eílimador  do 
que  ninguém  eílima ,  o 
qual  contente  com  o  ulti- 
mo lugar,  para  decer  com 
afetta,  naó  ha mifter ar- 
co, para  decer  com  a  bar- 
quinha, naó  ha  miíler  re- 
mo, &  para  decer  com  o 
homem,  &comohomem> 
quaíi  naó  ha  miíler  pès, 
nem  paííbs.  As  azas  do  fa- 
vor, os  impulfos  do  po- 
der5&  os  cuidados  da  diíi- 
2encia,tudo  para  ellefaã 
def- 


i 


L'.!: 


\m§ 


tes 


2  O  í)  Ser  ma  o  da  l^âmi 

defprezos58c  rifo :  &  quan- 
do os  outros  chegaó  can- 
çadosaos  primeiros  luga- 
res, onde  haô  de  começar 
acançardenovo,  elle  def- 
cançado  fe  acha  no  ulti- 
mo,onde  fó  repoufa  o  ver- 
dadeiro defcanço. 

i88     Nàoacho  exem- 
plo deíla  inclinação  ,   & 
deíla  facilidade  entre  os 
homens-,  porque  a fua  na- 
tural ambição  mais  os  leva 
a  fubir  pelo  difficultofo, 
que  a  decer  pelo  fácil. Mas 
fe  elles  fe  lembrarem  da 
facilidade,&:  felicidade có 
que  a  Pedra  de  Daniel  de- 
ceo  do  monte58c  derrubou 
aEftatuade  Nabuco  ,  & 
trocou  com  elia  o  feu  lugar 
de  que  a  fez  defaparecer 
com  todos   feus  metaes: 
Daniel.  NuUíisquc  locíis  iuventus 
^^^*    eji  eis  :  naquelle  efpelho 
tofco,  Sc  infeníivel  veráó 
eíles  mcfmos  dous  erros 
do  feu  mal  polido  juizo. 
Deceo  a  Pedra  do  monte , 
6c  naó  bateo  a  cabeça, nem 
os  peitos,  fenaó  os  pès  da 
Eftatua,  onde  parouj  por- 
que efte  era  o  lugar  ulti- 
mo, ôc  o  mais  baixoj  aonde 


'nga  dectmajexta 
a  levava  o  pefo  da  fua  na- 
tural inclinação.  E  nota,  ôc 
pondera  muito  o  Texto, 
que  a  mefma  Pedra  fe  ar- 
rancou, &deceo  do  cume 
do  monte  fem  máos :  Abf^  j,^. j    . 
ctffus  lápis  fim    manibus  : 
Porque  .^Porque  eíla  he  a 
facilidade,&  differença  có 
quefedece  ao  lugar  mais 
baixo,  8c  fenaó  pôde  fubir 
ao  alto.     Aquella    Pedra 
naó  era  pequena,como  co- 
mummente fe  cuida,fenaó 
muito  grande.    Taógran- 
de,que  fendo  a  eftatúra  da 
Eílatuade  feíTenta    cova- 
dos,6c  os  pés,  Ôc  efpaço  en* 
trehumjác  outro  iguaes  a 
efta  grandeza  5  ella  com  o 
mefmo  golpe  os  alcançou, 
&  bateo  a  ambos.    i\gora 
pergunto :  E  quãtas  mãos, 
&    quantas  machinas  fe- 
riaó  neceíHi rias  para  fubir 
eíla  grande  Pedra  ao  mef- 
mo lugar  do  monte ,  don- 
de tinha  decido.^  Mas  on- 
de naó  podia  fubir  fenam 
com  muitas  mãoSí&:  mui- 
tas machinas,  ella  deceo 
por  fy  mcí ma  fcm  ncceíli- 
dadc  de  máos  próprias,  né 
alheas,7^'k^  maníbus.  Oh 
ceguei- 


poH^entecoften.      ^  ^  207 

cegueira  da  ambição  hu-     ouosdiftribueajuftíçajou 
mana!  Dizeime,  quantas     faó  jndulgencias  da  gra- 


máos  bejais,  dizeime,quâ- 
tas  máosencheiSjdizeime, 
quantas  machinas  fabri- 
cais para  vos  alar  aonde 
quereis  fubir  ?  Edizeime 
também  ,  quantas  vezes 
defarmaó  em  vão  eíTas 
mefmas  machinas,  8c  eíTas 
máos  bejadas  ,  &  cheas, 
quantas  vezes  vos  deixaó 
com  as  voíías  vazias ;  por- 
que elies  alcançarão  o  que 
pertendiaódevòs,  Ôcnam 
vò$o  que  efperaveis  dei- 
les.  A  Pedra  naó  derrubou 
a  Eftatua,para  fubir  [  co- 
mo vos  fazeis  ]  pelas  mi- 
nas alheas,  mas  o  lugar  que 
ellacomo  foberba  pifava, 
detinha  debaixo  dos  pès, 
eíTe  mefmo,por fero  mais 
baixOj&oultimo,heoque 


ça.  Paraajuftiçahenecef- 
fario  o  merecimento,  para 
a  graça  he  neceíTario  o  fa- 
vor. Ebaftaó  eftas  duas 
coufastaõ  diííicuitofas  de 
ajuntar?  Náo  baílaó.  A- 
bel  tinha  o  merecimento , 
&  o  favor :  &  o  mefmo  me- 
recimento 5  &  favor  forao 
o  motivo  de  Caim  feu  ir- 
mão lhe  tirar  a  vida.  Pois 
fecomo  merecimento,  & 
com  o  favor  5  o  lugar  que 
veyo  a  alcançar  Abel  foi 
o  primeiro  entre  os  mor- 
tos i  naó  he  melhor  ter  o 
ultimo  entre  os  vivos,  fem 
o  trabalho  de  o  merecer  , 
nem  o  perigo  de  o  não  lo- 
grar .^  E  fe  illo  aconteceo 
nos  tempos  em  que  os  ho- 
mens fe  matavão  fem  fer- 


tomou  para  fy  a  Pedra ,  &     ro,&  a  graça,  &  o  favor  fe 
nelledefcançoucomo  em     alcançava  fem  ouro ;  que 


próprio  centro. 

189  Infinita  coufa  fo- 
ra fe  ouve/Temos  de  por 
emparalélloas  diííiculda- 
des  dos  primeiros  lugares, 
&  a  facilidade  do  ultimo. 
Os  lugares  que  dependem 
da  v6tade,&  poder  alheo , 


fera  no  tempo  prefente?^ 
Depois  que  as  dignidadeá 
feíizeraó  venaesjos  luga^ 
res  mais  fe  allugaójdo  que 
fealcançáo  :  &  não  fe  dap 
a  quem  melhor  os  merece> 
fenáoa  quem  mais  caros 
os  compra.  O  que  fe  buíca 
iios 


2  O  8  Sermão  da  T^ominga  decimafexta 

noshomenSjfaóosquean-     Eílaturas  tão  defméíiira- 


tigamente  fe  chamavão 
talentos  :  &  os  que  hoje 
tem  o  mefmo  nome,  fenão 
eftão  engaftados  no  mef- 
mo metal  ,  por  íingiilares 
quefejáojnão  tem  preço. 
Sò  o  ultimo  lugar  5  porque 
não  tem  compradores,  fe- 
não vende  j  8c  por  iíTo  fó 
elle  fe  confegue  íem  cabe- 
daljScfe  logra  fem  defpe- 
za. 

ipo  Confiderai,&  me- 
di bem  os  degraos  ,  liuns 
tio  altos,  outros  tão  bai- 


das debalde  as  conquiila- 
reis  commefuras,  que  jà 
fe  acabou  o  tempOjCm  que 
os  negócios  fe  adiantaváo 
com  fazer  pès  atraz.  ^s 
habilitações  de  peíroa,a  fé 
dosofficiosjas  certidoens 
dosferviços,&a  juftifícà- 
ção  das  certidoens  ,  tudo 
não  tem  tantas  letras,quã- 
tas  faó  as  diííiculdades  có 
que  nellastopão,  &  fem- 
pre  afortehefuaj&c  voílb 
o  azar.  Aos  menores  ha* 
veis  de  dar,  que  he  menos> 


xos  ,  por  onde  tropeçan-     aos  n^aiores  haveis  de  pe- 
do,  ajoelhandojôc  caindo ,     dir,&  rogar,  que  em  quem 


ou  fe  perde  a  pertenção, 
ou  fe  chega  finalmente  a 
tomar  poííè  do  lugar  per- 
tendido :  &  vereis  quanto 
mais  cufta  o  alcançar  ,  que 
o  merecer.  A  David  para 
merecer,  bailou  lhe  derru- 
bar hum  Fihíleo :  mas  pa- 
ra alcançar  o  merecido  , 
foilhe  neceíTario  vencer  a 
duzentos.  E  que  Mini- 
ftro  ha,  ou  Official  de  Mi- 
niílro,  que  mais  pelo  in- 
teiriçado, que  pelo  intei- 
ro, não  fcja  hum  Filiílco 
cíyrrancudo  ,  &  armado  í 


tem  honra,  he  muito  mais: 
ficando  pendente  a  voíTa 
efperança  do  feu  agrado , 
ócdahora,  &  humor  com 
que  foííes  ouvido.  Nos 
Confelheiros  haveis  de  fo- 
licitaraconíulta,  nos  Se- 
cretários a  penna,  &  no 
Principe  não  fó  a  refolu- 
cão,  mas  na  refoluçáo  o  ef-. 
feito  j  para  que  tudo,  de- 
poisdepa^ar  os  direitos, 
não  venha  a  fcrhúa  folha 
de  papel  fcllada  com  as 
Armas  Reacs,as  quacs  ha- 
veis de  cóquiílar  de  novo, 
para 


pofl^entecoflen.  209 

para  que  chegue  a  fer  ai-  dam  !  que  fendo  difficiil- 
gua  coufa,  o  que  ainda  de^  tofiirimo  o  fubir,  &  facili^ 
pois  do  defpacho  he  nada.  mo  o  decer  ,  elies  perver- 
Eniíim,  que  eíles  faÓ  os  tendo  as  leys  da  razaÓ,  & 
difficulcolbs,  Sccançados     da   natureza  ,  antes  que 


degraospor  onde  fobem, 
quando  naó  caem  ,  os  que 
aicançãoos  primeiros  lu- 
gares :  &:  fó  aqueile  que  fe 
contenta  com  o  ultimo, 
nem  ferve,  nemrequere. 


remfubircom  difficulda- 
de,&  trabalho,  que  decer 
com  facihdade,  Sz  defcan- 
ço.  E  notai,  que  he  tanta 
a  facilidade, «Sc  o  defcanço, 
que  fó  fez   Chrifto  men- 


nem  pleitea ,  nem  adula ,  çaò  do  defGançar,&:  naó  do 
nem  roga,  nem  paga,nem  decer.  Naó  diífe  como  a 
deve:  &  fem  depender  de  Zacheo,  dtfcende  ,  fenam , 
Minifl:ros,nemdeTribu-  recumbe-,  porqueo  deCer, 
naes,nemdomefmoRey,  ainda  que  fácil  ,  demanda 
eíle  he  o  que  fe  confulta,  paífos,6c  o  recumbe^  que  he 
êcelleoquefe  faz  a  mer-  eftarrecoftado  ,como   os 
ce,porque  fe  defpacha  a  fy  Hebreos  eílaváo  à  mefa  , 
mefmo.  Eque  podendo-  fófigniíica  defcanço  com 
meeudefpachar  a  mim,  gofto,&  fem  trabalho  i/eÉ-- 
haja   de  requerer  diante  cumbeinnovijfmo  loco. 
de  outrem?  Naó  he  mais 
fácil  o  querer  ,  que  o  re-  §.  VI. 
querer.^  Ouvi  a  juíla  excla- 
mação de  S.  Bernardo  ne-  ipi     A  Segunda  pre- 
fte mefmo cafo.   Operver-  Xlrogativa     do 
fitas !  o  abufiofilioru  Adaml  ultimo  luga  r  he  fer  o  maii§ 
&uia  ctm  afcendere  ãiffictli-  feguro.  Os  outros  lugares 
^="'-'  mum  fit ,  defcendere  autem  quanto  mais  altos  ,  tanto 
^i^í  facilimum^,  ipfi  &  leviter  menos  fegurança  tem :  &  a 
""^'     ^fcendunt,  &  dijfalius  àefr  fua  mefma  altura  he  o  pro  - 
cendunú  Oh  pcrverfidade,  noílico  certo  da  fua  ruma, 
óabufo  dos  filhos  de  A-  Naó  querp  que  vejamos 
Tom.;.  O         eftà 


k 


i 


Matth 
24.29. 


2 1 0  Sermão  daT>omingà  decimafexta 

cila  pouca  fegurança  em     ra,^:  propriamente  haó  de 


outro  lugar,  fenaó  naquel- 
le  mefmo  ^que  por  fer  o 
mais  firme  do  mundo,  lhe 
poz  Deos  o  nome  de  fir- 
mamento. Anunciando 
Chrifto  Senhor  noíTo  os 


cair,  &  o  Sol,  &  a  Lua  ef- 
curecerfe  fomente ;  porq 
fe  naó  efcurecem  todosjOU 
caem  todos?  Que  cuIpa,ou 
que  caufa  tem  as  Eílrellas, 
para  ferem  eilas  lo  as  que 


íinaes  do  dia  do  Juizo ,  diz     haó  de  cair  ?  Tem  a  culpa 
^,,^^  c^i  ru   ^r V  •  -     1    /'i  S 


que  O  Sol  fe  efcurecerà 
que  a  Lua  naó  dará  a  fua 
luz ,  &  que  as  Eftrellas  ca- 
hiráó  do  Ceo ;  Solobfcura- 
bttur  ,  ^  Luna  non  ãabit 
lumenfuu^Ò*  StelU  cadent 
deC^/o.Sobre  efte  cair  das 
Eftrellas  fe  dividem  os  In- 
terpretes em  muito  diífe- 
rentesexpoííçoens  -,  por- 
que íuppoem^  que  eíian- 
do  as  Eílrellas  fixas  no 
Ceo, &  fendo  o  Ceo  incor- 
ruptivel ,  naó  he  poílivel 
cahirê  propriamente.  Mas 
a  mim  (  diz  Maldonado 
di  (creta mente  )  quando 
Ariílotelesnegaoq  Chri- 
íto  affirma,  pareceme,  que 
antes  devo  crer  a  Chriíio, 
que  a  Ariftoteles  :  M^g/s 
enimChrijio  idaffirmanti  ^ 
quam  Ariíioteli  neganti 
Jieripojfe  ,  credendum  effe 
arbjtror.  Suppoílo  pois 
que  as  Eílrellas  vcrdadei- 


quetiveraó  defdequefo- 
raó  coUocadas  noCeo,que 
he  fer  o  feu  lugar  o  mais 
alto.  A  Lua  eftà  no  pri- 
meiro Ceo,  o  Sol  no  quar- 
to, as  Eftrellas  no  oitavo, 
que  he  dos  que  alcança  a 
noíTa  vifta  o  fupremo  :  & 
náo  he  neceílaria  outra 
culpa,  ou  caufa  para  ferem 
ellas  as  que  haó  de  cair. 
Em  todos  os  três  íinaes  fe- 
guio  Chriilo  a  natureza 
dos  lugares.  No  eclypfe  da 
Lua  feguio  a  natureza  do 
lugar  i  porque  no  primei- 
ro Ceo  naturalmente  a 
eclypfa  a  terra :  no  eclypfe 
do  Sol  fesniio  a  natureza 
do  lugar  5  porque  no  quar- 
to Ceo  naturalmente  o 
eclypfa  a  Lua  :  &  no  cair 
das  Eftrellas  também  fe- 
guio a  natureza  do  lugar; 
porque  no  oitavo  Ceo, 
iendo  cfte  o  mais  aito,tam- 
bem 


!bid.  8. 


poft^cntecõJíen.  21/ 

bem  hc  natural  o  cain  para  a  tentação.  O  primei- 

192  Não  ha  altura  ne-  rofoia  torre  do  Templo  ^^^^  ^ 

fte  mundo  ,  que  náo  feja  de  Jcrufalem   :  Ajjtmp(it 

precipício.  Todo  o  lugar  euminfanãam  Civitatem  ^ 

mais  aí  to  que  os  outros.ef-  &  ftatuit  eufuper  fimacu- 

tà  fempre  ameaçando  a  /í^«íTí'«?/>/í.  Ofegundofoi 

própria  ruina  ,  fem  outra  hum  monte  o  mais  levan- 

çaufa,ou  culpa,  que  o  fec  tado,  que  havia  naqueJle 

mais  alto.  Que  culpa  tem  deftriífco  -Jterum  affumpfit 

as  torres,  Sc  os  montes  pa-  etm  in  montem    excelfim 

ra  ferem  elles  os  ameaça-  <valde.    E  porque  razão  a 

dos  dos  trovoens,  &  os  fe-  húa  torre,&  a  hum  mon  te.*^ 

Fidos  dos  rayos  ?  Nenhúa  Porqueem  hum ,  &  outro 

outra  fenaò  a  fua  própria  lugar  armava  a  derrubar  a 

altura,  &:  ferem  os  lugares  Chriílo.  Na  torre,  foliei- 

mais  levantados  da  terra,  tando-oa  que  fe  precipi- 

Parece  que  fe  dà  por  of-  taífe :  Mitte  te  deorfum :  no  iwd  $. 

fendido  o  Ceo  de  fe  aviíl-  monte,  fa  zendo  lhe  gran- 
des promeífas  ,  para  q^e^^.^ 


cahiílè ;  Si cadens  adorave- 
ris  me. Os  que  tanto  anelaò 
àfubida  de  femeíhantes 
lugares,  3 à  que  náo  podem 


filiarem  mais  aelle,  como 
fe  todas  as  torres  foraó  a 
de  Babel,  &  todos  os  mo- 
tes os  dos  Gigantes.  Quâ- 

do  Chriílo   para  nos  dar    .^^ ,-,-l ^ 

exemplo  fe  defafiou  com  ver  quem  os  leva,  vejaó  ao 
o  Demónio  ,  a  primeira  menos  aonde  faó  levados, 
eleição  do  lugar  foi  fua,  A  torre  era  lugar  Eccleíia- 
provocando-o  ao  deferto :  ílico,&  fagrado  j  o  monte, 
*Duãuseftin  deJertumyUt  lugarfecular ,&  profaiio; 
Matth  tentareturà^Diabolo.i^^iS  na  torre  prometeolhe  o 
4».  *  a  fegunda,6c  terceira  elei-  Demónio  Anjos  j  no  mon- 
ção foraó  do  mefmo  Diç-  te  offereceolhe  mundos: 
ínonio, levado elle a ChriX  mascomohum,  ^  outro 
fto  aos  lugares,  que  lhe  pa-  lugar  eraó  os  mais  altos, 
recéraò  mais  a  propolico  ou  as  ofFertas  foífem  da 

Oij         Ceo, 


2 1 2  Sermão  da  T>ommga  decimafexta 

Ceo  5  ou  da  terra  ,  ou  na  de  Dário:  &  Aman  taõ  va- 

Igreja,  ou  fora  delia  ,  am-  jído  de  Aí]iiero,ambos  taó 

bos  eraó    igualmente  os  de  repete  cabidos,  &:  mais 

maisperigofos,  &  os  mais  fendo  taó  difFerentes  na 

aparelhados  para  a  cabida,  vida,  como  na   profííTaó  ? 

ipj     Jà  muito  antes  ti-  Sim.  Daniel  fervia  a  Deos, 

nhaenfayado  o  Demónio  Aman  fervia  ao    mundo: 

eíla  mefma  tragedia  em  Daniel  era  juílo,  &  finto, 

duas  grandes    figuras  de  Aman  era  mao,  &  perver- 

hum,&:  outro  eílado.  Da-  fo  j  mas  levantados  ao  cu- 

mel  era  peíToa  V  cclefiafti-  me  dos  primeiros  lugares , 

ca  dedicada  ao  ferviço  de  nem  a  Aman   Ibe  valeo  a 


Deos :  Aman  era  Miniftro 
fecular  occupado  nos  ne- 
gócios do  mundo.  Aman 
tinha  o  primeiro,  &  maior 
lugar  na  Corte  delfley 
-Aífuero:  Daniel  também 
o  primeiro  ,  &  maior  na 


fua  induftria  ,  para  fe  fu- 
ftentar,  nem  a  Daniel  a  fua 
virtude  ,  para  fe  defender 
da  cabida.  Mais  admirá- 
vel foi  ainda  a  de  Daniel," 
queadeAman.  Amanca* 
bio,  porque  perdeo  a  gra- 


Corte delRey  Dário:  mas  çadoRey  :  Daniel  tendo 

quem  he  aquelle ,  que  na  por  fy  toda  a    2-raca    do 

praça  da  Metropoli  de  Su-  Rey,  toda  ella  lhe  naô  ba- 

zan  pregado  em  bua  Cruz  ílou,  para  que  naó  cabiife.. 


de  cincoenta  covados  có 
amais  infame  morte  eílà 
acabando  a  vida  .?  He  A- 
man.  Equembe  aquelle, 
quenaf;^nofa  Cidade  de 
Babylonia  ,  levado  por 
Miniílrosdajuíliça  be  la- 
çado no  lago  dos  Leoens, 
para  morrer  efpedaçado 
de  fuás  unhas  ?  He  Daniel. 
PoisDaniei  taó  eítiuiado 


E  parou  aqui  .^  Não:  livrou 
Deos  milagrofamente  a 
Daniel  das  garras  dos  Le- 
oens: &  canonizado  fcu 
merecimento  com  hútao 
pubhco,  &  eílupendo  pre- 
gão do  Ceo,  o  Rey  o  relli- 
tuío  outra  vez  ao  lugar  q 
dantes  tinha.  Mas  o  que 
agora  fe  fcguc  ainda  foi 
maior  prodígio.  Foraó  taò 
pcdc' 


foJtTenfecofiefP.  213 

Í5oderoras,  5c  tao  aílutas  as  doente  que  nao  ha  de  mor- 
machinas  de  feiís  inimi-  rer  ,  eftà  tutus  na  febre 
gos,  que  obrigarão  ao  mef-  aguda  >  mas  não  ç^^^fecu-» 
moRey  a  que  elíe  otor-    r/zi-j  porque  não  eílà  fem 


perigo,  fem  temer,  &  fem 
cuidado :  que  iíCo  quer  di- 
zer Securusy  hoc  efi^  fine  cu- 
ra, Efta  he  a  energia,  ôc. 
elegancia  daquella  fenten- 
ça  de  Séneca :  Sceleratuta 


naíTe  a  meter  no  lago,  &  o 
entregaíTe  outra  vezà  fo- 
me, &  voracidade  das  fe- 
ras. 
■M94    Oh  bemaventu- 

radofó,  &fó  bem  enten-     3 . 

dido  aqueile,  que  entre  to-  ejfe^fecura  non  pojjunt.    E 

dos  os  lugares  do  mundo  efte  género  de  fegurança 

fabeefcoiher  hum  tal  lu-  fegura  não  fó  do  perigo, 

gar,  do  qual  ninguém  o  fenão  também  do  temor» 

poíla  derrubar  ,  nem  eile  &  do  cuidado ,  a  qual  nun-» 

cahir.  Dos  lugares  altos  he  ca  pode  haver  nos  lugares 

verdade,  que  nem  todos  altos,  he  aquefó  fe  acha 

cahiraój  mas  também  he  no  ultimo.  Quem  eftà  no 

certo ,  que  os  mefmosjque  lugar  alto,  pôde  não  cahirj 

naó cahiraò, podiaò cahir.  masquem  eílà  no  ultimo 

E  baila  o  poderem  cahir,  não  pôde  cahir,  que  hefó 

para  não  eftarem  feguros.  a  verdadeira  fegurança.  E 

Como  pôde  fer  fegurança  porque  >  Porque  fe  do  iu- 

a  do  mar  ,  fe  fempre  eftà  gar  ultimo  fe  podéra  cahir> 

íbgeitaà  inconftancia  dos  não  feria  o  ultimo.  Do  lu^ 

ventos? Os  Latinos    tem  gar  alto  pódefe  cahir  ao 

dous  nomes,  com  que  de-  baixo,do  baixo  pôdefe  ca- 

clarão  dous  géneros  de  fe-  hir  ao  infimo :  mas  do  iníi- 


gurança  muito  diverfa 
Ttitus ,  &  Securus.  Tutus 
figniíica  a  fegurança  do  q 
que  naó  periga :  SecuruSy  a 


mo,  que  he  o  ultimo  ,  nam 
fe  pôde  cahir,  porque  nam 
ha  para  onde. 

ipf    Efte  foi  aqueile 


fegurança  do  que  naó  pe-     evidente  argumento  ,  com 
riga,nem  pode  perigar.  O     que  o    Profeta  Jeremias 
Tom.7.  O  iij  con- 


■il 

m 


Thren, 

4.22. 


214  SermaÕ  da  'T)omlnga  decimafexta 

confolou  a  Jerufalem    no  de  todos  os  males  ,  izen ta 

cafo  da  tranfmigraçaÓ  de  da  morte,&faz  immortaes 

Babylonia.Chorou  o  Pro-  aos  que  mata  5  porque  nem 

reta  eloquentiííimamente  eliaos  pòdejà  matar,  nem 

aquella  tranfmigraçaÓ  có  eiies  morrer.  Eeílepriyi- 

quatro  Abecedarios  de  la-  legio  he  o  que  logra  na  vi- 

ítimasjfinalando   a  cada  da,quemconheceo  obeni 


letra  hum  novo  motivo  de 
dor  :&  chegando  ao  ulti- 
mo verfoj&à  ultima  letra, 
acabou  có  eíla  breve  íç^n- 
tença ;  Filia  Sion,  non  ad- 


do  ultimo  lugar ,  &  fe  con- 
tenta com  eile.  Antes  de 
fe  recolher  a  efbe  fortiíli- 
nio  aíilo, pôde  decer  por 
vontade,  pôde  cahir  por 


aetultra.ut  tranfmigrette.  defgraça,  &  pode  ferder- 

A  tua  tranfmigraçaÓ,  ôjc*  rubado  por  força;  masde- 

rufalem,  foi  o  non  fins  ul-  poisdeeftar  no  ultimo  lu- 

traáos  males,que  te  podia  gar,nema  força  alhca,né 

fazer  Babylonia.  Mas  ago-  a  mefma  vontade  própria, 

ra,que  eftàs  padecendo  ef-  nem  todo  o  poder  da  for 


fa  tranfmigraçaÓ,  tu  a  de-^ 
vesconfoiar  naó  com  ou- 
tra coufa,  fenaó  có  a  mef- 
ma tranfmigraçaÓ  :  Por- 
que? Porque  fe  ella  foi  o 
nonplus  ultra  ,  &  o  ultimo 
dos  males,naó  pôde  paífar 
dahi:  Non  addet  ultra  ^ut 
tranfmigret  te.  Taó  alta- 
mente exagerou  Jeremias 
o  mal,quamíutilmentelhe 
excogitou  o  alivio.     He 


tuna  o  pode  fazer  cahir, 
nem  decer.  Acrecente  a 
fortuna  hum  dcgrao  alem 
do  ultimo,  &  outro  abaixo 
do  iníimo,  Ç  o  que  Deos 
naó  pôde  fazer  )&  fó  en- 
tão poderá  decer,quem  ef- 
ta  no  Ínfimo  lugar,&:  cahir 
quem  eftà  no  ultimo. 

ipó  Soquem  foube fa- 
zer cí]-a  eleição  defarmou 
a  fortuna.  Oh  que  gloriofo 


propriedade  dos  males  ul-  trofeo !  A  fortuna  defpida 
timos  izentarem  de  fy  defuasarmas^&aopè  dcf- 
mefmos  a  quem  oprimem .  fcs  deipojos  aquelle  verfo  : 
Amorte,  quehc  oiiltimo     Maior /um  qiicm  aãpofft 

Joríwr.a 


pdfl  "Pentecofien,  /^if 

fortuna  nocêre.   AíTitn  fe     bemafortunado^quênam 
dearma  a  fortuna,  que  fó     pôdecahirj&fónaõpóde 
he  force  com  as  armas,que     caliir,  quem  naó  tem  para 
nós  lhe  damos.  Todos  os    onde.  E  porque  náo  pare* 
poderes  da  fortuna  em  que     ça,que  diílimuío  a  futiieza 
conriílem?EmIevantar,ac     dehúamílancia,  que  tení 
abater :  &  fe  eu  me  conten-    efta  Fiiofoíia>dirá  alguém, 
tocomoultimo  lugar,  né     queno  mefmo  lugar  ulti- 
ella  me  pôde  levátar ,  por^     mo>fem  haver  outro  mfe- 
que  não  quero,  nem  aba.    rior,  &  mais  baixo  ,  pode 
ter,porque  naó  pôde.  An^     cahir  quem  eíla  nelle :  ^u  ;^^;^^; 
tes  digo,  que  nem  abater^    feexiflsmatftare^  <videat  ne 
me,  nem  levantarme pôde    eadat :  Quem  eftà  em  pè , 
a  fortuna ,  ainda  que  quei-     olhe  naó  caya  i  porq  quem 
ra  5  porque  temos  os  con-     eíláempé^pòde  cahir  dê- 
€eitos trocados. Levantar-    trono  mefmo  lugar,  feni 
me  naó  ,  fegundo  o  meu     cahir  para  outro.  He  o   4 
conceito  j  porque  o  que  el-     diífe  judiciofaméte  o  Poe- 
la tem  por  melhor   lugar,     ta :  Infe  magna  ruunt.  Mas 
eíTeheo  que  eudefprezo.     eíl:a  inílancia  naó  tem  ia- 
E  abater  me  também  naó,     gar  no  noíTo  cafo  :  quem 
fegundo  o  feu  conceito  •,     eftà  empe  pôde  cahir  no 
porqueoqueeilatem  por     mefmolugar,mas  naóque  , 
peor  lugar,eíle  he  o  que  eu     eftà  deitado  j  &:  iíTo  quer 
eftimo.    Abra  os  olhos  a    áizzr ^recumhe.  Os  que  ÍM" 
fortuna  cega ,  &  emende  a     biaó,&:  deciaó  peia  efcada 
falfa  aparência  dos  feuser-     de  Jacob    podiaó   cahir, 
rados  conceitos,  &  fó  en-     mas  elle  que  jazia  aopè  da 
taô  poderá  fazer  bemafor-     mefma  efcada  no  ultimo 
tunadosjtédo  pelo  melhor    lugar,6c  deitado,  eftava  fe- 
lugar  do  mundo  naó  o  pri-    guro  de  poder  cahir,^  por 
meiro,&  mais  alto,  fenam     iífo dormia  a  fono  folro  : 
o  mais  baixo  ,  &  ultimo.     Recumkinnoviffimoloco. 
Só   he  verdadeiramente  ^ 

Oiiij        §Ylh 


m 


2 1 6  Sermão  da  T^omin^a  decimafexta 

refufcitouem  noíTos  tem- 
pos,aílim  foi  tarrj bem  con- 
denada como  errónea,  por 
ferexpreíTamente  encon- 
trada com  as  Efcriturasdi- 

ç     i  p       ^-  r ,'"r-     v^í^^s- C>oSoldizo  Texco 

tam^bem  o  mais  quieto ,  ou     claras ,  como  a  luz  do  mef- 


iP7 


Terceira  pre- 


XjL  rogativa  '  do 
ultimo  lugar  fobre   mais 


fó  elle  quieto.  Neíta  per 
petua  roda  em  que  fe  re- 
volve o  mundo ,  tudo  fe 
move,  tudo  fe  altera ,  tudo 
fe  muda,  tudo  eílà  em  có- 
tinua  agitação,  fem  coníi- 
llencia,nem  firmeza :  nem 


mo  Sol,  que  eile  heo  que 
dà  volta  ao  mudo,  allumi- 
ando^o:  Oritur  Sol,&  oc^cá^ 
ciditygyrat per  Mertdiem^^^^^ 
&fleã'itur  ad  Aqmlonem^ 
lu-i rans untverfa  m  circui^ 
Tiai,i^n\.^í  ';'     ^^-  ^ peio cótrariojda ter- 

«ínmí  Tr  ""' r^"'^  ?    "^"^  ^^^"  de  mover  jà 

ÍaôT'  °í  í'°^°^°';  """^  "P^  '^«^  Pl^"«^s  fe  moves 
J^aoeraoSoloque  fe  mo-    &  todos  os  Aftros,  &  cor* 

do  fín,  '''*'" '° '"""■  P^s^^eleftesdedia,  &  de 
do,fcnao  que  permanece-  noite  eftaó  em  perpetuo 
dolemprefixo,  &  immo-    movimento, &abS  do 

Ceo  arrebatada  com  eíle 
fe  move  a  esfera  do  fogo,  6c 
abaixo  do  fogo  o  ar,  &  os 
ventos, &  abaixo  do  ar  a 
agua,  ou  correndo  perpe- 
tuamente nos  rios  ,  &  nas 
fontes,  ou  indo,  &:  tornan- 
do àsprayas  no  mar  duas 


vel,  eíla  terra  em  que  eíla- 
moshe  a  que,  fem  nòs  o 
fentirmos,  fe  move ,  &  nos 
leva  comíigo,&  quádo  nos 
aparta  do  Soí,  faz  a  noite, 
&  quando  colo  torna  a 
mo/Irar,  o  dia.  Mas  eíla 
opinião  ,  ou  imaginaçam 


^\^i,      '  -         -^c^—^cv..*     'a»^ ua ura y asno  mar  duas 
pathcfliatica,  aflim  como    VC/e(ino.dia,aj;ida  quando 

as 


poftTentecoften.  217 

as  tetnpeflrades  o  naó  le-     para  o  Ceo3&  para  tudo  o 


vantaò  às  EftreIias,oii  abif- 
maó  às  áreas ;  qual  he  a 
razaó  porque  a  terra  no 
meyo  de  todas  eílas  agita- 
çoens,&  tumultos  da  natu- 
reza, fôellaeftà  firme  ,  & 
immovei,  fó  elia  em  per- 
petua quietaçaò,&  focego: 
Terra  autem  in  íeternuftat^ 
Náo  vedes  como  neíle 
immenfo  globo  do  uni- 
verfo  íó  à  terra  como  cen- 
tro delie  coube  o  ultimo 
lugar  do  mundo  ?  Pois  eíTa 
he  a  razaó  porque  fó  ella 


que  fe  move  entre  o  Ceo, 
&  a  mefma  terra,  que  con- 
tente eftaria  do  íeu  ultimo 
lugar,  &  que  graças  daria 
por  elle  ao  Autlior  da  na- 
tureza :  vendo  o  curfo  ,  & 
revolução  fempre  inquie- 
ta do  Sol,  da  Lua  ,  &  das 
Eftrellas:  5c  a  continua  ba- 
talha dos  elementos,  co- 
mendofehuns  aos  outros 
fempaz,nem  quietaçam, 
mas  em  perpetua  conqui- 
fta  de  dilatar  cada  hum  a 
própria  esfera  ,  &  fó  ella 


no  mefmo  mundo  goza  de     pacifica,^:  quieta  por  be- 
quietaçaó,& focego :  Cíí/í-     nefício  da  ultima  baixeza 


faftabílitatist  &  immobili^ 
tatis  terra  eÇt  ejus gravitas^ 
quaexigit  infimum  mundi 
locum ,  comenta  Cornelio. 
E  m  fuma, que  todos  os  ou- 
tros lugares  mais,  ou  me- 
nos altos  faó  naturalmente 
inquietos,  &  fó  o  Ínfimo , 
ultimo,  6c  mais  baixo  de 
todos  he  o  aíTento  firme, 6c 
o  centro  immovel  da  fe- 
gura,  6c  perpetua  quieta- 
rão. 

íp8  Oh  fe  a  terra  ti- 
fera  olhos ,  6c  entendimê- 
to,6c  oihaíTe  cà  debaixo 


em  que  Deos  a  fez  a  baze 
do  mundo,  6c  lhe  deo  por 
baze  o  feu  próprio  centro  : 
Fíindajti  t  erram  fufer  fia-  p^^jj^^ 
hílitatem  fuam  ?  Mas  o  ho-  í°3  í« 
mem,que  he  terra  com 
entendimento,6c olhos,  fe 
o  mefmo  Deos  lhos  abrio 
de  maneira,  que  foube  nao 
querer  outro  lugar  fehaóo 
ultimo  •,  elle  he  o  que  ver- 
dadeiramête  logra  aquie- 
ta paz  ,  Sc  pacifica  quie- 
tação do  feu  taó  feíice  co- 
mo defconhecido  eíladoj 
fem  quem  lho  perturbe  5 


^T!»„., 


/ 


i 


i.Rcg. 

Texc 
Hebr. 


Sidon. 
Apo\'ii- 
naiis 
hb.iE 


2 1 8  Sermão  da  T>omwga  ãecimafextà 

nem  altere.    Batalhem  os  public^pracipitibus  yò^íw 

outros,  &:  comãofe  fobre  brkisculminibus  infiftunt^ 

quem  ha  de  fubir,&  alcan-  hoc  ipfo  ,fatis  miferiores  , 

caros  lugares  mais  altos;  quodparum  intelltgtint  in- 

que  eu  (ciiràj  quanto  mais  quiettjjimo  fe  Jubj acere  fa- 

olho  para  elles,  ôcvejo  de  mídatui.  Notai  a  palavra 

fora  os  feus  perigos, Ôcnau-  fuperlativa  inquietiffimo , 

fragios,  tanto  mais  me  fa-  c6  que  hum  VaraÓ  de  taõ 

tisfaço  da  minha  paz,  que  alto  juizo  como  Sidónio, 


das  fuás  batalhasjda  minha 
retirada,  que  das  fuás  vi- 
torias >&  da  m  inha  fegu  ra 
baixeza  ,  que  das  fuás  in- 
quietas alturas,  Olhaijque 
bem  entenderão  a  inquie- 
tação de  todas  ellas  vivos, 
6c  mortos.  Quando  Saul 
depois  de  morto  Samuel, 
o  tirou  do  fundo  da  terra , 
&ofez  vir  a  eíle mundo, 
pofto  que  por  taó  breve 
efpaçoja  razão  porque  Sa- 


não  fó  chama  fervidaó  â 
dos  lugares  altos,  mas  in* 
quieriííima  fervidaó  :  in- 
quittifjimo  fumidatui. 

199  Ascaufasnaturae^ 
deila  inquietação  dos  lu- 
gares altos,  ou faó  as  co-n* 
petenciasdos  que  os  pro- 
curaò,  ou  as  envejas  dos 
queosdeíejao  ,  ou  o  pró- 
prio defi/íbcego  dos  mef- 
mos  lugares,  que  ainda  de- 
pois de  adquiridos  ,  nem 


muel  íe  queixou  delle  naó     elles  aquieta5,nem  deixaó 
foi  outra,  fenão  porque  o     aquietara  quem  eílà  nel- 


inquietára  :  ^are  inquie- 
ta ff  i  me ,  tit  afcenderern  ?  E 
Sidónio  Apollinar  refuta- 
do o  parabém  de  certo  lu- 
gar eminente  a  que  fora 
promovido  hum  feu  ami 


Ics.Qiianto  às  competên- 
cias s  porque  pcJejavaóJa- 
cob,&  Efui  nas  entranhas 
defiia  Mãy:&  Pilares  & 
Zaraó,quelhefucedéraó, 
não  pelejavcáo  nas  entra- 


go,  efcrevco  eílas  notáveis  nhãs  da  fua  ?  Porque  Jacob 
palavras.  Sedjententta  ta-  &  Efau  ambos  pertendiaó 
// nunquam  ego  afcntior  ,  ut  o  primeiro  luga r :  &  entre 
fortunatos putem^  qui  Rei-    Phares  &  Zaraò  taó  fora 

cílava 


foH^entecoften.  219 

citava  de  haver  a  merma  tns^alterafinlflrhfedeat. 
contenda, que  tendo  Za-  Os  outros  Difcipulos  ,  a 
raò  jànamáo  coma  pur-  quem  os  dous  irmãos  fe 
pura  a  enveftidura  do  pri-  viaó  preferidos  ,  nani  lhe 
TíiQiroy  hic  exiet prior  :,toj^-     davaó  cuidado  :  &  fó  de 


nou  a  retirar  o  braço  para 
o  dar  a  Phares.  De  forte, 
que  nas  mefmas  entranhas 
maternas,  onde  ouve  dous 
que  competirão  fobre  o 
primeiro  iugar,tudo  foraó 
inquietaçoens,&  batalhass 
Bcoiídeouve  hum  fó  que 
quiz  antesoultimo,queo 


Pedrofe  temiaó.  Mas  fe 
Joaó  &  Diogo  eraó  os 
dous  mais  virtuofos  do  A- 
poílolado,  &  os  dous  ma- 
iores amigos  de  Pedro, co- 
mo o  queriaó  excluir  por 
eíla  via  ?  Porque  onde  en- 
tra aenveja,  &aambiçam 
de  lugares5náo  ha  virtude. 


primeiro,  tudo  foi  paz,  &     nem  amizade fegura:o  ma- 
quietaçaò.  líto  quanto  às     ior  amigo  vos  ha  de  deA 


íoo  competências.    E  quanto 
às  envejasPMaior  cafo  ain- 
da.   Pedirão  os  filhos  do 
Zebedeo  as  duas  cadeiras 
da máo direita,  &  efquer- 
dadoReyno  de  Chrifto; 
&  com  que  tençaõ  as  pe- 
dirão ?  Com  tençáOj  diz  S. 
Joaó  ChryfoílomojqueS. 
Fedro,  de  quem  fó  fe  te- 
miaojlhc  não  levaíTe  o  pri- 
meiro lugar  ,  ouprimaíia 
do  Rey n o.  Trimatiim  hu- 
chryf.  J^-^  confejjus  impetrare ,  & 
Homii.  pneponi  auiãem  fe  c£teris 
Matth.  jciebant ,  T  et  rum  verojibi 
praferri  formidantes  dice" 
reaujífunty  ut  tmus  à  dex- 


viar5&o  mais  virtuofo  fe 
ha  de  introduzir.  Os  pri^ 
meiros  lugares  leve-os Jo- 
aó &  Diogo :  &  a  S .  Pedro? 
Nenhum  lugar.  Por  cer- 
to, quenão  havia  de  haver 
eíla  inquietação  no  Apo* 
íl:olado,fe  o  lugar  fora  o 
ultimo.O  ultimo  lugar  nao 
tem  envejofos,  nem  quem 
o  efcolheo  por  melhor,  te 
que  envejar :  &  onde  nam 
ha  envejofo,  nem  enveja- 
do,  tudo  eílà  quieto.  E  ba- 
ila iílo?  Não  baila. Porque  20 í 
ainda  que  não  haja  com- 
petenciaj  nem  enveja,  que 
inquiete  os  lugares  altos. 


•II 


2  2  (3^  Sermão  da  T^omlnga  decmafexta   ' 

he  nelles  ta6  natural  a  in-         202     Sò o  ultimo  lugnr 


quietaçaójcomo  dizia,quc 
cMqs  mefmos  fe  inquietaó, 
&  a  quem  eftà  nelies.  Lú- 
cifer foi  criado  no  Ceo, 
donde  cahio ;  Cómodo  ce- 
^  cidiJUdeCalo  Lúcifer  :  & 
com  tudo  dizia  a  fua  am- 
bição, que  hayia  de  fubir 
ao  Ceo :  ^i^  dícebas  in  cor- 
^id.  ij.  de  tuo:ln  Calum  confcenda.  res  mais  altos  do  mar,  que 
Pois,  Demoniojfe  tu  eftàs  em  penhafcos  ,  ou  áreas 
no  Ceo  ,  como  anelas 


Ifai. 
4  2.- 


eftà livre  deftas  inquieta- 
çoens,& perigos,  6c  nam 
por  outro  privilegio  ,  ou 
immunidade  ,  fenáo  por 
fero  mais  baixo.  Errada- 
mente fe  chamáo  baixos 
aquelles  em  que  naufra- 
gão  os  navegantes.  Não 
laó baixos,  fenão  osluga- 


fubir  ao  mefmo  Ceo  ^  Co- 
mo defejas  o  que  jà  tens.? 
Comopertendes  o  qae  jà 
alcançaíle  >  Como  te  in- 
quieta o  que  jà  gozas  ^  Co- 
mo queres  fubir  onde  jà 
fubiftej&eílar  onde  jà  ef- 
tàsi?  Porque  o  mefmo  lu- 
gar em  que  eílava,  o  in- 


fe  levantáo  no  meyo  delle. 
Por  iíTo  nelies  naufraga  o 
mefmo  mar,&:  fe  quebrão, 
&  efpedação  as  ondas.  T^i" 
tofas  as  que  fem  querer 
fair,  nem  fubir,  fe  deixaó 
eílar  no  feu  fundo ,  que  ef- 
fas  fò  íe  confervão  em  paz, 
&  gozáo  de  inteira  quie- 
tação: êc  fe  là  chegão  os 


quietava  de  forte,  que  ef-     eccos  das  que  perigáo,  & 
tando  nelle  ,    naó  podia     quebrão,  ellas  defcanção. 


aquietar  nelie.  Por  iífo  fem 
competência,  nem  enveja 
de  outrem  ,  que  o  dcrru- 
baíTe,  elle  fe  derrubou  a  fy 
mefmo.  A  Adam  derrubou 
o  Demónio  ,ao  Demónio 
elle  mefmo  fe  derrubou, 
porque  tanto  o  inquietou 
o  lugar  que  tnihajcomo  fe 
Q  naó  tivera. 


&  dormem  ao  fom  das  ou- 
tras. Deílamefma  quieta- 
ção feguraj&  firme  nos  dà 
outro  documento  a  terra 
naquelles  grandes  corpos 
aqueconcedeoa  vida,  & 
negou  os  fcntidos.  Todas 
as  arvores  tem  húa  parte 
firme,  &  outra  movediça. 
A  firme,  que  faó  as  raizes, 
eítà 


poftTentecoJlen.  ,       221 

eftà  no  baixo  j  &a  move-     põem  em  dons  animalr- 


dica,  que faó  os  ramos,  no 
alto.  Sôalli  temjurdiçaó, 
&  império  ,  ou  a  lifonja 
dasviraçoens,ouo  açoute 
dos  ventos.  Todas  na  ca- 
beça leves,&  inquietas ,  & 


nhosdetaó  pouco  vulto  .^ 
Para  que  fe  envergonhem 
os  homens  com  todo  o  feu 
ufoda  razão,  de  naófabe- 
remefcolher  o  lugar,  que 

^^^^. , ^ mais  lhe  convém.  E   íao 

fó  no  pè  feguras,  6c  firmes,  tão  efquecidos ,  &  defcui-; 
Noaltoquebraófe  os  ra-  dados  todos  em  fazer  eíla' 
mos,  voaó  as  folhas,  caem  efcolha  ,  que  fe  algum  ou- 
as  flores ,  &  perde mfe  an-  ve,  que  a  íizeíre,foi  por  ef- 
tes  de  amadurecer  os  fru-  pecial  auxilio  da  graÇa^ 
tos :  &:  fò  no  baixo  fuílen-  divina.  AíHm  continua  o 
taóas  raizes o  tronco,  &  meímo  David  com  eílas 
nelleasefperanças  de  re-  admiráveis  palavras :  ^^^- 
cuperar  em  melhor  anno  tus  vir.cujus  eft  auxilium  ^^.^^ 
tudo  o  perdido.  Oh  mal-  absteiafcenfionesmcorde 
eníinado  juizo  hu mano , '  fuo  dífpofmt ,  in  vdlle  lacff^ 
que  nem  as  plantas  iníen^?    marum^inloco  quem  pofiãPj" 

Bemaventurado,  Seníiof i^ 
aquelle  homem  a  quem- 
vosaílifbiscom  particular- 
auxiiio  de  voíTa  graçaipor* 
que  eíle  confiderou  todas 
as  afcençoens,  ifto  he,  to- 
dos os  modos  de  fubir 
com  que  os  outros  procu- 
raó  alcançar  os  lugares^ 
mais  altos  -,  por è  m  elle  eP 


fiveis  ,  nem  os  elementos 
fem  vida  baílaó  a  te  fazer 
fezudo!  aprende  ao  menos 
das  criaturas  fenfitivas  , 
&  fejaó  as  menores  as  que 
teeníinem. 

203  OPardal,&:a  Ro- 
la[diz  David  3  foubéraó 
bufcar,  &  achar  o  lugar 
mais  conveniente   a  fua 


confervaçaó :  Etenim  Taf-    col heo  para  fy  o  mais  bai-' 
ftr  invèntt  (ibi  domum  ,  &     xo  de  todos,  &  poz  o  feu 

lugar  no  valle  das    lagri- 
mas: in  valle  lacrymarumr 
in  loco  ({uem  fofúit,    Ma$;^ 
quQ 


Tuhur  nidíimfibi)  iibiponat 
puUqsfuos.  E  a  que  fim  traz 
David  eíte  exemplo  ,  &  o 


2  2  2  '  Sermão  da  dominga  decimafextA 

que  valle  de  lagrimas  he  valle  pois  ,  que 
eíte  ?  O  mundo  vulgarmé- 
techamafe  valle  de  lagri- 
mas: porém  nem  todo  elle 
he  valle,  nem  todo  de  la- 
grimas. Não  he  todo  val- 
le, porque  tem  campos, 
outeirosj&  montesj  &  naó 
he  todo  de  lagrimas,  por- 


he  dela- 
grimasjôc  trifteza  para  os 
demais,  neíle  mefmo  ,  & 
no  mais  fundo  ddie  ,  que 
he  o  ultimo,&  mais  baixo, 
pozo  feu  lugar  aquelle  a 
quem  Deos  alliftio  ;  por- 
que naó  bafta  fó  para  eíla 
valente  refoluçaò  o  enten- 


mas  he  neceflarioo  auxi- 
lio da  graça  divina :  Cujus 
eftaiixiuumabste:  auxilio 
de  luz  para  o  conhecer 
por  melhor  j  auxilio  de  va- 
lor para  o  preferir  a  todosj 
&  atè  auxilio  do  amor 
próprio  ,  para  defcançar 
íem  engano  unicamente 
ntW^'.  Recumbe in  novtjji- 
me  loco. 


quetambemhede  goíios,     dimento,&  juízo  próprio, 
delicias,  &  paíTàtempos,  *  "^   " 

Que  valle  he  iogo  efte  on- 
de fó  o  homem  aíliltido  da 
graça  de  Deos  pozo  feu 
lugar.  In  valle lacrymamm^ 
in  loco  qu^m  fofutt  ?  He  o 
valle  que  fazem  os  montes 
das  afcençoens,iílo  he ,  os 
lugares  altos  onde  todos 
defejaó  fubir,que  elle  con- 
liderou  muito  attentamé- 
te:  Afcenfiones pofiãt  in  cor» 
dejuo.  Os  que  fubiraó  a  eA 
tes  lugares  altos,  eftaó  nos 
montes  da  alegria ,  porque 
confeguiraóo  que  defeja- 
vaó:  &  os  que  nam  pode- 
rão fubir  ,  eftão  no  valle 
das  ÍP  grimas  >  porque  to- 
dos chorão  ,  &  fe  chorão 
de  lhe  naó  chegar  o  dia 
da  fua  afcençaó,  &  de  nam 
ferem  promovidos  aos  lu- 
gares, que  dçfcjaó.  Ncíie 


í.  VIIT. 


204 


T 


Emosviíloco- 


lugar,  entre  todos  os  do 
mundo,  para  alcançar  he  o 
mais  fácil ,  para  confervar 
omaisfeguro  ,&  para  lo- 
grar o  mais  quieto:  prero- 
gativas  nelle  fíngularcs, 
pelas  quaes  deve  fer  prefe- 
rido a  todos  os  outros.  Ne. 
o  no- 


pofiTentecôften.  12^ 

o  nome  de  ultimo  lhe  deve    ]icidade  com  Jupiter:&  el- 


tirar  nada  de  eftimaçaõj 
porque  fenaó  fora  o  ulti- 
mo, naó  as  tivera.  He  todo 
olugarultimocomooque 
coube  a  Benjamin  nanie- 
fadeJofeph.Como  os  Ir- 
mãos feaftentáraó  à  mefa 
conforme  as  fuás  idades  >  a 
Benjamin,  que  era  o  mais 


ta  felicidade  fobre  huma- 
na fó  a  depoíitou  nam  o 
falfo,  fenaó  o  verdadeiro 
Deos  nos  thefouros  cfcon- 
didos  do  ultimo  lugar.  Sò 
alli  íè  vive  fem  defejo,fem 
temor,  fem  eíperança,  fent 
dependência,  &  fem  cui-^ 
dado  algum,  nem  ainda  le* 


moço,coubelhe  o  ultimo  vepenfamento,queaper 

lugar.  Foi  porém  coufa,  turbe.SòallioíbnoJiedef- 

que  os  mefmos  Irmáos,  &  canço ,  o  comer  fuílento,á 

todos  os  Egypcios  muito  refpiraçaó  vital,  &  a  vida^ 


admirarão  -,  que  fazendo 
Jofephos  pratos,  o  deBé- 
janiin  fe  avantejava  fem- 
precom  notável  cxceílb  a 
todos.  Olhamos  para  o  lu- 


gar,&  naó  olhamos  para  o  todoem  fy,&fóradomu- 

praco.  Ohfe  foubeífemos  do ;  porque  naó  quer  nada 

tomaro  fabor  aos  goílos,  delle.  E  que  naó  bafte  tu- 

&  regalos  puros,  &  íince-  doifto,paraque  oultimq» 

ros,  que  fó  no  ultimo Jugar  lugar  íeja  o  mais  eftimadoj^ 

feachaó,  livres  das  amar-  o  mais  querido,  &  o  mai^ 


guraSjSc  deíTabores  ,  que 
em  todos  os  outros  luga- 
resjpor  altos,  &  foberanos 
que  fejaó  ,  ainda  com  os 
olhos  cerrados,  mal  fe  po- 
dem tragar !  Là  diíle  De- 
mócrito, que  aqueile  que 
fe  refolveíle  a  naó  defejar , 
poderia  competir  de  fe« 


vida-, porque  fóallieítà  a; 
Alma  naó  dividida,  mas 
inteira ,  &  toda  comílgo, 
&  dentro  em  fy  mefma> 
como  também  õ  homeríí 


pertendido  dos  homens? 
Tanto  pode  com  elles  a 
faifa  aprehenfaó  daquelle 
nome  de  ultimo,  com  que 
reconhecédo-o  no  demais 
por  taó  avantejado,&  me- 
lhor, o  reputaó  com  tudo 
naó  fó  por  menos  honra- 
do>masporafrontofo ,  ôc 
por 


1 

i 


224  Sermão  da  dominga  decimafexta 

por  iíTo  o  defprezão,  &  fo-  o  fenhor  da  carroça ;  &:  af- 
gemdelle.  íim  como  o  que  tem  o  ul- 

.  20^  Efte  he  o  iilfimo  timo  lugar  na  caía  ,  he  o 
engano  ,  que  fó  nos  refta  fenhor  da  caíIivaíH  mo  que 
por  refutar  3  cuja  mtelli-     voluntariamente  tem  o  ui 


gencia  çoníifte  em  faber 
diftinguir  no  mefmo  lu- 
gar húa  grande  diíferença 
de  ultimo  a  ultimo.  O  ul- 
timo lugar  merecido  por 
diílribuiçáo  alhea  ,  pôde 
fer  afrontofo  j  tomado  por 
eleição  própria,  he  o  mais 
honrado.  Quem  volunta- 
riamente, &  por  própria 
eleição  efcolhe  o  ultimo 
lugar  do  mundo ,  eíTe  fó 
ufa  do  mefmo  mundo  co- 
mo fenhor  delle.  Denos  a 
primeira  prova  o  mefmo 
mundo,  nao  como  vão,  & 
errado,  mas  como  cortez, 
&entendido.  Viftes  paf- 
fear  na  praça  de  Palácio 
liua  cochada  de  Fidalgos  j 
&  qualdelleshe  o  fenhor 
da  carroça.^  O  que  vai  no 
ultimo  lugar.  Viíles  os 
mefmos,  ou  outros  em  có- 
verfaçaó,  ou  viiitaj  Sr  qual 
he  o  fenhor  dacafa.^O  que 
eftà  na  ultima  cadeira. 
Pois  aíllm  como  o  que  té  o 


timo  lugar  do  mundo,heo 
fenhor  do  mundo.  Nam 
ponhamos  a  decifaó  na 
vontade  dos  homens,  que 
pode  fer  errada^  mas  na  do 
mefmo  Deos,  que  hc  a  re- 
gra de  toda  a  razaó,  &  ver- 
dade. ComeçoujSc  acabou 
Deos  a  grade  obra  da  cria- 
ção dcíce  mundo  em  féis 
dias :  mas  porque  ordem  ? 
Depois  de  criar  no  primei* 
ro  dia  a  luz ,  no  terceiro 
criou  as  arvores  ,  <Sc  plan- 
tas, no  quarto  o  Sol,  Lua, 
&  Eftreilas ,  no  quinto  os 
peixes,  Sc  a ve^,  no  fextoos 
animaes,  que  andaô,  ou  íe 
arrafbáo  fobre  a  terra  :  & 
depois  de  povoados  por 
eftemodoo  Ceo,  o  ar,  a 
agua,  6c  a  m.efma  terra, del- 
ia formou  ,&  criou  o  ho- 
mem, p.n"a  dominar  como 
fenhor  tudo  o  que  tinha 
criado.  A íli m  o  diíle  o  mef- 
mo Deos  no  mefmo  a^to 
em  que  o  formou  :    Fdcia-  ^mef 


ultimo  lugar  na  can-oça,he     mus  hfjmhian  adimaginemy ' ' 

à-fi' 


poH^enfecopn. 
& Jimilítudinem  noftram^    vendo  deter 
utprafit  pifei  hus  mar  is ,  & 
volatiíibus  C^líi  &  beliijs^ 
univerfa  que  terra.  Pois  íe 
o  homem  era  a  primeira  j 
&  mais  nobre  de  todas  as 
criaturas  deite  mundo,  8c 
criado  para  fenhor  delias, 
porque  o  naò  ctiou  Deos 
no  primeiro  lugar  ,  fenam 
no  ultimo?  Por  iflfb  mef- 
mo.   Porque  a  honra  ,  & 
dignidade  do  ultimo  iu-    rorum.  E  porque  razaó  o 
gar  do  mundo  fó  compe-    ultimo,  fendo  fua  a  eleição 


21f 

lugar  entre 
os  homens ,  que  lugar  to- 
maria ?  O  de  Nazareth  ?  O 
de  Belém  ?  O  do  Egypto  ? 
O  do  Calvário  ?  Tal  foi  o 
lugar  que  tomou  fempre, 
&  em  toda  a  parte  5  que 
vendo-o  o  Profeta  Ifaias, 
naó  teve  outro  nome  com 
que  fe  explicar,  fenaó  cha- 
ma ndoihe  o  ultimo  dos 
homens  :  Roviffimum  vi-  ^^^'-  ^5- 


tia  ,  &  era  devida  ao  Se- 
nhor,&  dominador  dellc. 
Vedeagorafe  hc  honra- 
do,&quam  honrado  he  o 
ultimo  lugar.  Mérito  ergo 
pojiremus^  quafi  finis  natu- 
ra for  matus  :  reèfe  ergo  no- 
'vijfímus^quajitotiusfumma 
operis-i  quafi  caufa  mundi , 
tropter  quemfaãafunt  om- 
nta^  diz  S.Ambroíio.  Mas 
ainda  naó  eftà  dito  o  que 
excede  quanto  fe  pôde  di- 
zer. 

'    2c6    Deos  em  quanto 
Deos,  por  fer  infinito ,  &: 


do  lugar  ?  Naó  porque  ti- 
ve ffcp^ir  3.  fj^quQ  a  igual- 
dade, que  tinha  com  o  E- 
terno  Padre  ,  foíTe  alhea, 
ou  roubada,  &  naó  natu- 
ral, &  própria,  CO  mo  notou 
S.  Paulo  i  mas  porque  {en-: 
do  taó  Deos ,  &  taó  fup re- 
mo Senhor  do  univerfo, 
como  o  mefmo  Padre ,  né 
outro  lugar  era  capaz  de 
fua  grandeza,  nem  outro 
mais  decente  a  fua  fobera- 
nía,né outro  emfimmais 
conforme  a  íua  doutrina  , 
fenaó  aquelle  mefmo    a 


immenfo  ,  he  incapaz  de  que  hoje  nos  exhortou,  o 

lugar:  porém  depois  que  ultimo.  Em  humbanque- 

deceo  do  Ceo  a  efie  mun-  te  a  que  ElRey  Dionyíio 

do,&  fe  fez  homem  ,  ha-  de  Sicília  convidou  as  ma- 

Tom.7.  P           ioi-es 


I 


/ 


2  2  6  Sermão  da  dominga  decimafexta 

lores  perfonagens  do  feu  ciufaódaparabola^naquâl 
Reyno,  como  puzeíTe  no  parece  que  desfez  o  divi- 
uitimo  lugar  da  meíci  a  A-     noMeftre  tudo  o  que  te- 


riftippo,  oráculo  daquella 
idade  ,  o  que  lhe  diíTe  o 
grande  Fiiofofo/oi :  Hunc 
plane  locum  decorare^  ò"  ti- 
luftrem  reddere  voluiJtkStm 
duvida,  ôDionyíio,  que 
hoje  quizefte  enobrecer, 
Sc  fazer  illuíi-re  efte  lugar. 
Efeaílim  honrou,  &  iliu- 
ílrou  Ariftippo  o  ultimo 
lugar  fô  com  fe  aíTentar 
iiellejque  diremos  depois 
que  Deos  o  efcolheo  ,  & 
tomou  para  íy  ?  OnovtJJi^ 
wumièr  altiUimiim  \  excla- 
ma S.Bernardo.  Antes  de 
Deos  efcolher  eíle  lugar 
■entre  os  homens  ,  podia 
andar  em  opinioens  fe  era 
honrado,  ou  naó  o  ultimo 
lugar 


mos  dito.  Dando  o  Senhor 
a  razaó  porque  fe  naó  de- 
vem procurar  os  primei- 
ros lugares  jfenaó  o  ulti- 
mo :  porque  virá  (^  diz  ^  o 
dono  da  cafa,&:  do  convi- 
te, 6c  fe  vos  vir  no  ultimo 
lugar,  dirvos  ha  ;  Amice-y  Luc  i^. 
afcendeftiperius'.  Amigo,fu-  *°* 
bi  para  cima ;  &:  pelo  con- 
trario, fe  tiveres  tomado  o 
primeiro,  o  que  ou  vireis,  rbijp, 
íerà:*D^  huic  loctim-.htY^n^ 
taivos  deíle  lugar,  &  dai-o 
a  eíle :  &  com  grande  con- 
fufaó,&  vergo  aha  voíTIi  fi- 
careis no  ultimo :  Etinci^ 
pias  cum  ruhóre  novijjimum 
locum  tenere.  Eíle  dono  da 
cara,&  do  convite  no  fim 


mas  depois  que     da  parábola  he  Deos  ,  que 
Deos  o  efcoihco,  &  tomou     fegundo  as  nollas  acçoens, 


para  fy  ,  intolerável  blas- 
fémia feria  dizer ,  que  naó 
he  o  mais  honrado  de  to- 
dos. 


ff.  IX. 


207 


p 


Orfimfó  rcíía 
fatisfazer  à  c6- 


6c  deliberaçoens  as  ha  de 
premiar,ou  caíligar:5c  naó 
pondero,  que  fó  ao  que  ef- 
colheo o  ultimo  lugar  cha- 
mou amigo,  Amice  :  nem 
pondero,  que  o  que  tinha 
tomado  o  primeiro  kigar, 
naó  ficou  nofegunuo,nem 
no  tcrceiío,  mas  deceo,  ou 
foi 


\\ 


fojt^entecoften.  ii) 

foi  lançado  no  ultimo:  mas    hçoens,  enganos,  faiíida- 
o  que  pondero,  &  reparo ,     des>  traiçoens,  violências , 


he,  que  ao  que  elegco  o  ul- 
timo lugar  o  premiou 
Deos  com  o  primeiro  ,  5c 
ao  que  tomou  o  priíneiro 
ocaíligoucoiii  o  ultimo: 
iogo  íè  o  ultimo  lugar  fe 
dà  por  caíligo>&  o  primei- 
to  por  premi  o,  melhor  pa- 


&  tratar  cada  hum  de  íu- 
bir  ,  ainda  que Teja  pelas 
ruinasalheas5&  para  ef- 
capar  de  todos  eftes  males^ 
maldades,  &  m  alicias ,  naó 
ha  outro  lugar  feguro  ,  & 
quieto,fena6  o  ultimo.Pe- 
lo  contrario,  no  Ceo  tudo 


rece  que  he  o  primeiro  lu-    hecharidade,paz,concor- 
gar,que  o  ukimo.  dia,  amor  ,  contentamen 


208  AHimparece,por- 
que  naô  coníiueramos  nos 
ni  efmos  lugares  o  onde,  &: 
o  quando.  Onde,  6c  quan- 
do foi  a  eleiçaô,que  os  ho- 
mens fízeraó  dos  lugares  ? 
Neíte  mundo.  E  onde ,  & 
quando  ha  de  fer  a  mudá- 
ça  com  que  Deos  os  ha  de 
trocar  ?  No  outro.  Pois  el- 
ía  hearazaò  da  difFeren- 
ça,Sc  da  troca.  No  outro 
mundo  he  melhor  o  pri- 
meiro lugar  ;neiie,  o  ulti- 
mo. E  porque  .<*  Porque  o 
Ceo  he  a  pátria  de  todos 
os  bonsA  de  todos  os  bés: 
a  terra  a  de  todos  os  máos , 
&  de  todos  os  males.  Na 
terra  tudo  íaó  foberbas, 
ambiçoens ,  envejas,  dif- 
cordias,  contendas,  cavii- 


to,  bemaventurança  ,  &■ 
eílimar,  &  gozarle  cada 
hum  do  bem  do  outro,  co- 
mo do  próprio :  &  por  iííb 
os  primeiros  lugares  de 
ninguém  envejados,nem 
pertendidos,  mas  de  todos 
aprovados,  6c  venerados, 
fem  receo  que  os  inquiete 
de  dentro,nem  perigo  q  os 
perturbe  de  fora  ,  íaó  taã 
íirmes,&  perpetuosjconio 
os  meímos  bens,  6c  felici- 
dade, que  lograó. 

209  Epara  que  veja- 
mos eílasduasdifferenças 
eftabelecidas  por  Deos 
defde  o  principio  do  mun- 
do, húa  na  terra  entre  os 
eiementos^Scoutra  no  Ceo, 
entre  os  Anjos  5  ouçamos  a 
Efcriturafagrada^Na  cria- 
Pij  çaó 


ífé' 


Pra'm. 
M8.  i. 


228  Sermão  da  Dominga  declmafexta 

ção  do  mudo  gaftou  Deos     Porque  fendo  a  agua  por 

natureza fuperior  à  terra. 


{çis  dias ,  mas  fó  cinco  del- 
les  foraó  propriamente  de 
criação.  No  primeiro 
criou ,  no  terceiro  criou , 
no  quartOjno  quinto,  &■  no 
fexto  criou ,  &  fomente  no 
fegundo  não  criou   coufa 


&■  fendo  o  lugar  da  terra  o 
ultimo,  ella  deixando  o  íi- 
tio  mais  eminente  em  que 
fora  criada ,  correo  efpon- 
taneamente  a  encher  as 
concavidades  da  mefma 


algua.  Pois  fe  o  fegundo  terra,  &fe  abraçou  de  tal 

dia  foi  totalmente  efteril,  force  com  ella  no  mefmo 

&  infecundo  fem  produ-  lugar, queda  agua,  &  da 

çaò  de  nova  criatura  >  em  terra  fe   formou  hum  fó 

quegaftou  ,  &  empregou  globo.  E  foi  taó  grata  aos 

Deos  todo  aquelle    dia?  olhos  de  Deos  eíla  acçaó. 


Empregou-otodo  emhò 
rar,&  exaltar  o  ultimo  lu- 
gar, quanto  elle  merece. 
Diz  o  Texto,  que  no  fegu- 
do  dia  dividio  Deos  o  ele- 
mento da  agua  ,  &  levan- 
tou húa  parte  delle  ,  &  a 
poz  fobre  o  firmamento,  a 
que  chamou  Ceo.  Eftas 
faó  aquellas  aguas  de  que 
diz  David :  Et  aqu^  omnes 
qH£ftiper  Calos funt  ,  Idu- 
dmt  nommT^omtni :  onde 
declara,  que  o  Ceo  fobre 
que  foraó  collocadas ,  he  o 
fupremojôc  mais  alto  de 
todos.  £  donde  lhe  veyo 
ao  elemento  da  agua  fer 
alfim  exalrado,o  que  Deos 
naó  fez  a  algum  outro? 


pofto  que  natural  3  do  ele- 
mento da  agua,que  haven- 
do de  lhe  compeafar  como 
Author  da  natureza  hum 
lugar  com  outro  lugar,pe-. 
lo  ultimo  a  que  fe  abateo 
na  terra ,  o  levantou  ao  fu- 
premodoCeo.  Mas  pois 
eílamos  no  Ceo,  vejamos 
quam  contrario  foi  ià  a  ef- 
te  exemplo  da  agua  ele- 
mentar o  do  fogo  racio- 
nai ,  que  iíTb  quer  dizer  Se- 
rafim. Tinha  o  primeiro 
lugar  no  Ceo  entre  o  Co- 
ro dos  Serafins  Lúcifer,  & 
naó  fe  contentando  có  me- 
nos fuaaltivcza  ,  que  com 
fubir  ao  fuprcmo  lòbrc  to- 
das as  criaturas,  lllo  hc  o  q 
rc- 


\ií 


põftTentecoJíen.  119 

revolvia  no  pcnfamento ,     poftosnos'primeiros?  Fa- 
quando  diífe  ;  Super  ajlra    cíl  he  dar  o  confelhojfenaó 


for  diíficultofa  a  refoluçaõ. 
Mas  eíta  naó  corre  por  mi- 
nha conta.  Porque  naò  fa- 
ráoos  que  tem  menos  que 
deixar,©  q  íizcraõ  tantos 


ifai.  r4.  Ç2)^/  exaltabofolium  tneum :: 
'^'  '"*■  jimilis  ero  AítiJJimo.  E  que 

lhe  fez  o  mefmo  Altifllmo 

a  quem  aífedbou  fer  feme- 

Ihanteí*  Verumtamen  ad  In^ 
&id  i   P^»^^ detraheris  mprofu-     Reys  >  &'Emperadores ? 
'  '^^'  dum  laci.  Do  Ceo  o  preci-     Náo  tinha  fé  do  Ceo,  nem 

pitou  no  Inferno,  6c  do  fu- 

premo  lugar,  que  aíFeârou 

no  Empireo,ao  iníimodos 

abi fmos.  Aíli m  caftiga,  ou 


do  Inferno  Diocleciano  &: 
Maximiano,  6c fó  pela  ex- 
periencia  que  tinhaó  dos 
primeiros  lugares  do  munr 


J>f emea  Dcos,6c  aíTim  tro-  do ,  cançados  de  o  gover^ 
ca  os  lugares,  fublimanda  nar,6c  mandar  ,  ambos  de 
atè  o  fupremo  a  quem   fe    comum  confentímento  re- 


íibateo  ao  ultimo  j  8c  der 
rubando  até  o  ultimo  a  quê 
affe£tou  o  fupremo.Tanto 
monta  na  parábola  do  noA 
fo  Evangelho,  ou,  Amice 
ajcêde  fuferhis^  ou  Incipias 
cum  rubor e  noviffimumlQ'* 
cum  tenére;,  v hs bc a  ol/o/n 
210  A  viíía  defteèter-^ 
nodefengano,  naóliene-^ 
ceíTario  inferir  qual  deve 
fer  a  reíoluçaó  nefta  vida 
dos  que  ainda  tem  livre  a 
eleição  dos  lugares.  Mas  q 


nunciáraó  o  Império  em 
hum  mefmo  dia(jque  foi  o 
de  dezafete  de  Fevereiro 
do  anno  de  trezentos  8c 
quatro  )  Diocleciano  em 
Nicomedia,  &  Maximia- 
no em  Milam.  E  quê  na m 
exclamará  nefte  paífo:ô  ce* 
gueira  do  juizo  humano ! 
ô  fraqueza  grande  da  noíla 
fé !  que  dous  Gentios,8c  de 
mà  vidajtiveirem  valor  pa* 
ra  húa  refoluçaõ  como  ef- 
ta,8c  que  fendo  a  medida 


faraó  os  que  jà  coníegui^  doslugares có  que  nos  le- 
rão afuajScpor  nafcimen-  vantamos  fobre  os  noíTos 
tojou  negociaça6,ou  qual-  iguaes  taó  curta,  baile  a  li- 
quer  outra  fortuna  eílaó  fonja  deíla  preferencia  taó 
Tom.7.  P  iij 


tra- 


i 


w 

ky 


226. 


2  30  Sermão  da  l^ominga  decimafexta 

trabalhofa,  &  incerta  para  mefmos  a  quem  inchaó,  & 
a  antepormos  neíla  vida  à  enganaò^  como  para  a  Re- 
quietação,  &  defcanço  da  publica,  que  arruinaó. 
temporal,&à fegurança  da  Eftes mefmos  Efcribas  & 
eterna!  ^  Farifeos    amadores     dos 

2 1 1  Razoens  pôde  ha-  primeiros  lugares, foraó  os 
ver  taô  urgentes  ,  &  obri-  foiicitadores  da  morte  de 
gaçoens  taô  fortes ,  q  naó  Chriíío,&  os  que  puzeraó 
permitaó  rompereftesla-  oFilhode  Deos  em  hua 
ços:  mas  nos  tais  cafos,que  Cruz :  Porque?  Sò  por  naó 
náo podem fer,  fenaó  mui-  perderem  os  lugares,  que 
torarosjjàquefenaôpof-  tanto  amavaó  :  Vement 
faó  renunciar  os  lugares,  Romani,  &tollent  noftrum  ^T^ 
ao  menos  fe  deve  renun-  locum.  Emíim  ,quefe  os 
Giaroamor.  Mais  eílra-  primeiros  lugares  fe  nam 
nhava  Chrifto  nos  Efcri-  amarem,  feráó  menos  os 
bas,&  Farifeos  o  amor  que  danos,  que  caufaráó,  pro- 
tmhaó  aos  primeiros  luga.  prios,&  alheos  j  mas,  ou 
res  ,  que  os  mefmos  luga-  amados,  ou  naó-  amados, 
res :  Amant  autem  f  rimos  fc  os  que  ellaó  nelles,  os 
recubitusin  canis  ,  &  pri-  não  renunciarem  de  todo , 
mas  cathedrasinfynagogis.  &  trocarem  generofamen- 
Para  ferem  taó  arrifcados     te  pelo  ultimo,  de  nenhum 

modo  poderáó  gozar  a  li- 
berdade, a  quietâçaó,&  o 
defcanço  íèguro ,  que  taò 
largamente  tenho  moílra- 
do-,  porque  efte  privilegio 


como  vemos  os  primeiros 
lugares  ,  baila  ferem  pri- 
meiros, ainda  que  fenaó 
amem.  Os  Santos  não  os 
amavaó,&com  tudofe  lè 


de  todos,  que  os  repugna-     fó  he  concedido  por  Deos 
yaó,&fugiaódelles  -mas     ao  ultimo  lugar:  Recumh 


fe  forem  primeiros,  &  jun- 
ta mente  amados,entaó  faó 
muito  mais  perigofos,  & 
pcrniciofos,  aíTimpara  os 


in  ntívíjjhno  loco. 


SER. 


:ê#: 


■£^  •?<$.? -?«^ -í^  í#? -S^ -S^S-S-íK 'Ê-^**^ -í^ -í^í  «*=^*^«® 


SERMAM 

ei     DO  santíssimos^ 

SACKã MENTO 

EM  DIA  DO  CORPO  DE  DEOS, 

«vv       .  na  Igreja,&Gonvenco  da  Encarnação. 

íííc  ejipams^qui  de  Calo-  defiendit.  Joann.  6, 


?Elebra  hoje  cfta 
Igreja,  o  4  cele- 
'  braó  todas  I  mas 
k  nenhua  com  táta 
obrigação,  nenhua  cò  tan-^ 
ta  propriedade.  Nas  outras 
hea  foíemnidade  própria 
do  dia,neíla  he  do  dia  ,  6í 
do  lugar,  Andão  taó  liga^ 
dos  entre  fj  eftes  dous  fo- 
beranos  myfterios,  Encar- 
naçãOjSc  Sacramento,  que 
amefmaSabedoria,&  elo- 


quência divina,  para  pre- 
gar as  grandezas  do  Sacra- 
mencojfe  valeo  das  excel- 
lencias:  da  Encarnação  :  .^^^ 
Hk  ejhpanis^  qui  de  Cak  0  fp. 
defcendit:E^Q  heopaó,diz 
Chriíí:o,q  deceodo  Ceo. 
Mas  quádo  deceo  do  Ceo 
efte  paó  ?  Não  no  dia  em  q 
feinftituíoò  myíterio  do 
Sacramento)  fenaó  no  dia 
em  que  fé  obrou  o  da  En- 
carnação. Aílim  o  confef- 
famos  todos  có-  os  joelhos 
P  iiij         ©m 


i 


■W 


232  Sermão 

em  terra :  T>efcendit  de  Ca- 
líSy  é-  incarnatus  eft.    De 
maneira  ,  que  no  mefmo 
texto  cio  Thema  temos 
dousdias,  &  dous  myfte- 
rios.  O  dia,  &o  myíVçpo 
do  Sacramento:  Hic  elipa- 
nis :  ac  o  dia ,  6c  o  myfterio 
da  Encarnação :  (^lá  de  Ca- 
lo defcendip :  odia,  &  o  my- 
llerio  do  Sacramento  con- 
forme a  celebridade,  &  o 
dia,&:myfterío  da  Encar- 
nação conforme  o  lugar. 
Havendo  pois  de  fer  o  Ser- 
mão Q  como  he  bem  que 
íeja^naô  do  corpo  de  Deos 
vagamente, fenaó  do  cor- 
po de  Deos  na  Encarna- 
ção :  &  havendo  de  tomar 
as  medidas  ao  difcurfo  pe* 
lo  mefmo  corpo  de  Chri- 
ílo,  naó  fó  em  quanto  cor- 
po de  Deosfacramentado, 
fenaó  também  em  quanto 
corpo  de  Deos  encarnado> 
digOjqueo  dia  da   Encar- 
nação ,  &  o  dia  do  Sacra- 
mento, ambos  faó  dias  do 
corpo  de  Deos  ;  mas  com 
grande  differença.    O  dia 
da  Encarnação  he  dia  do 
corpo  de  Deos,  porque  no 
dia  da  Encarnação  decco 


do  SantíJJtmo 
Deos  a  tomar  condiçoens 
de  corpo:  &o  dia  do  Sa- 
cramento também  he  dia 
do  corpo  de  Deos ,  porque 
no  dia  do  Sacramento  fu- 
bio  o  mefmo  corpo  a  to- 
mar attributos  de  Deos. 
Iftoheo  que  determino 
pregar  hojejmas  ainda  nao 
acertei  ao  dizer  com  os 
termos  grandes,  que  pede 
a  magefiade  da  matéria* 
Para  que  eu  a  faiba ,  &  me 
faiba  declarar  melhor,  re- 
corramos à  fonte  da  Gra- 
ça,qu€eítàpref€nte.  Av8^ 
Maria. 

§■  II. 

Hicejlpanis^  quíde  Cah 

...  i:'.  dffcendit. 

213  /^Apoftolo  S. 
\_/Pauio  fallan- 
dodafegiinda  parte  deíle 
Texto,  iílo  hc,  de  quando 
o  Verbo  divino  decco  do 
Ceo  a  veílirlè  de  noífa 
carne  ,  diz  eílas  notáveis 
palavras  :  Cum  in forma 
^cieffet^non  rapmayn  ^r- p},iHp. 
ifítratns  ejl  ejjefe  aqualem  -■^•7. 
%)eoyfedfimetipfHm  exhia-^ 
Tjrjit 


Sacramento.  2^}* 

nivít forma  fervi  accipiensy    vindadeimmortal,  &  im- 


mfmilítudinem  hommuyn 
faBiiSy  &  habitu  inventus 
ut  homo.  Quer  dizer  :  Sen- 
do o  Eterno  Verbo  igual 
ao  Padre  em  tudo,  &  nam 
podendo  deixar  de  o  íer, 
fazendofe  porém  homem, 
&  femelhante  em  tudo  aos 
outros  homenSj  de  tal  ma^ 
neira  encolheo  ,  &  fumio 
ern  fy  mefmo  os  attributos 
de  fua  divindade ,  &  gran- 
deza, que  naó  fe  viaójnem 
apareciaò  nelle  depois  de 
encarnado  mais  que  os 
vazios  da  mefma  divinda- 
de. Efta  he  a  própria  ,  6c 
rigorofa  íigiiiíicaçaõ  da- 
quelie  exinanivtt  femetip- 
jarm :  &  aílim  foi.  Era  o 
Verbo  pela  divindade  Ef- 
pirito,  &pela  Encarnação 
teve  corpo:  era  pela  divin- 
dade immenro5&  pela  En- 
carnação ficou  limitado: 
era  pela  divindade  infini- 
to ,  &  pela  Encarnação  fi- 
cou finito :  era  pela  divin- 
dade eterno,  Scpela  Encar- 
nação ficou  temporal :  era 


paífivel,  &  pela  Encarna- 
ção jà  padecia  5  ôc  eflava 
fogeitoà  morte.  Não  faó 
grandes  vazios  da  divin- 
dade eftes  ?  Taò  grandes , 
&  taó  profundos,  que  fó  a 
comprehenfaô  de  Paulo 
os  pode  de  aigúa  maneira 
fondar :  Exinanivitfemet" 
ipfum.  Mas  aguarde  trinta 
&  três  annos  a  mefma  à^^ 
vindade  encarnada,  &fai-- 
rà  com  igual, ou  maior  mi- 
lagre ao  mundo  o  Sacra^ 
mento  do  Altar :  Para  que? 
Para  que  os  vazios  da  di- 
vindade na  Encarnação  fe 
tornaífem  a  encher  no  Sa- 
cramento. Agora  acertei 
a  me  declarar.  Aífim  co- 
mo pela  Encarnação  a  di- 
vindade de  Chriílo  fedef- 
pio  dos  attributos  de 
Deos ,  &  fe  veílio  das  pro- 
priedades de  corpo  :  aííiin- 
o  mefmo  corpo  de  Cbri-j 
ílo  pelo  Sacramento  íè 
defpio  das  propriedades 
de  corpo,  ôcfe  veílio  dos 
attributos  de  Deos.  E  efte 


pela  divindade  invifivel,  foi  o  modo  mais  que  ad- 
Ôcpela  Encarnação  viaó-  miravel  có  que  os  vazios 
no  os  olhos  :  era  peladi-    dadiviadadena  Encarna- 

§á05 


i34*  SermaÕdõ 

çaó,  fe  eiichéra5,&  reílau- 
ráraõ  pelo  Sacramento. 
Ora  vede. 

2 144    Pela  Encarnação, 
(^como  dizíamos]   Deos 
que  era  efpiritual  ,  ficou 
corpóreo  com  partes  di- 
ftintas,  ôc  extenfasjpelo 
Sacramento,  Chriílo  que 
era,&  he  corpóreo  ,  ficou 
efpiritual,  todo  em  todo, 
&  todo  em  qualquer  par- 
te,como  efpirito.Pela  En- 
carnação 5  Deos  que  era 
immenfo,  ficou  limitado  a 
hum  fi5  lugar i  pelo  Sacra- 
mento, Chrifto  que  era  M- 
mitado,  ficou  irameníbj& 
eílà  em  todos  os  lugares  do 
mundo.  Pela  Encarnação, 
Deos  que  era  eterno, ficou 
temporal,  Scafiimnafceo, 
viveoj&morreo  em  tem- 
po; pelo  Sacramêto,  Chri- 
ílo que  era  temporal  ,  fe 
tornou  a    eternizar  íem 
termo,  nem  limite  na  du- 
ração. Pela  Encarnação, 
Deos  que  era  infinito,  fi- 
cou finito,  como  o  faó  am- 
bas as  partes  da    humani- 
dade i   pelo  Sacramento, 
Chriílo  que  era  finito,naò 
tem  fim ,  porque  eílà  infi- 


Santijjimo 

nitamente    multiplicado. 
Pela  Encarnação  ,  Deos 
queerainvifivel,  ficou  vi- 
fivelj&afiimoviaõ  os  ho- 
mens j  pelo  Sacramentoy 
Chriílo  que  era  vifivel,  fi- 
cou invifivei,  porque  nem^ 
ovemos,  nem  o  podemos 
ver.  Pela  Encarnação   fi- 
nalmente,Deos  qeraim- 
mortaI,&  impaflIvei,fÍGou 
mortal,  &  paífivel ,  (Scpa- 
à^cto^^  morreo  pelos  ho- 
mens >  pelo  Sacramento, 
Chriílo  que  era  mortal,  6c 
palllvel,  ficou  impaíllvel, 
&immortaI  ,   porque  no 
eílado,&  vida  de  f-icramé. 
tado,he  incapaz  de'  pade- 
Ger,nem  morrer.  Equehó 
cada  difierença  deílas  ,  & 
muito  mais  todas  juntas, 
fenaó  eílarem  hoje  cheos 
no  corpo  de  Chriílo  pelo 
Sacramento  os  vazios,com 
que  no  mefmo  corpo  íè 
ocultou  a  divindade  pela 
Encarnação :  &  fer  o  cor- 
po de  Chriílo  facramenta- 
do  por  todos  os  attributos 
divinos  corpo  de  Deos.^ 

215-  No  Capitulo  quin- 
to do  Apocalypíe  vio  S. 
Joaó  bua  couíà notável,  & 


ou- 


Sacramento. 


Apocal 


fcid.j 


oiivio  outra  mais  notável. 
Oqueviojfoi  hum  trono 
de  grande  mageílade  cer- 
cado de  toda  a  Gorte  do 
Ceoj&fobreelie  hu  Cor- 
deiro em  pè  ,  mas  como 
morto  :  Agmirn  Jiantem 
tanquam  occifum,  O  que 
ouvio  5  foraó  as  vozes  de 


í^f 


priedade5  porque  naó  di- 
zem, que  o  Cordeiro  efta- 
va  morto  como  vivo  ,  fe- 
naò  vivo  como  morto: 
Stantem  tanqudm  occifum, 
Ifto  he  o  que  cremos  pro- 
pria5&  diftintament^,  &  o 
que  nos  eníina  a  Fè  no  my^ 
ííerio  do  Sacramento.  A 


todos  aquelles  Cortefaós,     palavra  tanquam  íignifica 
&  de   muitos   Coros  de    reprefentaçaó^&naó  rea- 


Anjos,  que  cantando  ,  & 
acclamãdo,  diziaô:  Digno 
he  o  Cordeiro  ,  que  foi 
morto ,  de  receber  a  virtu- 
de, &  a  divindade:  T>ignu5 
eft  agnusy  qui  occifus  eft^  ac- 
cifere  virtutemy  &  divini- 
tatem.  Eíle  Cordeiro  nao 
jazendo  como  morto ,  fe- 
nãoempè  como  vivo,  he 
o  Cordeiro  de  Deos ,  que 
tira  os  peccados  do  mun- 
do, Chrifto  Redemptor 
noílb :  mas  he  ChrifÍ:o,&:  a 
mefmo  Chrifto  naó  em 
outro  eftado ,  ou  de  qual- 
quer outro  modo,  fenam 
em  quanto  facramentado. 
Aílim  o  entendem  com- 
mummente  os  interpretes 
defte  lugar :  &  as  mefmas 
palavras  do  Texto  o  de- 


iidade:&o  mefmo  Chri- 
fto facramentado ,  que  na 
realidade  eílà  no  Sacra- 
mento taó  vivo  como  no 
Ceo,  no  mefmo  Sacramê- 
to  por  reprefentaçaõ  eftà 
taó  morto  como  na  Cru^, 
Por  iílb  as  palavras  da  çó^ 
fagraçaó,  na  Hoftia  põem 
o  corpo  como  dividido  do 
fangue ,  &no  Caliz  o  fan- 
gue  como  dividido  do  cor- 
po, tudo  em  íignifícaçam 
da  morte,  na  qual  f  &  de 
nenhum  modo  fem  ella  j 
fe  aperfeiçoa,6c  confuma  o 
facrifício.  Epor  iííb  tam- 
bém emfôrma,&  com  no- 
me de  Cordeiro  5  porque 
defde  o  Cordeiro  de  Abel 
na  Ley  da  Natureza  ,  fe 
facriôcava  tambê  iia  Lev 


elaraó  com  grande  pro-     Efcrita  em  figura  de  Cor- 
deiro 


o'r'. 


I 


^m 


m 


V. 


yp\ 


2^6  Sermão  do 

deiro  o  mefmo  Chrifto. 
Aílimoeníinou  S.  André 
ao  Proconful  Egeas ,  dizé- 
do :  Ego  omnipotenti  Deo  , 
qiã  nnus^&vaiis  ejt-^immo- 
lo  quotidíe  immaculatn  ag- 
niimy  cujus  carnem  fofiqua 
omnis  foptilus  crekenttum 
manducavertt ,  infeger  per- 
feveratyò  vivus. 

2 16  Suppoftopois,qiie 
o  Cordeiro  vivo ,  &  como 
morto,  queS  Joaó  vio,  era 
Chrifto,  6cChriíto  facra- 
mentado  •,  entrem  agora  as 
fegundas,&mais  admirá- 
veis palavras  do  Texto, 
comqueosapplaufos  ,  8c 
acclamaçoens  de  toda  a 
Corte  celeftial  cantavaó, 
&  diziaó  ao  mefmo  Cor- 
deiro, que  elle  era  digno 
de  receber  a  virtude  ,  & 
divindade :  T>ignus  eft  ag- 
nusy  qtii  occtfiis  efiy  accipere 
*virtutem ,  &  diiúnitatem. 
O  mefmo  S.  Joaó  nota, 
que  efte  cântico  era  novo : 
Cantabant  canticum  novú : 
&  parece  que  naó  era  no- 
vo, fenaó  antigo,  &  que  jà 
tinha  de  antigu idade, quã- 
domenos,triiita  &:  quatro 
ajinos,  que  tantos  fe  pode 


Santtjjimo 
contardefdeodia  da  En- 
carnação do  Verbo  ate  o 
dia  da  inítituiçaô  do  Sa- 
cramento. Quando  fe  fez 
o  Filho  deDeos  homem, 
&  quando  fe  unio  à  huma- 
nidade de  Chriíto  a  di- 
vindade ?  Naó  ha  duvida  ^ 
que  no  dia  da  Encarnaçaói 
Pois  feo  receber  Chrifto 
em  quanto  homem  a  di- 
vindade, pertence  ao  mef- 
mo Chriíto  em  quanto  en- 
carnado :  que  novidade  hc 
agora  adeíle  cântico,  em 
que  toda  a  Corte  do  Ceò 
lhe  dà  o  parabém  de  rece- 
ber a  divindade  ,  naó  na 
Encarnação  em  quanto 
Deos  encarnado,  fenaó  no 
Sacramento,&cm  quanto 
Cordeiro  facramentado ; 
T^igniis  eft  agnus  accipere 
divinitatem  ?  A  palavra 
dígniis  ainda  aperta  ,  & 
acrecenta  mais  a  duvida  j 
porque  dignus  fignifica 
merecimento,  &  a  uniaó 
hypoílatica,  em  que  a  na- 
tureza  divina  fc  unio  com 
a  humana,  nem  a  mereceo, 
nem  a  podia  merecer  a 
humanidade  de  Chriíto: 
pois  fe  foi  divindade  ,  & 
di- 


Sacramento'. 


divindade  merecida  ,  co- 
mo fe  diz  que  Chriílo  he 
digno  de  a  receber ,  &  que 
a  recebeo  como  facramen- 
tado ?  A  razaó  alciílima,  & 
nova,  como  lhe  chama  S. 
Joaó,  he  a  que  eu  tenho 
dito  ,  &  vou  provando. 
Porque  duas  vezes,  6c  por 
doas  modos  diíFerentes  re- 
cebeo Chrifto  a  divinda- 
de .a  primeira  na  Encar- 
nação, em  que  Deos  ,  do 
modo  queerapoílivel  jfe 
defpio  dos  attributos  de 


n7 


aíllm  como  a  divindade  na 
Encarnação  foi  a  que  pro- 
priamente recebeo  o  cor- 
po, aílim  o  corpo  propria- 
mente foi  o  que  recebeo  a 
divindade:  Í>ignus efi ag-* 
nus  accipere  divmitatem. 

217  Pregando  o  mef- 
mo  Chrifto  aos  que  tinha 
fuHentadocom  o  milagre 
dos  cinco  pães ,  alli  come- 
çou a  revelar  o  myfterio 
do  Sacramento  ,  exortan- 
do-os  a  que  comeíTem  de 
outro  melhor  paó,  queelle 


Deo«,  veíbndofe  do  corpo  lhes  daria,  o  qual  era  pao 

humano :  a fegunda  no  Sa-  de  vida,naó  temporal,  mas 

cramento,  em   que  Chri-  eterna  :  Operamini  nm  ci^ 

fto,  do  modo  ta  m be m  que  buniy  qui perit ,  fed  qui  per-^ 

podia  fer,  enchendo  em  manet  in  vitam  internam  ^  y 

iy  os  vazios  da  divindade,  quemFiUus  hominis  dahit^' 

reveílio  o  mefoio  corpo  vobis.  E  para  que  nãó  du- 


das  propriedades  de  Deos. 
Ondefe  deve  muito  notar 
a  propriedade  das  palavras 
accipere  divimtatem  -,  por- 
que no  myfterio  da  Encar- 
nação naò  foi  o  corpo 
mais  propriamente  o  que 
recebeo  a  divindade,  fe- 
naó  a  divindade  a  que  re- 
cebeo o  corpo :  Ver  hum  ca- 
rofaãiim  tft  :  porém  no 
myfterio  do  Sacramento : 


vidaíTem  da  virtude  defte 
maravilhofo  paójacrecen* 
tou,  que  Deos  tinha  im- 
preíTo  nelle  o  feu  íigillo,ou 
íiaete  .*  Hunc  enim  "Tatev 
JignavttT>eus.  A  palavra 
Jígnavit  vai  o  mefmo  que 
ftgíUavit:  &  aílim  fe  lè  tio 
Texto  Original  Saibamos 
agora:  &  qual  foi  a  figura, 
ou  imagem  que  eftava 
aberta  aefte  íiaete.^  Todos 
03 


ibid. 


w 
llfc 


23S  Sermão 

os  Santos  Padres  concor- 
daõ,  em  que  era  a  fígura^Sc 
imagem  da  divindade:  & 
eíla  força  cem  o  nome  de 
Deos  acreccntado  ao  de 
Padre:  Hunc  ^Pater/igna- 
vitT>eus:  modo  de  failar 
em  Ciiriílo  íingular  neíla 
occaíiáo.  Mas  íe  Chriíto 
falia  de  fy  em  quanto  ho- 
mem, 8c  em  quanto  íacra- 
mentado:  em  quanto  hxO- 
incm^  quem  tilius  homints 
dabitvobis  ',^  em  quanto 
facramentado  5  cibum  qui 
permanei  in  tita  aternam ; 
porque  prova  os  poderes 
defta  virtude  com  o  linete 
da  divindade  ,  que  Deos 
imprimio  nelle  ?  Náo  fe 
podéra  melhor  confirmar 
oaltiííimo  penfaméto  em 
queeílamos.  AquellaHo- 
ííia,  em  que  a  noflli  Fè  crè, 
&  adora  o  corpo  de  Chri- 
jfto,  lie  húa  obrèa  confa- 
grada,em  que  Deos  impri- 
mio o  feu  fine  te:  &  como 
nefl-e  finete  eftava  aberta  a 
imagem  ,  6c  fisgura  da  di- 
vindade com  todos  fcus  at- 
tributos,  também  na  mef- 
ma  Hollia  ficou  impreífa 
afemelhançade  todos  el- 


do  Santifflmo 
les,  &  por  iílb  fe  achão  to- 
dos no  Sacramento.  Ain- 
da falta  a  maior  proprie- 
dade,  6c  energia  da  metá- 
fora do  linete  de  que  ufou 
o  Senhor,para  que  melhor 
entendejíemos  todoomy- 
fterio.  O  que  no  finete  ef- 
tá cavado,  èc  vazio,  he  o 
que  na  matéria  em  que  fc 
imprime  fica  relevado,  ^ 
cheo:6c  aílim  ficarão  cheos 
no  Sacramento  os  vazios 
da  Encarnação  :  Exmaní- 
ittf.mctipltim :  kujic  ^Fater 
JigiJiaiií^eus.  Na  Encar- 
nação todos  os  attributos 
divinos  vazios,  Sc  no  Sa- 
cramento cheos  :  na  En^ 
carnação  todos  fumidos, 
6c  no  Sacramento  todos 
relevados. 

§•     III. 

218  D  Or  efte  modo 
i  ficou  o  corpo 
de  Chrifto  110  Sacramento 
reveftido  dos  attributos 
divinos,  6c  com  maior  pro- 
priedade corpo  de  Deos". 
Corpo  de  Deos  ,  porque 
efpiritual :  corpo  de  Deos, 
porque  immcnfo  :  corpo 
de 


i::i 


^ 


Sacramento) 


de  Deos  ,  porque  eterno : 
corpo  de  Deos,porque  in- 
finito :  corpo  de  Deos^por- 
que  invilivel  :  corpo  de 
Deos  )  porque im mortal: 
corpo  de  Deosjporqueim- 
pallivel.  E  iílo  lie  o  que 
agora  parte  por  parte  ,  8c 
attributo  por  attributo  ha 
de  ir  moftrando  o  noílb 


219 


buto  com  queChrifto  o 
reílauroujôc  encheo  no  Sa- 
cramento: no  qual  eílà  feu 
corpo  facramentado  fem 
ocupar  lugarjôc  com  todas 
as  condiçoens  de  efpirito, 
Aílim o eníina a Fè,  Sepa- 
ra o  prosar  com  a  Efcritu- 
ra,  he  neceílàrio  que  nos 
engolfeinosem  hum  pego 


difcurfo.  Mas  porque  to-    fem  fundo,  qual  heo  Ca 
das  eílas  maravilhas  de  feu     pitulo  fexto  de  S  Joáo,  em 


corpo  àiVu)\z2.ào  forao 
ordenadas  por  Chriílo pa- 
ra noífo  remédio,  &  pro- 
veito ;  de  tal  maneira  as 
irei  provando  no  Sacra- 
mento ,  que  juntamente 
mollrarei  como  o  mefmo 
Sacramento  nolas  comu- 
nica todas  a  nos.  Elle  fe 
digne  de  me  ajudar,  &  afll- 
ftir  com  nova  graça  em 
matéria  taó  alta,  &  tão  dif- 
ficultofa. 

219  A  primeira  pro- 
priedade táo  natural  da 
divindade,  como  alheado 
corpo,  que  he  fer  Deosef- 
pirito  i  aííim  como  foi  o 
primeiro  vazio  com  que  o 
mefmo  Deos  fe  exiiianio 
na  Encarnação  ,  aílim   he 


que  ja  começamos  a  en- 
trar. Por  occaíião  do  mi- 
lagre referido  dos  cinco 
páes,  que  he  o  principio 
deíle  Capitulo,  falia  Chri- 
fto  na  maior  parte  de  todo 
elle,  do  paó  que  deceo  do 
Ceo  o  Santiílimo  Sacra- 
mento do  Altar.  Hua  vez 
diz  :  Nift  manducavevítíS 
carnem  Filif  hominis  ,  ^  *^  'f-t- 
biberitts  ejusfangiimem^non 
habebitis  vitam  in  vobisi 
Senáo  comerdes  a  minha 
carne,&  beberdes  o  meu 
fangue  ,  não  tereis  vida: 
outra  vez  mais  brevemen- 
te :  §ut  manducat  me  ,  ipfe  ibid.fg^ 
vivetpropter  me:Qntm  m  e 


[oariíiu: 


comera  mim  ,  vivirà 


por 


mim.  Ealêdeílesdouslu- 


tambem  o  primeiro  attri-     gares  do  mefmo  Capitulo^ 

jielié 


240  ^Sermão  do 

nelle  promete  outras  mui- 
tas vezes, &-  por  muitos 
modos  a  todos  os  que  o 
comerem  a   mcfma  vida. 
Mas  não  fe  pode  encare 
cer  o  grande abalo,pertur- 
bação  5  &  efcandalo  ,  que 
eíta  doutrina  caufou ,  não 
fó  nos  ouvintes  de  fóra,fe- 
náonos  mefmos  Difcipu- 
losda  Efcola  de  Chnílo, 
muitos  das  quaes  fó  por 
eíle  ponto  fe  fairáo  delia. 
Quãdoouviáo  ao  Senhor, 
que  lhe  haviáo  de  comer  a 
carne,  &  beber  o  Tangue, 
parecialhe  coufa  horren- 
da ,  &  barbara  :  quando 
ouvião  por  outra  fraíijque 
o  haviáo  de  comer  a  elle, 
o  que  não  fignifi cava  par- 
te do  mefmo    corpo  de 
Chrifto,fenãotodo  intei- 
ro, parecialhe  impoílivel, 
que  hum  homem  ouveíTe 
de  meter  dentro  em  fy  a 
outro :  8c  quando  em  hum, 
&  outro  cafo  ouvião,  que 
aquella carne,  &  aquelle 
corpo  Vue  havia  de  dar  vi- 
da, parecialhe  que  eíle  ef- 
feito  era  contra  toda  a  ra- 
zão natural ,  porque  o  que 
dá  vida  ao  homcm,náo  he 


SãntlJJlmo 

a  carne,  nem  o  corpo ,  fe- 
não  o  efpiríto;  como  Te  vio 
no  efpirito,  que  Deos  in- 
fundio  no  barro  de  Adam, 
&  na  vida,  que  a  Almada 
aos noíTos corpos,  a  qual 
em  faltando,  não  vivem. 
Atéqui  a  murmuração,  a 
duvida,  &  o  efcandalo  dos 
ouvintes;  vamos  agora  à 
repoíia  do  divino  Meftre. 
220  O  que  C?hriíio  ref- 
pondco,foráo  eílas  pala- 
vras :  Hoc  z  osfcandalizat  ? 
Sicrgovideritis  filinm  Lo-^^lff^^ 
mhiis  ãfccndmtem  ubi  erat 
prhis^  Spriiíis  tft  (jui  'vivi* 
fcaty  caro  non  procícfl  qnid" 
quam.  ]f!ovos  cícr.iK.di- 
za  .^  Que  feria  fe  m  e  v;  {{ç.\s 
fubirao  Ceo,donc'edecir* 
E  quanto  às  duvidas  do 
que  nic  ouviíles,  o  que  vos 
digo  he,  que  o  eipirito  he 
o  queda  a  vida,  que  a  car- 
ne ncnhúa  coufa  aprovei- 
ta. PoisfeChrifto  fallava 
de  fua  carne,  &  da  mefma 
carne  dizia,  que  havia  de 
darvida  aosquea  comef- 
fem  jcomo  agora  diz,  que 
a  ca  rne  ncnh ú a  cou fa  ap ro- 
vcita  ,  6:  que  o  efpirito  he 
o  que  dá  a  vida  ,^  He  tão 
diífi- 


Sacramento.  2_{.r 

difficultofa  eíla  fentença ,     mo  modo  podia  ter  impe 


Amo- 
niiis  ci- 
tac.  à 
Maldo- 
nato. 


q  deixados  os  delirios  dos 
HeregesjOsSátos  Padres, 
&  Doutores  Catholicosfe 
divide  na  expoíiçáo  delia 
emfete  opiniões.  A  ultima. 


dimento  para  todo  ,.&  in- 
teiro entrar  em  outro  cor- 
po, que  era  a  fegunda:ncm 
era  contra  a  razão  natural, 
íenáo  muito  conforme  a 


&  íingular  de  Amonio,Pa-     ella ,  que  fendo  efpirito  vi- 
dre Grego ,  he  a  meu  ver  a     viíicaííe ,  &  dèílè  vidajque 


que  melhor  penetrou  o 
íenddodeChrifto,6c  re- 
íblve  todas  as  duvidas  dos 
incrédulos  com  a  verdade 
do  mefmo  Sacramento.  O 
corpo  de  Chriílo  no  Sa- 
cramento não  eílà  com  as 
condiçoens  naturaes  de 
corpo,  fenáo  com  as  fo- 
brenaturaes,  &  milagrofas 
de  efpirito :  &  por  mo  ne- 
íle  lugar  chamou  o  Senhor 
efpirito  a  fua  própria  car- 
ne :  Spiritumhic  vocat^le^ 
nam  vi-vificifpiritus  virtu- 
te  carneMy  manet  enim  caro\ 
íaó/ as  palavras  de  Amó- 
nio. E  como  a  carne  de 
Chrifto  no  Sacramento 
não  deixando  de  fer  carne, 
he  carne  com  todas  as  con- 
diçoens de  efpirito  i  nem  a 
carne  comida  defte  mo- 
do podia  caufar  horror, 
que  era  a  primeira  duvi- 
da :  nem  o  corpo  do  mcf- 
Toiíi./, 


era  a  terceira.  E  deíla  for- 
te desfeitas  todas  as  diííi- 
culdades,  fefica  verifican- 
do com  fumma  proprieda- 
de, &  com  adequada  repo- 
llaatodasas  objecçoens,a 
fentença  de  Chriílo:  Spri- 
tus  eft  qui  vivificai  ,  caro 
nonprodeft  quidquam.  Por- 
que a  carne  não  obra  alli 
como  carne  o  que  fò  como 
carne  não  podia,  mas  obra 
como  efpirito ,  &  como 
carne  espiritualizada  o  q 
he  próprio  do  efpirito.  E 
daqui  fica  declarada  agrã- 
de,&:  exada  correfpondé- 
cia,  com  que  eíle  primeiro 
vazio  da  Encarnação  fe  re- 
ftaurou  com  o  primeiro 
cheo  do.  Sacramento.  Por- 
que na  Encarnação  a  di- 
vindade do  Verbo  fe  ve* 
ftio  da  corporeidade  da 
carne5& no  Sacramento  a 
carne  de  Chriílo  fe  veílio 

CL        ^-^^ 


i 


^'í:ii 


Jeann. 


2  ^2  Sermão  do 

da  incorporeidade  do  ef- 
pirico.  A  fraíi  particular 
dequeufaó  os  Santos  no 
myfterio  da  Encarnação, 
lie  chamar  a  Deos  incor- 
porado 5  &  da  merma  ufa  a 
igreja  cantando  na  feíla 
da  Epiphania  :  T)uecmfa' 
lutts  calittis  incorjjoratum 
gignere.  Pois  aílitn  como 
na  Encarnação  fe  contra- 
hioovacuo  da  divindade 
peloincorporàdo,aí!ím  no 
Sacramento  reftaurou  5  & 
encheoocorpo  de  Chri- 
ílo  o  meímo  vácuo  peio 
incorpóreo. 

221  Sobre  as  palavras 
Verbumcarofaãum  eft^  & 
hahitavit  in  nobis^  repara  o 
Cardeal  Cayetano  em  di- 
zer o  Evangejiíla  ,  que 
unindoíe  o  Verbo  anoífa 
carne  ,  habitou  em  nós. 
Parece  que  mais  propria- 
mente havia  de  dizer,  que 
habitou  com  nofcojou  en- 
tre nós,  como  verdadeira- 
mente habitou  Chrifto 
com  os  homens :  pois  por- 
que não  diz,  que  habitou 
entrenós,  ou  com  nofco, 
fciião  em  nós  ?  Agudamê- 
te  perguntado  3  mas   com 


Santijjhno 

muito  maior  agudeza  ref- 
pondido :  T)ixithoc^  ne  er- 
rares  ,  exijiimando  quod 
Ver  bum  ex  hoc  qtiodfaãum 
eft  caro-i  impedimentum  ejje 
ad  habitarídíím  fpirituali- 
terinanimis  noftris,  Deos 
em  quanto  Deos  habita,  & 
fempre  habitou  em  nós: 
hl  7pfo  enim  njtnjtmus  ,  mo-  ^^^J- 
vemur^&fíimus.'E  Tintes áQ  '''' ' 
Deos  fe  veílir  de  noíTa  car- 
ne, nenhúa  duvida  tinha, 
nem  podia  ter,  que  Deos, 
fendo  efpirito,  eftiveífe,ôc 
habitaíTe  dentro  em  nòs: 
porém  depois  que  Deos  fe 
veftio do noíTo  corpo, po- 
dia cuidar  alguém,  que  ef- 
fe  mefmo  corpo  podia  fer 
impedimétopara  quedei- 
xaííe  de  eftar  em  nós,  por 
quanto  dous  corpos  nam 
podem  eftar  juntos  no 
mefmo  lugar  :  para  tirar 
pois  eíle  erro,diíie  nomea- 
damente o  Evangeliíía, 
que  o  Verbo  depois  de  fe 
fazer  carne  ,  não  fô  habi- 
tou com  nofco,  fenão  em 
nós  :  Carofaãum  eft^  &  ha- 
bitavit  in  no  bis.  Atcqui 
Cayetano:  o  qual  porém 
declara ,  que  iíío  fc  lia  de 
cn- 


li^BMI 


lintendcr  na  o 
mente  do  feu  corpo  nos 
noílbs  corpos,  fenaó  efpí- 
ricual mente  da  fua  Almz 
nas  noíTas  Almas :  &  aííim 
foinomyílerio  da  Encar- 
nação precifa mente.  Mas 
depois  que  fobre  o  myfte- 
rio  da  Encarnação  o  mef- 
moVerbo  encarnado  acre- 
centouo  do  Sacramento, 
naó  fó  habita  Chriílo  em 
nòs  efpiritualmen te  quan- 
to à  Alma  5  fenaó  corpo- 
ralmente quanto  ao  cor- 
po j  porque  eftando  o  nief- 
mo  corpo  efpiritualizado 
no  Sacramento  5  como  ef- 
pirito  pòdeeftarjuntamê- 
teofeu  corpo  dentro  do 
noíTojfem  o  impedimento 
de  hum  corpo  excluir  o 
outro.  E  eíla  lie  húa  nova, 
&altiilima  razaó  porque 
nasmefmas  palavras  nam 


Sacramento.  24^ 

corporal-  mentada  havia  Chriílo  dé  . 
habitarnaófôcom  nofcO) 
fenaó  propriamente  em 
nos:  Et habitavit  innobis. 
222  Deíla  maneira  en- 
cheo  Chrifto  no  Sacramé- 
to  o  primeiro  vazio  da  di- 
vindade  na  Encarnação  9 
efpiritualizando  o  feu  cor- 
po, &:fazendo-o  efpirito, 
afíim  comoDeos,q  he  efpi- 
rito, fe  tinha  feito  corpo. 
Mas  efta  admirável  trans- 
formação, naó  fó  a  obrou 
Chrifto  em  feu  corpo  fa- 
cramentado  ,  fenaó  que 
também,  como  prometi, 
pormeyo  do  mefmo  cor- 
po facramentado  no  la  co- 
munica a  nòs.  Abre  bem  a 
boca,  que  eu  ta  encherei: 
diífe  Deos  a  David :  Dila-  pr.ií 
ta  os  tuum^&  implebo  illud.  '^^'^ 
Eftas  palavras  fe  entêdem 
do  diviniílimo  Sacramen- 


diffe  o  EvangeUíla  ,  que  o     to,  do  qual  fe  diz  no  mef. 


Verbo  fe  fizera  homem  , 
fenaó  que  fe  fizera  carne: 
Ver  bum  caro  fa^um  eji: 
porque  fendo  a  carne  á 
propria,&immediata  ma- 
téria do  Sacramento :  Caro 
mea  vere  eft  cibus  i  por  me- 
yo  da  meíma  carne  facra- 


mo  Pfalmo :  Cibavit  eos  ex 
adipefrumenti.  E  diz  Deos^ 
queelle  he  o  que  lhe  en- 
chera a  boca :  Et  ego  imple-  ibid 
bo  illud  :  porque  fô  Deos 
pôde  encher  a  capacidade 
da  noíla  Alma,  &  naó  com 
outra  coufà,  fenaó  comíi* 


i 


244  Sermão  do 

go  mefmo  ,  como  faz  no 
%       Sacramento.  Etegoimple- 
Hugo    bo  tllud^  me  ipfo ,    comenta 
^^''      Hugo  Cardeal.  Abrio  pois 
a  boca  David,  como  Deos 
o  tinha  convidado :  &  que 
Ihefucedeo  ?  Os  meúape- 
1  i?.T]]  ruh&attraxi[piritú\  Abri 
a  boca5&  o  que  recebi  nel- 
la5&  por  ella,  &:  o  com  que 
Deos  ma  encheo,  tudo  foi 
efpirito.  Poisfea  promef- 
fa  de  Deos  tinha  íido ,  que 
•  lha  encheria  com  feu  cor- 
po facramentado:  Aperte- 
mos  maiseíla  fuppollçaó 
có  a  authoridade  do  Dou- 
tor Máximo  S.Jeronymo 
no  mefmo  lugar:  Vis  come- 
dére  ipfum  T>eum  ttmm ,  ò* 
^ym°in  Salvãtorem^  Judiquid  dl- 
hua ;     cat '.  IDiUita  os  tnum^&  im~ 
^'^""''  plebo  ilhid.T>ilatate oraaje- 
ftra^  ipfe eft  &  T>ommusj& 
panis :  ipfe  horíatur  nos  ut 
comedamus-iò'  ipfe  nofier  eft 
ciíms.  Pois  fe  a  promeíTa, 
digo,  de  Deos  feita  a  Da- 
vid era ,  que  lhe  havia   de 
encher  a  boca  cóíigo  mef- 
mo, &  com  feu  corpo  fa- 
cramentado j  como  abrin- 
do a  boca  o  mefmo  David, 
p  que  rcccbeppÁaò  foi  cor- 


Santiffimo 

po,  fenaó  efpirito :  Os  meii 
aperiii-i&  attraxifpifitum  ? 
Porque  o  corpo  de  Chri- 
íloaflim  comoeílà  no  Sa- 
cramento transformado 
emfy  ,  aílim  eftà  também 
transformado  para  nòs  : 
em  fy  transformado  em 
efpirito  j  para  caber  fem 
extençaó  debaixo  das  ef- 
pecies,  queo  cobrem  :  & 
para  nòs  transformado  em 
efpirito,  para  caber  fem  a 
mefma  extençaó  dêtro  dos 
corpos  dos  que  o  comun- 
gaô :  em  fy  transformado 
de  corpo  em  efpirito  ,  & 
em  nòs  transformandonos 
de  corporaes  em  efpiri- 
tuaes.  Expreífamente  S. 
Bernardo  ;  Transformattir 
manducans  in  naturam  cibi: 
corpus  enim  Chrifti  mandu- 
care  nihil  eft  al/iidy  quam 
corpus  Chrifti  eftici.  E  por- 
que feria  coufa  muito  dihi- 
tada  confirmar  a  verdade 
deíles  maravilhofos  efTci- 
tos  com  os  exemplos  del- 
Ici  baRc  por  prova  o  mef- 
mo S.  Bernardo  ,  que  naò 
fó  odiírc,masocxprimcn- 
tou  em  Çj  mcfmOjVivcndo 
em  corpo  por  virtude  do 
mef- 


^-ir^ 


Sacramenta:  Í4f 

mermo  corpo^eomo  fe naó     bido  em  Nazsreth  ,  que 


tivera  corpo ,  andando  ve- 
ftido  de  carne,  como  fe  fo- 
ra efpi  ri  to,  podendo  dizer 
GiUt..f.  ^^^  S.Paulo :  Spiritu  vivi- 
H       mus^ffiritu  &  ambulemus, 

ff.  IV, 

èíj  /^Segundo  va^ 
V-/zio  da  divin^ 
dadeheairnmeníidadedi^ 
vina,  a  qual  pelo  my  ílerio 
da  Encarnação  fe  limitou 
a  hum  fó  lugar,  qual  era  o 
que  occupava  a  fagrada 
bumanidade.  OuveHere- 
gcs,que  entendendo  efte 
myfterio  ás  aveííàs  ,  úyq-- 
Taó  para  fy,  que  pela  uniaó 
hypoílatica  a  humanida- 
de fe  fizera  immenfa,&ef- 
tava  como  Deos  cm  toda  a 
parce,&:  por  iííb  foraó  cha 


nafceo  em  Beíem,que  pré- 

f;òu  em  tal,  &  tal  lugar  de 
udéa,&GaIiIéa,  &  mor- 
reo  em  Jeruíàlcm.  Deíla 
immenfidade  porém  de 
que  Deos  fe  defpio  pela 
Encarnação  ,  fe  reveílio; 
outra  vez  pelo  Sacramen- 
to ,  no  qual  o  corpo  de 
Ghrifl:o,ou  reproduzido, 
ou  multiplicando  as  pre-i 
fenças,  fendo  hum  fó  ,&  o 
mefmo,  eftà  no  mefmo  té-^ 
po  em  todas  as  partes  do 
mundo. 

224*  No  mefmo  mun- 
do ,  &  na  mefma  hora  em 
que  Chrifto  inílituío  o  Sa- 
eramento,fe  eílava  vendo 

fará  confirmação  da  noíFa, 
'è  hum  milagre  natural 
defta  mefma   multiplica- 
ção das  fuás  prefenças.  A 
mados  Ubiquitarios,  Mas    hora  em  que  Ghriílo  iníii' 
~    foi  a  humanidade  a     tuíooSacramento,erajàa 


nao 

que  pela  uniaó  có  o  Verbo 
jfe  eílendeo  à  immeníidade 
divina,fenaó  a  immenfida- 
de divina  a  que  pela  com- 
municaçaódos  ediomasfe 
eílreitou  à  limitação  hu- 
mana, fendo  verdadeiro 
dizer,que  Deos  foi  conee- 
Tom.7. 


primeira,  ou  fegunda  da 
noite:  In  qua  no6fe  trade-  i.Cov. 
batur :  &  que  he  o  que  vem  ^  ^-^^^ 
entaó  os  noííbs  olhos  neíle 
Emisferio?  Vem  queau^ 
fentandofe  o  Sol  de  nos, 
por  húa  prefença  fua  de 
que  nos  priva,  fe  nos  deixa 
Qjij     .       mui- 


m 


:!^í 


multiplicado  em  tantas 
prefenças,  quanto  he  o  nu- 
mero fem  numero  das  Ef- 
trellas  j  porque  cada  híia 
delias  naòhe  outra  coufa, 
fenaó  hú  efpelho  do  mef- 
mo  Sol,  em  que  elle  fendo 
hum  ró,&:  au fente  ,  fe  nos 
torna  a  fazer  prerente,mul- 
tiplicado  tantas  vezes,  & 
em  tantos  lugares  ,  quan- 
tos faódefde  o  Oriente  a 
Poente,  &  defde  o  Seten- 
trião  ao  Meyo  dia  os  de 
todo  o  mundo  que  vemos, 
lílomefmoheoque  fez  o 
noífo  divino  Sol  Chrifto 
facramentando  feu  facra- 
tiílimo  corpo.  Aufentoufe 
de  nòsfegundo  a  prefença 
natural  -,  mas  por  eíla  pre- 
fença fe  deixou  com  nofco 
em  tantas  outras,  quantos 
faõ  os  lugaresj&r  altares  de 
todo  o  mCido,  cm  que  ver- 
dadeira, 8c  realmente,  fen- 
do hum  fò^Sc  o  niefmo,efl-à 
multiplicado  no  Sacramé- 
to.  Vede  a  propriedade  có 
que  affim  o  defcreveo  o 
Profeta  Malachias. 

2  2f  Qucixavafe  Deos 
de  os  íilhos  de  lírael  a  imi- 
tação de  Caim  facníica- 


Sermaodo  SanttJJimo 


rem  ,  &  oíterecerem  em 
feus  altares  naò  o  mel hor , 
&  mais  preciofo,comô  erã 
decente,  fenaó  o  peor,  & 
mais  vil,  &:  os  confunde  c6 
eftas  notáveis  palavras: 
Isíon  eft  mtht  uclnntas  in 
'vobis^  &  nttàius  non  fujci-  Mahch.. 
piam  de  manu  vejtra  -.abor-^^^'^^' 
tuenimfoUsnfque  ad  occa- 
fu?ii  magmim  ejt  nomen  meu 
ingentibus  :ò'tn  cmniloco 
facrifcatur^  &  cfferttir  no» 
mhà  mco  oblatto  munda. 
Defenganaivos  ,  que  naó 
quero  voíTos  facri feios, 
nem  aceitarei  voífas ofier- 
tas :  &  porque  naõ  cuideis, 
que  me  faraó  falta  j  fabei 
para  confuíaó  voíTa ,  &  da 
voíTà  J eru fale m  e m  qu e  fó 
tenho  Templo,  &fou  co- 
nhecido, que  virá  tcnipo 
em  que  defde  o  Oriente 
ate  o  Poente,  em  todos  os 
lugares  do  mundoj&-  entre 
todas  as  gentes ,  fe  ofere- 
cera ,  &  íàcrifícarà  a  meu 
nome  naó  muitos  facriii- 
^iosj&impuroò  como  os 
vo/íbs,  fenaó  hum  purifíi- 
mo5&  fintiilimo-F.  quefa- 
criíicio  hc  cílc  r  Poílo  que 
todos  os  Santos  PndresjSc: 
Du.u- 


^ 


\^ 


Saàammta.    .  24/ 

"Doutores dizem,  que heo    veilidur^s de  Cíirifto ,  af- 


Sanciílimo  Sacramento  da 
-EuchariO:ia,naó  temos  ne- 
ceíUdade  de  fua  authori- 
dade,  porque  aíHni  o  tem 
■definido  (&  he  de  féjo  fa- 
^grado  Concilio  Tridenti- 
;no.  Só  acrecento,que  a  pa- 
lavra Hebréa,  que  refpon- 
-de  a  oblatio  mundafigniã- 
-cahúa  offerca  particulaii, 
-cha  mada  Mincha  j  aqu M 
<íc  fazia  como  as  noífás  ho»- 
ilias,  da  ílor  da  farinha,  & 
no  Levitico  fe  chama  Sa^ 
criíicio.  Efte  facrifício 
pois  a  que  naó  falta  a  pro^ 
priedade  das  efpecies  de 


íini  as  quatro    partes  do 
mundo  (diz  S.  Cyrillo^re- 
partiraó  entre  fj  a  carne 
do  mefmo  Chriíto  íacra- 
mentado,da  qual  fe  tinha 
veíjido  o  Verbo :  ^^uor 
orbis  partes  ad  fahtem  ta-  ,^y^*ií-' 
du5Í£  mdumentum  l^erm-i  m  yoan. 
hoceftycarnem  ejus  impar-  '^P^^' 
tihiliterparUtifunt^  E  no- 
ta elegantemente  o  Santp 
Padre,  que  neíla  reparti- 
íçaõ^ou  partição,  naõ  oiive 
partir :  Impartibiliter  par' 
titifunt ypotquc  cõmuni-    ^ 
eandoieo  Senhor>&Jíar|ti- 
^icandoatodos^,'  &  afeada 


paô,  hc  o  facrifício  do  cor-     hum  por  meyo  de  fua  car- 
po de  Chrifto  facramenta-     ne  na  alma,&:  no  corpo,  & 


do,  o  qual  enchendo  o  va- 
zio da  immenfidade  divi- 
na encolhida,  &  efcondida 
na  Encarnação ,  fe  èfíiend^ 
immenfamente  defde  ô 
Oriente  ao  Occafo,por  to- 
das as  partes,  &  lugares  do 
inundo  í  ^à  ortuenmfoUs 


eítando  prefente  em  tod;is 
as  partes  do  m  undo  ,  naó 
eftà  nellas  como  parte^  íè- 
naó  todo,  fendo  hum  íò-i^ 
o  mefmo :  Infiríguios  enim 
partibílitef  tranjiens^&  ani- 
mam^ ér  corpm  eorum  per 
carne fuam  fafíõiificansim- 


itfque  ad^accafitm  inomni    partibiUter  atqueinmgt^íiii 
Ucofàcrificatur^Ò'  offèrtur     omiibuseft^ctm 'Unu^úbime 


namMmtõ  oblatio  munda^  ■ 
226     Aílim   como   os 
foldadosdo  Calvário  par- 
tirão enx  quatro  partes  as 


fit  nuUo  modo  divifm.  A  tè 
aqui  o  grande  Cyrillomao 
fe  poderid<5  mais  largamê^ 
t€  éílendoraiinmeníidadè 
que 


^4^    ^  SermaSdoSantifflmo 

que  Chrifto  tem  no  Sacra-     mêto,fenâó  aquelles  mef- 


mento,  que  na  brevidade 
daquellas  duas  palavras , 
unm jíhiqueyh]xm  em  toda 
aparte.  :^;.'n 

227  E  para  qàeíè  ve- 
ja como  o  mefmo  Senhor 
facramentado  comunica 
eílaimmeníidade  aos  ho- 
mens,ponhamonos  no  Ce- 
náculo de  Jerufalem.   O 


8  ^ 


6.2#. 


LUC.X2. 


■:li  'K 


■  r  I 


mos  doze  a  quem  havia  de 
encarregar  a  converfaó  de 
todo  o  mundo.  Sendo  cou- 
fa  mui  diâicultofa  de  en- 
tender, que  taó  poucos  ho- 
mens, &  de  vidas,  quenao 
foraó  largaSjpodeíTem  em 
taó  pouco  cempo  penetrar 
todas  as  terras,  &  pregara 

^  _     todas  as.  naçoens dom un- 

primeiro  ado em  q  Chri-  do,  fenaó  foífem  multipli- 
ito  começou  a  exercitar  cando  as  preíènças  como 
eftafua  immenfidade,  foi  Chrifto  no  Sacramento, 
quando  entregando  o  paó  Os  Evangeliftas  fó  dizem 
confagrado  nas  máos  dos  dos  ApoKoloSyTr^^/cave-  ^^a^< 
^poílolos,  lhes  diííe,  que  runt  ubique :  mas  aílim  co- ' '' '" 
o  dividiflem  entre  fy ;  2)/-  mo  Chriíio  facramentado 
■vidite inter  vos.  Dividirão  umisubique.pnmtiTO  eíle- 
ò  pao ,  &  o  fagrado  corpo,  ve  em.  hua  fô  parte,  depois 
que  atè  entaó  nas  mãos  cm  todas-,  aflimeíleshúas 
do  Senhor  eftava  em  hum  vezes  eftavaò  firmes  em 
fó  lugar,  logo  ficouem  do-  hum  fó  lugar,&  outras  ve- 
ze  lugares.  Agora  pergun-  zes  multiplicados  em  mui- 
to; Eaífim  como  Chrifto     tos. 

-  228  Atègora  naó  hc 
ifto  mais  que  conjedura 
minha j  o  que  cume  naó 
atrevera  a  dizer,  fe  o  naó 
pudera  provar.  Paliando 
David  dos  mefmos  Apo- 
ílolos  ,  como  affirma  S. 
Paulo,&  he  de  fé,  diz,  que 


comunicou  aos  Apoftolos 
feu  corpo  por  aquelle  mo- 
doimmenfo ,  cómunicou- 
Ihes  também  a  mefmaim- 
menfidade?  Creo,  &  digo 
que  íim.  E  eíTa  foi  a  razaó 
porque  o  Senhor  naó  ad- 
mitioà primeira  mefa  em 


^ueiecoi3Ía|irou  O  Sac/a-    as  vo^s  de  fua  pregação 


rf 


Sacramento.  14^ 

íè ouvirão  em  todo  o  mu n-    Jhançavquéa  fuá  immen- 


18.Í. 


doatè  os  últimos  fins  dei-. 
le :  In  omnem  t  erram  exlvit 
fonuseorum:>&  in  fines  or- 
bis  terra  verba  eoriim.  E  fe 
pedirmos  ao  mefmo  Da- 
vid, que  nos  declare  com 
algua  comparação ,  como 
fendo  os  Apoílolos  taó 
poucos,  fe  pode  cftender  a 
íua  pregação  a  taó  remo- 
tas diílancias  ?  Refpondc, 
que  do  mefmo  modo  com 
que  os  Ceos  prégaó  5  6c 


íidadejôc  multiplicação  de 
prefenças  a  tinhaó  recebi- 
do de  Chrifto  facramenta- 
do,  o  qual,  como  fica  dito, 
na  noite  em  queinftituio  o 
SantiíHmo  Sacramento , 
aufentandofe  de  nós  coma 
Soljfe  deixou  multiplica- 
do no  mefmo  Sacramenta 
como  nas  Eftrellas. 
.  1 2p  E  fe  alguém  :re*- 
plicar,  porque  naó  áiz^m. 
ifto  os  Hiftoriadores ,  que 


apregoaó  a  gloria  de  Deos  efcrevéraó  as  vidas ,  &  pe- 
de dia  ,  6c  de  noite  :  C^-  regrinaçoens  dos  Apofto- 
li  enarrant gloriam  'I>ei^&  los  ?  R^efpondo  ,  que  fim 
ffperamanuuejmannuntiat  dkem,6cq<uefó  na  fuppp- 
^^^'^firmamentum:  dies  dieierm  fi^âo  doi  ^_iài\%o  fe  podem 
€iat  ver  bum  &  nox  noãi  conciliar.  Muitos  Autho^ 
indicat fcientiam,  E  como  res  aífinalaó  a  cada  hum 
préggóos  Ceos  de  dia,  6c  dos  Apoílolos  varias  re-í 
de  noite?  De  dia  prégao  dç>  gioèns  ,  Bcgentes '. a  quem; 
hum  fQlugar,queheoda 
Sol :  de  noite  prégaó  de 
muitos  lugares ,  que  íàó  os 
dos  outros  Planetas,  Sc  das 
Eftrellas.  Pois  aiHaiprégai 


pregarão,  o  que  outrostpc^ 
rèm  negaó  ,  fundados  fó^ 
mente  na  chronologià  dos 
tempos  por  onde  faô  jul* 
gadas  por  apócrifas  aquela 


vaó  os  Apoílolos ,  jà  cada     las  hiííorias.Ma«  fe  fuppo* 
hum  como  hum  em   hum     zermos;,  como  devemos; 


fó  lugar,Sc  jà  cada  hum  co- 
mo muitos  em  muitos  lu- 
gares confirmando  admi' 
ravelméte  com  efta  feme- 


fuppor,  que  no  mefmo  tê^ 
popor  multiplicação  das 
prefenças  aíliftiaò  o»  Apo- 
ílolos ^ídxyeríos  Jug^r^s,' 
•  tud^ 


ai 


>! 


25-0  Sermão  do 

tudo  facilmente  fe  verifi- 
ca com  grande  gloria  do 
Evangelho.  Nemcaufarà 
grande  admiração  eíle  mi- 
lagre aos  que  coníiderarê 
a  neceílidade  -delle^  -por- 
que fe  eílando  Q  mundo 
tão  cheò  de  Miniftros  do 
mefmo  Evangelho,  fabe- 
mos  que  conçedeo  Deos 
efta  graça  de  aparecer  em 
partes  muito  diífontesí  S. 
Martinho,  a  S.  Gemenia*- 
no,  aS:TrontanQ,  a  S..  An- 
♦toniodePadua,  aS.  Fran- 
eifco  de  Aílis,  a  S.Françif- 
co  Xavier  5  &  oa'  ostros' 
muitdá  para  fins  xíe  mui  tá 

Nazian.  •    -  i     '  ■  • 

pfat.2o  ttienor  impG7rtaneia^quan.4 
to  majs  para  a-conyerfaõ 
univerfal  do  mundo, fendo 
os  inftrumentos  delia  tad 
poticos  ?  -Fina;! rrí ente  fe  a- 
S.Bafiliofoi  licito  dizer 
de  fy  meímo  nullo  loco  ctr^ 
Enod  in  ciinfcriftm  fum :  &  a  Eno- 
píiamr  dio  chamar  a  Epiphanio 
inúpere^àirmmenjm-iQ^é 
negara  áipartieipaLçaó  de- 
lia immenfi-dadeàimmen-í 
fidade  daquellas  obras, 
quefem  ella  eraó  inconi- 
pofllvcis? 
'  í  j^í  lAíIiTn^íriukiplicou 


SantljTmo 
C  hrirto  as  fuás  prcfenças> 
aílim  multiplicarão  os  A- 
poílolosaç  llias,  &:  afíini 
devemos  ví<òs  multiplicar; 
as  noílas  para  afíitHr  ao  á^i" 
viiiifíimo  Sacramento  en» 
toda  a  parte.  O  noífo  cor- 
po naòhe   capaz  natural- 
méte  defta  multiplicação , 
ou  immeníidade  ,  mas  a 
noílaalmaíim  ,&  a  noíTa 
memoria>a  qual  fó  nos  per 
dio  o  mefmo  Senhor  na  in- 
flituiçaó    defte  immenfo 
mY^erio-.Uhicunquefuerit  me.i». 
corfnís^  íiltc  congregabúttir  n-  ' ' 
e^^^zí/7/í  Janota  ia  palavra 
íibicunqMe^^m  roda  a  parte. 
Emtodaaparte,dizChri-    :j^'^ 
fio, onde  eiHvxro  corpo, 
alli  voaráó,&:  concorrerão 
as  águias.  Eque  corpo,  & 
que  águias   íaó  eítas  ?  O 
corpo  5  refpóde  S.  Am  bro- 
fio,  heo  corpo  do  mel  mo 
Chriílo  no  Sacramento,&: 
ás  águias  faó  as  almas  de 
fublime,  &  levantado  ef-» 
pirito,  quecomas  azas  do 
penlamento,  ôcdoatfeíto 
oaíliíl:em,adoraó,  &•  vené- 
raó  em  todas  as  partes  do 
mundo :  Eji  corpus  de  quo  Amhr. 
dttííim-efi^ar^.mea  vereefi  càp^"/.' 

CíhíiSy 


% 


r\\ 


i   ■■" 


Sacramento.  *  25-1 

cibm-iCircahoc  corptis aqui-  ordine Melchifedech.  Cha* 
l(efunt',qu£aliscircunjiant  mafe  o  facerdoçio  ác 
fpiritualihís.  E  íle  he  o  mo-  C hriílo,  facerdôcio  fegú-^ 
do  com   que  noífas  almas     do  a  ordem  de   Melchife- 


pelopenfamento  ,  &:me- 
iMonàimmenías  hão  de  af- 
fiftir  5  adorar  ,  &  louvar 
fenítpreao  mefmo  Senhor 
em  todo  lugar,  como  Da- 
vid exiiortava  à  fua,  que  o 
íizefíe :  In  ofUni  loca  domi- 
nàtionis  èjmbèúedic  anima 
PieaT)omino. 


§.  V. 


231 


o 


Terceiro  va- 
zio da  divin^ 


dech,naó  quanto  à  digni- 
dade, como  fe  Melchifê. 
dech  [  que  foi  Sacerdote 
da  Ley  da  Natureza}  o  in- 
fl:ituiíreimasqua;ntó  à  fe' 
meihança  da  vidima  ,  &c 
matéria  do  facriíicio ,  por-^ 
que  na6  facrifica va  Cor- 
deiros como  Abel  5  nem 
outras  re^es,  ou  aves  co- 
mo Abraham  ,  fenaô  paó , 
&  vinho,  qiie  he  a  matéria 
do  faerifício  da  Ley  dá 
Graça ,  &  Sacrameiíto  de 


raça, 
dade  na  Encarnação  fói'o'    ^Wi^óvMelchifedechpro-  ^""^^^ 
dafua  eternidade,  fazen-    fèrenspànem^érvintim-.erat 

énim  Sacerdús  ^ei  altiffi- 
mi.  E  chamaíe  facerdocix^ 
eternojporque  naaacabõíí 
como  o  facérdociò  de  A* 
ram.  No  facerdôcio  de 
Aram  acabou  o  fa cerdo* 
ciOj&:  acabava  o  Sacerdè-^ 
te :  acabou  o  facerdôcio  j 
porque  fe  acabou  aquella 
Ley ; a  qual  neceíiàriamê-í' 
teha  de  acabar  quandoó 
facerdôcio  acaba  ,  como 
doutamente  deiine  o  Apo-  i^^ix^p 
íloloS.  Paulo  •/  Translato  -^^  "  \ 
enim 


dofe  temporal,  nacendo, 
&  vivendo  em  tempo  o 
que  era  eterno.  Mas  étíáé 
aníefma  eternidade  jurou 
Deo^  de  dar  a  feu  Filho 
encarnado  húa  tal  prero- 
gativa  com  que  podeíTe 
inaravilhofamente  encher 
efte  grande  vazio  ,  que  foi 
o  facerdôcio  eterno  fegú- 
doa  ordem  de  Melchifé- 
dech :  lura-vit  T>omi?ius.ò' 
nonpanitebit  eum^  tu  es  Sa- 
cerdos  in  íSternumfecímdàm 


n 


J 


:'l  í 


2  f  2  Semao 

enimfacerdoiío^  necejjeefi , 
ísííe^  /f^ij"  translatio  fiat, 
E  acabava  o  Sacerdote, 
porque  mor  ré  cl  o  hum  Sa- 
cerdote, lhe  fucedia  outro, 
comofucedeo  a  Aramfeu 
filho  Eleazaro,  &  a  Elea- 
zaro  os  demais :  o  que  iiaó 
foi,  nem  podia  fer  naPef- 
ípaimmortal  de  Chriíloj 
como  notou  o  mefmo  S. 
Paulo :  Et  alij  qtiiàem  plu- 
^  resfaãifimt  Sacerdotes^id- 
3rj. "  circo  quod  morte  probibe^ 
renturperm  nérejoic  autem 
eo  quod  mane  at  in  £ternumy 
fempiternum  hahet,  SaceV' 
dotium.  >5  ,íi:>mí) 

232  Maspoftoquc  o 
facerdociode  Chriftofeja 
eterno,&  eterno  o  mefmo 
Sacerdote  Chriílo,  parece 
quefc  naófegue  ,  que  o 
vazio  da  eternidade  do 
Verbo  na  Encarnação,  fe 
fupriíre,ou  encheífe  no  Sa- 
cramento ,  porque  o  Sa- 
cramento naó  he ,  nem  ha 
de  fer  eterno,  6c  fó  dura,  & 
ha  de  durar  atè  o  fim  do 
inundo  ,  &  acabar  junta- 
mente cóellc.  Depois  do 
fim  do  mundo  fó  ha  de  ha- 
ver CeOjÔc  Inferno :  os  do 


do  ^nntljjlmo 
Inferno  nao  faó  capazes 
de  ílicriíicio  ,  nem  de  Sa- 
cramento: os  do  Ceo  naó 
haõ  mifterhum  ,nem  ou- 
tro. Náohaô  mífter  o  fa- 
crificio ,  porque  faó  juílos, 
&jànaó  podem  crecer  na 
graça :  nem  haòmifter  o 
Sacra  mento,porque  a  prc- 
fença  de  Chriílo ,  q  criaó , 
&  venera vaó  encuberta,6c 
invifivel  ,  là  a  tem  defcu- 
berta  aos  olhos,  6c  a  gozaó 
manifefta:  logofeo  facri-»' 
ficio,6c  Sacramento  do  AI* 
tarnao  ha  de  durar  mais 
que  efte  mundo,  6c  ha  de 
ter  fim  como  elle ,  feguefo 
que  naó  he  eterno.  Efta 
mefma  duvida  excitou  S. 
Thomás  na  queílaô  vinte  n.y. 
6c  du as  da  terceira  parte, '^' ou; 
tx,  refponde,  que  no  facri-  \l  ^ 
ficiofe  devem  confiderar 
duas  coufas,  a  oblação  ,  6c 
aconfumação  :  a  oblação 
em  que  fe  offerece  o  facri- 
íicio ,  6c  a  confu mação  em 
que  fe  confegue  o  íi  m,6c  fe 
lograó  os  efl  eitos  delle.  S, 
oblação  pertence  a  efte 
mundo,  6c a  confumaçam 
ao  outro.  Por  jílb  S.  Paulo 
chamou  a  Q\\ú^o^Totifex 
fu. 


3.q. 
art.f 


71- J>, 


Sacramento 
fiituTorum  honor  um\  Ponti-    trabit  infância. 
íice,&:  Sacerdote  dos  bens 


futuros  ,  porque  os  bens 
futuros ,  que  faó  os  que  fe 
gozaój  Schaó  de  gozar  no 
Ceo,  faó  os  que  Chrifto 
nos  niéreceo  pelo  feu  fa- 
criíicio.  Epofto  q  a  obla- 
ção neíle  mundo  íqÍ![q  té- 
poraI,6c  em  tempo ,  a  con- 
funiaçaó  no  Ceo  ha  de  du- 
rar por  toda  a  eternidade ; 
&  por  i^o  he  eterna,^  como 
diííe  o  mefmo  S.  Paulo : 
Vha  oblatione  confummavit 
Í7t  fempiternum  fanõfifica- 
tos. 

233  No  Levitico 
mos  liiia  excellente 
deíla  differença  ,  &  deíla 
ordeai  no  dia  chamado 
d.is  Expiaçoens.Mandava 
Deos^queofummo  Sacer- 
dote nao  entraíTe  no  San- 
£ta  San£torum  ,  fem  pri- 
meiro fora  delle  offerecer 
o  facriíicio5que  no  mefmo 
lugar  difpoem  a  Ley  ;  Ne 
.  ingredtatttr   Sanõfuarhim , 

fíwd  efi  intra  velum  ,  nifi 
íCc  ante  fecerit :  'vitulum 
propeccatQofferet,  &  arie- 
ttm  inkolocauftíim :  his  rhe 
selebratisy  ultra  velum  in^ 


te- 
figura 


^51 
E  porque 
razaójôu  com  que  myfte- 
riooíàcrificio  fe  havia  de 
oíFerecer  primeiro,  &  fora 
do  San£ta  San6borum  ,  & 
naó  depois  5  &  dentro  nel- 
lefPorque  o  fummo  Sacer- 
dote íigniíicava  a  Chrifto, 
oSandta  Sãd-orumoCeo, 
o  facriíicio  o  da  morte  de 
Ghrifto  na  CruZjOu  no  Al'- 
tar,  onde  fe  reprefcnta  a 
mefma  morte  :  &  eíle  fa- 
criíicio naó  fe  havia  de  of- 
ferecer depois ,  fenao  an- 
tesjuemno  San£ba  Saníto- 
rum^fenaò  fora  delle.  Naó 
depois,  iílo  he  ,  na  eterni- 
dade, fenaó  antes  ^  &  em 
tempo,  em  quanto  dura  o 
mundo:  nem  no  San£ta  Sá- 
£l'orum,  iílo  he,no  Ceo,  fe- 
naó fora  delle,  Sena  terra. 
Aííim  foi  quanto  à  obla- 
çaó,&  aíTim  ha  de  fer  quá- 
to  à  confumaçaó  naò  de 
outro,  fenaó  do  mefmo  fa- 
criíicio. Foi  quãtoà  obla- 
ção 5  porque  na  terra  oííe- 
receoChriílo  o  facriíicio 
da  Cruz  como  hoje  oífere- 
ce  o  do  Altar ,  &:  oíFerece- 
rà  até  o  íim  do  mundo  :  & 
ha  de  ferguanto  á  condi- 
maçaoj 


I^sfj' 


/ 


m 


2  54  Sermão  do 

mação  5  porque  no  Ceo  ha 
de  coníumar  Chriílo  o 
rnefmo  íacriíicio,  cómuni- 
candonos  os  ePreitos  delle, 
que  coníiílem  na  viíla  cla- 
ra de  Deos  por  toda  a  eter- 
nidade :  &  por  iílb  o  Sacer- 
dote, &  o  facriíicio,  hum, 
êc  outro  eterno. 

2  34Tudoifl:ovioS.Joa6 
no  Ceo,  como  jà  tinha  vi- 
ílo  o  Cordeiro  vivo  de- 
pois de  morto,  &  gloriofo 
depois  de  facriíicado.  Fal- 
ia o  Evangeliíla  Profeta 
da  Cidade  de  Jerufalem 
Triunfante,  que  heo  Ceo, 
&  diz,  que  a  claridade  de 
Deosaallumea  ,  &:que  o 
lume fae  do  Cordeiro ;  Na 
claritas  ^ei  iUumina'vit 
eaniyò'  lucernaejus  eft  ag- 
mis.  P\ilIou  S.Joaó  como  o 
primeiro,  &:  maior Theo- 
logo  da  Igreja.  Para  os  Bê- 
aventurados  verem  clara- 
mente a  Deos,  he  neceíTa- 
rio  que  os  feus  entendi- 
mentos fejão  elevados  por 
húa  claridade  fobrcnatu- 
ral,  a  queos  Theologos 
chamaó  lume  da  gloria  j  & 
ifto  he  o  que  vio ,  &  diz  o 
Evangelilta.  A  claridade 


SantiJJImo 

d  e  Dcos> que  ai  í  u  m  e.i  a  C i- 
dade  de  Jerufalem  celeíle, 
he  a  viíla  clara  do  mefmo 
Deos :  Ciar it as  Dei  iUumi- 
naviteam  :  &  o  lume  da 
gloria ,  fem  o  qual  fe  náo 
pôde  ver  a  Deos,eíre  fae  do 
Cordeiro:  Et  lucernaejus 
eftagmts.  Mas  porque  fae 
o  lume  da  gloria  ,  nam  do 
objecto  eííencial  da  mef- 
ma  gloria,  que  he  Deos,  & 
claramente  viílo,  fenaó  do 
Cordeirojque  he  Chriílo , 
o  qual  S.Joaó  vio  como  fa- 
criíicado.^ Porque  eíTefoi 
o  ílm,&  effesfaó  os  effei- 
tos  do  mefmo  facriíicio 
ofFerecido  na  terra, &  con- 
fumadonoCeo  :  ofl^ereci- 
docmtempo,&:  confuma- 
do  na  eternidade  i  &  por 
iílb  taó  eterno  como  o 
mefmo  Sacerdote  :  Tu  es 
Sacerdos  in  ^ternum. 

23 f  Etla  eternidade 
he  a  que  faz  eterno  o  San- 
tiílimo  Sacramento, ainda 
que  a  oblação  do  íacriíi- 
cio em  que  fe  confagra  o 
mefmo  Sacramento  haja 
de  ter  íim,8c  acabar  com  o 
mundo.  E  poílo  que  eíla 
ctcrnidadcem  quç  naó  ha 
du- 


Sacramento.  2  ff 

duvida,  bafta  para  prova    ílofoi  crucificado  no  Cal- 


do meu  intento  >  &  ifto  he 
o  que  enfina  o  Doutor  An- 
gélico ,  allegando  os  nief- 
mos  textos  do  Apocalyp- 
fe,  &  Levitico  proxima- 
mente citados  5  eu  com  tu- 
do acrecento  ,  que  o  divi- 
nillimo  Sacramento  nam 
fó  he,6c  fera  eterno  no  Ceo 
pela  eternidade  de  feus  ef- 
íeítos  y  fenáo  também  de 
fua  própria  fuílancia  :  por- 
que depois  do  íim  do  mu- 
do, quando  jà  naó  haverá 
Altares^ncm  Sacrários  na 
terra ,  fe  confervarà  eter- 
namente no  mefmo  Ceo 
húa  Ho  ília  confagrada. 
Afíim  o  conííderáo5&  pre- 
lumem  muitos  Authores 
afceticos3&  contemplati- 
vos 5  cuja  opinião  para 
mim  naò  he  menos  prová- 
vel, que  pia.  No  dia  do  juí- 
zo ha  de  aparecer  no  Ceo 
com  o  mefmo  fupremo 
Juiz  a  fua  Cruz:  Tuncpa- 
rebit  Jígnum  Filij  homtnis 
inC^elo.  E  que  Cruz  ha  de 
fereíla?  SJoaÓ  Chryfo- 
ftomo  com  muitos  outros 
Doutores,  diz  que  ha  de 


vario,  &  afíim  o  profeti- 
zou a  Sibylla: 
O  Ugnumfelixjn  quo  T^eus  sibyiia 

ipfepependit !  ^^^;^^ 

Nec  te  terra  capit  ^fed  Ca  li 

teEfa  videbis. 
Cum  renovata  T)ei  fácies 

ignitamicabit. 
Suppofto  pois,  que  a  Cruz 
deChriílo  ^V7ÍÒ\à2i  hoje 
em  infinitas  partes,  fe  há 
de  recolher  outra  vez  de 
todo  o  mundo,  6c  reunirfe 
com  maior  milagre,  que  o 
da  refurreição  dos  mor- 
tos, à  fua  inteireza ,  &  con- 
fervarfe  eternamente  no 
Ceo  j  porque  fe  negará  fe- 
melhante  privilegio  ao 
pão  vivo,  &  vital,  que  de- 
ceo  do  mefmo  Ceo  ?  Se 
hum  lenho  morto,  {ç,co;y  8« 
duro  mereceo  fer  fublima- 
do  a  tanta  dignidade  ,  & 
eternizado  nella  ,  fó  por- 
que foi  fantiíicado  como 
cotado  do  corpo  de  Chri- 
ílo,&  matizado  com  feu 
fangue>  o  Sacra  mento,  que 
cótèm  todo  o  mefmo  cor- 
po,&:fangue,  &  foi  iníti- 
tuido  para  dar  vida  eterna 


fer  a  mefma  em  que  Chri-     aos  homens  >  porque  care- 
cerá 


i 


•'5 


■■íl 


2j6  Sermão  do 

cera  da  mefma  eternida- 
de? Foi  tanto  o  refpeito, 
que  o  Verbo  encarnado 
guardou  àquella  parteíi- 
nha  de  carne  ,  &  fangue, 
que  recebeo  das  entranhas 
puriílimas  de  fua  Mãy^ 
que  nunca  confentio ,  que 
o  calor  natural  5  como  na- 
turalmente coíiuma5aga- 
ftaíle,&:  confumiííe ,  &  co- 
mo diz  S.ilgo ílinh o,  ain- 
da depois  de  reíuícitado  a 
conferva  ,  &  coníervarà 
AngiiíT.  eternamente  em  fy  mef- 
.^crm:t3e  jYio :  Caro  Chriíti  auãmvis 
rione  B.  glorta  rejurrí6ttcms  juertt 
^-  mrignijicata^  eadcm  tamcn 
manfit ,  qtia  ft.  wpta  eíí  de 
Maria.  E  que  aggravo  fa- 
namos a  efte  mefmo  ref- 
peito ,&:  amor,  fe  imagi- 
naíTemos  do  mefmo  Chri- 
fto,  que  haja  de  permitir 
ao  tempo,  queaífim  como 
ha  deconfumir  ,  &  acabar 
p  mundo,  aíTim  confuma , 
&  acabe  com  elle  hum  Sa- 
cramento em  que  naó  fó 
eftà  húa  parte  da  fua  carne, 
&  fangue,  fcnaó  toda  em 
*  todo,  6ctoda  em  qualquer 
parte?  Digamos  logo,  & 
creíijUQS  piamente,  quç  aí- 


Sayitijfjno 
fim  como  a  Hoftia  confa- 
grada  fe  prefervou  muitas 
vezes  de  outros  incêndios, 
aílim  fe  prefervarà  do  in- 
cêndio univerfal  do  mun- 
do, para  que  como  paó  dos 
Anjosjque  çoméraó  os  ho- 
menS5a adorem  eternamê- 
te  no  Ceo  homens,  &  An- 
jos. 

236  Os  mefraos  Au- 
thores,  &  outros  (^  &  nam 
com  leve  conjectura  ^^t- 
tribuem  femeihante  pre- 
rogativa  ao  livro  dos  Evá- 
gelhcs:naô  porque  os  ou- 
tros fagrados  naó  conte- 
nhaó  a  palavra  divina  5 
mas  porque  efta  foi  pro- 
nunciada pelo  proprjo  Fi- 
lho de Deos :  Novijf/ivu' lo-  j'-^'"- 
qmitns  efi  nobis  in  tilio:  &c 
aííim  como  no  dia  dojui- 
zo  aparecerá  a  Cruz,  aílim 
eítarà  aberto,&  patente  o 
Evangelho  para  ferem  jul- 
gados por  elle,  huns  por- 
que o  naó  creraó  ,  outros 
porque  o  naó  guardarão. 
NofeuApocalypfediz  S. 
Joaó  ,  que  pelo  meyo  do 
Ceo  vio  voar  hum  Anjo,o 
qual  tinha  na  maó  hum  E- 
vangelho  ttQmo'Maòetem  i^X^ ' 
Evan* 


iill 


Sacramento,  257 

E'vangeliufn  'aternum:6>c  Clirifto  merece  juftamen- 

com  grandes  vozes  avifa-  te  fer  perpetuado  na  eter- 

vaatodo  ogenero  huma-  nidade  do  Ceo  ;  quanto 

no  ,  que  temeíTem  a  Deos  mais  a  maior  obra  das  fuás 

por  fer  chegado  o  dia  do  palavras,  &  o  fagrado ,  6c 

juízo  :  ^ia  venit  horaju-  confagrado  volume  do  di- 

dkij  ejus.   De  forte  que  viniílimo  Sacra  meto  ,  que 


também  no  dia  do  juízo 
aparecerão  Evangelho. E 
fe  perguntarmos  porque 
fe  chama  Evangelho  éter- 


também  Ezechiel  recebeo 
da  maó  de  outro  Anjo ,  & 
comeo  em  forma  de  livro  ? 
S  Joaó,  que  efcreveo  o  feu 


de  Deos  obrou  neíle  mun- 
do, foraó  tantas  ,  que  fc 
feouveífem  de  efcrever, 
naó  caberiaó  no  mefmo 


jiOi  reíponde  SJeronymo,     Evangelho  depois  dos  ou 
que  a  razaó  ,  &:  myfterio    trosEvangeliftas,  confef- 
he-,  porque  o  Evangelho    Ía5&  protefta  no  fim,  que 
neáe  mundo  foi  temporal,     as  maravilhas,que  o  Filho 
^pregado  temporalmen- 
te ;  mas  no  Ceo  durara  por 
toda  a  eternidade  :  Sempt- 
ternumfuturum  in  Calis^ad 
-,.       coparationem  videlicet  hw     mundo  os  livros.  Logo  fe 
■E^iOczàjusnoftn  Evangelijy  quoa    no  Ceo  na  de  durar  eter- 
^"^"'  temporale  efty  &  in  tranfitu-    namente  o  Evangelho,  em 
ro  mundot  ac  feculo  fradi-    que  fe  contem  parte  fó- 
catum.  Com  o  mefmo  fen-    mente  das  mefmasmara- 
pf^j^    tido  &\S^t  David :  In  ater-    vilhas  j  com  maior  razaó , 
>Sí8.8p.  num^omine-iVerbum  tuum     &  em  fuplemento  do  mef- 
permanet  in  Calo  :  onde  o     mo  Evangelho,  fe  deve  là 
n;eri;um tuumyT>omineipro-    eternizar  o  Sacramento, 
pria  a  &  particularmente 
íigniíica  o  Evangelho  ,  ao 
qual  tantas  vczgs  chama 
S.  Paulo  Evangelium  Chri^ 
fti.  Efe  o  livro  dos  Evan- 


em  que  eftão  reíumidas  to- 
á-3is: Memoriam fecit  mira- 
bilium  fuorum,  efcam  aedit  ,  j^  ™j^ 
timentibusje  ^  Fin alm en te 
o  Sacramento  he  o  penhor 


gelhos  por  fer  palavra  de    da  gloria,  que  o  Ceo  no^ 
Tom./,  R  deò 


2  f  §  ^  Sermão  do  SantiJJimo 

deoneíl:avida:&:  quando     não  durava  mais  que  hum 
depois  do  jSm  do  mundo     dia.   E  com  que  myíierio 


fe  defempenhar  ,  6c  nos 
meter  de  poíTe  da  gloria , 
encaó  fe  reílituirà  o  mef- 
moCeOj  Sc  tornará  a  rece- 
ber o  feu  penhor.  Emfu- 
ma,que  aíllm  como  aCruz 
de  Chrifto  ,  &  o  livro  dos 
Evangelhos  naó  haó  de 
acabar  com  o  mundo,  mas 
fer  eternos,  aílim  ,  &  com 
mais  jufti ficada  providen- 
cia o  Sacramento  emhúa 
Hoftia  confagrada. 

237     E  para  que  naõ 


eftas três  coufas  fomente , 
&  todas  na  Arca  ?  A  Arca 
encerrada  no  Sanda  San- 
(Eborum  ,  na  qual  reíidia 
Deos  prefencialmente  fo- 
bre  azas  de  Cherubins,  rc" 
prefentava  o  que  David 
chama  Ceo  do  CeOjque  hc 
oEmpireo  :  Caíum  Calí\f^% 
domino  :  &:  o  myfterio 
mais  próprio,  Sc  mais  pro- 
porcionado de  toda  cila 
reprefentaçaó,ou  naó  hc, 
ou  não  parece  que  pôde 


pareça,  que  eftas  três  ex-    fer  outro,  fenaò  que  con- 
ceiçoens   ílió  totalmente    fervarà  Deos  eternamente 


reíèrvadas  ao  conhecimê- 
todivinoj&fecreto  de  ne- 
nhum modo  revelado,  ao 
menos  naquella  parte  da 
Efcritura  fagrada,  em  que 
as  figuras  do  futuro  fepin- 
tavaó  na  hiftoria  do  paíTa- 
do ;  lembremonos  da  Arca 
doTeílamento  ,  na  qual 
confervou  Deos  três  cou- 


\i 


no  Cco,  a  Cruz  íigniíica- 
da  na  Vara,  o  Evangelho 
íigniíicado  na  Ley  ,  &  o 
SantiíUmoSacraméto  íig- 
niíicado no  Mana.  Por  iíTo 
omefmo  Chriílo  alludin- 
doà  Arcado  Teílamento, 
deoao  mefmo  Sacramen- 
to o  nome  de  Tefta mento, 

Sc  eterno :  Novty  &  aterra 

ias  entre  todas  as  daquelle  Teftamenti.  Ao  mefmo  fím 
íempolingulares:  a  Vara  podemos  dizer  ,  que  cúh 
deMoyfes,  as  Taboas  da  preparado  no  Ceo  aquclle 
Ley,&  com  maior  milagre  Altar,quc  là  vio  S.  Joaó : 
a  Vrna  do  Maná,  o  qual  Vidifui^tus  jiltare  animas 
fera  táo  corruptivd  ,  que     intcrfeãçrum  pro^ter  Ter-  ^l'. 


Apoíáf 


Sacramento]  2  ff 

humT^ei.  E  quepeçasjper-     da  arvore  da  vida  defen- 


guntoeu,  mais  próprias, 
&  mais  dignas  de  ornar 
hum  Altar,  quehiía  Cruz, 
o  Santiíluno  Sacramento , 
6c  hum  livro  dqs  Evange- 
lhos? 

238  Provado  aífim por 
hum  modo  com  certeza  j^ 
&  por  outro  com  probabi- 


dido  por  hu  m  Cherubim 
com  hua  efpada  de  fogo,r6 
para  impeair  totalmente > 
que  comédodaquelLefru- 
to,na6  yivt^ç,  eternamen- 
te: CoUocanjtt  ante  Tara- 
difumQherubim^&flammm  ^ 
gladium  ad  cuftodiendam  i.^tf.i.ii^ 
viamligm  vita.   Ne  forte 


Íidade,como  o  corpo  de    Jumatetiam  de  lignovita^ 
Chrifto  facramentado  Io-»    ^vivatin  aternum.  Per- 


gra,  &  logrará  para  fem- 
preoattributo  deeternoj 
ibreíla  moílrar  como  o 
mefmo  corpo,  q  por  amor 
de  nos  fe  facramentou,  co- 
munica aos  que  o  cómun- 
gaó  a  mefma  eternidade. 
Eftahea  fegunda  obriga- 
ça6,6ca  mais  diíficultofaj 
que  acompanha  todos  os 
nodbs  aíTumptos  i  masne- 
íie  carece  de  toda  a  diíE- 
culdade  pela  aííeveraçao 
taó  ciara,  ôc  taô  expreíTa  cq 
que  o  mefmo  Senhor  nos 
certificou  deíla  verdade  ^ 
dizendo  :  ^i  manducat 
fòan,  d  huncfanem^  vivet  in  teter^ 
^'  /z«r/3?.  Mal  cuidou  Adam , 
que  nunca  elle  ,  nem  feus 
filhos  ouviíTem  tal  oracur 


guntaó  agora  os  Expoíito- 
resfe  eílà  ainda  efte  Che- 
rubim guardando  o  que 
guardava  :  Sc  fenaó  eftà » 
quando  embainhou  j  ou 
apagou  a  efpada  ?  Reípon- 
dem  comummente,  que  a 
apagarão  as  aguaSjÔc  inun- 
dação do  diluvio  ,  o  qual 
também  dizem  ,  quede- 
ílruíojéc  desbaratou  oPa- 
raifo,  6c  fuás  arvores :  mas 
tudo  ifto  he  incerto.  Se  o 
diluvio  naô  derrocou,neni 
fccou  a  oliveira  ,  donde  a 
pomba  trouxe  o  ramo  ver- 
dej  porque  havia  de  arran- 
car, ou  derrubar  as  arvores 
doParaifo,6c  mais  a  da  vi- 
da ,  que  Deos  quiz  guar- 
dar? Se  o  mefmo  diluvio 


lOa  quando  vio  o  caminho    naq  aíFogou  no  mçfmo  Pa- 

B.Í)         raifp 


*•:-?< 


i 


% 


2<>^  Sermão  do 

raiíb  a  Enoch,  como  havia 
de  tirar  da  fua  eílancia  ao 
Cherubinijquenaó  reípi- 
ra  com  ar,  nem  fe  affoga 
com  agua  ?  E  fe  elle,como 
dizem  os  mefmosAutho- 
res,  naófó  guardava  dos 
homens  aqueiles  frutos, 
fenáo  também  do  Demo- 
nio,para  que  com  elles  nos 
nãotentaíTe;  como  fe  ha- 
via de  apagar  com  agua  o 
fogodaefpada,  q  os  mef- 
mos  Demónios  temiaõ» 
xnais  que  o  do  Inferno?Di- 
gaó  poisoslnterpretes^ou 
prefumaó  adevinhar  co- 
mo quizeremjque  eu  fô  di- 
go, &  com  toda  a  certeza 
aííirmo,queo  Cherubim 
deixou  a  fua  eftancia  ,  & 
embainhou,  ou  apagou  a 
fuaefpadanamerma  hora 
dirofiíTimaemque  ofobe- 
rano  Reílaurador  das  rui- 
nas  de  Adam  inftituío  o 
Santiílimo  Sacramento  > 
porque  entaó  ceílbu  o  fim 
daquella  prohi  bição,&da- 
quellaguiirda.  Aguarda, 
&  a  pruhibiçaó  era,  para 
que  o  homem  comendo 
naó  vivcíTc  eternamente: 
KefuukU  d(í  ligno  vít^e  ,•  <^ 


SantiJJimo 

vivai  in  aternum.  E  como 
Chrifto  inftituindo  o  Sa- 
cramento deo  faculdade  a 
todos  os  filhos  de  Adam, 
para  que  comendo  vivef- 
fem  eternamente  j  entaó 
apagou  o  Cherubim  a  ef- 
pada,&  deixou  a  fua  eftan- 
cia  ,  &  náo  fó  ficou  fran- 
queado o  caminho  da  ar* 
vore  da  vida,  fenão  a  mef- 
ma  arvore  tranfplantada 
por  todo  o  mundo,  paraq 
todos  os  que,  pelo  que  có- 
rneo o  mefmo  Adam ,  ficá- 
mos condenados  à  morte, 
não  de  outro  modo ,  íenaó 
também  comendo,  viva- 
mos eternamente  :  ^«/ 
'mmducat  hunc  fanem  ,  ^'/- 
vet  in  aternum. 

§•     VI. 

IVJlIatei  em  en- 
cher eftes  primeiros  três 
vazios  da  divindade  :  8c 
porque  ainda  nos  reílaó 
quatro,  fera  força ,  quanto 
forpoíTivel  ,  reduzilos  a 
maior  brevidade.  O  quar- 
to he  a  immortahdade  fei- 
ta mortal ,  o  quinto  a  im- 
pailibilidadc  feita  paíli- 
vel .-  ^  de  ambos  pela  mef* 
ma 


Sacramento,  ^  2í>i 

ina  razaój  8c  por  ferem  taó     qiíando  já  a  viílima  efta  va 


conexos,  trataremos  jun- 
tamente. Digo  pois,qiie  fe 
na  Encarnação  a  immor- 
talidadedivinajdo  modo 
que  podia  Ter,  fe  fez  mor- 
tal,  &:  a  impaíUbilidade 
paílivel  \  o  corpo  de  Chri- 
ílo  no  Sacramento  de  tal 
forte  fuprio,  &;  encheo  ef- 
tesdous  vazios  da  divin^ 
dade ,  que  fendo  natural^ 
mente  corpo  mortaljíicou 
immortal,  &  fendo  natu- 
.ralmêtepafliveljíicou  im^ 
paílivel. 

240  Com  ferem  tan- 
tas as  figuras  do  SantiíH- 
mo  Sacramento  >  que  fe 
lem,6c  o  precederão  na  fa- 
grada  Efcritura  j  a  primei- 
ra que  nos  propõe  a  Igre- 
ja, he  a  do  facrificio  de 
ífaac :  Infigwis  pT^figna- 
tur^  cum  Ijaac  immolatur. 
Mas  fe  bem  fe  coníldera  a 
hiftoria  táo  fabída  do  mef- 
jno  ifaac  ,  parece  que  fe 
náo  pôde  reprefentar  nel- 
Ia  o  Sacramento  ,  porque 
Terdadeiramente  náo  foi 
íkcrificio.  Mandou  Deos 
a  Abraham,que  lhe  facri- 
íicaíTefeu  íiiho  Ifaac  ,  & 
Tom./, 


fobre  o  Altar  ,  a  efpada 
defembainhada,  &  entre  o 
golpe,6ca  garganta  do  fi- 
lho fô  havia  dous  dedos  de 
diítancia,teve  Deos  maó 
no  braço  do  Pay.  Logoaf- 
íim  o  golpe,  como  o  facri- 
fíciojtudo  ficou  no  ar.  E  o 
mefmo  Deos  o  provou, 
porque  alU>  &  no  mefmo 
inítante  apareceo  atado 
Jium  Cordeiro  ,  no  qual 
Abraham  acabou  de  exe- 
cutar o  golpe,  &  efte  foi  o 
que  morreo ,  &  foi  íacrifi- 
cado.  Pois  fe  o  Cordeira 
foi  o  morto,  &  Ifaac  ficou 
vivos  como  foi  Ifaac  figu- 
rado facrificio  de  Chri- 
fto.?PoriíIb  mefmo:  5c  ca 
a  maior  propriedade ,  que 
fe  podia  imaginar.Chrifto 
não  foi  húa  fó  vez  facrifi- 
cado,  fenão  duas :  húa  vez 
na  Cruz,  outra  vez  no  Sa- 
cramento 5  &  primeiro  no 
Sacramento,  6c  depois  na 
Cruz,  aílim  como  primei- 
ro foi  facrificado  Ifaac,  & 
depois  o  Cordeiro. O  Cor- 
deiro morreo,  &  padeceo, 
porque  foi  figura  do  facri- 
ficio da  Cruz  ,  no  qual  o 
R  iij       corpo 


fpf 


2  <^2  Sermão 

corpo  natural  de  Chrifto, 
como  mortal,  &:pafíivel, 
padeceo,^  morreo  :  po- 
rem Ifaac  foi  figura  do  fa- 
crificio  do  Altar  5  &  por  ií" 
foj  fendo  facriíicado  ,  naò 
morreo ,  nem  padeceoj 
porque  o  corpo  de  Chrifto 
no  Sacramento  eftà  im- 
mortal,&  impafíivel.  Ex- 
cellentemente  Ruperto  : 

iSenef  meti  impãJJlhUts  permanet 
í»P'  32.'  ^viq;usy  qtiemadmodumtl- 
lie  Ifaac  immolatus ,  &  ta-^ 
men  gladio  non  efl  attaEíus, 
Se  em  Ifaac  fe  executara  o 
golpe,  &  morrera ,  feria  fi- 
gura do  facriíicio  da  Cruz 
cm  que  o  corpo  natural  de 
Chriílopadeceo,&:  mor- 
reo :  mas  porque  poílo  fo- 
breoAltar  náo  padeceo, 
nem  morreo  \  por  iíTo  foi 
figura  do  facriíicio  do  Al- 
tarjem  que  o  mefmo  corpo 
facramentado  fe  conferva 
immortal ,  ^  impaffivel: 
Impaffibilis  permanet    à* 

Wt'VUS. 

241  As  palavras  omni- 
potentes com  que  Chriílo 
inliituiOjíSc  obrou  hum  taó 
milagrolò  myíterio,forag: 


do  SantiJJimo 

Hoc  eft  corpus  metim ,  c^uod 
provobtstradetur  ;  Eftehe 
o  meu  corpo,  que  por  vòs 
fera  entregue,  E  porque 
naó  diíTe  o  Senhor,que  por 
vòs  fera  morto,  ou  cruci- 
ficado, fenáo  entregue  ?  A 
palavra  tradctur  íigniíica 
entrega  por  traição,  &  tal 
foi  a  entrega  que  fez  Judas 
do  mefmo  corpo  de  Chri- 
fto  aosJudeos,húa  vez  em 
quanto  corpo  natural ,  & 
outra  vez  em  quanto  fa- 
cramentado. Muitos,  6c 
graves  Authorcs,  entre  os 
quaeshe  Santo  Thomás  , 
entendem  q  quando  Chri- 
fto  diíTe  a  todos  os  Apoílo- 
los ;  Accipite ,  é'  manduca^ 
^í";  Judas  tomou  nas  mãos 
o paó  facramentado  ,  mas 
naó  o  comeo.  E  para  que 
faibamoso  que  fez  delJe, 
acrecenta  Theophilado , 
queoefcondeo  ,  &  levou 
aosPrincipes  dos  Sacer- 
dotes ,  quando  com  elles 
foi  ajuílar  a  venda :  Tanem 
accepity  ^  non  comedi t ,  feJ 
occultavit ,  ut  mavifcjtaret 
Ilidais  y  ano  d  corpus  juum 
voe  ar  et.  Depois  deíla  pri- 
meira traicaój  &  entrega 
fciU 


Savr  amento.  16^ 

feita  por  Ju das,  entaóexe-  panem  ejus  ,  &  erMamus 

cucouellea  fegiinda  ,  que  eum  de  terra  viventium.  O 

foi  a  da  prifaò  no  Horco.  I/gnum  he  a  Cruz  ^  o pamm 

O  que  fuppoílojpergunto;  ejus,  íie  o  paó  confagrado : 

Porque  razaójou  com  que  &  diz  o  Senhor,  que  reíbl^ 

myílerio  quiz  Chriíto  q  véraó  em  confelho,  de  pôr 


duas  vezes  foífe  entregue 
aos/udeos  feu  corpo ,  húa 
no  eflado  natural,  ôc  outra 
no  de  facramentado  ?  Sem 
duvida,  para  que  pofto  de 
hum  ,  &  de  outro  modo 
nas  mãos  de  feus  inimigos, 
atèelles,  o  feu  odio ,  a  fua 
raiva,&  as  fuás  máos  ex- 
primentaíTem  o  que  po- 
diaó,  ou  naó  podiaó  fobre 
o  corpo  do  Redemptor, 
que  para  o  fer,  fe  poz  nel- 
las.  O  corpo  natural  pode- 
raóno atormentar,  &  ma^ 
tar,&:  por  iífo  o  cruciíicá- 
ra5,&:  lhe  tirarão  a  vida :  o 
corpo  facramentado  tam- 
bém o  quizerao  cruciâcarí 
&  matar  }  mas  naò  pode- 
rão. Ouvi  agora  o  que  por 
ventura  nunca  ouviftes. 
242  He  cafo  ,  que  revelou  o 
mefmo  Chriílo  por  boca 
do  Profeta  Jeremias  ,  fal- 
ia ndo  dosjudeos ;  Cogita^ 
'veruntfuper  me  confíliay  di- 
í;  entes :  Mittamus  lignum  in 


Jerem 
H.19. 


O  feu  paó  na  Cruz5&:  o  cru- 
cificar para  lhe  tirarem  a 
vida.  Aílim  entendem  ef» 
te  Texto  pela  figura  H7- 
pállage  Tertulliano  ,  La- 
£tancio,S.  Thomás,  Joa- 
chim,  Maldonado,  &  ou- 
tros. E  quando  efta  execu- 
ção, por  fe  applicarem  o^ 
Principes  dos  Sacerdotes 
à  do  Calvário,  fe  naó  veri- 
ficaíTena  occafiáo  referi- 
da por  Theophilaíbo  ;  he 
certo  que  em  outros  tem- 
pos depois,roubáraó,6c  ef- 
condéraó  os  Judeos,  como 
Judas  5  a  Hoftia  confagra- 
da,êc  lhe  deraó  muitas  pu^ 
nhaladas  :  m.as  com  que 
effeito.^  Álguas  vezes  ma- 
nou delia  copiofo  fangue 
em  prova  de  que  debaixo 
daquellas  efpecies  exte- 
riores fe  encerra  realmen- 
te o  verdadeiro  corpo  de 
Chriílo  :  &  outras  vezes 
ceílbu  efte  prodigio  ,  nem 
viraó final,  ou  effeito  al- 
R  iiij  gunx 


■:1í 


2  ^4*  ^         Sermão  do  SantiJJifno 

gum  da  fua  impiedade  fa-  o  prova  quanto  à  immor- 
crilega ;  para  que  a  ceguei-  talidade-Áilim  comoDeos 
ra  Judaica  fe  defenganaf-  feito  homem  quiz  moi-rer 
fe  •,  que  fe  na  Cruz  lhe  po-  na  arvore  da  Cruz  para  fe 
dérao  tirar  a  vida ,  porque     vingar  do  Demónio ,  que 


eílava  nella  mortal,  &  paf- 
íivel:  jio  Sacramento  lhe 
não  podem  fazer  dano  pu- 
nhaes,  cravos,  nem  lançasj 
porque  eftà  alli  tam  im- 
mortal,  ScimpaíTivel,  co- 
jno  no  Ceo.  No  Cco  im- 
anortal^Sc  impaífivei  -,  por- 
que depois  de  morto  fe 
ámmortalizou  pela  refur- 
reiçaó:  &  no  Sacramento 
também immortal,  U  im- 
paílíveh  porque  antes  da 
morte  fe  tinha  já  im morta 


com  outra  arvore  tinha 
enganado  aos  primeiros 
homens :  affim  traçou  com 
fua  infinita  fabedoria  ,  6c 
omnipotência  5  que  nòs  o 
comcíFemosnoSacramen- 
tOjpara  continuar,  &  con- 
fumar  a  mefma  vingança, 
fazendo  verdadeiras  nelle 
as  duav<i  mentiras,  com  que 
omefmo  Demónio  f^ilfa- 
mente  tinha  acreditado  a 
virtude  daquella  fruta.  O 
que  o  Demónio  prometeo 


lizado   pela  coufagraçaó.     a  Eva,  foi ,  que  fe  comef- 
Bem  feencheo,  ôcfuprio     fem  da  fruta  da  arvore  vc 


logo  neílaim  mortalidade, 
&impaíllbilidade  do  cor- 
po de  Chriilo  f^cra  menta- 
doaimmortahdade,&ini- 
paílibilidade  divina  ,  de 
que  o  Verbo  na  Encarna- 
ção fe  tinha  exinanido. 

245  Eque  eíles  dous 
eíFeitos  de  immortal  ,  & 
impaílivelfe  nos  comuni- 
quem a  nós  no  Sacramen- 
to j  hum  dos  principaes 
«locivosdafua  ^Aituijáp 


■íí' 


dada  ,  nãofó  não  morre* 
riáo,  mas  licarião  como  -;enc# 
Deofes ;  Nequaquam  mor- 
temoriemm-i  &  eritisjicut 
dij.  Ahíim  Demónio,  á'\z 
Chriílo,pois  iílomeAiio, 
que  tumentindoíingiíle, 
flirei  eu  verdadeiro ,  &  in- 
ventarei hum  ta]  género 
de  manjar,que  comendo-o 
os  homcns,nãofó  íiqueni 
endeofados,//a//  á'//,fcna6 
^aitttçnuiumpxtaes  :  AV- 


Sacramento.  26  f 

quaqtíam  morte  monenúni.     me:  primeiro  fe  armavão 


Afíimofezafeu  tempo  o 
mefmo  Senhor  ,  &  afíini 
declarou )  que  eíle  fora  o 
íeu  intento,quando  tão  ex- 
preíTamentediíTe  :  Hk  eft 
fanis  de  Calo  defcendem^  ut 
fiquis  ex  ípfa  manducave^ 
rity  notí  moriatur.  De  forte, 
que  não  ha  du  vidajem  que 
ocorpodeChriílo  cómú- 
gado  em  quanto  no  Sacra- 
mento eílà  im  mortal  ,  5c 
impafíivei,  deites  dous  íb- 
beranoíiattributosnos  co- 
munica o  primeiro,que  he 
aimmortalidade. 

244  Sobre  o  fegundo 
porém,  que  he  o  da  impaf- 
iibilidade,íè  recorrermos 
à  experiência,  a  meíliia  ex* 
periencia  parece  que  o  faz 
difficultofo.  De  todas  as 
hiílorias  Eccieíiafticas  co- 
ita, que  no  tempo  dos  Ne- 
ros,ác  Dioclecianos,  quan- 
do os  Chriílãos  erão  tira- 
dos dos  cárceres  ,  ou  para 
adorar  os  ídolos ,  ou  pa^ 
ra  padecer  exquiíitifíimos 
tormentos:  lembrados  da 
fenteaça  de  David  :  ^Vara- 
Jti  in  confpt^u  meo  menfam 


me. 

com  o  Santiílimo  Sacra- 
mento. Aílim  armados  en- 
tra vão  em  tão  perigoías 
batalhas,  aílim  pelejavão, 
aílim  vencião;  masco  tão 
diíferentes  modos  de  ven- 
cer, que  a  mefma  vidloria 
parece  que  punha  em  du- 
vida a  fortaleza,  ôc  virtude 
das  armas.  Hunsmartyres 
caminhavãofobreas  efpi- 
nhas  como  fobre  íloresj 
outros  a  cada  paílb  que  da- 
vãOjlhe  brota  vão  dos  pès 
encravados  tantas  fontes 
de  fangue,  quantos  eraó  os 
efpinhos  :  huns  lançados 
com  pedras  ao  peícoço  no 
mar,  refpiravão  debaixo 
das  ondas,  &  faiáo  vivos  às 
prayas  ;  outros  morrião 
afogados;  huns  veftidos  da 
laminas  ardentes,  ou  me- 
tidos  nas  fornalhas  ,  naó 
lhe  fazia  mal  o  fogo,  ou^ 
tros  ardiãOjSc  íicavão  des- 
feitos em  cinza ;  huns  ex* 
poítos  no  Anfiteatro  aos 
Leoens,6c  Tygres  erão  re-- 
verenciados  das  feras,  ou- 
tros defpedaçados,  8c  co- 
midos da  fua  voracidade 3, 


^dverjus  eos^  qui  trihuUnt    &"  i^mw^ :  {luns  eílejididos 


i 


til 


*^ 


;  ■:  Ir 


2  66  Sermão  do  SmttJJimo 

nosequleos  ^nas  cataílas,  llld  extra  patientlam  eft^ 
nas  grelhas,  riãofe  dosty-  vosfuprapatientiam.  Por- 
raiios,  outros  invocaváo  o     que   Deos    he  impaffivel 


nome  do  Deos  ,  por  quem 
padeciáo,  com  o  qual  na 
boca,  exhallaváo  confian- 
temente a  vida.  Pois  fe  to- 
dos pelejaváo  armados  cô 
o  mefmo  Santiííimo  Sacra- 
mento, como  a  huns  com- 
municava  o  impaflivel 
corpo  de  Chrilio  a  fua  im- 
paílibilidade,  não  confen- 
tindo  que  padeceírem,&:  a 
outros  não  ,  deixando-os 
padecer? 

z^f    Refpondo  y  que 
ahuns,&a  outros  fazia  o 


'm\  I 


por  natureza,  &  vos  felo- 
heis  fuperiormente  pela 
paciência.  No  que  toca  ao 
exceder  a  Deos,falIa  c^ene- 
ca  como  Gentio  >  mas  na 
impafiibilidade  da  paci- 
ência ouçamos  nos  aos  Sá- 
tos Padres.  S.Pedro  Ve- 
ronenfe  poz  em  queílão  fe 
feha  de  chamar  impafíi* 
vel  a  fortaleza,  que  pade- 
ce tão  conftantemente,co« 
mo  fe  não  padecera.  Incer* 
tum  eft  utrum  impajjiòilis 
judie  et  ur ,  cítm  aliquidpaf' 
diviniílimo  Sacramento  fayquafinihilpalfajit^inve^ 
impaíTiveis,  mas  com  dif-  niatur.  Porem  S.João 
ferente  milagres  huns  ím-  Chryfoftomo  fobre  as  pa- 
paíTiveis  pela  impaíTibili-  lavras  de  S.  Paulo  ,  omnia 
dade,  a  outros  impaffiveis  fuffert ,  nao  com  duvida,  i^/v' 
pela  paciência.  Ouçamos     mas  como  propoílção  cer- 

ta,&  evidente,  aírlrma  que 
aque  affim  fofre ,  &  pade- 
ce, jà  tem  paífado  de  ho- 
mem paffivel  àimpafllbi- 
lidadedos  Anjos  :  Tradu^ 
ãus  eft  ddtpfam  yln^elomm 
mpatibílitatê.  Afiim  que, 
ou  porimpafíibihdade  íx- 
zendo  que  não  padeção,ou 
por  paciência  tão  force,  & 


aoMeílrede  húdos  mef- 
mos  tyranos  ,  &:  o  maior 
deli  es,  que  foi  Ncro,Ferte 
fortiter  adverfa :  hoc  e(i  quo 
U^eum  antece datis ,  diz  Se- 
neca:Padecci  forte,&:  con- 
•ílantemente,  advertnido, 
quciílo  he  io  aquillo  cm 
que  podeis  exceder  ao 
meiíno  Deos.  £  porque.^ 


m- 


invencível  como 
padecéraójfazo  corpo  de 
Chriílo  facramentado  im- 
palliveis  aos  que  o  come. 
Ejà  pôde  fer  em  confir- 


3 acr  amento.  26/ 

fe  naó  de  da  Hoftia, por  mínimas, 
&  imperceptíveis  que  fe- 
jaó  jcílà  inteiramente  to- 
do o  corpo  de  Chriílo; 
Perguntemos    agora    aos 


maçáo  da  primeira,  &  de-     Filofofos  quantas  faó   as 
ftafegunda  prerogativa,     partes  da  quantidade?   As 


que  por  iílb  David  diíle  do 
mefmo  Sacramento :  í*/2- 
nemAngelorum  manduca^ 
'vithomo.  Se  os  Anjos  naõ 
confagraó ,  nem  comem , 
nem   podem    confagrar. 


duas  opinioens  mais  cele- 
bres concordaó ,  em  que 
faó  infinitas :  &  fó  diíFerem 
em  que  género  de  infini- 
dade j  porque  huns  defen- 
dem, que  faó  adbualmente 


né  comer  eíle  divino  paó  >  infinitas,  o  qual  infinito  fe 

como  lhe  pôde  convir  o  chama  Categorematico  , 

nome  de  pão  de  Anjos-,  fe-  outros  fó  admitem,que  fe^ 

não  porque  faz    immor-  jãoinfinitas  potencialmé- 


taes,&  impaíli veis,  como 
Anjos,  aos  homens,  que  o 
gomem  ? 

í.    VIL 


O  Sexto,  &  grã- 


^4^ 

^.diflimo  vazio 
da  divindade  do  Verbo  na 
Encarnação,  he  a  infínida- 


te,  o  qual  infinito  fe  cha- 
ma Syncategorematico.  E 
porque  efta  fegunda  opi- 
nião he  a  mais  comum,  6c 
as  partes  que  admite  nelle 
género  de  infinito  naó  po- 
dem fer  menos  infinitas, 
que  as  do  outro,  confor- 
mandomecom  ella,  digo 
aííim :  Infinitum  eft  ,  cujus 


de  com  que,  fendo  por  na-    femper  aiiquid  extra  licet 
tureza  infinito,  fe  fez  fini-     ac cif  ere  \  O  mÇímto^  co- 


to. Mas  também  o  corpo 
de  Chriílo  no  Sacramen- 
to fuprio,  &•  enche  admi- 
ravelmente eíle  vazio. Em 


mo  define  AriíloteIes,he 
aquillo  ,  cujas  partes  por 
mais,&:mais  que  fe  divi-^ 
dáo,fempre  rcílaó  outras 


todas  as  partes  da  quátida-    mais  em  que  í  e  poííà  di  vi 


dir^ 


26^  Sermão  ão 

dir.  Eílando  pois  o  corpo 
deChriílotodo  em  toda  a 
Ho  ília  5  &  todo  em  qual- 
quer parte  dei  ia  por  míni- 
ma que feja,  defendo  po- 
tencialmente na  mefma 
Hoília  tantas  as  partes  da 
quantidade ,  que  por  mais 
quefe  divida  ,  fempre  fe 
pôde  dividir  mais,  6c  mais 
ítm.  fím :  bem  refegue,  co- 
mo concluem  todos  os 
Theologos,queefl:ào  cor- 
po de  Chrifto  no  Sacra- 
mento,naó  finita,  íènão  in- 
finitamente. 

247  E  pofto  que  efta 
verdade  a  não  alcácem  os 
fentidos  5  antes  fe  enga- 
nem nella,em  hum  mefmo 
exemplo  fez  Chrifto,  que 
a  provaíTe  o  gofto  ,  que  a 
apalpaílem  as  niãos,&  que 
a  vitíem  os  olhos.  Deo  o 
mefmo  Senhor  de  comer 
a  cinco  mil  homens  (^  a  fo- 
ra a  outra  multidão  de 
mulheres,  &  mininos,por- 
que  o  feguiáo  a-s:  famílias 
inteiras}  com  cinco  pães 
fomente,  osquaes  crccé- 
rãodc  fortc,que  depois  de 
fatisfeitos  todos,  recolhe- 
rão os  j  Apoíiolos  das  íò- 


SantíJTmo 
bras  doze  alcofas.  Mas  de 
que  modo  creòeo  tanto  ef- 
tepao,  fendo  tão  pouco? 
Frangentis  fragmenta  Juc- 
ceduntyé'fal/untfemperper 
fiaãafrangentes  :  Creceo 
tanto  aquella  quantidade 
de  pão,  fendo  tão  peque- 
na, diz  S.  Hylario  -,  porque 
quanto  mais,  ôc  mais  fe  di- 
vidia, tanto  mais  ,  &  mais- 
fe  multiplicava.    Tom.ou 
Chrifto  o  pão  cm  fuás  fa* 
gradas  mãos,  partio-o,  &j 
quanto  mais  o  partia ,  tan* 
to  mais  crecia  nas  máo5 
deChriftordeo-o  Chrifto 
aosApoftolos,  &  quanto 
os  Apoílolos  mais  o  par- 
tião,  tanto  mais  crecia  nas 
mãos  dos  Apoílolos  :  da-» 
vão-no  os  Apoílolos  aos 
paysjpartião-noos  pays, 
&  tanto  mais  crecia  nis 
mãos  dos  homens :  dav:3  o- 
noos  pays  às  máys,  par- 
dão-noasmãys  ,  &  tanto 
mais  crecia  nas  mãos  das 
mulheres  :   davaó-no  as 
m  áys  aos  fílhos,partiaó-no 
os  íilhos,&  tanto  mais  cre- 
cia nas  mãos  dos  mininos. 
Dcíla  maneira  partiaóto- 
dos,& coméraó  todos:  & 
por- 


Sacramento. 
porque  o  pao  quãto  mais,     ria  para  reparar  na 


&  mais  fe  partia  ,  tanto 
mais,  &  mais  íe  multipli- 
cava 'y  por  iííb  fendo  taó 
pouco,  fobejou  tanto  j  & 
fe  o  numero  da  gente  foíle 
maior  ,  fobejaria  muito 
mais.  Tanto  alEm  ,  que 
quando  os  doze  Apoftolos 
repartirão  entre  fy  o  mun- 
do, fe  cada  hum  levara  có- 
íigo a fua alcofa,  naó feria 
neceflario,  que  os  lavra- 
dores araílem  a  terra,  nem 
femeaíTemjnem  fegaíTem, 
nem  recolheíTem ,  porque 
squellas  mefmasíobrasde 
paó  tantas  vtz^s  partidas , 
partindofemais,  armais, 
baftariaô  a  fuílentar  o  mu- 
do. 

248  E  porque  mnguê 
duvide,  que  do  mais  par- 
tir nafcia  o  mais  erecer  , 
combinemos  elle  milagre 
com  outro  femelhâte.  Em 
outra  occaílaó,  6c  em  ou- 
tro deferto  deo  o   mefmo 


2^9 

diíFe- 
rença  deíles  números  em 
hum,  &  outro  cafo.  No 
primeiro,os  que  comerão  9 
eraó  mais ,  &  os  pães  eraá 
menos  5  porque  os  que  co- 
merão, eraó  cinco  mil,  8c 
os  pães  cinco.  No  fegundoj 
os  que  comi  raó,  erao  me- 
nos, 5c  os  pães  erão  maisg 
porque  os  que  coméraó, 
eraó  quatro  mil,6c  os  pães 
fete.  Logo  por  boa  conta 
parece,  que  mais  havia  de 
fobejãrneíle  fegundo  mi- 
lagre ,  que  no  prímeiroJ 
Qual  foi  pois  a  razaó  por- 
que quando  os  que  come- 
rão, eraó  mais,  &  os  pães 
menos,  fobejou  mais:.6c 
quando  os  que  coméraó^ 
erão  menos  ,  &  os  pães 
mais,  fobejou  menos  ?  A 
razaó  he  manifefta,  como 
eu  dizia,  porque  do  mais 
partir  nafcia  o  mais  erecer. 
No  primeiro  milagre  co- 
mo os  que  comiaò  ,  eraó 


Chriíío  de  comer  a  quatro  mais, 6c  os  pães  menos ,  foi 
mil  ho  mens  com  fete  pães:  neceílario  partir  mais ,  6c 
6c  recolhendofe  também     poriíTocreceoopaómais: 


asfobras  ,foraó  as  alcofas 
que  fe  encherão  fete.  Pou- 
ca Aritmedca  he  neceíFa- 


nofegimdojcomo  os  que 
comiáo,eraó  menos,  6c os 
pães  mais  a  foi  neceíFario^ 


í 


1í' 


270  Sermão 

partir  menos  ,  &  por  ií^o 
eréceo  menos.  Equeper- 
tendeo    Cliriílo   Senhor 
noílb  com  efta  evidencia 
tãofeníivel  aos  olhos,  às 
ináos,&aogofl:o  ?  Egré- 
gia mente  S.  Paulino :  'Po- 
fulos  quíJiquepanibusChri' 
ftus  implevity  ^fur  tentes  fi- 
dem  carnaliterfatians  ^fpi- 
ritualiter  irrigans.   O  mi- 
lagre dos  cinco  pães  foi  o 
prologo  com  que  o  divino 
Meftre  quiz  difpor  os  âni- 
mos dos  homens  para  a 
fé  do  Sacramento  de  feu 
corpo,  do  qual  tratou  na- 
quella  occaíiaò  taõ  larga- 
mente, que  tudo  o  que  en- 
íina  a  Igreja,  &o  mefmo 
Evangelho  que  hoje  can- 
ta, he  hiia  fó  parte  daquel- 
la  doutrina.  Por  iíTo  fez  o 
Senhor  ,  que  o  paó  fendo 
táo  pouco,  feníivel  6cpal- 
pavelmente  creceíTe  fem- 
pre  mais,  &  mais  entre  as 
mãos  dos  mefmos  que  o 
partiaó,para  que  naó  du- 
vidaíTem  crer ,  que  em  taò 
pequena   quantidade  co- 
mo adehúaHoíHa  fe  po- 
dia comprchender  toda  a 
grandeza  fem  fim  de  hum 


do  SantlJJlmo  j 

infinito,  &  que  naó  fó  fi- 
nita, fenaò  infinitamente 
eftava  nella  feu  corpo.  Eíla 
he  a  iníinidade,de  que  diz 
S.  Thomis  :EJfeChriJium 
in  Hojiia  Jemelin  aãu^  i». 
finitiesinpotentia:  porque 
eílando  todo  Chriílo  em 
toda  a  Hoftia,  6c  todo  em 
qualquer  parte  ,  fe  eftas 
aduaímente  fe  dividirem, 
ellarà  também  adrualmen- 
te  era  todas  ,  &  fempre 
mais,&  mais  fem  fim,  por-* 
queonaótem. 

24,9     Sendo  pois  efta 
manifeíla  infinidade  a  cô 
que  o  corpo  de  Chriílo  nô 
Sacramento  fuprioa  infi«# 
nidade  do  Verbo  efcondi-r 
da  na  Encarnação  3  fó  refta 
íliber  (^  o  que  naó  parece, 
fácil )  como  nos  cómuni* 
ca  também  a  nos  a  mefma 
infinidade  ?  Digo  que  nos 
comunica  Chriílo  no  Sa- 
cramento a  infinidade  de 
feu  corpo,  flizendo  que  afr 
fim  como  he  infimco  o 
manjar  ,  que  nosdàa  co- 
mer, feja  também  infinita 
a  fome,  ou  wòs  infinitos  na 
fome  com  que  o  comer- 
mos. O  manjar  fyncatcgo- 
rcmaticè 


D.TK-â 

4.Dift.  . 
lO.q.  I. 

Arr.í. 
explica- 
ras à 
Suario 

Sea.4* 


Sacramento.  lyi 

rematicè infinito , &  a  fo-    ra o  faftio : IniUis  àppeti' 


me  também  infinita  fyn- 
categorematicè.  Texto 
cxprellb  do  Efpirito  San- 
to no  capitulo  vinte  & 
quatro  do  Eccleíiaílico  ; 
^uiéàíintme^  aãhuc  efu- 
rienti  &  qui  bibtmt  me,  ad- 
hucfiúmt,  Chrifto  na  Ho- 
ftia  dà  a  comer  feu  corpo , 
&  no  Caliz  dà  a  beber  feu 
fangue :  mas  o  mefmo  cor- 
po caufa  tal  fome  aos  que 
o  comem,  &:  o  mefmo  fan- 
gue tal  fede  aos  queobe- 


tus  fatunt atem  ,  fatuntas^^^^^B^^^- 

r  /i-  1'  J  V       Homil. 

fajtíammgenerat  :  porem^^in 
nos  do  Ceo  ,  poílo  q  tam-  ^^^"S- 
bem  a  fome  fuccede  o  co* 
nier5&ao  comer  a  farturia, 
à  fartura  naó  fuccede  o  fa- 
ftio,  fenaó  outra  vez  a  fo- 
me:  Iniftis autem  appeti' 
tus  fatunt  atem  ,  faturitas 
appetitum  parit  i  donde  fe  ,  .r^ 
íegue(^conclue  o  Santo)  ;•; 
queaquelle  que  mais,  5ç       1: 
quanto  mais  come  >   eíle 
mais,6c  tanto  mais  fica  fa- 


bem,  ambas  fyncategore-  mmto-.Tantoqueampiiusà 

maticè  infinitas,  que  Òs  'comedenteefurimtur^quan-' 

que  o  comem  ,  quanta  taamplms  ah  efariénte  co- 

ínais,5c  mais  comem,  tan^  meduntur.  Notai  a  repeti- 

tomais,  &  mais  defejao  çáo,&conexa6dehum,âc 

comer-,  ^ui edunt  me  ,  ad^  outro  ampãus  :  amplius  ab 

huçefunent\  &  os  que  o  ba-  efuriente^  amplius  à  cút^^ 

Í)em,quanto  mais,  &  mais  dente -.  mais  o  que  come,.^ 


bebem,tanto  mais,&  mais 
deíè jaó  beber:  Er  qui  bi^ 
hmtme^aãhucjltient. 

2fo  Naó  feria  o  divi- 
no Sacramento  manjar  do 
deo  ,  fenaó  caufára  eftes 
cífeitos  taó  contrários  aos 
da  terra.  Nos  manjares  da 
terra  [diz  S.  Gregório]  à 
fome  fuccede  o  comer,  ao 
comer  a  fartura,  &  à  fartu* 


mais  o  que  tem  fome,  por- 
que a  comida  V&  a  fome 
fucceífíva  ,  &  reciproca- 
mente fe  caufaó  húa  a  ou^ 
tra.  E  defte  mais,  8c  mais 
quecrecendo  fempre  naÒ 
pôde  ter  fim  ,  fe  forma  o 
in^nitodos  que  aílim  co- 
mem .*  porque  como  ao 
mais,&:  mais  da  fome  íe  fç- 
guéomais,  6c  ma;is  da  far- 


i 


272 


Sermão  do  Sanfifjlmò 


mtnquam dicit^fufficit '.  Sc  ^'o^j? 


como  a  matéria  do  Altar 
era  inconfumptivel  ,  Sc  o 
fogo  que  delia  fe  fuftenta- 
va,  inlàcia  vel  j  nem  o  infa- 
ciavel  do  que  comia ,  nem 
o  inconfumptivel  do  que 


6.11 

Marc 


tura,&ao  mais,  &  mais  da 
fartura  o  mais,  &  mais  da 
fomcj  ou  eíles  fartos,&  fa- 
mintos haó  de  deixar  de 
comer,oufe  comem.,  haó 
de  continuar  mais,  Sc  mai^ 
infinitamente.  O  milagre 

do  deferto  teve  fím;  por-  fe  dava  a  comer  podiao 
quefobejouo  paó,  Ôcfal-  deixar  de  fer  perpétuos:/» 
•touafome.-fobejouopaó:  Altarifemper  ardebit.  Fi- 
joann:  Supevaverunt  fragmenta  :  nalmente  efte  era  o  my  íle- 
faltou  a  fome  :  Saturati  rio  que  depois  fe  verificou 
funt.  Mas  no  milagre  do  no  Sacramento  do  Altar, 
Sacramento,  nem  o  paó  aílim  quanto  ao  corpo,  co- 
pôde  fobejar,  nem  a  fome  mo  ao  fangue  de  Chrillo  i 
faltar.  A  fome  naó  pôde  porque  fendo  os  que  o  co- 
faltar  ;  porque  nafce  do  mem  infaturavelméte  fa- 
paó:  Bco  paó  naó  pôde  fo- 
bejar; porque  a  mefma  fo- 
me que  delle  nafce,  o  co- 
me. Eporiílb  nem  o  mi- 
lagre, nem  a  fome,  nem  o 
paó,nem  os  que  o  comem 

podem  chegar  jà  mais  a  efiirient-ièrqui  hwumme 
ter  fim  ,nem  a  deixar  de  adhucfitient. 
participar  por  efte  modo 
o  modo  de  infinidade,que 
«corpo de  Chriílo  tê  no 
Sacramento.  No  feu  Altar 
mandava  Deos,  que  fem- 
preardeíTefogo  :  Ignis  in 
Altari  femper  ardcbit.  E 
porque  >  Porque  o  fogo 
nunca  diz  ,  balta  ;  Ignis 


I^evit 


mintos,&:  os  que  o  bebé, 
infaciavei  mente  fcquio- 
fosjnem  aos  que  comem 
pôde  faltar  jà  maisa  fome, 
nem  aos  que  bebem,  a  ih" 
de :  §lut  edunt  me ,  aahtic 


§,  Vill. 


25-1 


Final  mete  o  ul- 
timo a  ttribu  to 
de  que  o  Verbo  fc  defpio , 
veílindofedcnofili  carne, 
foi  a  inviíibilidadc  divi- 
na, fazendoíc  de  invifivel 

Vifl. 


Joann. 
M4- 


Sacramento.  273 

He  o  que  diíle  o  propriedades  da  divinda- 
de exinanida,  riaõ  ío  as  re- 
cupera em  ÍY  Ghriííro  fa- 
cramentadO)  mas  também 
nolas  comunica  a  nòsi  co- 
mo fe  pode  verificar »  ou 
provar  no  attributo  da  in* 
vifibilidade?  Sefora  nou- 


viíivel 

Profeta  ^2imc\v\Tõft hac 
in  terris  vifus  efi  ,  &  cum 
hominibus  converfatus  eft : 
6cporiflb'  omefino  Evan- 
gelifta  S.  João  tanto  qxie 
diíle;  Ver  bum  carofaãum 
eH  j  ajuntou  logo  5  &  "vidi- 


mus  gloriam  epts ,  gloriam  tro  lugar  3  féria  diíHculto  - 
quafi  Vnigeniti  à  ^atre.  fo;nefteem  que  eílamos> 
Mas  fe  o  V  crbo  veftindo- 
Iç  de  corpo  humano  ,  &r 
fnanifeftandofe  a  noííb^ 
olhos,  de  invifivel  fe  fez 
viíivel  j  o  mefmo  corpo, 
para  recuperar  a  inviílbi- 
lidade  perdida  na  Encar- 
nação, depois  de  viílvel^^ 
6cviílc>,encobrindofe  ou- 
tra vez  aos  noííbs  olhos, 
fe  tornou  a  fazer  imiíxvcl 


he  evidente. 

2  f  5  Fallando  a  Efpo» 
fafanta  de  Chrifto  facra'-: 
menta  do,  diz  que  eftà  en- 
cuberto,  &  in  viíivel  de- 
trazdaquella  parede  dos 
accidentes:  En  ipjejíatfoft  cant. «: 
parietem  noHrum.  Amm^- 
entendem  efte  lugar  com- 
mummente  os  Interpre- 
tes.    Olhai    agora    para 


no  Sacramento,  Efta  pri-  aquella  parede^  ôc  paraef- 

meira  parte  do  noífo  af-  tas  paredes.  Detraz  da- 

fumpto  naó  ha  miíler  pro-  quella  parede  eftà  o  Eípo- 

vaj  porque  a  invifíbilída-  fo:  dentro  deitas  paredes 

de  fó  fe  pôde  v  er,naõ  ven-  eftaó  as  Efpofas :  alli  o  Ef- 

do,como  nòs  naó  vemos  pofoinvifivel,aqui  as  Ef- 

ao  mefmo  Chrifco  ,  que  pofas  também  inviíivei^. 

cremos,  &  adoramos  pre-  Que  maior,8c  mais  eílreita 

fente,mais  fírmcméte,  que  invifíbilidade,  que  aquellà 


tS^  fe  o  viramos.  Mas  a  fegu- 

da  parte  do  mefmo  af^ 

fumpto  ,  em  que  atègora 

moítramosjque  as  mefmas 

Tom. 7. 


que  naó  por  hum  dia,  nem 
por  muitos  )  íenaô  para 
fempre  fe  negou ,  &  fe  ef- 
condeoaos  olhos  domun- 
S    '         àoi 


jLevit, 

A  6.  2. 


Aaor. 

»9. 


ÍBI  i  i 


^4  Sermão  do  Santiffmo 
do? Talhe  a  invifibilida-  moveí,&  immudavel  E 
dedeChnítono  Sacra-  eíle  he  o  modo, &  encerra- 
mento, &  tal  a  das  Efpofas  mento  perpetuo  com  que 
domefmo  Chrifto.  EíTa  naquella parede,  &neftas 
he  a  grande  energia  com  paredes  o  Erporo,&  as  Ef- 
que  a  Eípofa  chamou  pa-  poías  eftaó  para  fempreef- 


redeàquellcs  accidentes: 
¥oft  parietem  noftrum.  Po- 
deralhe  chamar  véojpode- 
ralhe chamarnuvem.  No 
Templo  de  Jerufalem  o 
que  fazia  inviíivel  o  Pro- 
piciatório em  queeftava 
figurado  Chrifto^era  o  véo 
que  cobria  o  Sanda  San- 
ítorum :  SanBtiarhtm  qitod 
efi intra  velum:  no  monte 
Olivetea  que  também  ti- 
rou dos  olhos  dos  Difcipu- 
losaomefmo  Chrillo  fu- 
bindo  ao  Ceo,  foi  húa  nu- 


condidas  aos  olhos  huma- 
nos. 

2f4.     O  Profeta  Ifaias 
fallando  com  Chriílo  no  írai.45-. 
Sacramento,  diz  :  l^ere  tu  '^* 
es  'Deus  abfconditus^  D  tus 
IfraelSahator.  Verdadei- 
ramente, Senhor,  vòs  fois 
Deos  efcondido ,  Deosef- 
condidojôc  Salvador.  E 
fallando  do  myílerio  da 
Encarnação,  diz  que  aef- 
condida  conceberá :  Ecce  |^^'-7* 
abfcondttacoricifíet.  i^ílim  Tert; 
fe  lènoOngmalKebreOj^"'' 


vem :  Et  mbesfafcepit  eum     em  cuja  lingua,efcondida, 
abocuhs  eorum.  Pois  fe  os     &  Virgem,  tem  omelmo 


accidentes  daquella  Ho 
ftia  faó  os  que  nos  tiraõ 
dosolhos,&nos  fazem  in- 
vifivelo  Efpofo  facramê- 


íignifícado.  Chriílo  Deos 
efcondido  no  Sacraméro, 
&  as  Virgens  confagradas 
aChriílo  ,  efcondidas  na 


tado  i  porque  lhe  naó  cha-  Encarnação.  Nem  he  ma- 
ma a  Efpofa  véo,ou  nuvé ,  ravilha,  que  debaixo  deíle 
íenáo  parede ,  pojlparieté  >  fagrado  nome  jà  entaó  fof- 
Porqueo  véopòdefe  cor-  fe  exemplara  Virgem  das 
rer,&:anuvempodefemu-  Virgens  às  que  depois  a 
dar  -,  porém  a  parede  hc  haviaó  defeguir  .-^^^//c^- 
impedimento  íixiuc  ,  im-  tíir  RegtVtrgiuespoJt  eam. 

£  poi§ 


Sacramenta.  ijs 

E  pois  eílamos  no  ultimo    fto5&:  efcondida  em  Deos : 


attributo  da  divindade  re- 
ciif>erado  por  Chriílo  no 
SacramentOjSc  comunica- 
do a  eftes  generofos  1^  fpi- 
ricos,  que  por  feu  amor  em 
corpo  íè  iizeraó  i  n  viíi  veis$ 
que  lhe  poílb  eu  dizer  por 
fimjfenaóo.quelhe  dizS. 
CoioíT  Paulo  :  Mortui  eftis  5  &  ví- 
^  ^  •  ta  vefira  abfcondita  eft  cum 
<2hriJÍ0yin'T>eõ:B,9c2ls  mor- 
tos,diz  o  Kpo\\:o\o^  Mortui 
eftis-y^  não  diz  demaíia- 
doj  porque  hua  vida  en- 
cerrada entre  quatro  pare- 
des, nem  vifta  ,  nem  viíi- 
vel  5  que  outro  nome  Ih^ 
vem  mais  próprio ,  que  o 
de  morta,^:  fepultada?  Af- 
fim  encareceo  Job  o  eíla- 
do  da  Tua  fepultura  j  naó 
tanto  pelo  enterradojquá- 
íopeloinviíivel  :  Nec  af- 
loh.-^.í.píciet me vifiis  hominis :  nê 
meveráójà  mais  os  olhos 
dos  homens.  Mas  poíto 
que  eílavoíTa  vida  por  ef- 
condida, &:  inviíivel  pare- 
ça aos  outros  morta5Sc  fe- 
pultada  5  coníiderai-vos 
para  voiTa  confolaçaó,  on- 
de eftà  efcondida,  Sc  com 
quem ;  efcondida  có  Chri- 


Et  njita  veftra  ahfco7idita 
eft  cum  Chrifto  m'T>eo.  Eftà 
efcondida  com  Chriílo, 
porque  também  Chriílo 
eílà  efcondido  no  Sacra- 
mento V  &  eílà  efcondida 
em  Deos  ,  porque  quanto 
mais  retirada  dos  olhos 
humanos, tanto  mais  fenaó 
tiraò nunca  delia  os  olhos 
divinos.  E  fendo  eíla  taò 
grande  confolaçao  ,  ainda 
he  maior  a  com  que  con- 
clue  S.Paulo;  C^^^C^rz/^/z.f  CoioC 
apparuerit  vita  veftra^tunc  ^•^' 
^vosapparebitis  cum  ipfo 
inglória'.  Chriílo  que  ago- 
ra he  a  voíTa  vida  ,  &  alli 
eílà  como  vos  inviíivel,& 
efcondido,virà  aquelle  dia 
ultimo,  em  que  ha  de  apa- 
recer, 8c  fer  viílo  de  todo  o 
mundo:  &entaó  também 
vòs  haveis  de  aparecer,  & 
veráó  os  olhos ,  a  que  ago- 
ra vòs  negais,  quã  precio- 
fo  he ,  &  quam  agradável 
aos  divinos, que  fó  vos  vê, 
o  inviíivel  deíla  voííà 
claufura ;  porque  aílim  co- 
mo agora  imitaíles  aChri- 
ílo  na  fua  inviíibiíidade , 
aíHm  elle  vifivelmente 
S  i]  nos 


i 


27<^  Sermai 

nos  olhos  de  todo  o  mun- 
do vosha  de  coroar  com  a 
fuamefma  gloria  :  Et  vos 
apparebitiscum  i^fo  ingló- 
ria, 

§.  IX. 


BEm  acabava 


iJaqui  o  Ser- 
ma6:masemdia,  &foIê- 
íiidade  taó  univerfal,obri- 
gaçaóheprecifa,  que  di- 
gamos húa  palavra  para 
todos.  Se  o  corpo  de  Chri- 
ílo  no  Sacramento  enche 
os  vazios  da  divindade, 
quanto  mais  facilmente 
encherá  os  da  noíía  nçccf- 
iidade  ?  Tudo  Deos  criou 
vazio  ,  mas  logo  encheo 
tudo.  Vazia  criou  a  terra: 
Cenef  Terra  ãut em  erat  inani s^à" 
'vacuã}  mas  logo  a  encheo 
por  dentro  de  thefouros,6c 
porfóra  de  plantas,6c ani- 
ma es:  vazio  criou  o  Ceo; 
mas  logo  o  encheo  por  dé- 
trode  Gerarchias,  &  por 
fora  deSol,Lua,  &  Elirel- 
«  las :  vazio  criou  o  mar,  &  o 

ar-,  mas  logo  encheo  o  ar 
de  táta  variedade  deaves> 
&c  o   Kiar  de  taó  ^rniiaiu 


>  do  Santijflimo 
multidão  de  peixes  :  va- 
zios criou  aos  primeiros 
homens  como  vafos  ^e 
barro  j  mas  logo  os  encheo 
dejuíliça  original  ,  &  de 
tantos  outros  doces, &  gra- 
ças. Taó  natural  he  à  ái'- 
vina  bondade,  que  foi,  he, 
6c  fera  femprc  a  mefma  , 
encher  os  vazios  de  íuas 
criaturas :  &  aflim  enche- 
rá os  da  noííli  necellidade> 
&  pobreza ,  muito  melhor 
que  o  óleo  de  V'  lifeo  ,  por 
muitos  que  fejáo,  vaja  va^  ^.R<?gf 
cua  non  pa-iica.    Antigua-  '^^* 
mente  na  JeV)  que  era  de 
rigor,  mandava  Deosque 
ninguém    apareceíTe   em 
íua  prefença  com  as  mãos 
vazias :  Non  apparebis  in  ^^"^ 
confpeEiu  mco  vacuus  :  po-  ^^'^^' 
rèm  hoje  que  eílamos  na 
Ley  da  Graça,  a  todos  nos 
exhortao  mefmo  Senhor, 
quenaó  fó  lhe  prefcnte- 
mos  vazias  as  mãos,  fenao 
tambem,&:  muito  mais,os 
coraçoens  ,&  os  dcfejos, 
para  nolos  encher  abun- 
dantiífimamente   do  que 
elle melhor fabe  dar,  que 
nòs  pedir.  Quando  os  Ir- 
mãos dejofeph  furão  btif- 
çar 


Sacramento.  277 
car  paó  ao  Egypto  ^  todos  2  f^  Mas  he  tanta  (de 
levavaóos  faccos  vazios,  quem  me  queixarei? ^  ^ô 
&  todos  os  trouxeraó  tanta  a  fraqueza  da  noíTa 
cheosj&ríellesjuntamen-  fé,  &ta5  poucaaeftima- 
te  o  preçoj  porque  eíle  à^v-  ça5,que  fazemos  dos  bens; 
vino  pao ,  que  naqueJle  fe  do  Ceo,  que  nem  de  graça 


j'eprerentava  5  era  paò  de 
graça.  E  depois  que  Deos 
peio  beneficio  da  Encar- 
nação fe  fez  Irmaó  noíío , 
naó  íèria  taó  bom  Irmão 
como  Jofeph,  fe  recorren- 
do aos  ceileiros  de  fua  li- 
beralidade, que  no  mefmo 
paóeftaô  encerrados, nos 
naóderpachaífe  cheos,  & 
ricos  de  tudo  o  que  a  noíla 
íieceííidade  lhe  prefen- 
tafle  vazio.  Chegai,  che- 
gai (^  diz  S.  Thomás  A  rce- 
bifpo  de  Valença)  chegai, 
naó  aefta  fonte  ,  íènaó  a 
efte  oceano  immenfo  de 
graças  ,  que  a  todos  eílà 


os  queremos.  Oavi  o  que 
diz  a  femelhantes  Almas 
ate  hu 111  Poeta  Gentio :  O 
cuTvas  animas  htnninum^ 
ér  caleftmni  inanes  \  Oh 
Almas  dos  homés  taò  bru- 
tas,&:  irracionaes  como  as 
dos  mefmos  brutos  :  í*^^^- 
i;^5"5porque  fempre  andais 
encurvadas ,  &  inclinadas 
para  a  terra,  &  por  iíTo  va- 
zias dos  bens  do  Ceo  ,  & 
caleftium inanes  \  Por  mais 
que  húa  Alma  foíTe  fenho- 
ra  de  toda  a  terra ,  6c  defde 
a  terra  ao  Ceo  fenhora  de 
todo  o  mundo  >  fempre  fi- 
caria vazia,porq  fó  Deos  a 


expofto,  a  todos  defeja ,  a     pôde  encher.  E  tendo  nos 
todos  chama,a  todos  efpe-     a  Deos  tão  perto,  quantas 


ra  ♦,  &  por  maiores  ,  &  de 
maior  fundo  que  fejaó  os 
vazios  de  voíla  neceíllda- 
de,  cada  hum  encherá  os 
íeus  atè  naó  poder  levar 


Almas  ha  indignas  deíle 
nome,quefe  naó  chegaó  a 
elle,fenáo  por  força  ,  &  a 
mais  naó  poder  deanno 
em  anno  ,^   EUe  chanoufe 


mais.  Oceanus  eft  gratiarú  paó  de  cada  dia,  para  que 

immenfus  ,  vasfuum  (^uif"  todos  os  dias  o  comeílc- 

gmadfummumreflet^  mosj  como  faziaó  ospri- 

Tom./.  S  iij        meiros 


i 

li 

'  ' "  -''■ 

,■■        ■; 

'■''■. 

1    '4^ 

u 

1^ 

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BvB^H 

\í' 

V^iB^H 

Pii 

■  *'^fifiíí 

1      vÊW 

1    'Mi 

■278  Sermão  do 

meiros  Chrií]:áos:8c  fomos 
chegados  a  tempo  em  que 
fe  tem  por  grande  chriítã- 
àoAQ  5  &  devação  comun- 
gar todos  os  mefes.  Que 
bem  compete  aos  que  nem 
ifto fazem,  as  palavras  de 
Job  ISic  é^ego  habni  men- 
]ob.y. ,.fes  vácuos.  Devendo  fer  os 
diascheos,arèos  mefes  faó 
vazios.  PaíFafe  hum  mez, 
&  outro  mcz,  paíFafehum 
JiibileOj&:oucroJubileo,ac 
nem  a  importância  da  gra- 
ça, nem  a  cóveniencia  das 
graças  (^como  fe  naò  ou  ve- 
ra fé, nem  outra  vida  ;  co- 
mo fe  naó  ouvera  inferno, 
nem  Purgatório}  nos  per- 
mitem os  vicios  j  de  que 
eílâo  cheas  as  nofilis  Al- 
mas,que  por  meyo  da  con- 
triçáo,&  coníiífao  as  pre- 
fentemos  àquella  fagrada 
mefa  vazias. 

2  f7  Vazias  aífim  dos 
peccadosasnoíílis  Almas, 
ffc fomos  Chriftãos,  ou 
daqui  por  diante  oquere- 
'mos  fer Jo  que  deve  procu- 
rar cada  hum  de  nos  com 
verdadeira  refolução,  fiô 
duascouíasraprimcirajen- 
cher  a  Alma  com  a  graça , 


Santiffimo 

para  que  naó  eíleja  vazia: 
afegunda,  encher  a  graça 
com  obras  chriftáas  jpara 
que  perfeveremos  na  mef- 
ma  graça.  Qual  he  a  razaó, 
ou  defeito,  porque  os  que 
fe  confeífaó,&:  cómungaô, 
&  fe  põem  em   graça  de 
Deos ,  naó  perfeveraó  na 
graça  muitos  dias,  &  tal 
vez  no  mefmo  dia  a  per- 
dem >  A  razão,&  o  defeito 
hej  porque  ainda  que  en- 
chemos   a    Alma   com  a 
graçajnáo  enchemos  a  gra- 
ça com   as  obras  ,  fem  as 
quaesclla  naó  pode  per- 
manecer. Confideremos, 
&pefemos  bem  o  que  diz 
S.  Paulo  de  fy,  &  o  que  nos 
aconfeiha  a  nos.  O  que  nos 
aconfelha  o  Apoftoio,  que 
foi  ao  Ceo,  &  tornou  ,  he, 
que  não  tenhamos  a  gra- 
ça vazia  :  Ne  in  "vaciium  , 
gratiam  T>ei  recipjatis :  & 
o  que  nos  diz  de  Íy,he5que 
a  graça   que  recebeo   de 
Deos,  nunca  a  teve  vazia, 
&■    por  ifío   permaneceo 
femprenella  ;  Grar/a  tjus 
in  nie  ia  ena  non  fuit ,  fcd 
gr  aí!  a  (jiisfempcr  in  me  ma- 
net.  Sendo  a  graça  tàò  con- 
traria 


Ó   I. 


I  Cor. 
r-T  10. 

c!cí: 


mk 


iBfei 


Sacramento.  27P 

traria  à  natureza  ,  fó  nifto     vácua nonfult:  ta mbem  fá- 


íe  parece  a  natureza  com  a 
graça  ,  ou  a  graça  coma 
natureza.  A  natureza  de 
nenhum  modo  admite , 
nem  permite  vácuo  ,  don- 
de naíbeo  ò  Proíoquicí^ 
KondãiuT  i)acmm  m  r-e- 
rum  natura.  E  eíTa  he  a  Fi- 
loíbfia,  porque  nos  ele- 
mentos, &  mixtos,  ou  ef- 


rà  em  nòs  como  nelle  fem- 
pre  permanente  5  Etgra^ 
tia  ejus  femper  in  me  ma^ 
net. 

25-8  E  fe  me  pergun- 
-tais  como  eferà  a.  graça 
fempre  cliea,  &  inunca  va- 
zia ?  Refpondo  ,  que  en- 
chendo os  vazios  que  na 
Alma   Gccupavao  os   vi- 


pontaneamente  5  &  porfy     cios,  primeiro  có  os  aélos, 
mefmasjou  obrigadas  da     &  depois  com  os  hábitos 


arte  ,  vemos  tantos  eíFei 
tos  ,  que  parecem  mila- 
grofos,  &  verdadeiramen- 
te faó  naturaes.  Vemos  fu- 
bir  a  agua,  &  a  terra  5  ve- 
mos decer  o  ar,  &■  o  fogo, 
vemos  róperemfe  os  már- 
mores, Sceílallaros  bron- 
zes ,  tudo  por  acudirem  a 
impedir  o  vácuo  ,  ou  va- 


das  virtudes  contrarias. 
Em  lugar  da  foberba  entre 
emnofías  Almas  a  humil- 
dade, em  lugar  da  intem- 
perança; entre  a  pureza , 
em  lugar  da  envejaa  ca- 
ridade, em  lugar  da  ira  a 
maníidaó,  em  lugar  da  gu- 
la a  fobriedade,  em  lugar 
da  ambição  o  defprezo  do 


zio  5  o  qual  fe  ouveíTe  na     mundo,  em  lugar  da  Vm^ 
natureza ,  pereceria  o  mu-     gança  o  perdaó  das  inju- 


do.  O  mefmo  aconteceria 
(^  &  acontece  }  à  graça ,  fe 
nella  ouveíTe  vácuo:  &  por 
iíTo  o  devemos  reíiftir  com 
todas  as  forças :  Me  in  va- 


nas,  em  lugar  do  ódio  o 
amor  do  próximo  ,  ainda 
que  feja  o  maior  inimigo  ; 
finalmente  em  húa  pala- 
vra, por  mais  que  a  natu- 


cuumgratiam  "Dei  recipia-  reza  corrupta  ,  &  mal  ha- 
tis.  Se  a  graça  em  nòs  nun-  bicuada  repugne,  que  o  ai  - 
ca.eftivervaziajcomo  em  to,& leve deça,& o  baixo, 
§.Paulo ;  Gratia ejus  in  me    &  pefado  fubá:  porque  de- 

S  iiij       Ha 


2  8o  Sermão  do 

íla  maneira  nos  confor- 
maremos com  todo  o  ex- 
emplar do  noíTo  aíTump- 
tOi  imitando  a  Deos  na 
Encarnação,  que  deceo  a 
tomar  condiçoens  de  cor- 
po,&aChrifto  no  Sacra- 
mento, cujo  corpo  fubio  a 


Santiffimo 

participar  os  attributos  de 
Deos,  os  quaes  nòs  tam- 
bém gozaremos  eterna- 
mente na  mefa  da  Gloria 
por  graça  do  mefmo  paó, 
que  para  nòs  fubirmos  de- 
ceo do  Ceo :  Hic  eftpanis^ 
quideCalodefcendit. 


SER- 


28l 


cia fi^-!ri) «falia lia  stlcíactllfeííal^ 

f  f  f  ^f  ff  ¥f  f  f -^  t  f  #f  f 'f  *  f  t" 

SERMAM 

DE 

S  GONÇALO 


*JV  venerit  infecunda  'vigiUa^&fim  tertiavigilia^eneritf 
&itamvenerit  ykeatífunt fervi illi.  L.uc.12. 


§.i. 

Nde  ha  muito 
i||(gi|em  que  eleger, 
L^^iR  n-aó  pôde  haver 
:  Vrwi®  pou  CO  íbbre  qu  e 
duvidar.  Celebra  hoje  a 
noíTa  devaçaó  hum  Santo, 
fobre  cujo  ellado  duvida- 
rão os  Hiftoriadores  ,  fo- 
bre cuja  profiíTaó  duvidou 
^llemeímo,  &  fobre  cujas 
grandezas,  para  eleger  as 
maiores,  eu  fou  o  que  mais 
duvido,  DuvidáraposHí-^ 


ftoriadores  fobre  p  íeu  ej^ 
tado^porquehunso  fize- 
raó  da  Jerarchia  Clerical , 
como  filho  de  S.  Pedro | 
outros  da  Monaílica ,  co- 
mo Monge  de  S.  Bento } 
outros  da  iMendicantejCO- 
mo  Religiofo  de  S.  Do-» 
mingos  :  controverfía  era 
que  he  mais  glonoía  a  du* 
vida,  que  a  decifaó.  Aíllm 
duvidarão  ,  &■  contende- 
rão as  mais  nobres  Cida- 
des da  Grécia  fobre  qual 
foife^ououveffeíidoa  Pá- 
tria 


2S2  ^. 

tria  do  famofo  Homero. 
Duvidou  o  mefmo  Santo 
fobre  qual  feria  a  profííílió 
em  que  Deos  mais  fe  agra- 
daria que  elle  o  ferviífe: 
porque  naó  baila  fervir  a 
Deos  ;  mas  he  neceílàrio 
ft:rviIo  como  elle  quer.  E 
como  neíle requerimento 
empenhaíTe  muitas  horas , 
&  muitos  dias  de  fervoro- 
faoraçaó,&,porque  jà  era 
Sacerdote>  muitos  facriíi- 
cios  ;  finalmente  lhe  ref- 
pondeo  o  divino  oráculo, 
que  fe  dedicaíTe  a  feu  fer- 
viço  naquella  Religião, 
em  que  fe  dà  principio  aos 
Officios  Divinos  pela  Ave 
JVlaria.  Com  efte  indicio , 
no  qual  era  íignifícado  cla- 
ra mente  o  fagrado  Inftitu- 
todos  Pregadores,  refol- 
veooSanto  a  fua duvida: 
&comomefmoefpero  eu 
refolver  a  minha.  Para  dar 
pois  bom  principio  ao 
noíTo  difcurfo  ,  antes  de 
faber  ,  nem  propor  qual 
ha  de  fer,comecemos  tam- 
bém faudando  a  Máy  da 
graça  ,  &  digamos  A^ve 
Maria, 


nnao  de 


í.  II. 


s; 


■venerit  infccuda  vigília^ 
&fun  tertia  vigilia  vene-  * , '• ' '» 
rity  beatijunt  fervi  tUi:     ^  ' 


DUvidofo  eu  5 


26o    .      ^ 

&  muito  du- 

vidoíb,  como  dizia,  entre 
as  grandezas  do  no íib  San- 
:to,para  eleger  ,  Sc  pregar 
dcUeas  mais  admiráveis, 
fobre  efta  minha  duvida 
encontro  no  Evangelho 
có  outra  maior.  Diz  Chri- 
fto  Meftre  divino  ,  &  Se- 
nhor noíTo  5  que  os  fervos 
que  elle  achar  vigilantes, 
ou  venha  na  fegunda  vigia 
da  noite,ou  na  terceira^ef- 
fesfaóos  Bemavéturados. 
A  fuppoílção  ,  &  fraíi  he 
niihtar;  porque  jà  os  fol- 
dados  naquelle  tempo  di- 
vidiaó  a  noite  em  quatro 
vigias  ,  de  cujo  numero 
perfeverahojeonome  de 
fe  chamarem  quartos.  E 
porque  a  nofla  vida,  como 
dizJob,he  milicia,&  nefte 
mundo  vivemos  às  cfcu- 
ras,ou  com  pouca  luz  co- 
mo denoitCj  divide  o  Se- 
nhor 


^.v 


mmm 


S.Gonçãto.  iS^ 

nhor  a  mefma  vida  do  lio-     dos  miniiios^  ainda  os  naó 


meni  em  quatro  partes 
com  nome  de  quatro  vi- 
gias. A  primeira  parte,  ou 
idade  he  a  de  minino,  a  fe- 
gunda  a  de  manceboja  ter- 
ceira a  de  varaója  quarta  a 
de  velho.   Suppoílo  pois 


tenta  o  mundo ;  na  ultima, 
quehea  dos  velhos  jjà  os 
não  tenta :  &  a  virtude  fem 
batalha,  que  nos  mininos 
he  innocencia ,  6c  nos  ve- 
lhos defengano  ,  quanto 
mais  eftà  em  paz ,  &   fora 


queeílas  partes,  ou  idades     da  guerra  ,  tanto  menos  té 
nocurfoda  vida  humana     de  vidoria,&  de  folida ,  & 


faó  quatro,  porque  deixa  o 
Senhor  a  primeira,  &  a  ul- 
tima, Seio  fazmençaó  da 
fegunda,&  da  terceira  ?  Si 
venertt  i?i  fecunda  vigiliay 
&Jii?i  tertia  ^vigília  vene- 
rit?  A  razaó  natural  quan- 
to às  vigias,  he,  porque  na 
fegunda,  &  na  terceira  he 
mais  carregado  o  íbno, 
mais  trabalhofa  a  refiílen- 
cia,&mais  difficuitofa  a 
vigilância.  E  quanto  às 
partes  ,  ou  idades  da  vida 
neta  mb  em  a  mefma  ,  ou 
•femelhante  -,  porque  na 
idade  de  mancebo  ,  &  de 
varaó ,  aílim  como  as  ten- 
taçoens  faó  mais  fortes,  af- 
íim  he  mais  trabalhofa  a 
•reíiílencia  dos  vicios  ,  & 
niaisdiflicultofa  a  obfer- 
vancia  das  virtudes.  Na 
primeira  idade  ,  que  he  a 


forte  virtude. 

2 dl  S.  Gregório  Na- 
zianzeno  concordando  ef- 
te  texto  com  a  Leyem  q 
Deos  nos  manda  que  a 
amemos  ,  da  outra  razap 
igualmente  própria,  &  na- 
tural, mas  muito  maisfu- 
blime;  T>iliges  T>omlnum  ux^^^^, 
l^eum  tuum  ex  totó  cor  de  -"• 
tuOi  &  ex  tota  anima  tua^  ò* 
ex  omnibus  viribus  tuis^  C^* 
ex  omni  mente  tua.  Amaras 
a  Deos  teu  Senhor  com  to- 
do o  teu  coraçãOjCom  toda 
a  tua  alma,  com  todo  o  teu 
entendimento,  5c  com  to- 
das as  tuas  forças.  De  forte 
quedeílas  quatro  partes, 
ou  deftes  quatro  todos  ha 
de  conftar  o  amor  deDeos, 
para  fer  legitimo  de  todos 
CS  quatro  cofiados.  Amor 
de  todo  o  coraçáo^anior  de 
toda 


ni 


r'.t' 


2S4.  Si 

tocia  a  alm.ij  amor  de  todo 
o  entendimento,  &  amor 
de  todas  as  forças.  Poisef- 
ta  he  a  razáo,porque  Chri- 
ílofó  falia  da  fegunda,  Sc 
da  terceira  vigia, &  naóda 
primeira,  nem  da  quarta: 
£  porque  fó  chama  Bem- 
aventuradosaosda  fegun- 
íiaj&  terceira  idade  ,  que 
faó  osmancebos5&:  osva- 
roens,  &  naô  aos  da  pri- 
meira,&  da  quarta,que  faó 
osmininos  ,&  os  velhos? 
Sim  5  Sc  clariílimamente. 
Porq  Deos  quer  Ter  amado 
não  lo  com  todo  o  cora- 
ção 5  &  com  toda  a  alma, 
fenaó  também  com  todo  o 
entendimento,  &  com  to- 
das as  forças :  &  pofto  que 
osmininos,  &  os  velhos  té 
coração,  &  tem  alma  5  os 
mininos  ainda  não  tem 
cntendimêto,  &os  velhos 
jà  naó  tem  forças  :  logo  fó 
os  da  fegunda ,  &  terceira 
vigia,  fó  os  mancebos,  Sc 
os  varoens  podem  amar,& 
fervir  a  Deos  com  todas 
as  quatro  partes,  ou  todos 
os  quatro  todos  do  intei- 
ro,&  perfeito  amor  :  com 
fodo  0  CQraçáQaí'^'  íoto  cor' 


de :  com  toda  a  ai  ma ,  ex  to- 
ta  anima-,  com  todo  o  ç^n- 
tcv^CwmzritQ^extota  mente-. 
com  todas  as  forçasjí  a"  om- 
nibus  viribus. 

261  Entendido  afllm 
(^  pois  aíTimfe  deve  enten- 
der^  o  Evangelho ,  parece 
queelleporfy  mefmo  nos 
tem  jà  dividido  o  difcurfo 
em  duas  partes,  &  que  íè* 
gundo  ellas ,  devemos  tra» 
tar  das  duas  principais 
idades  do  noíTb  Santo:  a 
fegunda,  que  nos  mance- 
bos heílorente,&  a  tercei- 
ra,que  nos  varoens  he  ma* 
dura  i  fendo  húa ,  Sc  outra 
na  fua  perfeição  ,  ambas 
forãocheasde  flores  ,  Sc 
ambas  de  frutos.  Mas  po- 
ftoqueaílim  pareça  a  ou- 
tros, a  mim,  cuja  he  a  elei- 
ção, não  me  parece.  Não 
faó  as  excellencias  de  S. 
Gonçalo  tão  pouco  gran- 
des, quecaibãoemtãoef- 
treitos  limites.  Quando  o 
Rio  fae  daMadre,tambem 
as  margens  faóRio.Não  fó 
havemos  de  alargar  o  E- 
vangclhojfcnão  também  o 
numero  das  vigias.  Digo 
pois,  ou  deteriniiio  dizer , 
que 


^.^r;:  V. 


S.  Gonçalo.  285: 

que  S.  Gonçalo  naó  fó  foi    tos  dias ;  S.  Gonçalo  na6 

efperounem  hum  fôdia, 
porque  no  mefmo  dia  em: 
que  naícendo  fahio  à  luz 
quarta  :&  não   íó  da  pri*     do  mundo,  jà  era  homem, 
meira,  da  fegunda ,  da  ter-     &:  grande  homem  no  fer , 
ceira,&da  quarta  jfenaõ     poíloque  foíTe  mininona 


Santo  da  fegunda  ,  6c  da 
terceira  vigia  ^  fenaótam 
bem  da  primeira  ,  & 


da 


eftatúra.  Fallandoo  Pro- 
feta Zach árias  do  futuro 
Salvador  do  mundo,  ç^iíci^   , 
ta  primeiro  as  admirações 
do  que  havia  de  dizer  com 
a  palavra  Ecce  :  &  o  que 
diife ,  he,  que  o  feu  nome 
íeria:  O  que  nafce  homem: 
Ecce  vir  oriens  nomen  ejus, 
Efehe  prodígio  digno  de  ^ 
pois  de  morto  5  em  que  tê     admiraçáo,5c  admirações,  |*'2^^ 
jà  cinco  vezes  tantos an-     quehum  homem,  que  era 

juntamente  Deos,nafcdIe 


também  da  quinta.  Santo, 
&  admirável  Santo  na  pri- 
meira idade  de  minino : 
Santo, &  admirável  na  fe- 
gunda de  mancebo  :  San- 
to, Sc  admirável  na  tercei- 
ra de  varaó :  Santo,  ^ad- 
mirável na  quarta  de  ve- 
lho:&  finalmente  Santo, 
6c  admirável  na  quinta  de- 


nosjquantostevede  vida. 
Se  o  difcurfo  for  largo,  fa- 
cilmente fe  acomodará  a 
devaçaõcoma  paciência. 

/.  ÍII. 

2^3  /"  Omeçandope^ 
V^la  primeira  vi- 
gia ',  foi  Santo,  6c  admirá- 
vel Santo  S.  Gonçalo  na 
primeira  idade  de  minino, 
porque  naó  foi  minino 
minino,  fenaõ  mijiino  ho- 
mem. Os  outros  mininos 
para  chegarem  a  fer  ho- 


minino,&:  homem,^/>  ori* 
ms\  quam  admirável  San- 
to devemos  entender,  que 
foi  o  noííb  ,  fendo  àAã.^ 
feu  nafcimento  naó  home 
minino,  fenaó  minino  ho- 
mem? Hum  íó  homem  ou- 
ve no  mundo,  que  nafceA 
fe  homem.  Eftefoi  Adam^ 
a  quem  Deos  criou  em 
idade, 6c  eftatiira  perfeita, 
Maseíle  homemjque  uni- 
camente  naí?:eo  homem» 


aBensiiíiQ  de  eípexar  piui-    neíp  pojr  ilío  deixou  de  fer 


286 


Sermão  de 


iy^r: 


I    .1^ 


minino.Vòso  julgai.  Ode 
que  era  renhor,&  o  que  ti- 
nha de  Teu  Adam,  naó  era 
menos  que  todo  efte  mia- 
do :6c  hum  homem  ,  que 
tendo  tanto  ,  deo  quanto 
tinha  por  húa  maçãaj  vede 
fe  foi  minino.  Adam  naf- 
cido  homem  ,  mas  ho- 
mem minino  •,  Gonçalo 
nafcido  minino,  mas  mi- 
nino homem. 

E  quando  come- 
çou eíle grande  minino  a 
moílrar  publicaméte,  que 
era  minino  homem  ^  Oito 
dias  depois  de  nafcido, 
que  foi  o  de  feu  bautifmo. 
Sahiodapia  onde  os  ou- 
tros mininos  eílranhaó  tã- 
to  o  rigor  da  agua, 8c  quan- 
do a  ama  o  recolheo  nos 
braços  para  o  acalentar  do 
choro,&:lhedaro  peito;  o 
prodigiofoinfinteem  vez 
de  chorarj&:  mamar,  fitou 
os  olhos  em  hum  Chriílo 
cruciíicado,&  com  o  roílo 
alegre  ,  &:  os  bracinhos 
abcrtos,&c  cftendidos,  pa- 
recia que  lhe  dava  as  gra- 
ças da  graça  que  recebera. 
ÃnimeRcvc  por  largo  ef- 
paço  com  admiração  ,  & 


pafmo  dos  circunfl-antes, 
fem  o  poderem  divertir  da 
viíla  firme  ,  &:  contempla- 
ção attenta  do  fagrado  ob- 
jedto.  E  quem  negará,  que 
foi  iílo  receber  o  bautif- 
mo náo  como  minino,  íè- 
não  como  homem.^  O  bau- 
tifmojou  o  recebe  osadul- 
tos,que  íàò  os  homens ,  ou 
osinnocentes,  que  faó  os 
mininos :  mas  com  grande 
femelhança  no  bautifmo, 
&com  grande  dift'erença 
nos  bautizados.  No  bau- 
tifmo com  grande  feme- 
lhança j  porque  afiim  a 
huns  como  a  outros  comu- 
nica a  quelle  Sacramento  a 
graça,  &  infunde  os  hábi- 
tos de  todas  as  virtudes: 
mas  nos  bautizados  com 
grande  differençaj  porque 
nos  innocentes  fícão  os  há- 
bitos das  virtudes  como 
amortecidos  fem  podcré 
exercitar  os  a£bos delias: 
&  nos  adultos  ficão  vivos, 
Ôcpromptos  5  porque  lo- 
go, ou  produ7:em,  ou  po- 
dem produzir  os  a£los  vir- 
tuofos,  a  que  os  mcfmos 
jiabitos  osínclinão.  Allim 
fcvio  no  bautifmo  de  S. 
Ago- 


S.  Gonçalo.  287^ 

Agoftinhoj  que  foibauti-    devotajôc  confiante  atten- 


zado  em  idade  de  trinta  &: 
três  annos,  &  aílí  ni  elle  co- 
mo S.AmbroíIoq  obauti- 
ZOU5&  também  tinha  fido 
baiitizado  em  idade  adul- 
ta, compuzeraô  extempo- 


çaójO  da  perfeverança. 

264  Là  diz  O  Real  Pro- 
feta do  homem  que  logo 
começa,  &  ha  de  fer  gran- 
de Santo :  Et  erit  tanquam 
Ugmim^  quodplantatum  eji^ç^i^ 


raneamente5&  cantarão  o    fecus   decurfus   aquãrum  ^^-^ 
Hy mno,  Te T>etimiÇ.m  que     quodfruBum  fuum  dabit  in 


fe  contém  tantos  ,  &  taó 
excellentes  a£tos ,  &  taó 
ardentes  aíFedtos  de  todas 
as  virtudes.  Agora  pergú- 
to :  E  a  qual  deílas  duas 
differenças,  ou  claíTes  de 
bautizadospertéceo  nof- 
fo  Sáto  ?  He  certo,  q  naó  à 
dos  mininos  ,  &  innocen- 
tt^.,  íenaó  à  dos  homens, & 
adultos.  Porque  logo,  co- 
mo íe  o  bautifmo  lhe  in- 
fundira naó  fó  os  hábitos, 
fenão  os  a£tos  de  todas  as 
virtudes; em  não  chorar, 
exercitou  o  da  fortaleza  j 
em  naó  tomar  o  peito,o  da 
temperança  ;  em  fixar  os 


temporefuo\  Que  fcrà  como 
a  arvore  nova ,  &  tenra 
plantada  junto  às  corren- 
tes das  aguas,  a  qual  dará  o 
fruto  a  feu  têpo.  As  aguas 
correntes  faó  as  do  bautif- 
mo: as  plantas  novas  re- 
gadas có  ellas,  faó  os  bau- 
tizados  não  adultos,  fenaó 
mininoS)&innocentes:  & 
deílesdiz  o  Profeta  naô 
que  dão  logo  o  fruto, fenaó 
que  o  daráó  a  feu  tempo. 
Porque  ?  Porque  naquelle 
eílado  imperfeito  da  natu- 
reza, que  he  a  infância, 
aííimcomo  tem  emmude- 
cida  a  lino;ua ,  &  enfaixa- 


olhos,&  eftender  alegre  os  dos  os  braços,  aílira  as  po- 

bracinhospara  a  imagem  tecias  da  Alma  comodor- 

de  Chrifto  crucificado  ,  o  mentes  não  efláo  promp- 

da  prudência,  o  da  juíliça,  tas,&  expeditas  para  exer- 

o  da  religião,  o  da  fé,  o  da  citar  logo  os  ados  das  vir- 

caridade:&em  onaó  po-  tudes.    Crecendo  porém 

derem  divertir  daquella  depois^ac  tomando  força s^ 


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É 


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1 

Sermão  de 
ou  amanhece,     raò  a  Fé,  aquelles  olhos  fí- 


2S8^ 

entaófae  , 

como  Sol  de  entre  nuvês, 
o  lume  do  entendimento, 
&darazaó,  &  entaõ  he  o 
tempo  determinado  pela 
natureza,  6c  efperado  pela 
graça,  para  poderem  pro- 
duzir, 6c  produzirem  os 
frutos  :  Etfruãnm  fimm 
dabit  in  temp  ore  fito .  À  íli  m 
fucede  a  todos  os  mininos. 
Porèmonoífo,  como  ex- 
ceiçaó  dos  demais,  antici- 
pando  os  limites,  &  vaga- 
res da  natureza,  fez  feu  o 
tempo  que  naó  era  feu,  &: 
léus  os  frutos  que  naó  eraó 


zeráo  feu  o  coração  com 
que  a  creraó  ,  &  aquelles 
olhos  íizeraó  feus  os  pès, 
ou  para  melhor  dizer  ,  as 
azas,comque  vencerão  as 
diílanciaSjque  ha  de  mini- 
no  a  homem  ,  fem  deixar 
efpaçoemmeyo,  Aflim  fi- 
cou o  noílb  SantOj&fe  mo- 
ftrou  publicamente  mini- 
no,6c  homem  juntamente 
no  mefmo  tempo  -,  porque 
náofendoo  tempo  feu  em 
quanto  minino ,  em  quan* 
to  homem,&:  com  acçoens 
de  homem  o  fez  feu  :  Et 
do  tempo.  Reparou  ,  &  fruãumfimm  dabit  in  tem* 
confidera  difere  ta  mente  porefuo. 
S.Agoftinho,  queosmini-  zóf  Náoparouopro- 
nosvaõ  ao  bautifmo  com  digio  naquelle  primeiro 
pès  naò  feus,  8c  crem  com  dia  j  mas  depois  fe  conti- 
coração  não  reu,6c  confef-     nuou  com  novas ,  &  maio- 


faó  o  que  crem  com  lingua 
naófua  :  ^ar^oulis  mater 
E,cclejta  aliormn  pedes  ao- 
cÕmodatutveniant  -i  aliorú 
corutcredant^  alionim  lin- 
guam  íLtfateantur.  E  tudo 
ifto  fízerão  feu  os  olhos  do 
noflb  n-iinino  ,  fíxandofe 
cm  Chrifto  cruciíicado. 
Aquelles  olhos  íizeraó  fua 
a  lingua  com  que  confeííá- 


res  circunftancias  -,  porque 
o  mefmo  minino,  que  en- 
tão não  chorou,agora  cho- 
rava irremediavelmente, 
&  o  que  entaó  não  tomou 
o  peito,  agora  eftava  con- 
fiante em  de  nenhum  mo- 
do o  querer  admitir.  Não 
fe  entendia  ao  principio  o 
fciircdo  deitas  lasírimas,^: 
abílincaciasi  até  que  final- 
mente 


S.Gonçalo,  1%^ 

"mentefe  conheceoc|  eraó    piritualfejamaisnobreno 


faudades  dos  feus  primei- 
ros amores.  Para  qiienaó 
chor-iíre5(Sc  íe  deixaíTe  ali- 
mentar, de  que  induílria 
ufáraó  ?  Levavaó  a  Gon- 
çalo ,  ou  Gonçalinho  à 
mefma  IgrejasÔc  tanto  que 
punha  os  olhos  na  imagem 
de  Chriílo  crucifícado, 
cila  vifta  lhe  enxugava  lo- 
go as  lagrimas  ,  &  lhe  tira- 
va o  faliiojcom  quejàcon- 
|:ente,&:  goftoíò  aceitava  o 
natural  alimento.  Hfte  era 
o  único  remédio,  fem  ha- 
ver nenhum  outro  ;  cafo 
verdadeiramente  raro ,  & 
mais  íè  confultarmos  nelle 
a  S.  Paulo.  Para  intelligé- 
cia  do  grande  prodigio, 
que  encerra,  fe  ha  de  fup- 
por^que  o  homem  he  com- 


homem  que  a  animal ,  a 
animal  com  tudo  he  pri- 
meiro que  aeípirimal,  Sc 
que  a  efpiritual  naó  tem 
lugar  fenão  depois  da  ani- 
mal :  Non  prius  quoàfpiri- 
tualeeft^fedquod  antmaley^^^^l' 
deinde  quod/pirituaJeMn^iy 
fie  outra  coufa  confirma  o 
Apoftolocom  o  exemplo 
de  Adam  homem  da  terra, 
de  quem  recebemos  a  vida 
animal,&  foi  primeiro  que 
Chrifl:o:Sc  como  exem- 
plo de  Chriílo  homem  do 
Ceo,  de  quem  recebemos 
a  vida  efpiritual,  &  foi  de- 
pois de  Adam.  Ifto  he  o 
que  enfina  S,  Paulo.  Va- 
mos agora  ao  que  fe  via  no 
noílb  Santo.  O  chorar,  ou 
naó  chorar,  pertence  à  vi- 


poftodeduas  partes,  húa    da  feníitiva;  porque  o  cho- 
animaljêc  outra  efpiritual:    ro  he  effeito  do  fentimen- 


a  animal  coníta  de  duas  vi- 
das, que  faó  a  vegetativa , 
&fenfitiva  i  5c  a  efpiritual 
confiíle  em  húa  fó ,  quehe 
a  racional.  E  que  diz  S. 
Paulo  ?  Tudo  o  contrario 
do  que  acabamos  de  con- 
tar do  noítb  minino.  Diz 
que  pofto  que  a  parte  ef- 
Tom./. 


to :  o  tomar50u  nao  tomar 
o  peito,pertence  à  vida  ve- 
getativa -,  porque  a  nutri- 
ção he  effeito  do  alimento: 
do  mefmo  modo  o  chorar 
porver  a  Chriílo,  &;  naó 
admitir  gofto  íem  elle,  he 
eíFeito  da  vida  racional,  & 
o  mais  racional  da  mefma 
T         vi^ 


25ÍO  Sermão  de 

vida.  Pois  fe  S.  Paulo  diz,     meira,  que  Deos  he  o  ulti- 


õJilL^ 


I  .1 


que  primeiro  he  no  ho- 
mem a  parte  animal,  &  de- 
pois a  parte  efpiritualj  co- 
mo eraó  primeiro  no  noííb 
minino  osa£í:os  da  parte 
efpiritual,  &  depois  os  da 
animal:  primeiro  o  bufcar, 
&veraChriílo,&  depois 
o  ceíTar  do  choro,  &  tomar 
o  peito?  Porque  S.  Paulo 
fallava  conforme  a  ley  or- 
dinária da  natureza,  &  dos 
mininos,  que  primeiro  faó 
mininos,&  depois  homés  : 


mo  fim  do  homem  :  fegun- 
da,"  que  todas  as  acçoens 
humanasjôc  propriamente 
de  homem,  devem  fer  en- 
caminhadas a  efte  ultimo 
fim:  terceira  ,  que  as  ac- 
çoens,  que  não  levão  dian- 
te dos  olhos  efte  fim,  ainda 
que  as  faça  hum  homem 
de  cem  annos,  naó  faó  hu- 
manas, nem  de  homem, 
fenaó  animaes,  &  de  mini- 
no,ou  bruto.  Edigo  indi- 
ftintamente  de  minino,  ou 


porém  o  noíTo  Santo  obra-     bruto;  porque  taó  animal 
vacomoexceiçaó  da  mef-     acçaóheo  n>amar  ,  &   o 


ma  ley,  6c  náo  como  mi- 
nino fomente  minino,  fe- 
naó como  minino  junta- 
mente homem. 

266  Daqui  fefegue em 
maior  aíTombro  do  cafo, 
que  o  mefmo  não  ceifar 
do  choro,  oco  mefmo  naó 
tomar  o  peiro,  fenaó  com 
Chrifto diante  dos  olhos, 
jà  não  eraó  no  noíTo  Santo 
ados  animaes ,  &  de  mini- 
no, fenaó  racionaes ,  &  de 
homem.  Para  prova  deíla 
grande  confequencia  fup- 
ponhocomaFè,&com  a 
Xheologia  três  coufas:  pi  i- 


chorar  em  hum  minino » 
como  o  mamar,  &  o  balar 
em  hum  cordeiro.  Nem  o 
exemplo,  ou  nome  demi«p 
nino  de  cem  annos  he  no- 
vidade neíle  ponto  >  por- 
que mininos  de  cem  annos 
chamou  o  Profeta  faias 
aos  que  delle  modo  obraó: 
'Fuerictntum  annorum.  -Errai. tf c: 
como  o  noífo  minino  cef-  20. 
fava  do  choro,&  tomava  o 
peito  com  Chriílo  diante 
dos  olhos,  que  he  o  ultimo 
fimdohomcm  ,  o  mefmo 
ceflar  do  choro,  &  o  mef- 
mo tomar  o  peito,  que  nos 

OUtiO,' 


«fe 


S.Gonçalo.  291 

outros  mininos  faó  acções  não  muito  antes  deila,aín- 

animaes^demininojiiel-  da  mudo  ,&  ainda  total- 

le  eraó  racionaes,&  de  ho-  mente  infante ,  jà o  noíTo 

mem.  Oh  que  grande  mi-  minino  erajuntaméte  ho- 

nino,&  que  grande  home  mem.  Tire  pois  S.  Gonça- 

fois>  meu  Santo !  O  mefmo  lo  das  mefmas  palavras  do 

S.Paulo  dizia  de  fy  :  Cum  Apoftolo  o  qumdo  autem^ 

efemparvulust  lo  que  bar  ut  Sc  applicando  a  fy  as  pri- 

farvulus  yfapiebam  utpar-  meiras,&  as  ultimas ,  diga 

vulus, cogitnbam  utparvu-  confiadamente :  Cum  ejfem 

lus  :  quando  autcm  faBus  parvuluSyfaãusfum  vir, 
fum  vir ,  evacuavi  qua  erat 


parvuli:  Eu,diz  o  Apoílo 
lo,  quando  era  minino/al- 
lava  como  minino ,  enten- 
dia como  minino,  6c  cui- 
dava como  mininOjporèm 
depois  que  creci,&  fui  ho- 
mem, ácr^ú  tudo  o  que 
era  próprio  de  minino.  S. 
Gonçalo  era   muito  mais 


§^    IV. 


167 


QS 


anto  à  fegu- 
'da  vigia  ,  foi 
Santo,&  admirável  Santo 
S.  Gonçalo  na  idade  de 
mancebojporque  feito  na- 
quelles  annos  Paftor  de 
Almas  C  oíficio   taó  peri- 


minino  que  S.  Pauloj  por-  gofo  para  a  própria,  como 
queS.  Paulo  na  idade  cm  útil  para  as  alheas  }  de  tal 
que  fe  chama  minino  ,  jà  forte  acodio  a  húa  obriga- 
fallava :  Loquebar  ut  par-  çaò  fem  faltar  a  outra,  que 
'z;í////j:&  S.Gonçalo  ainda  a  ambas  fatisfez  adequa- 
naòfallava,  nem  começou  damente.  Faltavaóihe  ao 
afallar  fenaó  dahi  adous  novo  Prelado  as  cans,  que 
annos  :&  quando  o  Apo-  no  facerdocio  faó  os  ef- 
ílolo  do  terceiro  Ceo  era  maltes  da  coroa,  6c  na  pre- 
minino,  6c  obrava  como  lazia  o  ornamento  da  dig- 
minino,6clhe  falta  vão  ain-  nidade  •,  mas  não  lhe  falta- 
da muitos  para  fer  home ;  va  nada  do  que  as  mefmas 
n^o  neíFa  mefma  idade,  fe-  cans  íigniiicaó,6c  naó  pou- 

T  ij         cas 


2  92  Sermão  de 

cas vezes dermentem.  Saó  Ihores  cabeíIos,&:a  peor 
como  as  neves  de  que  fem-  cabeça,  que  nunca  ouve, 
preeftà  cuberto  o  monte  foi  a  de  i^  bí aláo :  oscabel- 
Ethna ,  debaixo  das  quaes  los  vendiãofe  a  pefo  de  ou- 
feocultaóvolcoens5&  m-     ro,&  a  cabeça  nenhum  pe- 


cendiosifaó  como  as  que 
o  divino  Meílre  chamou 
j^^,,j^  fepulturas  cayadas,  Sepul- 
33.27-  chradealbata^  brancas  por 
fora,  6c  corrupção  por  den- 
tro. E  também  podem  fer 
como  aquella  arvore,a  q  jà 
comparamos  o  noíTo  San- 
to em  mais  levantado  fen- 
tido.  Delia  diz  o  Profeta , 
que  nunca  lhe  cahirá  a  fo 


focinha.  Mais  lhe  tomara 
eu  o  chumbo  na  teíla,  que 
o  ouro  na  gadelha.  Tam- 
bém ha  cabelloSjque  pare- 
cem de  ouro,&  faó  de  pra- 
ta fobredourada  i  &  ido 
he  o  peor,  que  tem  as  C2nsj 
poderemfe tingir.  Náoaf- 
íim  os  cabellos  negros,que 
não  admitem  outra  cor. 
Por  iÇÍ'o  a  Paftora  das  E- 


.Pfalm. 


r  '.t ; 


Sapicnt. 


\h^: Folmmejus nondefuet:     glogasde  Salamão  o  que 
&c  as  arvores  que  naó  mu-     louvou  nos  cabellos  do  íeu 


dão  a  folha,  tão  verdes  faó 
de  poucos  annos,como  de 
muitos.  Mas  quanto  com 
maior  indecencia  fe  de- 
vem eftranhar  nos  velhos 
as  verduras,  tanto  he  dig- 
na de  maior  veneração  nos 
moços  a  madureza.  As 
verdadeiras  cans,diz  o  Ef- 
pirito  Santo  ,  faó  o  juizo 
íezudo  5  &  naó  coníiítea 
velhice  na  cor  dos  cabel- 
los, fenaó  na  pureza  da  vi- 
da :  Cam  autem  funt  Jmfus 
homints^  ér  atasjenc^hitis 
vitaim?mctílata:..    Os  me- 


Paílor,  foi  ferem  da  cor  do 
corvo :  Com£  ejusficut  eíâ-  Cant.-ç, 
ta  palmar  um  ,  rjgra  quaji^^' 
corvus, 

268  Sendo  pois  o  me- 
lhor,&  maior  de  todos  os 
Paftores  Paílor,  &:  mance- 
bo, grande  louvor  he  do 
noíío  Santo  fer  eleito  Pa- 
ílor na  mefma  idade.  Man- 
cebo era  A'^el ,  &  que  Pa- 
Itormaisrcligiofo  ^  Man- 
cebo era  Jacob,  <Sc  que  Pa- 
ílor mais  vigilaure?  Man- 
cebo era  David,3c  que  Pa- 
ílor mais  animoíb,  &:  ef- 
forcado  i* 


í^ 


S.  Gonçalo.  293 

forçado?  Se  oLeaó  ("diz     mes  o  roílo   dos  podero- 


o  Texto  3  lhe  tomava  o 
cordeiro  pela  cabeça,  tira- 
valho  da  garganta  pelas 
pontas  dos  pès  :  &  fe  lho 
engolia  pelos  pès  ,  arran- 
cavaího  das  entranhas  pe- 
las orelhas.  A  idade  da  ve- 
lhice he  jà  muito  fria  para 
acçoenstaó  alentadas,  & 
tão  ardentes.  O  peor  ga- 
do de  guardar,  he  o  ho- 
mem.Quarêta  annos  guar- 
dou ovelhas  Moyfes  fem 
nenhum  perigo,  &  naó  ha- 
via dous  annos,que  era  Pa- 
ftor  de  homens,  quando  fó 
Deos  lhe  pode  guardar  a 
vida  dos  mefmos  a  quem 
cUe  guardava.  Elle  leva- 
va-os  a  beber  nas  corren- 
tes puriííímas  do  Jordaój 
&  elles  fufpiravaó  pelos 
charcos  do  Nilo,  &  lodos 
do  Egypto.  A  maior  falta 
que  hoje  fe  exprimenta 
nos  PaftoreSjhe  a  do  valor. 
Se  S.Gonçalo  o  naó  tivera 
moftrado  antes,  tanta  cul- 
pa teria  quem  lhe  meteo  o 
cajado  na  mão,  como  elle 
em  o  aceitar.  Se  nào  tens 
valor  para  arcar  com  os 
vicios  authorizadosj  &  te- 
Tom.7, 


foSjnaò  aceites  o  officio, 
diz  Deos :  Nolifierijudex ,  ecí 
ni/i  vaieas  irrumfere  mi-^- 
qtiitat  es  ^ne forte  extimefcas 
faciempotentis.  No  reba- 
nho manfo  à-AS  ovelhas 
também  ha  valentes  de  te- 
íla  taó  dura,&  armada,que 
fe  batem  huns  com  os  ou- 
tros, mas  todos  temem5& 
reverenceaóoPaílor.  Aí- 
íim  foi  antigamentejqiiá- 
doosPaíloreseraó  Chry- 
foílomos,  &  Ambrofios, 
poftoqueojmais  podero- 
fos  da  manada  foíTem 
Theodofios,  6c  Arcadios. 
Se  os  Paftores  não  guarda- 
rão tantos  refpeitos  5  elles 
foraómais  refpeitados.  E 
aííim  o  foiS.  Gonçalo,  po- 
ílo  que  mancebo. 

269  Do  tempo  em  que 
governou  a  íua  Igreja,  di- 
zem muitas  coufasos  Hi- 
ftoriadoresjtodas  próprias 
de  hum  bom  Paílor.  Di- 
zem que  naó  fe  veília  da 
láa  das  ovelhas,  nem  fe  fu- 
ftentava  do  feu  leite  ,  & 
muito  íiienos  do  feu  fan-^ 
gue.  Dizem  que  o  patri- 
mónio de  Chriíto  não  o 
T  '^i]         ga- 


294  Sermão  de 

gaíiava  com  criados,  cães,  mais  a  pena  que  os  multa - 
oucavallos,  nem  cóacre-  vanabolfa,  que  a  que  os 
centaracafa,  oulheveílir  condenava  na  Alma.  Pre- 
ás paredes.  Dizem  que  ex-  gando  pois  hum  dia  o  San- 
cepta  a  limitada  côngrua     to,  ^-aíFcando  eíle  abufo 


do  próprio  fuftento  ,  tudo 
o  demais  diílribuia  aos 
pobres, &  naó  comopro- 
priocomnomede  carida- 
de, fenaó  como  feu  delles , 
&:por  obrigação  de  juíli- 
ça.  Dizem  que  naó  íb  pre- 
gava aos  ouvidos  ,  fenaó 
tambem5&  muito  mais  aos 
olhosj  porque  os  exem- 
plos da  fua  vidaeraó  a  al- 
ma de  toda  a  fua  doutrina. 
Eftas  5  &:  outras  muitas 
eoufas  dizem  os  Hiftoria- 
dores,  mas   todas  em  có- 


como  tão  alheo  da  Fè,  & 
Religião  Chriíláa  j  vio 
paíTarhâa  mulher,  que  le- 
vava húa  ceíla  de  pao,cha- 
mou-a  5  mandou  lhe  que 
pozeíTe  a  ceíla  a  feus  pès, 
&:  repetindo  com  voz  te- 
merofa  a  forma  da  excó- 
m.unhaò  febre  os  pães,que 
eraò  muito  alvos  ,  fubita- 
mente  fe  converterão  em 
carvoens.  Ficarão  aífom- 
brados  todos  ,  &:  muito 
maisa  pobre  mulher,  que 
deoporpeididooíeupaó. 


mum.  E  porque  do  tempo     Mas  depois  que  com  a  vi- 
emqueonoílò    Santo  foi     íladetaóeítranha  ,  &  rc- 


Paftor,  hum  fó  cafo  refe- 
rem em  particular  /  por  ef- 
tecollegiremososdemaisi 
6c  vendo  como  obrava, co- 
nheceremos qual  era.  Ha- 
via entre  os  freguezes  de 
S.  Gonçalo  o  abufo,  que 
ainda  dura  em  outros,  de 
terem  perdido  o  medo  às 
excómunhoens.  Eraó  da- 
qucl  la  gente  que  naó  crè  o 
que  naó  fe  vè ,  &  fentiaó 


pentina  mudança  os  vio 
perfuadidos  ao  que  naó 
acabaváo  de  entender  j 
agora,  diz  o  banto  ,  para 
que  vejais  também  quam 
contrario  he  o  elfeito,  que 
obra  a  abfolvição  nos  ex- 
comungados, Vepetio  fo- 
bre  os  carvoens  as  palavras 
daabiolvicaò,  6c  nomef- 
mo  momento  ,  &:  do  mef- 
mo  modo  íicáraó  outra 
vez 


m 


S. Gonçalo,  295- 

vez  convertidos  em  páes     rer  Fazer  niilap;resà  cuíia 


taó    alvos  como    dantes 
eraó. 

270  Feitaademoftra- 
ça5dehiini,&:oiitro  mila- 
grejdiíle  S.  Gonçalo à  mu- 
lher, que  ievaífe  o  feu  paó 
com  a  benção  de  Deos:  & 
aqui  reparo  muito.  Sendo 
opaónar-húa,  fenão  duas 
vezesmilagroíbj  dobrada 
razão  tinha  o  Santo  para  o 
aplicará  Igreja.  Oh  tem- 
pos !  Parocho  íç,i  eu,  que  à 
conta  de  liúa  excomunhão 
teve  pão  com  quefuílen- 
tar  muitos  dias  a  fua  famí- 
lia ,  6c  era  muito  mais  nu- 
merofa  que  a  de  S., Gonça- 
lo. E  porque  náo  fez  elle 
outro  tanto  ?  Ao  menos 
parece  que  devera  mandar 
refervar  alguns  daquelies 
pães  convertidos  em  car- 
vão para  perpetua  memo- 
ria, &  horror  do  cafo.  Por- 
que tornou  pois  a  entregar 
à  mulher  todo  o  feu  paó 
taó  inteiro  no  numero,  & 
tão   branco  na  cor  como 


do  pão  alheo.Qiiantos  mi- 
lagres vemos  neííe  mun- 
do,^ quantos  homens,  6c 
alvitres  milagrofos,  &  to- 
dos ã  cuíla  do  pão  alheo5& 
nenhum  do  feu  .^  A  Elias 
fuílentava  Deos  cada  dia 
com  douspãesj&a  S.  Pau- 
lo primeiro  Ermitão  tam- 
bém cada  dia  com  meyo 
pão  :6c  fendo  os  Miniíiros 
de  hum  5  &  outro  milagre 
corvos,  fempre  o  pão  era 
damefa  de  quem  manda- 
va fuílentar  os  famintos, 
&  não  tomado  a  outrem. O 
maior  milagre  neíle  géne- 
ro foi  o  dos  pães,que  fendo 
cinco,  fe  multiplicarão  a 
tantos  milhares  ,  que  fu- 
ílentáraó  cinco  mil  ho- 
mens ,  &;  fobejáraõ  tantas 
alcofas  Mas  eftes  fobejos 
para  quem  foraõ  ?  Para  os 
donos  dos  cinco  pães,  que 
eraôosApoílolos.  Seme- 
lhante milagre  jà  o  vimos  5 
&  eltamos  vendo.  O  que 
hontem  fe  cotava  por  uni- 


era  dantes  \  Porque  enten-  dades  9  hoje  fe  conta  por 
deo  o  bom, 6c  defmtereíià-  milhares, ác  por  milhoens. 
doPaílor  ,  que  era  coufa  Mas  à  cuíla  de  quem.^Dos 
muito  fora  de  razão  que-    mefmojs  que  daó  a  mate- 

T  iiij         ria^ 


:^.w 


29<>  Sermão  de 

ria,5co_cabeda]  paraomi-     confirmação   dous    mila- 


lagre.  E  em  vez  de  terem 
parte  na  multiplicação,  & 
quando  menos  nos  fobe- 
jos,atèos  feus  cinco  pães 
Ihosexcómungão  de  ma- 
neira, que  antes  os  querem 


gresj  mas  com  tal  condi- 
ção, que  o  que  fízeíTe  o 
primeiro  ,desfizeíle  o  fe- 
gundo.  Tomou  pois  Ge- 
deão  hum  velo  de  lãa  das 
fuás  ovelhas,  &  pondo-o 


pcrder,que  lograr  5  porque  no  meyo  da  eyra  ,  diíFe; 

lo  lhos  permitem  conver-  Quero  que  todo  o  orvalho 

tidos  em  carvaó.  defta  noite  caya  na  láa  ,  & 

2/1     O  remédio  defl-a  nada  na  eyra:    Scaflimíu- 

grande  perdição,  &:  deíla  cedeo.  Ao  outro  dia  pofto 

grande  laílima  jà    o  enfi-  o  velo  no  mcfmo  lugar. 


nou  S.  Gonçalo ,  fe  ouver 
quem  lhe  queira  tomar  a 
lição.  E  em  que  coníiftio  o 
remédio  ?  Cófiílio  em  tor- 
nar a  converter  o  carvaó 
empaóíaílim  como  opaó 
le  tinha  convertido  em 
•carvão.  Nãoeílàa  perfei- 
ção do  milagrofo  em  po- 
der fazer  os  milagres,  fe- 
nãocm  os  fabcr  desfazer. 
E  a  razaó  no  noíTo  cafo  hej 
porque  quando  os  mila- 
gres faó  danofos ,  para  re- 
fazer o  dano  do  milagre, 
he  neceííario  que  desfaça 
ofegundooquefez  o  pri- 
meiro. Tendo  hum  Anjo 
feito  hua  grande  promeáa 
a  Gedeaòjque  também  era 


ò^i^ç: :  Agora  quero  às  a ve- 
ças,  que  todo  o  orvalho 
deíla  noite  caya  na  cyra,& 
nada  na  lãa :  6c  também  fu  - 
cedeo  do  mefmo  modo. 
Mas  porque  fenão  conten- 
tou Gedeão  com  hum  fó 
milagre,  fcnão  com  dous, 
ScquedesfizeíTe  o  fegun- 
do  o  que  tiveífe  feito  o 
primeiro?  Porque  fequiz 
certihcar  da  promeíla  do 
Anjo,&:  conhecerei  eraò 
milagres  de  Deos.  Eentê- 
deo  que  fendo  o  orvalho 
bem  comum  de  toda  a  ter- 
rajnaó  podia  Deos  defrau- 
dar húa  parte  delia  com  o 
primeiro  milagre,fem  que 
Iherefizeíleo  dano  com  o 


Paílor  5  pediolheelle  em     fegundo.  Ifto  hc  oquepe- 

dio 


S.  Gonç 
d  Io  Gedeaó ,  iil:o  o  que  fez 
S.Gonçalo  ,  &  ido  o  que 
naó  ha  quem  imite.  Baila 
que  tudo  ha  de  fer  para  o 
particular,  &  nada  para  o 
comum  j  tudo  para  o  velo 
deGedeaó,  &  nada  para  a 
eyra  ?  Aílim  o  exeçutaó 
fem  nenhúa  igualdade  os 
que  querem  ter  jurdiçaó 
atè  no  que  cae  do  Ceo : 
&  por  mais  que  as  queixas 
cheguem  ao  mefmo  Ceo, 
nenhum  dos  que  fazem  os 
milagres  os  quer  desfazer. 
Se  cuidaó  que  he  defcre- 
dito,  &  menos  authorida- 
de  do  poder  desfazer  o 
que  íizeraó  ,  enganaófe  5 
porque  muito  mais  pode- 
rofos  fe  moílraráó  no  des- 
fazer do  milagre,  que  em 
o  fazer.  Vede-o  no  noíTo 
cafo.  Converter  o  paò  em 
earvoens,  pòde-o  fazer  o 
fogo  queimando-o  5  mas 
converter  os  carvoens  em 
paõ,  fó  o  pôde  fazer  a  om- 
nipotência obrando  fobre 
as  leys  de  toda  a  natureza. 
272  Finalmente  nefte 
milagre  fe  retratou  o  noílb 
bom  Paftor  a  fy  mefmo,  & 
moftrou  qual  era,  Eíle  mi- 


Pfalm, 


úlo.  297 

lagre  teve  aveço ,  &  direi- 
to :  &  taes  haò  de  fer  os  ho- 
mens, que  governa®  ho- 
mens. O  bom  Paílornam 
ha  de  fer  todo  bondade : 
Cum  eleão  elecius  eris  ,  c^ 
cum  perverfo  per  verter  is.  \'^Tij\ 
.Nem  tudo  ha  de  fer  indul- 
gência, nem  tudo  ceníura. 
Ha  de  ter  excómunhoens 
para  os  rebeldes  ,  &  abfol- 
viçoens  para  os  arrepen- 
didos: &  tanto  para  os  bra- 
ços como  os  pães  ,  como 
para  os  pretos  como  os 
carvoens.  Ha  de  faber  fa- 
2er,&:  desfazer,converter, 
&  defconverter.Deos  con- 
verteo  a  Nabucodonofor 
de  homem  em  bruto,&  de- 
pois tornou-o  a  converter 
de  bruto  em  homem.  A 
vara  de  Moyfes  era  o  mef- 
mo cajado  com  que  eile 
governava  as  fuás  ovelhas. 
Eque  propriedades  tinha 
efte  cajado  ^  Húas  vezes  fe 
convertia  de  vara  em  Ser- 
pente, ôc  outras  de  Serpen- 
te em  vara.  Nem  por  fer  a 
Ley  de  Cfiriílo  Ley  da 
Graça,ha  de  fer  nella  tudo 
graça.  A  ceremonia  com  q 
oAuthojr  da  mefma  Ley 

GOÍl* 


298 


■'«I 


conflítiiío  a  S.  Pedro  fu- 
premoFaílor,   foi  meter- 
Ihena  máo  as  chaves  do 
Ceo,6c  da  cerra.  E  porque, 
ou  com  que  myíterio  cha- 
ves? Porque  a  chave  tem 
huavoka  para  fechar,  & 
outra   volta   para    abrir. 
Nem  ha  de  fechar  tudo  có 
rigor  5  nem  deixar  tudo 
abertocom  demafiada be- 
nignidade.    Quando  for 
neceíTario,  fechar  de  pan- 
cada; mas  fe  não  for  neccf- 
fario,  não  andar  às  panca- 
das. Com  ferem  porem  as 
mCigaízs  do  poder  paíio- 
ralas  chaves  ,  jà  eu  notei 
noutra  occafiaó  ,  que  naó 
diíTe  Chrifto,  o  que  fecha- 
res, fera  fechado ,  &  o  que 
abrires,  aberto  j  íenáo,o  q 
atares,  Terá  atado,  &  o  que 
defatares,  defatado.E  por- 
que ?  Porque  quer  Chriílo 
que  os  feus  Pailores  fai- 
baó  atar,5c  defatar ,  Sc  naó 
fejáo  homens   ,   que  naó 
ataó,  nem  defatáo.  Porque 
não  atão,  andão  os  vicios 
Toiros  y  &  porque  não  ác[- 
ataó,eftão  as  virtudes  pre- 
fas.  Ohfe  refufcitára  hoje 
S^Ççnçalo,  cQmo  fc  havi^ 


Ser  r/í  a  ode 


dever  tocado  tudo!  Mas 
temo  que  o  não  haviaó  de 
merecerosnoílbs  tempos, 
como  ta m.  bem  os   feus  o 
defmerecéraó. 
§•     V. 
273    /^Uantoà  ter- 
V^ceira   vigia  , 
foi  Santo,6c  admirável  Sã- 
toS.  Gonçalo  na  idade  de 
varaô  5   porque  tanto  que 
entrou  nella ,  fahio  da  pa- 
tria,&fe  partio  peregrino 
ajerufalem  a  viíitar  osfa- 
grados  lugares  de  noíía  re- 
dempçaó,  Sc  viver,  como 
viveo,naTerra  Sáta  todo  o 
reftante  da  mefma  idnde. 
Não  admiro  nefta  notável 
refoluçaó   o   deixar  a  pá- 
tria, onde  o  amor  natural 
coíluma    lançar    aquellas 
íorteSjSc  doces  raízes ,  que 
tão    difiicultofa mente    fe 
arrancão :  mas  quando  vos 
vejo,  meu  Santo,com  o  ca- 
jado de  Paílor  trocado  em 
bordaó  de  peregrino ,  dei- 
xando as  voffas  ovelhas,«Sc 
de  Chrifl:o,porir  correr,&: 
venerar  os  paílbs  q  o  mcf- 
nio  Senhor  andou  neíla  vi- 
da para  as  apafccntar;,  6c 
rematou  na  morte  para  as 
rc- 


S.  Gonçalo.  299 

remirjifl-oheoqiienaófei     eíle  confelho  parece  que 


admirar    baílantemente  , 
nem  acabo  de  entender 

274  Hiíavezfabemos 
que  mudou  Chriílo  os  tra- 
jos,&íe  veftio  de  peregri- 
no: mas  quando,  ou  para 
que  ?  Era  no  mefmo  dia  da 
fua  refurreiçaó  ,  tendo  di- 
to três  dias  antes,  q  quan* 
do  tiraílem  a  vida  ao  Fa- 
llor,re  derramariaó  as  ove- 
lhas:  Terctitiam  paftorem , 
O"  ãifpergenttir  oves  gregis, 
E  porque  duas  delias  hiaó 
defgarradas  ,  &  quaíi  per- 
didas de  Jerufalem  para 
Emaús  ,  eíla  foi  a  caufa 
daquella  peregrinaçam , 
querendo-as  reduzir  outra 
vez  o  Senhor,  &  unir  com 
o  Teu  rebanho.  Pois  fe 
Chriílo  como  bom  Paílor 
fe  faz  peregrino  para  tra- 
zer duas  ovei  has  deEmaús 
a Jerufalem-,como  S.  Gon- 
çalo ,  que  devia  imitar  a 
Chriílo,  fe  parte  peregri- 
no a  Jeruíàlem  ,  deixando 
em  Emaús  naó  duas  ove- 
lhas, fenão  todo  o  rebanho 
de  que  era  Paílor  ?  Emaús 
quer  dizer,  Cófelho  teme- 
rofo :  Timens  conjilium  3  & 


Ibid 


naó  fó  foi  temerofo  ,  fenaó 
temerário.  Nota  o  Evan- 
geliíla,  que  Emaús  ellava 
diílante  de  Jerufalem  í^^- 
fenta  edadios,  Stadiorum 
fexaginta^  que  fazem  da 
noílà  medida  três  legoas: 
&  fe  Chriílo  naó  fofreo  , 
que  duas  ovelhas  fe  au- 
fentaíTem  do  feu  rebanho 
três  legoas, &  as  foi  bufcar 
ao  meyo  do  caminho:  Ipje 
lefus  ãppropinquans  ibat 
cum illis ico-cvío  fe  aufenta 
S.Gonçalo  das  fuás  ove- 
lhas em  não  menor  diílan- 
cia,que  de  mil  legoas,quã- 
tasdiíla  Portugal  de  Jeru- 
falem .?  Mais  nota  o  Evan- 
geliíla,  que  eíla  diligencia 
afez  Chriílo  no  mefmo 
dia,  In  ipfadie :  &  fe  o  bom  ibi, 
Paílor  no  mefmo  dia  aco- 
de a  húataó  pequena  par- 
te do  feu  rebanhoj  como  S. 
Gonçalo  deixa,  &  defem- 
para  totalmente  o  feu  ,  6c 
fe  vai  viver  tão  longe  del- 
le,  não  por  menos  efpaço 
de  tempo  ,  que  quatorze 
annos  inteiros  ^ 

27  5     Se  alguém  quizer 

bufcar  efcufa  a  hua  tão  no^ 

taveL 


H' 


«If 


30 3  Sermão  de 

tavel  refoluçaó  do  noííb     Santa,  fora  trocar  a  terra 


Santo,  difficultofamentea 
achará  tal  que  fatisfaça.  Se 
diíTermos  que  quiz  trocar 
a  fua  terra  pela  Terra  San- 
ta ;  eíla  razão ,  ainda  que 
parece  pia,  não  he  baftan- 
te  para  deixar  o  feu  reba- 
nho, fendo  Paftor.  Porque 
ainda  que  trocar  a  fua  ter- 
ra pela  Terra  Santa ,  fora 
trocar  a  terra  pelo  Ceo , 
devera  trocar  o  Ceo  pela 
terra,  não  digo  por  acodir 
a  to  do  o  rebanho,  fenaó  a 
húa  fó  ovelha  delle.  Que 
Paftorha,  diz  Chrifto,  o 


pelo  Ceo,  devera  não  fa- 
zer tal  troca,mas  deixar,&: 
trocar  o  Ceo  pela  terra, 
nãofó  para  confervar  todo 
o  feu  rebanho,como  diziaj 
mas  para  acodir  a  húa  fó 
ovelha  delle.  E  fequizer- 
mosconíiderar  ,  que  a  jor- 
nada da  Terra  Santa  foi 
feita  com  efpirito,  &  defe- 
jo  de  lá  converter  os  In- 
íieis  Mahometanos,  que  a 
dominavão  ,  &  habitão, 
também  eftaefçufa  he  in- 
fuíficiente,  &alhea  do  ex- 
emplo de  Chriílo.  Quan- 


qual  tendo  cem  ovelhas,fe     do  os  Apoftolos   pedircão 
acafo  fe  lhe  defgarrou ,  &     ao  mefmo  Senhor,que  ou 


perdeo  húa ,  não  deixe  as 
noventa  &  nove  no  defer- 
to  5  &  và  bufcara  ovelha 
perdida?  Aííim  o  fez  o  mef- 
mo Chriílo.  A  ovelha  per- 
dida era  o  homem  :  as  no- 
venta &  nove  erão  os  nove 
coros  dos  Anjos  :  o  defer- 
to  onde  as  deixou,  era  o 
Ceo :  &:  fe  o  bom,&  verda- 
deiro Paílor  deixou  oCeo, 
&  reyo  aterra  para  acodir 
a  húa  fô  ovelha  perdida; 
ainda  que  trocar  S.Gonça- 
lo a  fua  terra  pela  Terra 


viíFeos  clamores  da  Ca- 
nanéa,  que  era  Gentia,ref- 
pódeo,  que  as  ovelhas,  que 
Deos  lhe  encomendara  , 
eraó  os  filhos  de  Ifrael ,  & 
não  os  Gentios :  Nonfum  ^.  "]^' 
mijfus  nifi  ad  oves  qu/epe- 
rierunt  domus  Ifrael.  E  em 
confequécia  defta  mefma 
doutrina  mandou  a  feus 
Difcipulos,  que  fó  prègaf- 
femaosjudeos,  &  nam  à 
Gentilidade :  hi  -viam  gen-  Matth. 
/  ntm  ne  abkritis.  E  como  as 
ovelhas,  que  S.  Gonçalo 


10.^. 


. '     I.- .  II ' 


S.  Gonçalo.  501 

deixava  na  fua  pátria,  &  na     riam :  Sc  diz  o  Texto  fagra- 
fua  Igreja  ,    erao  as  que     do,  que  vendo  Deos  que 


Deos  lhe  tinha  encomen- 
dado j  ainda  que  a  fua  pe- 
regrinação ajerufalem  fof- 
fe  com  intento  de  conver- 
ter outras  do  Paganifmo, 
comparado  efte  zelo  com 
a  fua  obrigaçaõjnaó  fô  naó 
parece  louvável,  mas  nem 
ainda  lícito. 

2y6  Primeiramêteref- 
pondojque  a  peregrinação 
deS.Gonçaio  à  Terra  Sa- 
tã ,  naó  fó  foi  licita,  &  lou- 
vável, mas  verdadeiramé- 
te  fanta  5  porque  elie  a  em- 


elle  voluntariamente  hia, 
o  chamou,  &  lhe  mandou,  j^id.-^ 
qiiefoíTcCeniensquòdper' 
geret  ad  videndum^  vocavit 
eum.  Pois  fe  Moyfes  jà  Jiia 
por  fua  própria  vontade ; 
porque  o  chamou  Deos  ? 
Porque  efte  era  o  cafo  co- 
mo o  do  noííb  Santo ,  em 
que  naó  bafta  a  inclina- 
ção, &  deliberação  pro- 
priaj  mas  he  neceíTaria  ef- 
pecial  vocação  divina.  A 
Çarça  ardente  juntamen- 
te, &  illefa,  como  dizem 


prendeo  naõ  fó  por  efpiri-     todos  os  Santos,  íignifica  o 
to,  8c  devaçaó  particular     myfterio,  &  myfterios  da 


fua,  fenão  por  impulfo,  6c 
vocação  efpeciai  de  Deos. 
Vejamosocafo  refoluto, 
&  definido  na  Hiftoria  fa- 
grada.  Era  Paítor  Moy- 
Íes,&  andava  nos  deíèrtos 
deMadian  guardando  as 
ovelhas,  que/etro  lhe  ti- 
nha encomendado,  quan- 
do vio  de  longe  a  Çarça 
que  ardia,  &  naó  fe  quei- 
mava. Reíblveofeentaóa 
ir  ver  de  mais  perto  aquel- 
la  maravilha:  Vadam^  & 
vidtbo  vijwnem  hanc  mag- 


redempçaó  humana  3  &af. 
fimdiílèo  mefmo Senhor, 
que  decéra  a  libertar  o  íèu 
Povo:  ^efiendíutliiferemiKd,^ 
eum :  a  terra  em  que  eftava 
a  Çarça,  fignificava  a  Ter* 
ra  a  que  hoje  chamamos 
Santa,  Ôcaílim  lhe  chamou 
a  voz  da  (^^LYf^x.Locus  enim 
inqtio  jias^  terra  fana  a  ejí,  '^^^^^^ 
E  para  hum  PaUor  como 
Moyfes,  deixar  como elle 
deixou  a  ailiílêcia  das  fuás 
ovelhas  por  ir  ver,  &  con- 
templar de  mais  perto  os 
my* 


302  Sermão  ãe 

myfterios  de  noíTa  redêp-    pelo  mcyodia,  para  que  o 

caó,6c  venerar  com  os  pès     naó  bufcaíTe  erradamente, 


defcalços  a  Terra  Santa , 
não  baila  fó  a  vontade  >  & 
deliberação  própria;  mas 
heneceílaria  particular,& 
efpecial  vocação  de  Deos : 
Cernens  quod  pergeret  ad 
*videndum  ,  vocavit  eum, 
AlHmofez  Moyfes,  que 
totalmente  deixou  entaó 
ooííicio,  &  o  rebanho:  & 
aííím  o  fez  o  noílb  Santo 
chamado  também,  &  inf- 
pirado  por  Deos,  &  por  ií^ 
íb  náo  fó  licitajôc  louvável, 
fenaófantamente,  &  com 
adtode  maior  perfeição. 

2  77  Mas  fe  foi  grande 
a  duvida  em  que  da  fua 
parte  nos  meteo  a  delibe- 
ração do  noíTo  peregrino 
em  deixar  as  fuás  ovelhas  > 
muito  maior  he  a  que  de- 
vemos admirar  da  parte 
de  Deos  na  vocação  divi- 
na taó  efpecial,rara,  &:  naó 
ufadadomefmo  Deos,  co- 
mo agora  veremos  Pedio 
aPaílora  dos  Cantares  ao 
feu  divino  Paftor  lhe  ma- 
nifeílaíTe  os  lugares  onde 
apacentava  as  fuás  ove- 
lhas ,  &  onde  defcançava 


&  de  balde  por  outras  par- 
tes :  Indica  mihi  quem  dili-  <^ant. 
git  anima  mea^  ubipafcasy'^' 
ubi  cubes  in  meridie  ,  ne  va- 
gar i  incipiampoji  gregesfo- 
daliumtuorum.  E  que  lhe 
refpóderia  o  foberano  Pa- 
ftor? Primeiro  lhe  diíTcq 
naó  conhecia  quem  era:  Si 
ignoras  te  \  porque  fe  co- 
nheceíTe  fuás  obrigaçoens, 
naó  faria  femelhante  pe- 
tição :  &:  fem  deferir  a  el- 
la,  lhe  mandou  que  feguif- 
fe  as  pifadas  do  feu  reba- 
nho ,  &  que  trataíTedeo 
apacentarcomo  os  outros 
Paftores:  Egreàere^  cr  abi  ^.^ 
poBveftigtagregum^érpaf-  '  '^' 
ce  hados  tuos  juxta  taber- 
naculapaJiorum.Qn^m.  naó 
reconhece  nefta  breve  hi- 
ftoria  ,  quam  femelhante 
foi  a  petição  da  Alma  fan- 
taaodefejo  do  noílb  San- 
to: &  quam  diíFerente  a 
repofta  que  elle  alcançou 
de  Chrifto,  à  que  ou vio  de 
fua  boca  a  mefma  Alma, 
em  que  fe  reprefentavaó  as 
de  todos  os  Paílores  de  fua 
Igreja  que  mais  o  a  mão? 
A 


f     ' 


45*.  Gonçalo.  ^05 

j\  petição  da  Alma  fanta,  he  ,  quam  fínguíarm ente 

&oderejodo  noíTo  Santo  eítimou  Chrifto  os  aíFe- 

era  de  ver  os  lugares  onde  dos  também  íingulariíli- 

Chriftoem  fua  vida  apa-  mos  com  que  S.  Gonçalo 

centou  fuás  ovelhas  com  a  na  fua  peregrinação  acom* 

doutrina    que  trouxe  do  panhou  os  paílbsda  vida, 

Ceo,  &  onde  finalmente  &  morce  ao  mefmo  Se- 

defcáçouaomeyo  dia,nao  nhorjpois  antepoz  efta  deJ 

à  fombra    da  arvore  da  vaçaó  j&defejoà  obriga- 

Cruzjenaó  pregado  ,  &  çaó,  6c  cuidado  da  guarda 

mortonella.ííTo  quer  di-  das  fuás  ovelhas.  De  húa, 

zer,  UbipaJcaSi  ubi  cubes  in  &  outra  parte  foi  defufada 


meridie.  Mas  fe  ao  noíTo 
Santo  fendo  actualmente 
Paftorlhecócedeo  o  mef- 
mo Chrifbo  efta  peregri- 
naçaó,6c que  foíle  ver,  & 
viv^er  naquelles  fagrados 
lugares 5  como  a  Alma,  6c 
Paftora  fanta,  em  que  eraó 
íigniíicados  os  outros  Pa- 
ítores,  de  nenhum  modo 
lhe  defere  o  Senhor  a  eftes 
mefmosdefejos,  &  refo- 
lutamente  lhe  manda,  que 
apacentem  as  fuás  ovelhas, 
&que  trate  cada  hum  de 
feguir  naó  as  pifadas  de 
Chrifto  em  Jerufalem ,  fe- 
naóasdofeu  rebanho   na 


fínezajmas  muito  mais  adi- 
miravel  da  parte  de  Chri- 
fto ,  a  qual  ainda  naó  eftà 
baftantemente  põderada, 
^{òi^c  pôde  dignamente 
encarecer  ou  vindo  ao  meP* 
mo  Chrifto  com  S.  Pedro, 
iftohe,ao  primeiro,  &  fii-» 
premo Paftor  com  ofegu- 
do.  Perguntou  Chrifto 
RedemptornoftbaS.  Pe- 
dro, fe  o  amava  mais  que 

os  outros  DifcipuloS  :  ^^-Joanc^^ 

mon  loannisy  diligis  meflus  ^iisr. 
his  >  E  como  S.  Pedro  ref- 
pondefte  có  a  devida  mo- 
ácíiizyTíifiis  T>ommeyqma 
amo  te-.  Bem  hbGÍsYÒsS^-' 


fua  terra:  Abipoji  vifiigia     nhor,quevos  amo:  Pois, 

g^^gum,  Pedro,  fe  meamas,  ài^^  o 

280  Oquedefta  admi-     Senhor,  Fafce  ovesmeas^ 

ravel  diíFerenca  fe  fegue  ^    Apacenta  miíxhas  ovelhas. 

Fei 


^oj,  Sermão  ãe 

Feita  eíla primeira   reco-     Io,  pois  em  lugar  de  Ihedí- 

mendação,  repetio  Chri-     zer,  que  continuaíle  em 


itid. 


íloa  mefma  pergunta  -,  & 
como  Pedro  reípondeíTe 
do  mefmo  modo:  Pois,Pe- 
dro  )  torna  a  dizer  o  Se- 
nhorjfe  me  amas,  como  di- 
zes, '^Pafce  agnos  meos^Apz- 
centaos  meus   cordeiros. 
Jà   as  perguntas  fobre  o 
amor  eraó  duas,  ôc  as  reco- 
mcndaçoens  do  rebanho 
também  duas  ,  &   ainda 
acrecentou  o  Senhor  a  ter- 
.  ceira,  ^icit  ei  tertio-^ác  íbr- 
ite  que  Pedro  fe  entritte- 
•ceojcomofe  o  divino  Me- 
"íl:re,a qiicm  faó  manifeltós 
òscoráçbens,  duvidaíTe  do 
'feuamor,  ou  deíconfiaíTe 
'  do  feu  cuidado. Pois  fe  três 
vezes  examina  Chriílo  o 
amor  de  S.  Pedro,naó  fô 
comograndej  fenaócomo 
maior  de  todos,  &  as  pren- 
dasqlhepede  deíleamor 
húa,  duas,&  três  vezes,he 
queapacente  as  ovelhns,& 
cordeiros  do  feu  rebanho , 
^afce  oves  meas-^  ^afce  ag- 
fiosmeos  ^  que  novo,ou  que 
outro  amor  he  eílc  de  S. 
Gonçalo  para  Chnílo,  & 
deChriíloparaS.  Gonça- 


apacentar  as  ovelhas,  que 
lhe  tinha  encomendado, 
lhe  infpira  que  deixe  as 
mefmas  ovelhas,  &  fe  par- 
ta peregrino  a  Jerufalem, 
naõ  fó  a  viiitar,  fenaô  a  vi- 
ver nos  lugares  fagrados, 
onde  o  mefmo  Senhor  ti- 
nha paíTa  do  a  vida,  &  pa- 
decido a  morte? 

2  8 1  A  mefma  vida  ,  & 
morte  de  Chriílo  femprc 
íixa,&  ardente  na  memo- 
ria dono/To  peregrino  Pa- 
fíor  não  ha  duvida  que  foi, 
comodejacob,  s  fua  ama- 
da Rachel  ,  pois  por  cila 
fervio  duas  vezes  íete  an- 
nos  naqucUe  voluntário 
defterro,  fendo  as  fuás  fau- 
dades  as  ovelhas,  &  os  feus 
defejos,  &:fufpiros  os  cor- 
deiros que  apacentava, co- 
meçando dcfdc  Nazareth, 
&:  acabando  no  monte  O- 
livete  ,  &:  repetindo  cílc 
amorofo  circulo  com  tan- 
tas paufas  ,  &:  eílancia.ç, 
quantos  eraó,  ou  tinhaó  fi- 
do ospaffos  do  feu  aulente 
amor.  Mas  quem  nos  aca- 
bará de  defcobrir  o  niylte- 
rio 


S.  Gonçalo'.  ^of 

fio  deíla  taó  íingiflar  no-  Te  naó  podia  apartar  áú- 
vidade,&  fem  exemplo  na  les.  Oh  íingular,&admira- 
eftimaçaó  de  Chriílo  ?  O     vel  fineza !  E  cila  digo  em 


primeiro  penfamentoque 
meoccorreo,  foi,  que  em 
premio  da  pureza  virgi- 
nal ,  que  perpetuamente 
guardou  o  nofíb  Santo,  lhe 
quiz  Deos  conceder  na 
terrayo  que  fó  concede  aos 
Virgens  no  Ceo.  Hepri- 
vilegio  concedido  no  Ceo 
aos  Virgens  5  diz  Saó 
Joaóno  Apocalypfe,  que 
clles  fó  íigaó  ao  Cordeiro, 
que  he  Chrifto,  a  todas  as 
partes  por  onde,  &  para 
onde  for  :  Virgin  es  enim 
funt :  hi  fequuntw  Agnum 
'  quoctimqueierit.V orem  os 
Virgens  no  Ceo  naó  fó  fe- 
guem  os  paífos  do  Cordei- 
rO:,mas  vem  o  mefmo  Cor- 
deiroj  &  S. Gonçalo  na  ter- 
ra fem  ver,  nem  poder  ver 
o  Cordeiro ,  lhe  feguia,  & 
adorava  os  paífos.  Elles 
feguem  os  paífos  do  Cor- 
deiro onde  eílà  o  Cordei- 
ro j  mas  S.Gonçalo  naó  fe- 
guia os  mefmos  paífos  on- 
de o  Cordeiro  eftiveífejfe- 
naó  onde  tinha  eílado,  & 
fó  porq  tinha  eílado  alli, 
Tom.7, 


conclufaó  ,  que  foi  a  que 
Chriílo  aílim  amado  tan- 
to eílimou.  A  primeira 
peíToaaquê  Chriílo  apa- 
receo  na  manháa  da  fua 
Refurreiçaó,  foi  à  Magda- 
lena.  AíIlm  o  dizem  os  E- 
yangeliílas.  Mas  porque 
mereceo  a  Magdalena  naó 
fó  com  exceiçáo  de  todas 
as  outras  devotas  mulhe- 
res,mas  também  dos  mef- 
mos  Apoílolos  5  eíle  taó 
fingular  privilegio  ?  hç,àQ 
a  Hiftoria  fagrada, 8c  o  que 
ellafez,&  os  outros  naóíi- 
zeraójôc  achareis  arazaó. 
As  outras  Marias,  como  os 
Anjos  lhe  diíreraó>  que  o 
Senhor  refufcitára,  &  naó 
eílava  alli,  foraófe :  S.  Pe- 
dro, 8c  S  Joaó  como  acha- 
rão no  fepulchro  a  morta- 
lha, 8c  o  Sudário,  8c  naó  o 
íagrado  corpo,  também  fe 
foraó :  porém  a  Magdale- 
na  fomente  porque  fabía 
como  os  demais  q  aquelle 
era  o  lugar  onde  o  Senhor 
fora  fepuitado,  iflo  fó  ba- 
ilou para  que  perfeveraíic 

V         Au 


li! 


^^o5  Sermão  de 

alli,&:  naó  fe  apartaíTe  do  do  abazterno  a  Sabedoria 

mefmo lugar.  De  maneira  divina,  que  he  o  nicfmo 

queos  outros  deixarão  o  Verbo^&dizquerecrean- 

fepulchro,porque  Chriílo  dofe  pelos  lugares  da  ter- 

naóeílavanellejporèm  o  ra^eráo  as  fuás  delicias  ef- 

amorda  Magdalena  naõ  tarcó  os  homens  :2)^//?í^^-praim; 

fe  fou  be  apartar  do  mefmo  i?ar  jjerjingulas  d'm ,  htdens  ^•^'•^'• 

fepulchroi  porque  ainda  inorbe  terrarum,&  delicia 


ijue  o  Senhor  naó  eftava 
aielle,tinha  eftado.  E  afllm 
como  bafl-ou,  que  Chriílo 
tivti^Q  eftado  dentro  da- 
^uellas  pedras,  para  que  a 
Magdalena  fe  naópodeífe 
apartar  dellas,eíla  foi  tam- 
bém da  fua  parte  a  iineza, 
^da  parte  do  mefmo  Se- 
nhor a  razaó,porque  tanto 
eílimou  o  feu  amor  ,  &  o 
antepoz  ao  de  todos. 
282    Deíle  mefmo  mo- 


me£  ejfe  ciimfilijs  hominum. 
Mas  fe  ainda  então  não 
havia  homensjquc  eíliveP 
fem  naquelles  lugares,  co* 
mo  tinha  as  fuás  delicias  o 
Verbo  em  eílar  com  ellcs? 
Porque  ainda  que  os  ho- 
mens então  não  eílivelTeni 
alli,  haviáo  de  eítar  de- 
pois. Como  fe  diíFera  o 
Verbo :  Aqui  ha  de  eílar  o 
Para ifo terreal, &  as  fuás 
delicias  eráo  eílar  com  A- 


doaíliília  S.  Gonçalo  náo     dam:  Aqui  feha  de  fabri- 
fóaofepulchro  de  Chri-     cara  Arca,  &  as  fuás  dcli- 


llo,íènáo  a  todos  os  outros 
lugares,  em  que  o  Senhor 
vivo,  ou  morto  tinha  eíla- 
dotrefpondendo  ,  êc  pa- 
gando com  eíla  fineza  o 
amor,  com  que  o  mefmo 
Chriílo  em  quanto  Verbo 
tinha  todas  as  fuás  delicias 
ab  xterno  em  eftar  com  os 
homens  na  terra.  Notai 
muito.  Traçava  cite  mun- 


ciaseraó  eítar  com  Noé  : 
Aqui  fe  fundará  a  Cidade 
deHebron,  &:  as  fuás  deli- 
cias eráo  eítar  com  Abra- 
ham.- Aqui  fera  a  terra  de 
HuSjScasfuas  delicias  eráo 
eítar  com  Job:  Aqui  fe  le- 
vantará o  monte  Smay,  & 
as  fuás  delicias  erão  citar 
comMoyfes:&:  aílim  dos 
outros  homens,  ^  dos  ou- 
tros 


§.  VL 


283 


QUanto  â  quar- 
ta vigia  ,  foi 
Santo,  Sc  admirável  Santo 
S,  Gonçalo  na  idade  da  ve- 
íliicej  porque  paílandofex 
humdefertoa  fazer  vida 
eremitica,  foube  deixar  9 
mundo  5  antes  que  o  mudo 
o  deixaáè.  Naó  quiz  queo 
achaíle  a  morte  dentro  doá 


S.Gonçah:  .  30/ 
tros  lugares.  Do  mefmo 
modo  S.Gonçalo. Em  Na- 
zarech  dizia :  Aqui  encar- 
nou o  Verbo:  em  Belém, 
Aqui  nafceo :  no  móce  Ta- 
bor,Aqui  fe  transfigurou: 
no  Calvário,  Aqui  morreo: 
no  OUvecejDaquifubio  ao 
Çeo:6cem  todos  eftes  lu- 
gares erão  as  fuás  delicias, 
cftar  com  Chriílo  >  não 
porque  alli  eftiveííè,  ma^ 

porque  alli  tinha  eftado.  *icuciin-aiiivji.uv,«wivi.v^«.vy* 

De  forte  que  o  Verbo  fup-  muros  do  povoado  j  mas 

pondoofuturOj&S.  Gon^  eilerefahioao  defertopa- 

çalo  fuppondo  o  paíTado ,  ra  a  efperar  em  campanha, 

ambos  có  o  mefmo  amor,  Oh  que  valente  refoluçáo, 

&  com  a  meíma  fineza  i  o  6c  que  bem  entendida! 

Verbo  tinha  as  fuás  deli-  Como  a  velhice  héo  ori- 

€Íascomos  homens,  onde  zontedavida,&daniorte, 

não  eftavão  ,  porque  ha*  oorizonteondefeajuntaa 

vião  de  eílar  j  8c  S.  Gonça*  terra  com  o  CcOySc  o  cem- 

lo  tinha  as  fuás  com  Chri*  po  com  a  eternidade;  que 

íl:o,onde  não  eftava  ,  por-  refoluçaó  pode  haver  mais 

que  havia  eílado,  E  por  ef-  bem  aconfelhada,  &  mais 

te  modo  excellente,  6c  íiíi*  digna  da  madureza  de  hu- 

guiar  comprío  melhor  que  mas  canSjque  dçdicar  à  có* 

todos  o  noflb  peregrino  o  templação  da  mefma  eter- 

queDeos  prometeo  por  nidade    aquelles   poucos 

ffaias ,  que  havia  de  fazer  dias,8c  incertos ,  que  pôde 

glorio fos  os  lugares  onde  durar  a  vida  .^  Não  foi  ad- 

tinha  poíío  os  feus  pès :  Et  miravel  o  noíTo  Santo  ve- 

lociimpedim  m^orum.  glori-  lho,porque  iílo  fez^mas  he 

!í'  ^'^  ficabo,  verdadeiramente  admira- 

^  Vij          M 


?°f  Sermão  de 

vel,porque  fez  o  que  deve-     que  contamos ,  tanto  mais 


Senec 


raó  fazer  todos  os  velhos, 
&não  vemos  algum  que  o 
faça.  Notou  judiciofamê- 
3  teSenecajquede  todosos 
ou  tf  os  géneros  de  morte, 
fendo  tantos,&:  tão  vanos, 
pôde  haver  efperança  de 
efcaparjfóa  morte  qtraz 
comíigo,ou  aposfy  a  ve- 
lhice, he  morte  fem  efpe- 
rança.  Mataadoença,ma- 
ta  o  incêndio,  mata  o  nau- 
frágio, mata  a  efpada,  ma- 
ta a  feta,ou  defcuberta,  ou 


faó  as  raízes  com  que  efta- 
mos  pegados  à  terra.  A  'as 
confideremos  quamdiíFe- 
renremente  tinha  paíTado 
o  noíib  Santo  velho  as  ou- 
tras ilias  idades  ,  do  que 
nòs  temos  vivido, ou  def- 
baratadoas  noíílis,  &  eíla 
feja  a  maior  advertência 
de  o  reconhecermos  por 
íingular  ,  &  venerarmos 
por  admirável. 

284     Emfímnáo  tenda 
S.  Gonçalo  porque  fugir 


atraiçoada,  mas  de  todos  defy,  íug.odenòspara  o 

eftes  géneros  de  mortes  feu  deferto,  &  levantando 

muitos  efcaparao  y  ío  da  húa  pequena   Ermida  fo- 

morte  da  velhice  ninguém  bre  as  ribeiras  do  Rio  Ta- 


efcapou :  AUagenera  mor- 
tisfpei  mixtafimt.nihil  ha- 
ht  qiiod  fperet  quem  f ene- 
ãus  dticit  admortem.  E  fen- 
do táo  defefperada  eftaef- 
perança,mais  á:i^r\:às  faó 
para  mim  de  admiração  as 


maga,  fabricada  pelas  me- 
didas do  feu  eíJDirito  5  alli 
fó  por  fó  com  Deos  em- 
pregava os  dias ,  &  velava 
as  noites  na  altjílíma  con- 
templação daquelle  fum- 
mo  bem,  que  cedo  efpera- 


-     rr  11  •  ,       2 — '         *"^  «^v-tii,  uuk.  v-tuu  cinera- 

noílas^v^lhices,  do  que  foi     vagozarcomavu^a.  Naó 
a  aeb.Gonçalo,  pois  nos     havia,oufc  ouvia  naquelle 


não  dcfenganamos  com 
ellas.  Quanto  mais  temos 
vivido  neíle  mundo,  tanto 
mais  amamos  o  mefmo 
mundo^éc  a  mefma  vida5& 
quanto  mais  iaó  os^nnoí. 


hemaventurado  lugar  al- 
gum ruído,  que  perturbai 
Ic  a  quietação  do  Santo 
Anacoreta,  fcnãoa  tépos 
demundaçocns  ,  ^  rcm- 
pcíbdcs  os  gemidos, ac  vo- 
zes 


S.  Gonçalo.  ^  ^o^ 

€cs  mortacs  dos  que  arre-     debaixo  dos  pès  dospaíTa- 


batadosda  fúria  ,  Sc  cor- 
rentes do  Rio  taó  impe- 
tuonis,como  fubicas,  ou  ef- 
pedaçadosnospenhafcos, 
ou  afogados  no  remoinho 
das  aguas  pereciaò  lafti- 
nioíliniente, &  íèm  remé- 
dio. Eraó  muitos  todos  os 
annos  os  miferaveis  nau- 


geiros a  braveza,  5c  fúria 
do  Rio,que  a  tantos  tinha 


acto. 


trag 

2^f  Grande  em pfefai 
mas  táo  aíhea  do  fogeiro 
que  a  emprendia  ,  como 
difficulrofa  ,&:  impoíTivel 
por  todas  fuás  circunftan- 
cias.  AíTim  fe  riaô  agora  do 


fragantes3&  muito  mais  as     imaginário  remcdio  os  ^ 
lagrimas  dos   que  nelles     tantas  vezes  tinhaó  chora 


perdiaó  filhos,  pays  ,  ou 
maridos.  E  que  faria  quá- 
do  ifto  ouvia,  &c  via  hum 
coração  taó  cheo,  &  abra- 
zado  do  amor  divino  ? 
Quanto  maior  he  nos  San- 
tos o  amor  de  Deos ,  tanto 
mais  forte  he, Sc  mais  foli^ 
cito  o  amor  do  próximo. 
Orava  continuamêce,  mas 


do  os  verdadeiros  perigos, 
E  certamente  quando  íc 
naó  confideraíTe  no  novo 
architevlo  mais  que  o  pe- 
fo,  &  debilidade  dos  an- 
nos 5  a  velhice  he  idade  pa- 
ra ter  trabalhado  ,  &  naa 
para  trabalhar,para  ter  fei- 
to, mas  naó  para  fazer.  E 
que  proporção   tem  Ç  di- 


porque  de  ordinário  para  ziaò}  as  contemplaçoens 

remediar  os  trabalhos  hu-  de  hum  Anacoreta  comas 

manos  naó  baftão  as  máos  execuçoens,&;  adividades 

Ocioías,  pofto  que  levan-  de  húa  taó  grande  obra?Sc 

4:adas  a  Deos :  refolveofe  o  S.Pedro  foi  chamado  nef- 

efpirito  de  hum  pobre,  ôc  cio  ,  porque  fendo  pefca- 

folitario  Ermitão  ao  que  dorquiz  fazer  tabernacu* 

iiunca  fe  atreverão  a  inté^  los  -,  que  fe  diria   do  noíío 

tar   os   braços  poderofos  Ermitão   determinado  a 

dosReys,  que  foi  uniras  fabricar  pontes.^  A  fuper- 

duas  ribeiras  do  Tamaga  ficie  defta  defaprovaçam 

Çjpm  húa  ponte » ^  meter  do  vulgo  ainda  tem  mu  irg 

^i::.  /fom7>  Y  iij         ma- 


^"li 


l  uc  j  o 

41  r~. 


maior  Fundo  naThcologia 
erpiritiia],&:  afcerica.QLiá^ 
do  Marcha  fe  queixou  de 
que  Maria  fua  irmáa  a  naò 
aiudaíre,oquelhe  refpon- 
deo  o  divino  Meílre,  foi: 
Manhãs  Manha/jolicitA 
es  5  ér  turbaris  erga  phiri^ 
7na  Maria  optimampartem 
elegit :  EíTe  voíTo  cuidado, 
Martha,poftoque  bemin- 
têcionado,  não  lerve  mais 
quede  vos  perturbar  ,  ^ 
divertirem  muitas  coufas 
alheas  da  proíiílaó  de  Ma- 
ria: &  fe  cuidais  que  ella 
aíTentada  a  meus  pès  ,  & 
ouvindome  eftà  ocioía, 
enganaif-vos  -,  porque  ef- 
colheoaparteque  Iheeftà 
melhor,  6c  mais  me  agra- 
da. ^  iílo  meímo  parece 
que  eíiava  dizendo,  ou  di- 
stando a  S.Gonçalo  a  dou^ 
trina  de  Chrifro  naquelle 
cafo,&:  contra  a  fua  decer- 
jninaçaó.  Maria  íignihca  a 
vida  contemplativa,  &  in- 
terior, que  he  a:  que  pro- 
feíTaó  os  Eremitas  ;  Mar- 
•tha  figniíifa.avidaaanra, 
^uehea  que  le  emprega 
em  acçoens  extcriorcs,po- 
fto  que  cm  fervido  'de 


'ma  o  de 
Deos,&:  do  próximo  ;  &  fe 
eíla  das  portas  adentro 
dehuaçafa,  &  occupada 
fó  em  preparar  o  que  lhe 
parecia  neceíTario  para 
hua  mefa ,  divertia,  &  per- 
turbava tanto  a  Martha; 
qual  feria  a  perturbação,& 
perpétuos  divertimentos 
do  noíTo  Ermitão,  empe- 
nhada a  fua  velhice  na  fa* 
brica  dehúa  ponte  taòdif- 
íiculcoía  ?  Pareceme  qu<? 
eílou  ouvindo  os  ruidos 
dos  carros,  dos  penhafcos, 
dos  madeiros  ,  &a  conti- 
nua bateria  dos  inftrumé^ 
tos  dos  OiTiciaes,  &trabar 
Ihadores,  huns  desbaftan* 
do,  outros  lavrando  ,  ou- 
tros fabricando,  6c  levan- 
tando as  machinas  para 
fuítentar  os  arcos,  &  guin- 
dar, 6c  aflentar a  pedraria 
ja  hivrada ;  Sc  o  author  ,  6c 
fuperin tendente  da  obra 
no  mcfmo  tempo  dividido 
em  tantas  partes,  com  o 
cuidado,  6c  os  olhos  nas 
máo6  de  todos.  Vede  fe  có- 
petiaaeíla  fua  jRidiga  me- 
lhor que  a  Martha  o  Soli^ 
cita  es ,  (^  turharis  ergapltp^ 
rm^,  :. 

•  V  '  •  ^'  •  Mas 


S.  GonçA 
i%6'  Mas  efta  mefma 
era  a  maior  prova  do  ai- 
tiííimo  grão  da  contem- 
plação a  que  o  efpirito  do 
San'to  Eremita  tinha  fubi- 
do.  A  Alma  que  chegou  ao 
cume  da  perfeição  da  vida 
contemplativa,  nem  asacr 
çoens  lhe  divertem  a  con- 
templaçãojnem  a  contem- 
plação lhe  impede  as  ac- 
çoens  3  mas  toda  dentro5& 
toda  fora  de  fy,  juntamen- 
te eílà  obrando  no  exte- 
rior,&  no  interior  cótem- 
plando.  Que  vida  mais 
a£tiva,&:  mais  aduofajque 
a  dos  Anjos  fempre  occu- 
pados5&  nunca  jà  m  ais  di- 
vertidos ?  Omnesfunt  ad" 
.  mintftratorijfpiritus  in  mi- 
nifterinm  míffi.  Os  Anjos 
da  guarda  de  dia^&i  de  noi- 
feeftão  velandojcada  hum 
íòbre  o  homem  que  lhe  ef- 
tà  encomendado  :  os  Cu* 
ílodios  dos  Reynos ,  & 
Monarchias  íèmprc  atten- 
dendo  ao  governo,  &  con- 
fervação  delias  na  paz,  & 
<ia  guerra, &  em  tantos  ou- 
Çros  accidentes  ,  que  nun- 
ca paráoros  que  guião  com 
tanta  ordçm,  &  concerto 


lo.  Cíli- 

os AílroSj  cada  hum  mo- 
vendo a  fua  eílrelía,  quaíi 
todas  maiores  que  efle 
mundo.  E  de  todos  diz 
Chrifto :  Semper  videntfa-^  \  %,ip\ 
ciem  ^atris ,  qui  in  Calis 
eft :  Que  eílão  fempre  con- 
tem plando  a  face  de  Deos> 
comofe  eíliverão  no  deí- 
canço>5cíbcegodo  Empi* 
reoíem  outra  occupaçãOj 
ou  cuidado.  E  tal  era  a  c5^ 
templaçáo  verdadeiramê-- 
te  Angélica  do  noííb  Ana- 
coreta, tão  quieto ,  &  fem 
perturbação  no  meyo  da 
tumulto,  &  trafego  da  fua 
obra  ,  como  fenão  tivera 
fahido  da  ília  Ermida.  Po-»- 
dendofe  dizer  delle  o  que 
do  mefmo  Deos  ,  de  cuja 
vifta  nunca  fe  apartava : 
Immotusque  manens  das 
cunEia  movéri. 

2  87  Vencida  efta  pri- 
meira apprehenfaó  ,  &  co- 
nhecida a  concordiaj&ar- 
monía,  que  confervão  dê- 
trono  mefmo  efpirito,  fe 
he  perfeito ,  a  vida  adiva , 
&  contemplativa  ,  a  qual 
não  entendião  os  que  con-- 
íideraváo  o  noííb  Eremi- 
ta divertido  do  exercicio. 
V  iiij        da 


ií 


fu 


•^^^  ^  ,  Sermão  de 

da  fua  pronnaó  5  feguefe  a  do  qual  diz  S.  Paulo,  aue 
regunda.cm  que  toda  a  tudo  crè,  tudo  efp era  ,^^ 
prudência,  &  providencia     com  tudo  poác:Omnia  cre- 


humana  podia  reparar 
muito.  E  qual  era?  Que 
hum  homem  fó,  &:  defaíFi- 
íHdodetodaaoutra  com- 
panhia, 6c  poder,  íe  atre- 
veíTea  hua  emprefa  ,  que 
muitos,  &  muito  podero- 
íos  juncos  jà  mais  empren- 
deriáo,nem  imaginavam 
poílivel.  Se  os  fabricado- 
res  da  Torre  de  Babel,  fen- 
do todos  os   homens  que 


T.Cot. 
II. 7. 


dit^  omniafperat ,  omntafn 
ftinet.  Hu  dos  que  fe  acha- 
rão entre  os  edificadores 
da  Torre  de  Babel  ,  foi 
Noè  j  &  he  coufa  bem  no- 
tável, que  a  ellefó  enco- 
mendaíFej&dellefó  fiaíFc 
Deos  a  fabrica  da  Arca. 
Fac  tibí  Arcam  de  ligms^tvxC 
Uvigatis,  lhe  diíTc  o  fupre-  '^  '•*• 
mo  Architedo  daquella 
novamachina,  &  prefcre- 


,  , —   1 —     *iwvrt  iixai^iiiija,  oc  prcicre- 

havia  no  mundo  juntos,  &     vendolhe  a  traça,  a  forma, 
unidos   no  mefmo  penfa-     &as  medidas  com  tanta 


inento,o  íim,&  effeito  que 
confeguiráo,  feia  confu- 
íaó,&  defengano  da  fua  te- 
meridade >  verdadeiramê- 
|:eparece,  que  náo faziam 
grande  injuria  às  caos,  & 
prudência  do  noíJb  Santo 
veiho,os  que  reprova  vão, 
que elle fendo  hum,  Sc  fó. 


ain 


da 


miudeza,nem  em  comum, 
nem  em  particular  faz 
mençaó  de  outro  Artiíi- 
ce  5  ou  companheiro,  que 
ouveíie  de  ter  parte  na 
obra,fenaóo  meímoNoè 
fomente:  Manjiunculas  in 
Arca  factes  ^  Ò'  bit imine  li- 
mes intriníecus^  &  extrin-  ^^'^  ^» 


que  a  fua  idade    ficns-.&jir fácies eam.Voís'''' 


foffe  mais  viva, &  mais  ro 
buíla  3  intentaíle  húa  tal 
pbra.  Mas  o  que  ninguém 
cria,  nem  efperava ,  mten- 
fou,profeguio,&  levou  ao 
lim  cm  S.  Gonçalo  a  cari- 


fe  a  fibrica  era  taó  grande, 
&  taó  nova,&  previa  Deos 
que  todos  os  homens  do 
mundo,cntrando  nelte  nu- 
mero o  mefmo  Noé  ,  nam 
haviam  de  poder    confe- 


tí;ide,ôcamor  dpProximp,     guir,  nè  cgncinuar  aquclla 


!••; 


S.  Gonçalo.  ^rjf 

Torre  na  terra  ,  havendo    var  dismiindiçoens   do 


decereíla  fabrica  os  ali- 
ceíTesfobreaagua;  como 
a  encomenda,  &:  íiadehu 
fó  homem  ?  Porque  o  in- 
tento da  Torre  era  a  vai- 
dade, o  intento  da  Arca  a 
caridade. O  intêto  da  Tor- 
ra era  celebrarem  os  ho- 
mens o  feu  nome  antes  de 

fe  dividirem  :  Qeiebremus    fuerit  fundamentmn^  &  non 
Gcneí.  nomen  noftrum    antequam    potuerit  perficere^  omnesquh 
intento  da 


Rio. 

288  Mas  ainda  aqui  nos 
falta  por  dar  íatisfaçam  a 
húa  grande  máxima  da 
doutrina  de  Chriílo.  ^is 
exvobis-volens  turrim  (edi- 
ficarei nonpriusfedens  com»  \.x\c.x^ 
putatfu  mptus^  qui  neceffa-  ^  ^  •  ^9- 
rtj  fimt :  nepofieaquam  po- 


dhndamiir  :  o 
Arcaerafalvaros  homens 
da  inundação  univerfal 
do  Diluvio:  Utpoffim  vi- 
vere :  &c  quando  para  con- 
feguir  os  intentos  da  vai- 
dade, naõ  baftaô  todos  os 
homens;  para  os  da  cari- 
dade, por  árduos  ,  &z  diili- 
cultofos  que  fejaõ  ,  baila 
hum  ío  homem.   Trocai 


vident-,  incípiant  iUitdere  etí 
Que  homem  ha  de  vòs  >  O 
qual  querêdo  edificar  húa 
torre,  naó  lance  primeirp 
asíiias  contas  muito  deva'- 
gar,  &:  computando  o  ca- 
bedal com  asdcrpefasi  nap 
vejafe  he  baílante  \  por^ 
lhe  naó  aconteça  começar 
a  obra, 8c  não  a  poder  aca- 
bar,ficandoella,  ^elleex-» 


agora  o  nome  de  Noè  em  poílosaorifodas  gentes  ^ 

Gonçalo,o  da  Arca  em  Pó-  Ifto  he  o  que  enfína  Chri- 

te,&:odo  Diluvàoem  Rio:  fto  Senhor  noílb,  &  efta$ 

&  vereis  quam  bem  fun-  faóascontas,  Sco  compu- 

dada  foi  a  caridade  do  nof-  to  que  devia  fazer  o  noííb 

ío  Santo  na  efperança  de  Eremita  antes  de  pòr^nao 


famento  à  obra :  ver 
meiro  fe  tinha  com 


levar  ao  cabo  afua  obra-,     digoa  máo,  fenaó  o  pen 

poisailimcomo  a  deNoè 

era  para  falvar  os  homens 

xla inundação  do  Diíuvioj     comprar  os  matenaes,  có 

aíTim  afua  era  paraosfal-    ^que pagar  aos  Meílres,  cq 


pn- 
que 


o:> 


314*  Sermão  de 
que  fazer  ^  feria,  &  fuften-  fabulas,  que  Orfeo  com  a 
tar os  trabalhadores,  &ir.  fua  Cithara  edificou  os 
to  naò  fó  para  começar  a  muros  de  Tliebas',  porque 
obrajfenaô  para  a  pòr  em  era  tal  a  doçura ,  &  fuavi- 
perfekaó.  Agora  pergun-  dade  daquelle  pequeno  in- 
ço fe  fez  S.  Gonçalo  efte  ftru mento  tocado  porelle, 
computo?  Digo  que  fim,  que  levava  após  fy  as  ar- 


voresjos  montes,  os  rios,a5 
feras,  &  atè  a  liberdade 
dos  homens.  Aífim  creciap 
fabulofamenteemTheba^ 
os  muros,  &  aílim  em  A- 
marante  verdadeiramente 
aponte. 

289  DerãolheaS.  G6- 


&  com  taó  nova ,  &  a  bre 
yiada  Aritmética, q  todo 
o  refumio  a  duas  adiçoena 
fomente :  primeira,Eu  naó 
poflb  nada :  fegunda,  Deos 
pode  tudo.O  mefmo  tinha 
jà  feito  S.  Paulo,  quando 
diÇCcOmnia  pojjum  in  eo 

Philip.  ^^\ ^^  confortai :  Eu  pelas  calo  huns  touros  bravos,& 

é-^i-     minhas   forças  nenhuma  feros,&ellecom  a  voz  de 

coufapoíToj  mas  pelasque  húafó palavra  osamanfou 

Deosmedà,  fou  todo  po-  de  maneira  ,  que  logo  to- 

derofo.  Tal  era  o  efpirito ,  máraó  o  jugo,&  tirara  ó  pe- 

6c  tal  a  confequencia  do  lo  carro,  feguindo  a  quem 

noíToSantoiporqueeunaó  esguiava,  comofetiveraó 

poíTonada  ,  eufem  Deos  eníino  de   muitos  annos. 

Dão  poderei  mover  huma  Chegava  à  ribeira  do  Rio, 

pedra  :  mas  porque    Deos  chamava  os  peixes,  &  eiles 

pôde  tudo,  eu  com  Deos,  corrédoem  cardumes  fal- 

&Deos  comigo  bem  po-  tavãoaospèsdoSanto,em 

detemos  fazer  aponte.  E  quanto  elle  não  dizia  ba- 


aííl m  foi.  Naó  deo  Deos  _ 
S.Gonçalo  a  Vara  deMoy- 
fes  i  mas  para  lhe  dar  ainda 
mais,  deolhe  a  Cithara  de 
Orfeo,f:izendo-ade  f:ibu- 
íofa  vcrdadeixa,CoataQ  as 


lia,  &  os  demais  com  fua 
benção  fe  retiravaó  para 
tornarem  outra  vez  quan- 
do foíTem  chamados.  Era 
neceíí:u'ia  agua  para  mais 
ftcil  íerviço  da  obra,tocou 
a  SAn< 


S.'  Gonçalo.  3  ^  f 
o  Santo  velho  com  o  feu  co,  elle  eícurandofe  por  ef- 
bordaó  em  hua  pedra  ,  Sc  tar  fora  de  caía,  lhe  refpó* 
correo  logo  húa  fonte:  mas  deo, que  íiiã  mulher  o  foc- 
porquea  agua  bailava  pa-  correria5dandolhe  para  ei- 
ra fatisfazer  a  fede,  &  nam  la  hum  efcrito.  Recebeo-o 
para  alegrar,  &  dar  forças  a  mulher,  &  rirídofe  para  o 
aos  trabalhadores  ,  tocou  Santo,lhe  diíTe :  Padre  Er- 


.rioT 
•1? 


do  mefmo  modo  em  outra 
pedra,  Ôc  (ahio  delia  outra 
fonte  de  vinho.  Trabalha- 
vaô  muitos  braços,  &  mui- 
tos inftrumentos  para  aba- 
kr  hu  m  grande  penedo  , 
(em  elle  fe  mover,  mas  cô  o 
impulfodehuafó  maó  do 
Santo,  mais  como  andan- 
do por  fy  mefmo  ,que  le- 
vado por  força ,  fé  foi  pèr 
onde  erà  necéíTariOvForé  m 
como  ha  homiens  mais  du- 
ros que  as  pedras ,  Sc  mais 
irracionaes  que  os  brutos  j 
aili m  como  com  elies  per* 
fuadindo-òs (O  Saiito   fúal 
vemente  a  quanto  queria, 
femoílrava  mais  evideni 
temente  a  oculta  divinda- 
de ,  que  lhe  governava  a 
lingua  vâílim  ouve  hú  tão 
duro, &  tão  afbuto,  que  pe* 
dindolhe  o  pobre  Ermi* 
táo,em  cuja  fantidade  naõ 
criajalgum  foccorroparaa 


mitáo,  efte  credito  não  vail 

nada  •,  porque  o  que  nelle 

me  diz  meu  marido  ,  he  q 

vos  dè  de  efmola  quanta 

pezarefte  papel.  Defpedi* 

do  taò  íècam  ente,  replicou 

com  tudo  o  Santo  ,que  f$ 

pezaífeopapel  como  mã»- 

dava  o  dono  da  cafajSí  qu« 

elle  pelo  pezo  fe  contenta* 

ria  có  a  efmola.    Cafo  vèr* 

dadeiramêteda.máo  ocul* 

tadeDeos!  Poz-feo  papel 

em  húa  parte  da  balança  ^ 

&  quando  parece  que  ba-^ 

ftavaõ  poucos  gráos  de  tri^ 

go  l^araia  por  em    equili^í- 

brio,  viera 6"facos5&  maia 

facosj&po dera  vir  todo  Q 

ceileirojfem  igualar  o  pezo 

do  papel, que  naò  chegava 

a  húa  folkav  Là  fe  queixa» 

va Job  de  'que a  Omnipo* 

tencia  divina  para  o  mor% 

tiiicar' ,  ofleãtaíTe  feu  in A^ 

nito  poder  contra  húa íok 

fua.Qb-ra,  .^or  íkzmmm  *>    ilia,quetea  ç  vçatQ  'r-  C^tu 


/  >" 


3^^  Sermão  de 

Job.  13  trafolhim.quoãvento  rapi-  como  diz  Plínio,  he  huma 

^s-      turyoífendíspotentiam  tua:  flor,  a  qual  porque  nunca 

^  cà  para  canonizar  a  S.  fc  murcha,  mereceo  dcfde 

Gonçalo  oílenta  feu  poder  a  antiguidade  o  nome  de 

a  divina  Potencia  em  fazer  immorcal.  líTo  íigniiica  o 

taó  pezada  húa  meya  fo-  mefmo  nome  que  Ihepo- 

ina  ,  que  nenhum  pezo  a  zeraó  os  Gregos,por  onde 

podcíie  Igualar,  nem  leva-  lhe  cantou  a  immortalida^ 

tar,nem  mover.  AlTim  có-  de  o  Poeta  h^ninodmmor* 

correo    Deos  juntamente  talesqtie  Amararithi.   E  fc 

como  noíTo  Santo  no  co-  bufcarmos  no  Evangelho 

jneçar,no  continuar,  Seno  eíla  quinta  vigia  ,  achare- 

aperfeiçoarafua  obra  5  &  mosque  depois  de  failar 

alFim  a  deixou  perfeita,  &  exprelTa mente  na  fegúda, 

acabada  para  tanto  bem  &  terceira,&  fuppor  nefla 
de  tantos,  antes  que  a  ulti- 
ma idade  IJie  acabaílc  a  yi^ 
4%'7  ói^O    j.  ■  ofíiio  -'•  <;  a  íii-í 


, ;  apo  ^"^Oncíuídastaó 
V^^  felizmente  as 
quatro  vigias,  6c  idades  da 
vida  humana,  qual  cuida- 
mos que  feria  a  quinta  vi- 
gia, que  eu  prometi  do 
iioííb  Santo  ,  naójà  de  vi- 
yo,&: mortal,  fenaôdeim- 
-mortal,  &  depois  da  mor- 
te ?  h  íla  nova  prerogn  ti va 
mais  parece  que  lhe  con- 
vém a  S.Gonçalo  de  Ama- 
rante pelo  fobrenome,quc 
pelo  ijome.  O  Aniaxaatho^ 


mefma  conta  a  primeiraj^c 
a  quarta    ,   introduz  em 
quinto  lugar  outra  inde- 
terminada ,  &  nella  hum 
Pay  de  famílias  muito  vi- 
gilante :  §hiontamfi  feira 
'Pater famílias  qtia  horafur  \^^^'  ^■ 
veniret ,  vigilaret   utique, 
Eíla  pois,  naó  das  idades 
que  tem  íim  ,  mas  da  vida 
immortal  quenaó  acaba, 
foi,iSchea  quinta  vigiado 
noíTo  Sanro  ,  na  qual  lhe 
quadra  admiravelmente  o 
nomedePay  de  fiimiliasi 
porque   elle    verdadeira- 
mente he  o  Pay  univcrfal 
nam  íó  daqucllagrande,& 
numerola,  PrQYÍjucu>mas 
de 


S.  Gonçalo,  517 

de  todas  as  viíinhas ,  6c  có-  cilía  nas  difcordias  -,  elíe 

íinantes  j  as  qiiaes  em  tudo  emíim,  fe  andáo  defgarra- 

oqiiehaómifterde  perto,  doSjOs  encaminha  ,  &  tal 

&  de  longe,  a  eile  recorre,  vez  os  caíliga  tambê  amo- 

Sò  quem  o  vio,  o  pode  có-  roíam  ente  ,  para  que  nao 

tarj&crer.  Se  naó  tem  fi-  degenerem  deíilhos  de  tal 


lhos,  a  S.Gonçalo  os  pedéj 
&  fe  tem  muitos,a  S.  Gon- 
çalo confultaó  fe  os  haó  de 
mandar  à  guerra, ou  ao  ef- 
tudo,  ou  aplicar  ao  arado. 
Sehaò  de  caiar  as  filhas, S, 
Gonçalo  heocaíàmentei- 
ro,&feos  próprios  pays, 
ou  não  podem,  ou  fe  átí^' 
cuidáo  de  lhe  dar  eftado,  a 
lembrança  que  ellas  por 
modeítiaiè  naó  atrevem  a 
lhe  fazer ,  a  fazem  em  fe- 


Pay. 

291  Por  todas  eftas  ra- 
zoens  confirmadas  có  infi- 
nitos exemplos  me  parecia 
ao  principio,  quecò  o  no- 
me de  Pay  de  familias  fa- 
tisfazia  S. Gonçalo  às  obri- 
gaçoens  da  quinta  vigia, 
que  lhe  acrecentamos  à  vi- 
da. Mas  bem  confiderada 
o  que  depois  de  morto,  òc 
immortal  obra  ,  &  eítà 
obrando  cada  dia  em  be- 


gredo  ao  Santo,  que  como     neficio  dos  que  o  invocaó^ 
mais  poderofo,  &  mais  vi-     não  ha  duvida ,  que  lhe  vé 


gilantePay,  fe  naó  defcui 
da.  A  elle  encomendaó  os 
Paílores  os  gados,6c  os  La- 
vradores as  fementeiras:  a 
elle  pedem  o  Sol  ,  a  elle  a 
chuva :  &o '  anto  pelo  im- 
pério que  tem  fobre  os  ele- 
nientos,afeu  tempo,&  fo- 
ra de  tempo  os  alegra  com 
odefpacho  de  fuás  peti- 
çoens.  Elleosremedea  nas 
pobrezas,  ú\q  os  cura  nas 
enfcrmidades,elie  osrecá" 


muito  curto  eíle  nome.  E 

para  inventarmos  algum, 4 
iguale  as  medidas,  &  encha 

o  conceito  de  fuás  mara- 
vilhasjaílim  como  ao  prin-; 
cipio  diífcque  no  feu  naf-* 
cimento  foi  minino  como 
home,  ailim  digo  por  fim  , 
que  depois  da  fua  morte 
foi  homem  como  Deos: 
Alguns  annos  depois  de 
morto  S.  Gonçalo  em  oc- 
^fiáo  de  húa  extraordiná- 
ria 


m 


318  Sermão  de 

riu  tcmpeílade  vinha  tâo     todos  graças  a  S.  Gonçalo, 


cheoj&furiofo  o  Rio  Ta 
maga,  que  náo  fó levava 
envolto  com  figo  quanto 
encontrava  nas  ribeiras, 
mas  também  nos  montes. 
Entre  outras  couíàs  vinha 
atraveííàdo  na  corrente  hu 
carvalho  de  tanta  grande- 
za, que  julgarão  attonítos 
quantos  o  viaó,que  baten- 
do como  pezofeu,  &  das 
aguas  a  Ponte, arruinaria 
os  arcos,  6c  a  derrubaria 
feni  duvida,    S.  Gonçalo, 


que  peio  Habito,  &  lugar 
donde  fahira  viíivelmen- 
te,  fe  lhe  manifeílou  quem 
era.  E  eu  torno  a  repetir, 
como  dizia,  que  neíla  ac- 
çaó,bem  entendida,  mo- 
llrouonoííb  Santo,  q  para 
com  as  fuás  obras  nam  fe 
portava  como  homem  ho- 
mem, fenão  como  homem 
Deos. 

292  Entre  as  caufas  fe- 
gundas  j  comofaô  osho- 
menSj6ca  cauíli  primeira, 


C gritarão  todos^S.  Gon-  quehe  Deos,  ha  tal  diíFe 

calo, acudi àvoíía  Ponte:  rença    comummente    no 

eisque  no  meyo  deftes  cia-  obrar,que  das  caufas  (c^xx-^ 

mores  vem  fair  da  Igreja  das,comofaíláoosFílofo- 

hum  Fradinho  veílido  de  fos,dependem  as  obras  fó- 

branco  com  o  manto  ne-  mtntc infierí-y  mas  dapri- 

gro,  &  hum  cajadinho  na  meiracaufa  dependem  in 

máo,  o  qual  voando  pelo  feri  ,  ó-inconjervari:  dasl 

ar  ao  Rio  ,  lançou  a  volta  caufas  fegundas  depende 

do  cajadinho  a  hum  ramo  as  coiifas  quanto  ácriaçaój 

dotronco,&fazendo-ocn-  masdacaufa  primeira  naó 

canar, 6c embocar  direito  fó  dependem    quanto  à 

pelo  olho  do  arco  maior,  criação,  fenaó  tambê  quá- 

çllepaíTou  precipitado  c6  toàconfervaçaó.Quantoà 

a  corrente, 6c  a  Ponte  fem  criação,  Deos,6c  o  Pay  gc- 


dano,nê  perigo,  íicou  taò 
íirme,6c  inteira  como  fora 
edificada. Com  iguaes  cla- 
mores, 6c  triunfos  deram 


raõ  o  Filho  :  quanto  à  con- 
íèrvaçaõ,  Dcoshefóoquc 
o  confcrva  fcm  dependên- 
cia, nem  concurlb  do  Pay. 
Da- 


mas  obras  as  tinha  Deos 
criado,&  feito  para  as  fa- 
zer:  Ah  9mm  opere fu&^quod 
creavit  'Deus  5  ut  faceret. 
Pois  fe  as  úv)}ii'x  jà  fei  to,  co- 
mo as  fez,&  criou  para  as 


S.Gonçãla.  ^ic? 

Daqui  fe  entendera  aquel-  de  fer.  Pois  aílim  como 
le  modo  notável  de  f ai  lar  meu  Pay  obrou  ao  fabba- 
com  que  diz  a  Efcritura ,  do  naô  fervil ,  fenão  fobe- 
que  Deos  ao  dia  feptimo  ranamentejaflimofaçoeu. 
defcãçou  de  todas  as  obras  Ifto  he  o  que  faz  Deos  co- 
que tinha  feito :  Requievit  fervando  as  fuás  obras  5  & 
die feptimo  ah  univerfo  ope^  ifto  he  o  que  fez  S.  Gonça- 
rei^uodpatrarat :  &  logo  lofahindo  porfymefmo  a 
acrecenta,q  todas  as  mef-  confervara  fua.  Confer- 
"^  You-aenta63&  ha  tantos 

centos  de  annos,  que  a  có- 
Tervaj  &  a  çonfervarà  fem- 
pre  5  porque  nas  fuás  obras 
náo  obra  como  home  ho- 

— , ^ ^    mem,  dequem  àQpQnÚQm. 

fazer  ?  Forque  a  primeira  fó  tnfieri^  fenao  como  ho- 
vez  fellas  de  novo  pela  mem  Deos  ,  de  quem  de- 
criação,  &  depois  de  cria-  pendem  inferi ,  é^  confer^ 
das,  para  que  náo  deixaf-  Vâri, 
fem  defer,fempreas  ha-  193  Vamos  a  outras 
via  de  eftar  fazendo  pela  obras  de  Deos  homem,  & 
confervaçáo.Heoqueref-  de  S.Gonçalo,  Foraó  os 
pondeo,&  declarou  Chri-  difcipulos  do  Bautifta per- 
ito, convencendo  admira-  gíãtar  em  nome  de  feu  Me- 
velmenteaosqueocalum-  íi:reaChrifto,feeraelle  o 
niaváo.de obrar  ao  fabba-  verdadeiro  Deos,  6c  home 
do :  Tater  meus  ufyue  modo  prometido  peios  Profetas, 
operatury  ér ego  operor.  Por  &  efperado  do  mundo.T?/  ^^^ 
ventura  Deos  no  mefmo  esquiventurusesyanalium  luf} 
dia  do  fabba  do  em  q  def-  expeãamus>  E  qãttcÇ^on- 
cançou  das  fuás  obras, dei-  deo  o  Senhor?  Em  prefen- 
xou  de  obrar?  Naô  i  por-  çados  mefmos  difcipulos 
que  fe  deixara  de  obrar  có-  deoolhosa  cegosjouvidos 
íervando-asjdeixáraó  ellas    a  furdos,  lingua  a  mudos 3, 

íi^iáoa 


3-0  Sermão  de 

mios  a  alejados,  pès  a  mã-     raçoens  dos  trifles,  dos' af- 


rDid.4. 


cos,  faiide.&:  limpeza  a  le- 
proros,&  vida  a  mortos.  E 
eftafoiarepoíla  com  que 
os  defpediojdizendo:  £■«;?- 
tes  reniintiate  loanni^  qute 
audiftis^&vidiflis-.láQ^ái- 
zei  a  Joaó  o  que  ou viftes, 
&viftes.O  mefmorerpon- 
doeu  a  quem  por  ventu- 
ra duvidar  do  que  tenho 
dito,  ou  eftranhar  que  Te 
diga  de  S.  Gonçalo,  q  nam 
obrava  como  homem  ho- 
mem, fenaó  como  homem 
Deos.  Ide, ide  a  Amaran- 
te, vilitai  no  far^rado  iVIau- 


fli£l'os  ,  dos  perfeguídoS) 
dos  defefperados  ,  que  fó 
na  invocação  do  nome  de 
S.Gonçalo acháraô  a  con- 
folaça®,oaíivio,  arefpira- 
çaõjO  remédio. 

294  Aílím  obra  como 
immortal  depois  de  morto 
o  grande  imitador  deDeos 
homem.  E  porque  o  mef- 
moSenrhor  deixou  ditOjq 
depois  de  fubir  ao  Ceofa- 
riaó  feus  fieis  fcrvoá  na  ter- 
ra naó  íò  femelhátes  obras 
às  ruas,fenão  maiores:0/é'-  Joann: 
ra  qu^  ego  facioyfaciet  ,  c^  '"^•'^ 


foleo  de  S.Gonçalo  as  me-     maiorafaciet ,  quta  ad  Ta- 
morias  immortaes  de  fua     írf;;/^W^.  Seattentamen- 


vida  pofthuma,  &  vereis  o 
que  me  ouvis.  Vereis,  ou 
pintadas  ,  ou  de  vulto,co- 
motrofeos  das  fuás  obras 
divinamente  humanas ,  as 
muletas  dos  mancos  ,  os 
braços  dos  alejados  ,  os 
olhos  dos  cegos,  as  orei  has 
dosfurdosjaslinguas  dos 
mudos,  as  mortalhas  dos 
mortosjou  moribundos:  & 
porque  os  maies  interio- 
resj&invirivcisíiió  os  que 
maisatormentaó  ,  &  ma- 
taõ>  tambcni  vereis  os  co- 


te confiderarmos  as  circú- 
ílancias  deíles  milagres, 
acharemos  que  os  de  S. 
Gonçalo  comparados  cò 
os  do  mefmo  Deos  home 
tem  hoje  no  modo  de  os 
obrar  grandes  exceíTos  de 
maioria.  Grandes  eraò  os 
concurfos  dos  que  em  fé 
dos  milagres  que  obrava, 
bufcaváo  ,  &:  íeguiaó  a 
Chrifto  :  Seque batur  eiitn 
multttudo  nuigna 
debant jigna ,  qn.i:  fncicbat 
fiiper  hiò^qni  injírmabanttiry 
diz; 


quíavt-  ^ 


S.  Gonçalo.  ^^i 

dizSJoaÕ.  Efepergun-  quias,  &  eiicomendarre  a 
tarmos  ao  mefmo  E  vange-  feu  patrocinio,naó  faó  cin- 
lifta  a  que  numero  chega-     co  mil,nem  dez,  nê  vinte, 


ibid.f, 


ria  a  maior  multidão  de- 
íles  concurfos  ;  naó  fó  com 
o  nome  de  maior,  fenaó  de 
niaxima,diz  que  chegarão 
aferquaíicinco  mil:  Cum 
fublevaffet  óculos  lefus ,  & 


fenaó  trinta  ,  &  quarenta 
mil.  Vereis  que  a  multidão 
innumeravel  denaturaes* 
&  cftrangeiros  naò  cabe 
pelas  eílradas  ,  que  cobrc 
os  montes ,  que  inunda  09 


Ibid.  10. 


vidijfet  quia  multitudo  ma->  valles,&  que  não  podendo 
xlma  venit  adeum :  Sc  logo  todos  entrar,  nem  chegar 
declarado  o  numero  :  !D//-  de  perto,cercáo  tumultuo^ 
cubuerunt  ergo  viri  numero  famentea  Igreja,veneran- 
quaji quinquemillia. AhS^'  do,6c  adorando  de  longe 
nhor,com  quanto  exceíTo  as  paredes  fantas,  queen- 
fe  prova  no  voíTo  fideliín-  cerraó  táo  benéfico  ,  &  fo- 
rno fervo  a  verdade  da-  beranodepoílto.  Eeftehe 
quella  grande  promeíTa!  outro exceíTo de  maioria. 
Quando  naterra  levanta-  que  também  na  compara- 
ftes  os  olhos  para  ver  a  çáo  de  vòs  mefmo  lhe pro- 
multidaó  dos  que  pela  fa-  meteíles. 
ma,& experiência  de  vof-  29f  Para  receberem  a 
fos  milagres  vos  feguiáo,  a  faude,dizem  os  Evangeíij 
maior,&rnais  numerofaq  ftas,quea  multidão  dos  q 
viílesyfoi de  cinco  milho-  concorriaóa  Chrifto  ,  to- 
mens.  Porém  hoje  fe  do  dosprocuraváo  tocar  feu 
Ceo  onde  eftais,aba  terdes  facratiíTimo  corpo>do  qual 
os  mefmos  olhos  divinos ,  fahia  a  virtude,  que  os  fa- 
&  os  puzerdes  em  Amará-  rava :  Omnis  turba  qudere^ 
te,  vereis  que  pela  fama ,  &  bat  eum  tangere^quia  virtus 
experiências  dos  milagres  deillo  exibat  y  &  Janabat 
de  S,Gonçalo,os  que  con-  omnes.  Cà  também  procu- 
correm  neíte  feu  dia  a  vi-  raó  o  mefmo 5  mas  porque 
fiçar  fuás  fagradas  reli-  o  aperto,6c  a  multidão  que 
:  Tom./.                   '  X            con. 


322  '  Sermão  de 

contenciofamentc  fe  im-     Invocareis oSenhor^&elIc 


pedejhonaó  permite ,  de 
longe  venéraó  o  Santo,  de 
longe  fe  encomendaõael- 
Je,6c  de  longe,  ou  recebem 
logo  os  milagrofos  eíFeitos 
de  fua  virtude  5  ou  a  levaó 
comíigo  alegres  a  fuás  ca- 
fasjcomoprimicias,  d<  pe- 
nhores certos  dos  beneíi- 
cios,que  na  occafião  da  ne- 
ceilidade  nenhum  duvida 
Ihehajão  de   faltar.  Mas 


vos  ouvira:  chamalohei», 
&  elle  dirá  :  Aqui  eftou.. 
Aquieftou  jdiz  Deos:  & 
Aqui  eftoujdizS. Gonçalo, 
homem  emíim  no  obrar 
como  Deos :  Invocabis^  à* 
dtcet :  Ecce  adjum. 

E  porque  algúa  vez  in- 
vocado S.  Gonçalo,  fuce- 
deràquevos  naò  conceda 
o  que  pedis,  &  pareça  que 
vos  nam  ouve  \  fabei  de 


que  muito  he,  que  aquella     certo, que  vos  enganais,  & 
venturofaProvincia,  &  as     naó  quero  por  prova  ou- 


outrasvifinhas,  &  coníi- 
áhantes  logreni  a  felicidade 
de  táo  continuos,  &  certos 
favores :  fe  as  remotiíli  mas 
terras  da  Africa,da  A  íia,& 
defta  America,  onde  ape- 
gas ha  lugar,  que  naò  te- 
nha levantado  Templos, 
4DU  Altares  a  S.  Gonçalo,fó 
com  a  invocação  de  feu 
jiome,comofe  nelie  fe  ti- 
vera facramentado,  pelo 
efFeito    maravilhofo    de 


tro  exemplo,  fenaó  o  da 
mefmo  Deos.  Deos  diz, 
que  peçamos,  &  que  rece^ 
beremós :  Tetite^  &  acci-  I^^JJ*- 
j&/>r/>:  8c  com  tudo  moílra 
a  experiência,  que  muitas 
vezes  pedimos,  &  não  re- 
cebemo<í.  Náohatal,  aco- 
de S.Agoílinho.  Que  nam 
recebemos  o  que  pedimos, 
he  verdade:  mas  que  naò 
recebemos,  hefallb  /porq 


9- 


fenam  recebemos  o  que 
fuás  graças  de  taò  longe  o  pedimos,&  queremos ;  re- 
exprimentaõ,  &  tem  pre      cebemos  o  que  devêramos  :^ug^í^ 

pedir,  &  querer.   AT-^^^r  Ep^íi. " 
^ominus  cjuod  volumus^  ut  ÍX^. 
trtbuat  qnod  rnalhnius,  A  f- 
j[pi  fa^  cambem  algumas 


fente.DeDcosdiziaoFro- 
fctalfiias  :  hivocabis  ,  à* 
^omimis  exaiidiet :  clama^ 
kfs^  ii^dicet  :  Ecceadfum  : 


fcMk.« 


S.  Gonçalo. 
vezes  S.  Gonçalo,  &  naó  ítia 
fora  Santo,  nem  amigo,  fe 
aílim  o  naó  íizera.Taó  mi- 
lagrofo  he  quando  faz  por 
vos  o  milagre ,  porque  vos 
ellà  bem  ,  como  quando 
ceíladeofazer  ,  &  ofuf- 
pende,  porque  vos  eftaria 
mal.  Vede-o  no  mefmo  Sá^ 
to.  Jà  deixamos  dito  como 
para  a  fabrica  da  fua  Ponte 
abrio  duas  fontes  nas  pe- 
dras, húa  de  agua,outra  de 
vinho :  mas  a  de  agua  ain- 
da hoje  corre,  &  perfeve- 
ra,&:  faz  milagres:  a  de  vi- 
nho fecoufe  totalmente.  E 


3^3 

fenaó  também  ojui*» 

zo.  Vede  o  que  fucederia 
ao  Povo  de  Amarante,  fe 
perfeveraífe  a  fonte  do  vi* 
nho  ?  Por  iíTo  o  Santo  ain- 
da no  tempo  da  fua  obra, 
como  notaó  os  Hiftoria- 
doreS,abria5  &  fechava  a 
mefma  fonte  três  vezes  no 
dia:  a  primeira  vez  a  ho- 
ras de  ai  moço  -,  a  fegunda  a 
horas  de  jantar, &  a  tercei* 
ra  a  horas  de  cea :  &  neftes 
três  tempos  que  fucedia .? 
Tanto  que  os  ofíiciaes,  & 
trabalhadores  recebiaó  ca- 
da hum  por  medida  a  fua 


porque  fe  fecou  ?  Porque  reção  ,  a  pedra  fe  fechava 

maiores  naufrágios  podia  outra  vez  5  &a  fonte  naó 

padecer  aquelle  Povo  ne-  corria.  Taó  provido,  Sc  vi- 

íla  fonte   ,  do  que  dantes  gilante  era  S.  Gonçalo  em 

padecia  no  mefmo  Rio. O  que  os  feus  milagres  foi- 

primeiroqueefpremeo  as  femparaproveito,&  naó 


uvas,&:  inventou  o  vinho , 
foi  Noè  :  &  fendo  Noè 
aquelle  grande  Piloto,que 
na  maior  tempcílade  do 
mundo  foube  governar  a 
primeira  náo,  5c  levou  nel- 
ía  a  falvamento  o  mefmo 
mundo  ;  goftando  depois 
o  mefmo  licor,  que  inven- 
tara, areou  de  tal  maneira, 
que  naô  fóperdeo  a  modç- 


para  daiio  daquelíes  por 
quemosfazia.  E  eiftahe.a 
regra  por  onde  haveis  de 
conhecer  os  milagres,  & 
benefícios  do  noíTo  Santo , 
taó  agradecidos  quando 
vos  negar  o  que  lhe  pedir- 
des ,  como  quando  volo 
conceder,  pois  vindo  por 
ília  maó  húa,ou  outra  cou- 
áa,íèmpre  he  para  voílb  bé. 
^X  ij  Atè 


i 


\li< 

\ 


324  Sermão  de 

296     Atè  aqui  tenho     com  todas  as  fuás  forças? 


fallado  em  tudo  com  os 
>\uchores  da  vida,  8c  mila- 
grés  de  S.  Gonçalo.  Por 


Cuidando  em  feus  pecca- 
dos  5  lembroulhe  o  novo 
propofito  que  tinha  feito 


íim  quero  acabar  có  hum     &arrependendofedaquel- 
cafo, deque  eumefmofui     laque  tivera   por  melhor 


teftemunha.  Havia  em 
Lisboa  hum  devoto,&  có- 
frade  do  mefmo  Santo ,  o 
qual  todos  os  annos  con 


obra,pedioperdaó  aoSá» 
to,  ratificando  com  voto, 
quenaó  faltaria  jà  maisà 
fua  antiga  devaçaó  5  fe  cf- 


corria  para  a  fua  fefta  com     capaíTe  daquelle  acciden- 
vinte  &  cinco  cruzados.     tecomvida.Náocraóaca- 


Humanno  porém  em  que 
os  Oííiciaes  eleitos  eraó  ri- 
cos, fendo  também  rica  a 
Confraria ,  entrou  elle  em 


badas  eítas  palavras,  quã- 
do  com  fegundo  repente 
ceílbu  totalmente  a  dor,& 
paflado  o  moribundo  das 


penfamento,  que  feria  ma-  portas  da  morte  à   inteira 

iorferviço  de   Deos  def-  íliude,  achandofe  taó  fam 

pender  aquelle   dinheiro  como  dantes  ,  foi  porfeu 

com  os  pobres.  Aílim  o  re-  pè  dar  as  graças  ao  Santo , 

folveo  comíigo  fem  o  có-  que  taõ  alpero  ,  &  taó  be- 

jnunicar  a  outra  peílba  :  jiigno  tinha  exprimenta- 


fenaó  quando  no  mefmo 
ponto  lhe  fobreveyo  húa 
dor  interior  ,  qne  de  ne- 


do  em  dous  momentos. 
Mas  quem  haverá,  que  fe 
não  admire  do  novo  eftilo 


nhum  modo  podia  fopor-  praticado  nefte  cafo  con- 
tar-, Sc  chamados  à  preíTa  tra  a  ley  geral  da  efmoIa,& 
os  Médicos  ,  refolvéraó  contra  a  preferencia  ,  & 
que  logo  logo  tomaíFc  os  privilegio  dos  pobres  tan- 
S.icramentos,  porque  in-  tas  vezes  publicado  ,  & 


fallivelmentc  morna. Que 
faria  pois  com  efta  fubita 
fentcnça,  quem  hum  mo- 
mento antes  citava  fani;  5c 


pregado  por  boca  do  mef- 
mo Dcos  ?  Quando  con- 
correm Chriíto,  «Sc  os  po- 
bres para  a  efmola,  day-a, 
diz 


i^ 


S.  Gonçãlo. 
diz  Chrifto  ,  aos  pobres, 
porque  dando -a  a  elles,ma 
dais  a  mim:  Queâ  uniex 
hís  minimisfeci^is^mihffe' 
ciftis.  Pois  fe  neííe  cafo 
concorre  S.  Gonçalo  com 
os  pobres,  como  ameaça  o 
mefmo  Chriílo  de  morte  a 
quem  quer  dar  a  efmola 
aos  pobres ,  Sc  na 6  oííerta- 
k a  S,  Gonçalo ?  Baila  que 
iguala  Chnftoospobresa 
íy  mefmo,  &  quer  que  S, 
Gonçalo  feja  preferido 
aos  pobres  ?  Bafta  que  an- 
tes quer  Chríílo  que  feja 
feílejado  S.  Gonçalo  com 
maiores  aparatos,&  maio- 


^^S 


§,  Yim 


^97  nPEnho  acaba- 
;i  do  5  ou  deixa- 
do fem  o  acabar,  o  mea 
difcurfo.  Mas  fe  os  Ser^ 
moens  de  S.  Gonçalo  to-^ 
dos  eraó  encaminhados  à" 
doutrinados  ouvintes, & 
naõ  he licito  faltara  imi- 
tação do  Santo  no  feu  pró- 
prio diaj  que  doutrina  pof- 
fo  eu  tirar  deíle  Sermaó, 
que  feja  acomodada  aos 
qHC  me  ouvem  ?  Heyde 
exhortalos  a  q  fejao  bons 
Paílores,  como  S.  Gonça- 


res  defpeías,  que  os  pobres  lo .?  J  ílb  pertence  aos  Ec- 

niais   Ibcorridos  ?  Bafta  cl eikfticos.  Heyde  exiior- 

que  fendo  os  pobres  fub-  talos  a  que  vaó  em  pere- 

liitutos  de  Chriílo  ,  nao  grinaçaó  do  Braíil  a  Jeru- 

quer  o  mefmo  Chriíl:o>  q  falem  ?  Aífaz  peregrinos 

o  fejaó  de  S.  GonçaíoPPois  faó  os  que  taó  longe  fe  de- 

aííim  lie  ^  feja  também  o  fterráraõ  da  pátria.  Heyde 

mefmo  Chriílo  feu  Prega-  exhortalos  a  que  façao  mi- 

dor,&  acabe  o  feu  panegy-  lagres  ?  Baila  que  fejamos 

rico,  que   eu  emudecido  Santos  fem  a fpirarà cano- 

con fc0b,que  o  naó  íoi  lou-  niza^ão.  Que  doutrina  fe-^ 

var.  E  eée  he  o  exceíTo  de  rà  bem  logo  a  que  tirem  os 


favor,  &  lugar  a  que  S.  Gó- 
çalo  fubio  na  fua  quinta 
vigia,  em  qvive  j&reyna 
immortal  no  trono  daglo^ 
ria.  Tom./. 


da  vida,&:  obras  de  S. Gon- 
çalo? A  primeira  que  me 
occorria  muito  útil  ,  & 
muito  neceí]íaria,he,  que  o 
X  iij         irxii'^ 


i 


l 


/    V 


^Í:í  I;i 


í 


n; 


32<^  Sermão  de 
imicaíTemos  em  fazer  pÓ-  doclima,porq  naô  crcyo, 
tes.  Coufa  he  digna  de  como  cuida  o  vulgo ,  que 
grande  admiração ,  &  que  os  que  lhe  adminiílraò  o 
mal  fe  poderá  crer  no  mú-  Erário,  mais  o  querem  pa- 
do, que  havendo  cento  &  rao  Papado  ,  que  para  o 
noventa  annos,  que  domi-  Pontificado. 
iiamos,&  povoamos  efta  298  Mas  porque  o  def- 
terra,  &  havendo  nella  cuido  que  eftranha  eíla  ad- 
tantos  rios,&:  paíTos  de  dí^-  vertencia  pertence  a  pou- 
cultofa  paíTagem  ,  nunca  cos  j  feja  doutrina ,  &  exé- 
ouvefle  induítria  para  fa-  pio  geral  para  todos ,  q  ao 
zerhúa ponte.  Queriojou  menos   procuremos   aca 


que  regato  ha  na  Europa 
fem  nome,  &  que  lugar  de 
quatro  viíinhos  ,  que  nas 
pontes  naófeja  magnifico? 
Sò  por  ellas  fe  conferva 
era  Hefpanha  a  memoria 
de  que  os  Romanos  a  do- 
minarão. Porque  Anco 
Mareio  fez  a  Ponte  Subi i- 
cia,  da  Ponte ,  &  de  a  fa- 
zer lhe  formou  Roma  a 
dignidade  de  Pontifice, 
cujo  nome,  antes  ainda  de 
a  mefma  Roma  fer  Chri- 
flãa,  fe  unio  ao  Su  mo  Pon- 
tificado. Tanto  honra  eíle 
género  de  fabricas  a  feus 
Authores.  Pois  por  certo, 
que  nem  por  pobre,  nem 
poravaréta  padece  a  nof- 
fa  Republica  efta  falta.  Eu 
a  attribuo  à  inércia  natural 


bar  por  onde  S.  Gonçalo 
começou,  S.  Gonçalo,  co» 
mo  vimos,  fendo  minino> 
foi  homem  :  nòs  fendo  na 
idade homens,na  vida,  & 
nos  coftumes  fomos  mmi- 
nos.  Melhoro  djffe Séne- 
ca do  que  fe  pode  traduzir 
na  noíTa  lingua :  Adhuc  nori 
folumpueritia  in  nobis  ^  ftd ^^^^^ 
quod  eft gravius^ptteriLnas  i-.b  1 Ê- 
remanet :  ér  hoc  quidi  mpe-  p'^*" 
tus  ePt ,  quod  authuritatcm 
habemiis  ftmimfoittafut  ro- 
rum^necpiierorum  tantunjy 
fedinfanttnm.  Temos  a  au- 
thoridade  de  velhos,  &  05 
vi  cios  de  mininos  ;  &  o 
peorhe,  que  naó  fó  fevè 
em  nòs  a  mininiíTc,  quehe 
defeito  da  idade,  fenaó  as 
mininiíles ,  que  o  faó  do 
juizo  ; 


S.Gonçalo]  327 

juízo  :  Nonfolltm  fueritia  depois  a'terra ,  parece  que 
innobis  yfed puenlitas  re-  he começar  o  ç^ô^iííqxo  pe- 
Tnanet.  A  primeira  coufa  lasabobodas  ,  &  acaballo 
que  fez  S.Gonçalo,  foi  por  pelos  aliceíies.  Quanto 
os  olhos  em  hum    Chrifto     maiSjque  fendo  a  terra  ,& 


crucificado,  6c  eftenderos 
bracinhospara  fe  abraçar 
c(?melle:êc  ifto  he  o  que 
moços ,  &  velhos  giiardao 
para  o  fim  da  vida.  Então 
vem  o  crucifixo  ,  entaó  fe 


o  Ceo  criados  para  o  ho- 
memjalíim  como  o  fim  do 
home  he  o  Ceo ,  6c  o  prin- 
cipio a  terra ,  aíllm  parece 
que  devia  começar  pela 
terra,6c  acabar  pelo  Ceo. 


abraçaó  com  fuás  Chagas,  Antes  naó,&  por  iíTo  meA 

êc  como  he  por  força,  6c  a  mo.  Porque  o  homem  tem 

mais  naó  poder,muita  gra^  o  feu  principio  na  terra,  62: 

ça  de  Deos  he  neceífaria  o  feu  fim  no  Ceo,  por  iíTo 

para  que  feja  de  coração,  lhe  propõem  Deos  primei* 

Quem  quer  começar  bem,  roo  Ceo,  6c  depoisa  terraj 

6c  acabar  bem  ,  ha  de  co-  porque  fe  quer   começar 

meçar  pelo  fim,  6c  acabar  bem,6c  acabar  bem,  ha  de 

pelo  principio.    Defde  o  começar  pelo  fim  ,&  aca- 

principio  do  mundo  enfi^  bar  pelo  principio.  Aílini 

nou  Deos  ao  homem   eíla  começou,  6c  aílim  acabou 

importantiílima   máxima  S.  Gonçalo.  E  fendo  a  fua 

nas  primeiras  palavras  da  vida  ,6c  morte  hdaperpe- 


YÁcúXMTTiún principio  érea- 
vit  l^eus  Calmn^àrterram: 
onde  nota  S.  Joaó  Chryfo- 
ítomo,  que  Deos  na  obra 
da  criação  começou  pelo 
Ceo,6c  acabou  pela  terra; 
poriíTo  naó  diz  o  Texto: 
Creavit  ferram^  &  Qteltim , 
fenaõ  Calum^ò'  terra.  Mas 
criar  primeiro  o  Ceo,  6c 


tua  imitação  de  Chrifto^f 
foi  coufa  maravilhofa,  que 
aíTim  como  nafcido  tomou 
por  exemplar  a  Chrifto 
morto  na  Cruz,allim  mor- 
rendo imitou  ao  mefmo 
Chriílo  nafcido  no  Prefe- 
pio.  MorreoemfímS.Gó- 
çalo,  entregando  a  Alma 
nas  mãos  da  Rainha  dos 
X  iiij  An- 


íi 


Sermão  de 


A  njos ,  de  que  foi  devotif- 
íinio,&  fe  achou  prefente  a 
feufeliciílimo  traníico  5  & 
tanto  que  erpirou,re  ouvio 
noar  liãavoz  ,  que  dizia, 
Ide  todos  ao  enterro  do 
Santo.Concorréraó  todos, 
&  o  leito  em  que  acháraó 
defunto  o  fagrado  corpo, 
foi  deitado  no  cha6  fobre 
húaspalhas.  Aílim  acabou 
na  morte  imitando  a  Chri- 


morrer !  ô  ditofo  começar, 
&  ditofiíTimo  acabar  !  Efte 
foi  o  ultimo  exemplo,  que 
S.Gonçalo  deixou  ao  mu- 
do, 6c  com  que  deixou  o 
m  udo,  que  todos  ta  m  bem 
havemos  de  deixar.  E  pois 
o  não  imitamos  no  nafci- 
mento,  ao  menos  comece- 
mos defdeeíle  dia  feu  ao 
imitar  na  morte,  trazendo 
fempre  diante  dos  olhos  o 


ílo  nafcido  no  Prefepio,  fim  da  vida  ,para  que  por 

xjuem  aíTim  defde  feu  naf-  fcus  merecimentos ,  &  in- 

cimento  tinha  imátado  a  terceíTaó  configamosavi- 

Chriílo  morto  na  Cruz.  dafemíim.  Amen. 
í)h  ditofo  nafcer,&  ditofo 


SER- 


y.9 


í*3 -Ç^l  •Ê<5f>3  «M-^«M'^S>3- Ç#3.*^y€^--ÇÍ>?'í^'^^^ 

ffffff¥fffff-ffffff--fffi 

SERMAM 

DA 

D  O  M  I  N  G  A 

VIGÉSIMA  SEGUNDA  POST  PENTE  COSTEN, 

Na  occafíaó  em  que  o  Eílado  ào  Maranhão  fe  repartia 
em  dous  GoTernos5&:  eíles  fe  deraó  a  Peííbas  par- 
ticulares moradores  da  mefma  terra. 


Cujus  efl  imago  baec ,  à^fttperfcriptio  ?  T^icunt  ei : 
Cíefaris.  Matth.22. 


§.i. 

A6  ha  terra  ma- 
is diííicultofa 
de  governar  5  q 
a  pátria:  nê  ha 
mádo  mais  mal 
íbfrido^nem  mais  mal  obe- 
decido, que  o  dosiguaes. 
Vivendo  os  Hehreos  go- 
vernados por  Deos,  o  quai 


no  Propiciatório  rerpódia 
a  todas  fuás  confultas  ,  6c 
ordenava  em  voz  clara  O' 
quefe  havia  de  fazer,  ou 
naó  fazer ;  foraó  elles  taò 
mal  aconfelhados ,  q  qui- 
zcraó  fer  governados  por 
liomens,  como  as  outras 
nnçoens :  &  fendo  taó  fo- 
berboS:,quedefprezavaó  a. 
todas  em  tudo  o  mais?  ne- 


K 


301 


4i<>i, 


5  50  Sermão  da  'Dominga  'vjgefimaftgundd 

ílepontOjqueeraafuama-     a  pátria,  &  os  eleitos  eraô 


lorprerogatiya  ,  pedirão 
fer  femelhantes  a  ellas: 
Conflitue  nobis  Regem ,  fi- 
cut  &  tinivcr'£  habent  na- 
lionês.  Oi  primeiros  Go- 
vernadores pois,que  Deos 
liies  concedeo  com  poder, 
&  foberanía  real  ,  foram 
Saul  &:  David  ;  Saul  que 
andava  bufcando  asjumé- 
tas,  que  fe  perderão  a  fcu 
Pay,  &  David  que  andava 
guardando  as  ovelhas  do 
feu.  Naó  fez  Deos  diffe- 
rençadas  calidades,  por- 
que todos  eraó  filhos  de 
Abraham ;  nem  a  fez  tam- 
bém dos  officios  ,  porque 
todos  naquclle  tempo  vi- 
via5  de  fuás  lavouras  ,  & 
dos  Teus  paílos.  Sò  teve 
attençãoàs  peíToas,  Scaos 
talentos^porque  afUm  Saul 
como  David  debaixo  do 
feu  fayal  eraó  homens  de 
taó  grandes  efpiritosy  co- 


iguaes  (^  como  dizia  }  & 
naó  bailou  que  hum  foíTe 
Saul,& outro  David, para 
ferem  bem  aceitos.  Ale- 
gráraóíèos  parentes,  mur- 
murarão os  eftranhos,  & 
os  demais  (^que  eraóqua- 
fi  todos}  ficáraó  defconté- 
tos.  Naó  digo  o  que  diíTe- 
raó,  porque  as  couíâsnam 
eraó  para  dizer  ,  nem  fao 
para  ouvir:  íbdigo  queef- 
tamos  no  mefmo  cafo.  Te- 
mos repartido  efte  noílb 
Eílado  em  dous  governos 
iguaes,&:  debaixo  de  duas 
cabeças,ambas  naturaes  da 
mefma  terra,  fem  fer  a  de 
Promiíraó:&;  aíTim  da  par- 
te das  cabeças, como  dos 
membros  ,  allim  da  parte 
dos  novos  Governadores , 
como  dos  fubditos  ,fe  po- 
dem recear,  como  jà  fe  te- 
mem, naó  pequenos  incó- 
venientes.  O  recurfo  eftà 


mo  logo  moftráraõ  as  fuás     Ionge,o  remédio  naó  pode 
obras.  Mas  quaes  foraó  os     chegar,  fenaó  tardcj  entre- 


applaufos  com  que  foi  re- 
cebida naquella  Republi- 
ca depois  de  taó  apertadas 
inílanciasa  eleição  deíles 
dous  governos?  A  terra  era 


tanto  fó  vos  peço,  que  to- 
meis o  melhor  confelho.  A 
obrigação  dos  Pregado- 
res ,  a  quem  a  h  fcncura 
chama  Anjos  da  paz  ,  he 
ferem 


pofl  Tentecojien.  531 

ferem  Miniftros  da  uniaó,     Senhor,Cuja  era  aquella 


&  concórdia :  &  porque  ef- 
ta  devemos  defejar  todos , 
como  bons  Chriíláos,  co- 
mo bons  repúblicos,  &  co- 
mo bons  vaíTallos ,  para  eu 
fatisfazer  à  minha  obriga- 
çaó,naó  me  occorre  outro 
meyo  mais  efíicaz,  que  de- 
clarar a  hunsjSc  a  outros  as 
fuás.  O  meu  intento  fera 
eíle,  o  Evangeiho  a  guia,  a 


imagemj&cujo  o  nome  ef- 
crico  nas  letras  :  Ctijus  eji  ^ 
imago  h^c^&fuperfcriptio  ? 
Reiípondéraó,  que  a  ima- 
gemj&-  o  nome  era  do  mef- 
mo  Gefar;  T>icunt  e^Ctífa- 
m.Iíio  he  o  que  contém  as 
palavras  que  propuz.  O 
reílodo  Evangelho  ficará 
para  outra  occaíiaó  ,  & 
também  a  moeda.  Eu  naò 


interceílbra  para  a  graça  a    quero  para  hoje  mais  que 
Virgem  Senhora  noíTa.Pe-     a  imagem  do  Cefar  5  por- 


çamola  com  aquella  atten- 
çaó  que  requere  taõ  im- 
portante matéria.  Ave 
Maria. 


5.  II. 


que  com  as  imagens  dos 
Cefares  hey  de  fallar. 

303  Cujzueft  imago  hac^ 
Todos  os  que  governaó 
faó  imagens  de  feus  Frin- 
cipes :  porque  os  reprcfen- 
taó  na  peííoa,  &  no  exerci- 


302 


PErgutado  Chri-     cio  dos  poderes.  Começou 
ílo  Senhor  noíTo 


como  Meftre  da  Leyjfe  era 
licito  aos  Hebreos  pagar 
tributo  ao  Cefar  Empera- 
dor  dos  Romanos,refpon- 
deo,  que  lhe  modralTem 
primeiro  a  moeda  do  tri- 
buto: Oftendite  mthi  numif- 
ma  cenfus.E  como  n3.moQ' 
daeftiveííe  eílampada  húa 
figura  com  certas  letras  em 
roda  i  perguntou  mais  o 


id.ao; 


efte  nome  ,  ou  titulo  de 
imagem  no  primeiro  go- 
verno do  mundo, dado  nao 
menos  que  por  Deos  ao 
primeiro  homem,  &  nam 
nas  proviíoens  do  officio^ 
fenão  antes  da  creaçaó  del- 
le,  &do  mefmo  que  o  ha- 
via de  exercitar.  Faciamus 
hominem  ad  imaginem^  ò-'fi-  q  .  ^ 
milituãimm  noftram  ,  &  xlz^' 
/f/f/í/" :  Façamos  o  homem 
^        (diíTe 


i 


t 


,M 


Oí 


ç5  3  2  Sermão  da  T>omínga  -jigefimafegíinda 

(^  diíTeDcos^à  noíTa  ima-  re  deo  Deos  o  titulo  de 
gemjêc  femelhança  ,  para  imagem  fua  ,  porque  lhe 
quetenhaa  preíidencia,&  encarregou  o  governo  do 
governo  do  mundo.  Sobre  mundo  ,  6c  que  ajuntou  à 
eílas  palavras  lie  grave  imagem  a  femelhança,  ad 
queílaó  entre  os  Theolo-  imaginem-iérfimiUtttdinefn: 
gos,em  que  coníiíla  no  ho-  para  que  no  mefmo  gover- 
memoferimagê  de  Deos?     noíeíembraílê  Adam^que 

fe  devia  fazer  femelhante 
quanto  foíTe  poífivel  ao  fu- 
premo  Senhor  a  quem  re* 
p  refenta va :  Imaginem  di' 
xit  obprincipatus  rationem^ 
fimiiitudinem^  utpro  vir  i  bus 
humanisfimilesficimus  T>eo . 
304  OhquantoSi&quã 
exceilentes  documentos 
deixou  Deos  naquella  pri- 
meira acção  aos  Principes 
de  como  deviaó  fazer  ,  ^ 


Hereges  Audeánosdif- 


feraójqueconfiília  na  ror 
nia,&:  eílatura  do  corpo.  E 
também  he  herefia  politi- 
ca a  de  alguns  Príncipes, 
os  quaes  tanto  fe  deixao 
levar  deffas  aparências  ex^ 
teriores ,  que  por  ellas  fa- 
zem a  eleição  das  fuás  ima- 
gens. Taò  pouco  importa 
Earao  governo  da  Repu- 
liça  a  eftatura50ugentile* 


za  dos  corpos,  C  dizSene-     eleger  as  fuás  imagés!  To- 
ca }  como  para  o  governo     das  as  outras  criaturas  má- 


danáo  fero  Piloto  fermo 
fo.  Kefolvem  pois  todos  os 
Santos,  5c  Doutores  Ca- 
tholicos  ,  que  a  razaó  da 
imagem  de  Deos  no  ho- 
mem confifte  na  Alma 
adornada  de  três  potécias, 
emqucreprefentaao  mef- 
mo Deos  trino,&  hum. Po- 
rém S.  Bafilio  &  S.  João 
Chryfoítomo  acrcccntaó) 
que  a  Adam  parcicularmé- 


dou-as  Deos  fazer,  ou  má- 
dou  que  fe  fízeífe m :  o  ho- 
me, queohaviaderepre- 
fentarcomo  fua  imagem, 
&  a  quem  havia  de  entre- 
gar o  [governo  do  feu  mun- 
do,fello  có  confuka,  ôc  có- 
felho,  &:  naô  de  homens, 
que  ainda  naó  havia,  nem 
de  Anjosjqucjà  eraó  cria- 
dos ,  mas  das  trcs  PcQbas 
divinas :  Faciamus  hominè 
ad 


1iWu!. 


põflTentecoften,  555 

nd imaginem ,  &  fimilitudi-     moria,  para  que  fe  lembre 


nem  nojtram :  &:  para  que  ? 
Et  prafit  pifei  bus  maris^  & 
volatilibus  Caliy  &  befiijsy 
univerfaqíie  terra:  para  que 
governe  os  peixes  domar, 
as  aves  do  ar,&  os  animaes 


da  fua  obrigação  ;  o  enten- 
dimento, para  que  faiba  o 
que  ha  de  mandar  >  &  a  vó-? 
tade,  para  querer  o  que  for 
melhor :  &  naó  homens  de 
húafó  potencia  Q  que  por 


da  terra.    Efe  paraaelei-     ilTo fazem  impotenciasJ& 
çáodequem  ha  de  gover-    faltandolhe  a  memoria,  & 


nar  brutos,  fe  requere  tan- 
to apparato  j  &  prevenção 
deconfultas,  &  confelhos 
fabedoria  do  mefmo 


na 


oentendimêto,  fó  tem  mà 
vontade.  Com  todas  eftas 
qualidades  formou  Deos » 
&  aperfeiçoou  a  imagem, 
Deos  i  que  fera  para  eleger  que  no  governo  do  mundo 
hum  homem,que  ha  de  go-  havia  de  reprefentar  a  Ma^ 
vernar  homens  ?  O  cara-  geftade  divina :  bem  aílim 
£ter  de  imagem  fua  polio  comoreprefentaó  as  Ma- 
Deos  por  ventura  na  Alma  geílades  humanas  os  que 
do  homem,porquefe  naó    em  feu lugar,  &  com  feus 


ha  de  entregar  o  governo 
a  homens  fem  Alma  ,?  Sim-, 
masnaófó  por  iífo.  Naó 
bafta  que  o  que  ouver  de 
governar  feja  homem  com 
Alma,  mas  he  neceíTario, 
que  feja  Alma  có  homem. 
Se  tiver  Alma,  &  boa  Al- 
ma,naó  quererá  fazer  mal : 
mas  fe  juntamente  naó  ti- 
ver a£tividade ,  &  refolu- 
ção,&  talento  de  homem , 
náofarà  coufa  boa.  Deo- 
lhe  Deos  memoria ,  enten- 
dimento,&  vontade:  a  me- 


poderes  governaó  eftas, 
ououtraspequenas  partes 
do  mefmo  mundo.  A  ima- 
gem do  Cefar  naó  fó  efta- 
va  eftampada  na  moeda-, 
fenaó  também,  &  muito 
mais  em  quem  goyernava 
a  Republica.  Na  moeda 
era  imagem  morta,em  quç 
governava,  imagem  viva: 
na  moeda  davalhe  o  cu- 
nho o  valor,  em  quem  go- 
vernaua  davaólhe  as  pro- 
vifoens  o  poder.  E  fe  de 
qualquer  delias  fe  pergun- 
taífe; 


5 ;?  4.  Sermão  da  TDo minga  ^vige/imafeg unda 

taíle  -•  Cujas  eft  imago  bac  \ 
Cuja  he  eíla  imagem  7  De 
ambas  fe  havia  de  refpon- 
deremdifferente  fentido, 
mas  com  a  mefma  verda- 
de5que  era  imagem  do  Ce- 
far :  l}icunt  et:  Cafaris. 

^of  Suppoíla  efta  fig-     reprefentar  hum  Principe 
nificaçaô  nafcida    com  o     fupremo  nos  olhos  do  mú- 


§.  III. 

^06  /^"^Omeçádopois 

V^^pela  obrigação 

das  imagês,  aílim  comohe 

grande  dignidade  haver  de 


mundfoj&cò  a  mefma  na- 
tureza, de  que  faó  imagens 
dos  Princjpes  os  que  go- 
vernaó  em  leu  nome,  &  os 
reprefentaô  -,  fe  eu  pregara 
em  outra  parte  ,  havia  de 
repartir  o  Sermão  em  três 
pontos.    Primeiro  ,  como 
haóos  Cefares  de  fazer  as 
fuás  imagens:  fegundojco- 
mohaôas  imagens  de  re- 
prefentar os  Cefares  ;  ter- 
ceiro, como  os  fubditoS3& 
vaíTallos   dos  Cefares  haó 
•de  reverenciar ,  &  obede- 
cer  às   mefmas  imagens. 
Mas  porque  o   primeiro 
ponto  naó  pertence  a  efta 
terra,  nem  a  efte  Auditó- 
rio; tratarei  fomente  do 
í^gundo,  &  do    terceiro, 
que  fió  taó  próprios  do  lu- 
gar, como  neceílarios  ao 
tempo. 


do,  (^ouíejamaior,ou  me- 
nor o  theatro  ^  ^^irn  hc 
muidifficultofo  5  Sc  arrif- 
cado  o  acerto  deíla  grande 
reprefentaçaó.  Facil  no 
oue  tocaaopoder  3  mas  no 
mandar 5 &  obrar,  muito 
difficultofa,  &  de  poucos, 
lífoquizfigniíicar  o  Pro- 
vérbio dos  antigos,  quan- 
do diíTeraó)  que  a  imiageni 
de  Mercúrio  naòfe  faz  de 
qualquer  madeiro :  Ncn  ex 
qnolibet  lignofit  Mercnrius. 
£  porque  mais  a  imagem 
deMercurio,que  a  de  Jú- 
piter, q  era  entreosDco- 
les  a  primeira,  &  mais  alta 
foberanía  ?  Porque  Júpi- 
ter era  Deos  do  poder  , 
Mercúrio  da  fabedona,  4SC 
prudência :  8c  a  mageílade 
do  poder  qualquer  a  pode 
reprefentar  facilmente,  as 
ac^ocns  porém  da  fabedo- 
na," 


poft  Tentecojlen 
ria  5  &  prudência  íaó  mui 
poucos  os  que  fejaó  capa- 
zes de  as  compor ,  &  exer- 
citar 5  como  ellas  requerê. 
Mais  fácil  he  parecer  Jupi- 
ter,que  Mercúrio.  Quan- 
do S.Paulo,  &  S.  Barnabè 
entrarão  em  Licaonia,  ad- 
mirados aquelles  Gentios 
do  que  viaó  em  ambosjdif- 
feraó,  que  os  Deofes  em 
femelhança  de  homens  ti- 
nhaó  decido  do  Ceoàfua 
Cidade :&  a  Barnabè  cha- 
mavaó Júpiter,  6c  a  Paulo 
Mercúrio :  Vocabant  Bar- 
nabam  lovem^Tauhim  vero 
Merctirium.  Mas  fe  Paulo 
por  tantas^Sc  taó  excellen- 
tts  prerogativas  era  maior 
que  Barnabè  ,  porque  de- 
rao  a  Barnabè  ,  &  naó  a 


^507  Subamos  das  dei- 
dades fabulofas  à  verda- 
deira,&ellanos  dará  a  ra- 
zão deíla  differença.  O 
Verbo  eterno  como  Filho 
natural  de  Deos  Padrcjhe 
imagem  perfeitiílima  da 
mefmo  Deos.  E  porque  nó 
fer  divino  atè  os  Gentios 
coníideravaó  duas  eminé- 
ciasfuperlativas  5  húa  da 
fumma bondade, 8c  outra 
dafumma  grandeza ,  poí 
onde  chamavão  a  DcQ^ 
Óptimo  Máximo  ;  decla-- 
rando  Sala  mão  no  livro  da 
Sabedoria  a  fumma  per* 
feição  com  que  no  Verbo 
fe  reprefentão  bua^Ôc  011? 
tra,  diz  que  he  efpeiho  fem 
macula  da  Mageílade  de 
Deos  5  &  imagem  de  fua 


Paulo  o  nome  de  Júpiter  5     honà-xà^-.Specítlumfine  ma- 


&aPauIo,&naó  aBarna 
bè  o  de  Mercúrio.^  Porque 
Barnabè  excedia  na  efta- 
tura,&magefl:ade  da  pef- 
foa, Paulo  na  eloquência, 
na  fabedoría,  &  na  doutri- 
biiera.  nz:  ^ioniam  ipfe  erat  dux 
'verbkéc^.  repreíentaçaó  da 
fabedoria  requere  muito 
maior  cabedal ,  &  muito 


maior  home,  q  a  da  ma^e-    fta  diíTereiíca 
ílade.  t>  .  -    , 


go  bonitatis  illius.  O  que  ^''^^ 
aqui  fó  reparo,  he>que  híia, 
&amerma  reprefentação 
em  quanto  he  da  magefea?- 
dejfe chama eípelho;  Spe^ 
culum  mahfiatis  ',  &  ena 
quanto  he  da  bondade  ^(^ 
chama  imagem ,  imago  bo^ 
mtat is  illius.  E  arazáo  de^ 
deixando 
por 


40',' 


^^6  Sermão  da  dominga  vigefinafegtmda 
por  agora  a  Theologica,&:  der,&:  a  oítentaçáo,  &  exc- 
bufcando  fomente  a  Mo-  cuçáo  delle  he  muito  fa- 
ral,qualhe,  ou  pode  fer?  cil:  porém  asda  bondade, 
He  a  mefma  que  exprime-  que  faó  as  do  bem  mandar, 
tamos  na  facilidade  das  &bem  obrarjSc  bem  fazer 
imagens,que  vemos  no  ef-  a  todos,  reprefentãofe  nas 
pelho  ,  &  na  difficuldade  outras  imagens ,  ou  pinta- 
das que  fe  moílraó ,  8c  re-  das,ou  efculpidas ,  porque 
prefentão  em  fy  mefmas.  eftasfaò  muito  difficulto- 
As  imagens  que  fe  repre-  faSj&trabalhofas,  &  que 
fentãoemfy  mefmas,  ou  requerem  muita arte,mui- 


faó  de  pintura,ou  de  efcul 
tura.  As  de  pintura  hzér 
fe  com  muitos  debuxos, 
muitas  cores,  muitas  fom- 
bras,muitos  claros,muitos 
cfcuros :  as  da  efcul  tura  có 
muito  bater,  muito  cavar, 
muito  polir  ,  muitos  che- 


tafabedoria  ,  muita  pro- 
porção, muita  regra.  As 
imagens  de  efcultura  fazé- 
fe tirando,  as  de  pintura, 
pondo: para efte  tirar,  he 
neceífario  muito  defmte- 
reífe  :  para  efte  por  ,  & 
acrecentar,muita  igualda- 


yos,muitos  vazios:  &  hu-  de:  Separa húa  coufa  ,  & 
tnas,&:  outras  có  muita  ar-  outra,  muita  prudência, 
te,muita  applicação,  mui-  muita  juftiça,  muita  intei- 
ro trabalho.  Pelo  contra-  reza5muita  conftancia,  & 
rio  as  imagens ,  que  fe  re-  outras  grandes  virtudes,  q 
prefentão  no  efpelho,  ellas  mais  facilmente  faltaó  to- 
fe  pintão  fem  tinta  ,  &  fe  das,do  que  fe  acháo  juntas, 
entalhão  fem  fcrro,8capa-  308  Nas  duas  images 
recém  perfeitas  em  hum  de  Júpiter  &  Mercúrio,  q 
momento  fem  mais  traba-  feattribuíraò  aos  dous  A- 
lho,  ou  artificio  que  húa  poftolos,  temos  o  exemplo 
reflexão  natural.  Pois  por  detudo.  A  imagemdeju- 
iífo  as  da  mageftade  fe  re-  piter  pmtavafe  com  hum 
prefentão  no  efpelho,  por-  rayo  na  mão ,  a  de  Mercu- 
quç  a  magQlUde ,  &;  o  po-  rio  com  hum  báculo  entre 


fojlTentecoften.  337 

duas  ferpentes.  E  aqiiife     omefínotempo  fe  Tuften- 


via  bem  quatn  fácil  hehua 
reprefentaçáo^&quam  dif- 
fic  111  cola  outra.  Fulminar 
rayosjeílremecero  mundo 
com  rrovoens,  efcalar  tor- 
res:,  derrubar  cafas  ,  matar 
homens,  fender  de  aíto  a 
baixo  cedros,  cipreíleSíCn- 
zinhas,  &  todas  as  outras 
violências  ,  &  danos,  que 
caufaóosrayos  ,  tudo  he 
muito  fácil  ao  poder,  em 
quemabufardeile.  Porém 
meter  o  baíláo  entre  fer- 
pentes difcordes ,  &  vene- 
nofas,&:  fazer  que  não  fe 
mordáo,nemfe  efpedacê: 
domar  ferezasjamanfar  re- 
beldias  5  &■  reduzir  a  que 
vi  vão  conforme  a  razão  os 


tão  os  que  a  conquiítárão 
nãodospaílos  deanimaes 
domeílicos,  íènão  da  ca- 
ça,6c  montaria  dehomês: 
&  que  dificuldade  fera 
ainda  maior  manter  em 
paz,8cjuil:iça  os  que  fó  íe 
mantém  da  guerra  injufta? 
Eíla  he  pois  a  primeira  dif- 
íiculdade  geral  deíle  go- 
verno •,  mas  eíla  a  obriga- 
ção ,  6c  officio  dos  que  nel- 
le  repreíèntáo  a  imagem 
do  Cefar. 

í.  IV. 


A  Segunda  dif- 


30P    _ 

ficuldade,que 

mais  ainda impede,&  qua- 


quepornatureza,&coí1:u-     fi  impoíUbilita   a  boa  re 
me  não  tem  ufo  delia  -,  eíla     prefentação    deílas    ima 


he  a  diíficuldade  grande 
em  toda  a  parte,&:  na  terra 
em  que  eílamos,maiorque 
emnenhúa  outra.  Menos 
ha  de  ciacoenta  annQS,que 
nefla  terra  fe  não  conhecia 


gens,he,que  as  imagens,  & 
o  Cefar  eftão  muito  diílá- 
tes.  Quando  refpòndéraó 
aChriitOjque  aquella  ima- 
gem era  do  CefarjoCeíar 
eílava  em  Roma,  &  a  ima- 


onome  deRey,nemfeti-     geríi  em  Jerufaiem.   Que. 
nhaouvido  o  de  I.ey  :  &:     fera  onde  o  Cefar,  &  o  Ref 


que  difiiculdade  fera  fazer 
Gbedecer,&  guardar  nella 

as  Leys  dos  Reys  "i  DeíUe 
Tom.  7. 


eílà  na  Europa ,  &  as  ima- 
gens na  America  ?  O  Rey 
em  hum  mundo,  6c  os  que 
Y         ore- 


n 


•i^ 


Jeiem 


fe- 
nhor.  Tanto  atrevimento 
Ihedàeílar  o  Príncipe  16- 
gCjorecurfo  longe  ,  o  re- 
médio longe,  écatè  a  ver- 
dade não  íò  eícurecida  , 
iTiãs  opprimida  dos  mef- 
mos  longes.  A  Rainha  Sa- 
bà  chamava  bemaventu- 
radososque  ferviaòahl- 


33^  Sermão  da  T>ominga  vige  [ima  fegtmda, 

o  reprefentáo  em  outro?  lesnáo  tiveráo  outro 
AtèDeoife  temeo  deíles 
longes :  náo  porque  não  ef- 
teja  em  toda  a  parte,  &  ve- 
ja tudo,  mas  porque  vè  fem 
íerviílo.  Aílimo  mandou 
notificar  ao  mundo  pelo 
Profeta  Jeremias  ;  Ttitas 
ne  "Deus  c  ^cicino  ego/um^é* 
noTíDeus  de  longe?  Cuidais 

que  eu  fou  Deos  fó  de  per-  Rey  SaJamáo  em  fua  pre- 
tOj&  não  de  Jonge  ?  Enga-  fença.  E  deita  bemaventu- 
naif-vosjporque  ainda  que  rança  fepriváo  em  tempo 
210  Ceo  íenho  a  minha  de táo bons, 6c  táo  julios 
Corte,tanto  aíJiílo  na  ter-  Reyscomoos  noíTos  ,  os 
ra.como  no  Ceo:  C^km  queporíerviçofeu  ,  &  de 
&  terram  ego  impleo.  Ouve  Deos,  í'e  expõe m  náo  fó  às 
com  tudo  homens  tão  ig-  inclemências  dos  climas, 
norantes,que  interpretan-  que he  muito  menos,  mas 
do  mal  o  verfo  de  David:  às  fúrias  dos  longes  :  &  a 
^^íumcainjomino^terram  verjôc  chorar  de  perto  as 
113. j 6.  autem deditfilijs hominum :  perdas  temporaes,  5c  éter- 
cuidarão  que  porq  Deos  nas,dequeclles  íiiocaufa. 
puzera  a  fua  Corte  no  310  Diz  a  parábola  do 
Ceo,  demitrira  de  {^  o  do-  Evangclho,que  partio  hií 
minioda  terra  ,  èc  o  dera  Rey  para  muito  longe  a 
aos  homens.  Náo  creyoq  conquiílar  hú  novo  Rey- 
os  que  governáo  as  Con-  no,  &  entre  tanto  deixou 
quiítas  cuidáo  o  mefmo  ,  encomendada  a  fua  fazen- 
nias  he  certo  ,  que  muitos  da  a  três  criados ,  para  que 
ásdomínãotão  defpotica-  negociafiem  com  cila.  De- 
mente, como  fe  o  cuida-  ftestrcs  criados  hum  naò 
rão.Tãofenhoresfefiizeni  negociou  ,  mas  não  rou- 
dellasjcomo  fc  ellas  ,  &  el-  bou ,  &  os  dous  dcrão  táo 

boa 


.ibid.24. 


pfí 


/•nfel 


fofl  7entecoflen\  539 
boa  conta  da  fua  negocia-  ges  tem  depois  osfeusper- 
çáo,  que  dobrarão  o  cabe-  tos ;  Sc  por  iííb  os  criados 
dal  doRey,  &  merecerão  na  aufencia  fervem  có  tal 
delle grandes  mercês.  Di-  refpeitOjOu  tal  medo,  que 
tofo  tempo>em  que  de  três  na  prefença  dão  boa  conta 
criados  de  que  fez  coníi-  de  íj.  Porém  quando  os 
anca  hum  Rey  ,  fervindo  Keysnaó  váo  às  Conqui- 
não  à  fua  viílajfenáo  mui-  ílas>  ou  elías  íàó  tão  remo- 
to longe  delle,  os  dous  ihe  tas^quenão  podem  là  irj 
acrecentáraó  a  fazêda  em  comooslongesfempreíaõ 
dobro,  &  o  menos  diíigen-  longes ;  quam  longe  eílà  o 


te,  pofto  que  a  náoacre- 
centou  ,  nem  hum  feitil 
furtou  delia.  Acharfeíia 
hoje  hum  par,  8c  meyo  de 
criados  femelhantes  a  ef- 
tes  ?  Nem  em  tres,nem  em 
trinta,  nem  em  trezentos. 
E  qual  he  a  razão  ?  Omef- 
mo  Texto  a  deo  narrati vã- 
mente em  bem  clara  prova 
do  que  imos  dizendo.  Diz 


Rey  dos  criados,  tão  longe 
fe  põem  elles  das  íuasobri- 
gaçoens.  Quando  o  Rel- 
vai do  Reyno  às  Conqui- 
íi;as,&  das  Conquiftas  tor- 
na ao  Reyno  ,  he  Rey  do 
Reyno,  6c  mais  dasCon- 
quiílas:  mas  quando  o  Rey 
fica  no  Reyno,  &àsCon- 
quiílas  manda  fó  os  cria- 
dos, os  criados  faó  os  Reys 


o  Texto  ,  que  foi  o  Rey  das  Conquiítas  ,  &  não  o 
muito  longe  do  feu  Reyno  Rey.  O  Rey  fallos  fuás 
a  conquiílar  outro  ,  mas    imagens,  &  elles  fazemfe 


para  tornar  outra  vez: 
Abijtin  Regíonem  longin-* 
quam  acciperefibi  Regniim , 
ér  reverti.  Qiiãdo  os  Reys 
vão  do  feu  Reyno  às  Con- 
quiílasj^cdas  Conquiílas 
tornâo  ao  Reyno  :  ainda 
queasConquidas  eílejaó 
muito  longe,  aquelles  lon- 


Reys. 

311  E  quem  lhe  da 
eftes  azos,  ou  eftas  azas,fe- 
não  aquellas  que  os  levão , 
%c  põem  tão  longe  ?  De 
Roma  a  Jeruíàlem  ainda 
tinhaó  algum  vigor  os  ref- 
peitos  do  Cefar  .'  Si  hmic  Joana: 
dimittis^non  esamicusC^e^  '^•"' 
Y  ij        faris. 


3  -í^o  Sermão  da  T>ominga  vigefimafegunda 

y^w.  Mas  de  Lisboa  à  In-     pois  era  fua  imagem,  que 


i 


ciia,&  ao  Brafil  com  todo  o 
mar  Oceano  em  meyo?  a 
fé,  a  obrigação,  a  obediên- 
cia, o  reípeiro,  tudo  fe  ef- 
fria,tudo  fe  raaréa,tudo  re- 
ferve. Vendofe  taó  longe 
de  quem  os  manda ,  como 
là  pòdeni  o  que  querem , 
naò  íe  contentão  có  que- 
rer o  que  podem.  Leváo  os 
poderes  de  imagens  ,  & 
tomão  as  omnipotencias 
deCefaresj  &não  de  Au- 
guílos,  ou  Trajanos  para 
confervação ,  &  aumento 
da  Monarchia,  mas  de  Ti- 
berios  ,  de  Caligulas ,  de 
Neros,  deftruidores  delia : 
para  que  nos  não  admire- 
mos das  ruinas  da  noíla, 
nem  lhe  bufquemos  outra 
caufa.  Porque  percleo  A- 
dam  com  o  Parai  fo  a  Mo- 
narchia do  Vniverío.^  Por- 
que fe  não  contentou  com 
£er  imagem  de  Dcos,  mas 
quiz  fer  como  o  mefmo 
Deos,  que  o  fizera  fua  ima- 
gem. A  tentação  çom  que 
o  fez  apoílarar  o  Demó- 
nio, foi  com  lhe  dizer,  que 
feria  como  Dcos.  Masfe 
Adam  jà era  como  Dcos, 


lhe  prometeo  de  mais  o 
Demónio  n?,qucllc  //r//í ,  GcneC 
ernisficutdtj  r  O  cquivo- '■'^" 
CO  do //r//?  foi  verdadvcira- 
menre  diabólico.  Adam 
em  quanto  imagc  de  Deos 
|à  era  como  Deos  na  repre- 
fentaçáo,  mas  não  era  co- 
mo Deos  na  foberanía  :  & 
iíioheoquclhe  prometea 
o  Demónio.  E  como  A  dam 
fe  não  contentou  de  fer 
como  Dcos  fó  na  reprefen- 
tação,  queeraoque  tinha 
por  imagem  ,  Òc  quiz  fer 
como  Deos  na  foberanía, 
que  era  o  que  lhe  vedava  a 
obediência,  &:  o  preceito; 
por  iíib  quebrou  o  precei- 
to, &  negou  a  obediência  a 
Deos.  L  líto  que  lez  Adam 
na  Aria,he  o  que  fazem  na 
mefina  Afia,  òc  n.i  no/la  A- 
mericaosquenão  fe  con- 
tentando com  fer  imagens 
dos  Keys  ,  excedem  tão 
exorbitantemente  toda  a 
medida,  &  proporção  de 
imagens,  como  agora  ve- 
remos. 

§■  V. 
312     ^  Ntcs  de  haver 
no   mundo  a 
arte 


A 


poftTentecoften.  341 

arte  da  pintura  C  que  co-     que  mais  parecem  Ricos 
meçou  depois  do  incêndio     feitios  ,   que  verdadeiras 


de  Troya  ^  diz  Plinio,que 
fe  rerrataváo  os  homens 
cada  hum  pela  fua  fombra. 
Punhafe  o  homem  empe, 
fazia  fombra  com  o  corpo 
interpoíloàluzdo  Sol,  &: 
aquelia  fombra  cortada 
pela  mefma  medida  era  a 
lua  imagem. E  como  fe  po- 
dia conhecer  a  imagem,  fe 
não  tinha  feiçoens  por  on- 
de fe  dilHnguiíle  ?  Diz  o 
mefmo  Piinio^que  para  fe 
conhecer,  lhe  cfcreviaó  ao 
pè  o  nome  de  quem  era : 
Omnes  umbra  kominis  cíT" 


imagens  do  que  ha  de  crer 
a  noíía  fé  que  reprefentao. 
Mas  ainda  tinhaó  outra 
maior  impropriedade  as 
imagens  cortadas  pela  me- 
dida da  fombra, porque  fe- 
gundo  o  lugar  em  que  eíli- 
veífe  o  Sol,  feriaó  fem  ne- 
nhúa  proporção  muito 
maiores  que  os  mefmos  a 
quem  reprefentaváo.  E  iÇ- 
to  he  o  que  fe  vè,  como  eu 
dizia, na  Afia,  6c  na  Ame- 
rica, nas  índias  Orientaes, 
ondenafce  o  Sol  ,  ^  nas 
OccidentaeS;  onde  fe  poé. 


cumduãa :  ideo  &  quospn*    Não  pôde  haver  fem elhã- 
gerent  aáfcribere  inftitutú,     ça  mais  própria.   A  fom- 


Faziãofe  os  retratos  na^ 
quella  rudeza  da  arte,  co- 
mo em  Portugal  os  que 
chamão  Ricos  feitios :  nos 
quaes  as  imagens  fenão 
conhecerião  pela  figura,  fe 
o  não  diíTeíFe  o  rotolo.  Ê 
helaftima,  que  prohibiu- 
do  Alexandre  ,  que  nin- 
guém podeííe  pintar  a  fua 
imagem,fe  não  Apellesj  ca 
nos  apareçaó  algúas  fi- 
guras tão  dcífemelhantes 
dos  foberanos  originaes, 
Tom./. 


bra  quando  o  Sol  eílà  no 
Zenith  he  muito  pequeni^ 
na,8ctoda  fe  vos  mete  de- 
baixo dos  pès:  mas  quando 
o  Sol  eílà  no  Oriente  ,  ou 
íiO  Occafo  )  eíla  mefma 
fombra  fe  eftende  tão  im* 
menfamente,  que  mal  ca* 
be  dentro  dos  orizontes, 
Ailim  nem  mais  nem  me- 
nos os  que  pcrtendem,  ^ 
alcançáo  os  go\^rnos  ul* 
tramarinos.  Là  onde  o  Sol 
eílànoZenitK,  naò  fó  fc 
y  II)         me- 


í. 


f^i" 


342  Sermão  da  Uominga  vigefimafegunda 

metem  eílas  fombras  de-     damaó,aque  vulgarmen- 


baixo  dospès  do  Príncipe, 
fenão  também  dos  de  Teus 
Miniílros.  Mas  quando 
chegão  àquellas  índias, 
onde  nafce  o  Sol  ,  ou  a  ef- 
tas,  onde  fe  põem,  crecem 
tanto  as  mefmas  fombras, 
que  excedem  muito  a  me- 
dida dos  mefmos  R.eys,  de 
que  faó  imagens. 

Hecouíli  muito  nota- 
vel,&  que  por  ventura  não 
tendes  advertido ,  quanto 
excedeo  a  medida  de  Na- 
bucodonofor  a  grandeza 
daquclla  imagem,  que  elle 


te  chamamos  meminho, 
contém  a  decima  oitava 
parte  do  mefmo  corpo.  E 
que  fc  fegue  daqui.^  Cou  fa 
verdadeiramente  não  íó. 
fe  mais  para  a  d  in  irar  ,  íe 
para  rir.  Seguefeque  todo 
Nabucodonofor  cabia  dé- 
tro  do  dedo  meminho  da 
fua  imagem.  Jà  naó  he 
grande  a  infolencia  deRo* 
boani  em  dizer ,  que  era 
mais  groííb  o  feu  dedo  me- 
minho, que  ElRey  Sala- 
maófeuPay  pela  cintura. 
Mas  qual  fera  a  daquelles 


mandou  fazer  depois  que  vaífallos,  que  fendo  fómê- 

vioemfonhosada  fuaEf-  te  imagens  dos  feus  Reys, 

tatua.DizaHiíloriafagra-  fe  fazem  tanto  maiores  q 

da,  que  tinha  de  altura ,  ou  elíes  cà  onde  o  Sol  fe  poé  , 

cóprimentofeífentacova-  ou  ià  onde  o    Sol  nafce, 

dos:  Nabuchodoilofor Rex  quanto  he  o   exceílb  im- 

fecit  ft atuam  auream  alti-  menfocomque  a  fombra 


Daniel.;  ttidine  ctibitorum  fexag in- 
3^-  ta,  i'\gora  pergunto  :  E 
quanto  vinha  a  fcr  maior  a 
grandeza  deíla  imagem, 
que  a  eftatura  do  mefmo 
Rej,  a  quem  rcprefenta- 
va.<^  Segundo  as  regras  de 
Vitruvio,&:  a  fymctría ,  & 
proporçoens  de  hum  cor- 
po humano,  o  dedo  menor 


fe  eíiende,  fem  outra  me- 
dida,Ibm  outra  proporção, 
nem  outro  limite  mais  que 
o  quenomar,ou  na  terra 
fecha  os  orizontes.  A  ima- 
gem de  Nabuco  era  de  ou- 
ro, as  fuás  faó  de  fombra: 
mas  como  as  artes  que  vé, 
ou  vaó  exercitar,  laò  as  da 
folida,&  verdadeira  alchi- 
mia. 


CJMI 


poft  ^entecoflen.  i  \.  | 

mia  ,elles  ilibem  cooTcr-^  grés  dos  rippliuididDs.Nei- 
tereílaíbmbraem  ouro,Sc  íesíamoros  Santuários  da 
fazerfe  melhor  adorar  que  Europa  ,  ondeie  veneraò 
o  mefmo  Nabuco.  A  ima-  imagens  milagrofas  ,  alli 
creiTi  de  Nabuco  para  os  fe  vem  penduradas  as  mor- 
feus  adoradores  naò  tinha  talhas,  as  muletas  ,  asca- 
prémios  ,  Separa  os  que  deas,  as  amarras,  os  pès>os 
naó adora vaó  tinha forna-  braços,  os  olhos,  as  lin- 
Ihas.  Là,ac  cá  naó  he  aífim.  guas,  os  coraçoens  dos  que 
Os  que  adoraó,  &  os  que  proteftaó  naquelles  votos 
não adoraó, todos  ardem:  deverlhe  miraculofamen- 
porque  todos  por  diverfos  te  todos  eftes  benefícios. 
moaosficãoabrazados,&  Deixadas  pois  as  outras 
confumidos  terras  mais  remotas  ,  que 

313  Ainda  reíla  a  ma-  também  podem  teílemu- 
iordor,&  o  maior  eícan-  nharneíle  cafo  j  vos  que 
dalo,  E  qual  he  ?  He  que  me  ouvis  ,  que  direis  da 
quando  eíias  imagens  tor-  voífa  ?  Que  milagres  viíles 
naó  para  donde  vieraó,ía6  nos  jà  mortos?  (quenao 
taes  as  bulias  de  canoniza-  fallo ,  nem  quero  que  fal- 
cão, que  leváo  com  figo,  leis  nos  vivos.  }  Equaes 
que  merecem  fer  colloca-  feriáo  as  merecidas  iníig^ 
das  |pbre  os  Altares.  Oh  nias,  ou  trofeos  dos  meín 
quem  lhe  puzera  também  mos  milagres,  com  que  a 
diante  as  iníignias  dos  feus     verdade  fem  lifonja^  &  a 

milagres!  Vede  que  Xa- -'—^^  —  ^— 

vieres  da  India,6c  que  An^ 
chietasdoBraíil !  Eopeor 


he,  que  fe  algum  os  nao 
imitou,  nem  teve  imitado- 
res i  eíle  he  recebido  fem 
applauro,&  eftà  fepuitado 
fem  culto.  Mas  naô  deixe- 
znos  em  íúmcig  os  múd,-^ 


memoria  ainda  com  hor^ 
ror,  lhe  adornaria  as  fe* 
pulturas  ?  Também  alli  fe 
veriaó mortalhas,  naó  de 
poucos  que  refufcitaííem  ^ 
mas  deiníinitosjêc  fem  nu-' 
mero,  a  quem  tirarão  a  v'u 
da.  Também  fe  veriaó  ca-. 
4eaSí  naó  dos  que  Ubertá^ 
Y  iii j  raé 


-    » 


íi: 


344  _  Sermão daT>ominga vige/ima fegmda 

raó  do  cativeiro,  mas  das  quellas  canonizadas  ima- 
naçoens.Sc  povos  inteiros,  gens,  que  chegando  aqui 
que  fendo  livres  ,  fizeraó  deípidas^Sc  toicas  ,  torná- 
cativos.   Também  fe  ve-     raóeílo£idas  de  borcado. 


riaô  amarras,  naó  dos  na- 
vios, que  falváraó, mas  dos 
queíizeraó  naufragar  ,  6c 
perder,  fendo  elles  no  mar, 
&:  na  terra  a  maior  tormê- 
ta.  Também  fe  veriaó  mu- 
letas, não  dos  eílropeados 
quefaraíTem,  masdos  que 
fendo  ricos ,  &  abadados, 
os  deixarão  mendigando 
por  portas,  &  fem  remé- 
dio. Também  fe  veriaó 
braços,6c  pès  dos  que  fen- 
do poderofos,  fó  porque  o 
eraó,os  enfraqueceo ,  der- 


&  ouro;  6c  pintadas  có  as 
falfis  cores  com  que  en- 
ganarão a  fama  ,  por  ella 
faó  recebidas  em  andores, 
6c  frequentadas  com  rg^ 
marias.  > 


A   Tègora  tenho 


^^4     ,  . 

reprefentado- 
aos  noíTos  novos  Gover- 
nadores,6cnaturaes  o  que 
naó  devem  imitar  nos  ef- 
tranhos.  Nem  creyolhc; 
fera  diííicultofa  a  abomi- 


rubou,6coprimio  ofeuin-  nação  de  taò  perniciofos 
jufto  poder  fem  mais  ra-  exemplos,naófócomoex- 
zao  que  a  violência  Tam-  primentados  em  todos, 
bem  fe  veriaó  finalmente  mas  também  como  feri- 
osol?ios,que  fizeraó  cegar 
com  lagrimas:  d>:  os  cora- 
çoens  que  afogarão  em 
triílezas,  em  laííimas  ,  6c 
defefperaçoens  :  d:^.  as  lín- 
guas que  emudecerão  fem 
poderem  fallar,  nem  dar 
hum ay, por  Ihenaó  fer li- 
cito clamar  à  terra,né  ain- 
da gemer  ao  Ceo.  Elles,  6c 
outros  faO  os  milagres  da- 


doSjSc  magoados.  Saibaó 
porém  que  nelles  como 
naturaes  concorre  outra 
terceira  difiiculdade  ,  que 
nos  eftranhos  naó  tem  lu- 
gar. Porque?  Porque  ain- 
da que  huns,  6c  outros  faó 
imagens,  elles  faó  imagens 
comas  raizesna  terra. As 
imagens  naó  fó  ião  obra 
dosElUtuarAos,6c  Pinto- 
res, 


I 


U 


pofiTentecoften^  345- 

rcsjíenaó  também  dos  Jar-     ceder  aos  que  tem  o  o^over- 


dineiros.  Húa  das  coufas 
mais  curioías  ,  qiiefe  vè 
nos  jardins ,  onde  as  terras 
le  cultivaó  mais  primoro- 
fa mente  que  nefta  noíTa, 
faó  varias  íiguras  de  muf- 
ta^oii  de  outras  plãtas  for- 
madas com  tal  artificio, 
proporção  ,  &:  viveza  de 
membros,  que  tirada  a  cor 
verde,  em  tudo  o  mais  íe 


no  da  fua  própria  pátria, & 
naó  por  outra  razaó  ,  ou 
funda mentOjíenaó  porque 
temasraizes  na  terra. Alli 
tem  os  parêtesj  alli  os  ami- 
gos, alli  os  inimigos  ,  alli 
os  intereíles  da  fazenda5da 
familia,  da  peííba :  &  qual- 
quer ácÇccs  humores  3  ou 
rcfp eitos, 6cmuito  mais  to- 
dos j untos  podem  defcó- 
naó  diltinguem  do  natu-  por  de  tal  forte  a  imagem, 
ral  que  reprefentaó.  Mas     dcreprefentaçaó  de  quem 


efta  mefma  reprefentaçao 
he  muito  diíHcultofa  de 
confervar.  As  outras  ima- 
gens>  ou  fejaó  fundidas  em 
metal ,  ou  efculpidas  em 
pedra,  ou  entalhadas  em 
madeira,  ou  pintadas  nos 


governa,  que  nem  appare- 
cia  lhe  íiquedo  que  deve 
fer,&:  em  tudo  obre,  &  feja 
ocótrariodo  que  he  obri- 
gado. Se  o  humor  das  rai- 
zes  lhe  brotar  pelos  olhos , 
naó  poderá  ver  as  coufas. 


quaílros,  ou  tecidas  nos  ta-  nem  ainda  olhar  para  ellas 

pizes,  fem  mais  diligencia^  fem  paixaó ,  que  he  a  que 

nem  cuidado,  fempre  c5-  troca  as  cores  as    mefmas 

ferváo,&:  reprefentaó  a  íi-  coufas,&  faz  que  fe  vejaó 

gurajqiielhedeooartifice.  hiias  por  outras.  Selheto^ 


Porem  as  que  faó  forma- 
das de  plantas,çomo  tem 
asraizes  na  terra,  donde 
recebem  o  humor,  crecen- 
do  naturalmente  os  ramos. 


mar,  &occupar  os  ouvi- 
dos, naó  ouvirá  as  infor- 
maçoenscom  acautela  c6 
que  as  deve  exammar  ,  ou 
ficara  taó  furdo,que  as  naó 


facilmente  fe  defcópoem,  ouça,  ainda  que  fejaó  cla- 
Zc  fe  fazem  monftros.  Ifto  mores.  Se  lhe  rebentarpe- 
meímp  fucede>ou  pôde  fu-    la  boca,  mandará  o  que  de- 


/ 


■A 


í^, 


34,<^  Seymao  da.^õmingdvigefimafegunda, 
veprohibir,  &prohibiráo  oíferccer  o  governo  àOíi- 
quc  deve  mandar  ,  &  as  veira,aquairecrcurou,dí- 
fuas  ordens  feráó  defor-  zendo,  que  naó  queria  dei- 
à^n^  ,&  as  fuás  fentenças  xarofeuoleo,  cora  aue  fe 
aggravos.  Finalmente,  fe  ungem  os  homés,&fealu- 
fair,  &  vecejar  pelos  bra-  miaóosDeofes.  Ouvida  a 
ços,&:  pelas  mãos,  quefaÓ  efcufa.foraóà  Figueira,  & 
as  extremidades  mais  pe-  tambcm  a  Figueira  naó 
rigoías ,  &  onde  fe  expri-  quiz  aceitar,  dizendo,  que 
mentaó  maiores  exceílòs,  os  feus  figos  eraó  muito 
eftenderàos  braços  aonde  doces,  &  que  naó  queria 
naò  chega  a  fua  jurdiçaó,  deixar  a  fua  doçura.  Em 
&  metera  a  inaó,&  enche-  terceiro  lugar  foraó  à  Vi- 
rá as  máos  do  que  naó  deve  de,  a  qual  diíle,  que  as  fuás 
^^-^^'  uvas  comidas  eraó  o  fa  bor, 
31;  Por  certo  que  fe  &  bebidas ,  a  alegria  do 
os  que  tomáraó  febre  fy  mundo,  &  a  quem  tinha 
eíles  encargos  fe  aconfe-  taô  rico  património  ,  naó 


Iháraó,  naó  digo  comigo, 
fenaócom  asmefmasplã- 
tas,  que  tem  as  raizes  na 
terra,  ainda  que  os  gover- 
nos Foraó  de  maior  íuppo- 
íiçaó,  &  aurhoridade  ,  os 
naóhaviaódc  aceitar.  O 


lhe  convinha  deixajo  para 
fe  meter  em  governos.  De 
forte  que  aíllm  andava  o 
governo  univerfal  das  ar- 
vores,  como  de  porta  em 
porta,fcm  haver  qué  o  qui- 
zeíTe.    Mas  o  que  eu  noto 


primeiro  apologo  que  fe  nefíasefcufis,  he,  que  to^ 

efcreveo  no  mundo  [  que  dasconvicraó  em  húa  fq 

he  fabula  com  fignihcaçaó  razaó,  &  a  mefma,  que  era 

verdadeira   ]  foi  aquelle  naó  querer  cada  húa  á^zu 

que  refere  a  fagrada  hfcri-  xarosfeus  frutos.  E  ouve 

tura  no  Capitulo  nono  dos  alguém  que   diíTeífe  ,  ou 

Juizes.  QuizeraÓ  (  diz)  as  propuzeífe  tal  çoufa  a  cila» 

Arvores  fazer  hum  Key  arvores .^^  Ouve  alguém,  q 

gue  as  governafle,  &  foraó  iiRd^Q  à  OUvexra,  que  ha^ 


via 


•í 


foft  ^entecoflen 
Via  de  deixar  as  fuás  azei- 
tonas, nem  a  Figueira  os 
feus  figos,  nem  a  Vide  as 
fuás  uvas  ?  Ninguém.  So- 
mente lhe  diíTeraó,  &  pro- 
puzeraó  ,  que  quizeífem 
aceitar  o  governo.  Pois  fe 
iÇÍQ  foi  fó  o  que  I he  diífe- 
raójSc  offerecéraó ,  &  nin- 
guém Ihefallou  em  have- 
rem de  deixar  os  feus  fru- 
tos ;  porque  fe  efcufáraó 
todas  com  os  naó  quererê 
deixar  ?  Porque  entende- 
rão, fem  terem  entendi- 
mento,  quequem  aceita  o 
governo  de  outros  ,  fóha 
de  tratar  dei  les,  &  naó  de 
fy:  &  que  fe  naó  deixa  to- 
talmente o  intereífe ,  a  có- 
"veniencia, a  utilidade,  6c 
qualquer  outro  género  de 
bem  particuíar,&  próprio, 
naó  pôde  tratar  do  co- 
mum, 

5 1  é  Saibamos  agora , 
&  naó  de  outrem  ,  fenaó 
das  mefmas  arvores,  fe  efte 
bom  governo ,  do  modo  q 
cilas  o  entendéraójfe  pôde 
confeguir,  6c  exercitar  có 
as  raizes  em  terra? Aílim  as 
que  o  offerecéraó,  como  as 
que  o  naó  aceitarão,  todas 


concordáo,que  nao.  Que 
diíTeraó  as  que  offerecéraó 
o  governo  ?  Diíferão  a  ca- 
da hiia  das  outras :  Vehi^  ò' 
impera  no  bis\\ináQ^Sz  go* 


Judie 

9.12, 


vernainos.  Vinde  ?Xogo 
feeilas  haviaó  deir  ,  ha- 
viaófe  de  arrai^cardo  lu- 
gar onde  eílavãó,6c  deixar 
as  fuás  raizes.  £  cada  húa 
das  que  náo  aceitáráo,  que 
refpondeo  ?  Reípondeo, 
que  não  podia  ir  ,  porquj 
movendofe  havia  de  deir 
xarás  fuás x'aizes  ,  èc  fem 
raizes  náo  podia  dar  fruto; 
Nunquid  pojjlim  déferere^^'-^'>*- 
pnguedinemmeam-tér  veni- 
re,  tit  inter  ltg7ia  promove  ar  l 
De  maneira  que  governar, 
&:  governar  bem  ,  não  pô- 
de fer  com  as  raizes  na  ter- 
ra. Governar  mal,  6c  para 
deftruiçãodo  bê  comum, 
iííbíim.  E  na  mefma  hi- 
ftoria  o  temos  ,  que  ainda 
vai  por  diante.  Vendo  a^ 
arvores ,  que  as  três  a  que 
tinháo  oíFerecido  o  gover- 
no, o  não  quizeráo  aceitar^ 
diz  o  Texto,  que  fe  forãé 
ter  com  o  Efpinheiro ,  U 
lhe  fizerãoamefma  offer- 
ta.  E  que  refpondeo  o  Ef- 
pinheiro? 


/ 


>4 


5  4.8  Sermão  da  dominga  vigejimafegunda 

pinheiro  ?  He  repofta  mui- 
to ái<^m  de  ponderação.  A  ^..  VII.-  > 
propoíla  das  arvores  foi  a 
Íbid.r4.  meíma :  ^^2/,  é^  impera fu 


Zbid.if 


pernos-.  &  elle  refpondeo 
não  fó  como  Efpinheiro , 
fenão  como  efpinhado :  Si 
verè  me  Regem  vobis  confti- 
tuitis^  venite^  &fubumbra 
mea  requiefcite\fi  autem  fion 
vultis  5  egrediatur  ignis  de 
rhamno^  à*  de^oret  cedros 
Libani:  Se  verdadeiramê- 
te  me  dais  o  império,  vin- 
de todas  deicarvos  a  meus 
pès  ,  &  porvos  à  minha 
fombra:  &  fe  ouver  algúa 
que  repugne,  fahiràtalVo- 
godo  Efpinheiro,  q  abra- 
ze  os  mais  altos  cedros  do 
Líbano,  Não  fei  fe  repa- 
rais na  diíferença.  As  ar- 
vores, que  lhe  ofFerecéraõ 
o  governo,  diíferãolhe,/^- 
ni :  &  elle  diíTelhes,  k^enite. 
Não  íbu  eu  o  que  hei  de 
deixar  as  minhas  raízes, 
fenão  vòs  as  voíTas.  Em 
conclufaô,  que  quem  ha  de 
governar  bé,  deixa  as  fuás 
íaizcsi  6c  quem  governa 
n\al,arranca  as  dos  fubdi- 
tos,6c  fô  trata  de  confervar 
as  fuás. 


317 


Stahea  partí- 
L^cular  difíícul- 
dade,  &  o  grande  perigo 
cm  que  eftaó  de  fe  não  có- 
formarem  com  o  foberano 
original,  que  reprefentaô 
asimagens,que  tem  as  raí- 
zes na  terra.  HeneceíTario 
para  fe  confervarem  neíla 
nova  reprefentaçaó,  &pa* 
ra  governarem  como  de- 
vem ,  que  fe  apartem  da$ 
fiías  próprias  raízes.  Olhai 
para  todas  as  varas  defdc 
a  maior  à  menor  com  que 
fe  governa  a  Republica. 
AqueihcS  varas  não  tiver aò 
também  fuás  raízes  ^  Sim 
tívcrão.  Mas  para  gover- 
narem,&  terem  jurdiçaó, 
todas  foraó  primeiro  cor- 
tadas das  mefmas  raizes,6c 
por  lífo  todas  faó  varas  fe- 
cas.  Qae  remédio  logo  pa- 
ra que  as  novas  varas,que 
nos  governão,  tendo  como 
tem  as  raízes  na  terra,  con- 
fervem  a  imagem  do  Ce- 
farquereprefentaó.^O  me- 
lhor, &  anticipado  remé- 
dio ouvcra  fido  efcufaréfc 
como 


pofiTenfecoJien.  349 

como  fizerão  as  arvores     que  pôde  a  diligencia,  &  a 


bem  entendidas  j  mas  a  eí- 
cufa  jà  não  tem  lugar.  O 
receo  de  poderem  fer  co- 
mo o  Efpinheiro,  quepro- 
meteo  fombras,  &  amea- 
çou rayos,tambem  me  não 
dà  cuidado  i  porque  todos 
conhecemos  a  moderação, 
^  modeíHados  que  acei- 
tarão o  go\^erno.  Mas  por- 
que os  mefmos  governos 
antes  coílumão  mudar  as 
condiçoens  dos  homens , 
que  con  ferva  las  j  o  mais  fe- 
guro  mcyo  de  todos  feria 
cortar  as  raízes.  E  quando 
areíoluçâo  de  algum  foiTe 
tão  animoíii  que  afiim  o  fi- 
zeiTej  cu  me  atrevia  a  lhe 
prometer  da  parte  de 
Deos,  que  nem  por  iíTo  lhe 
farião  falta.  A  Vara  de  A- 
ramnão  tiaba  raizes  na 
terra ;  &  com  todo  rever- 
deceOj  íloreceo,  &:  deo  em 
meyo  dia  o  fruto,  cjue  as 
raizes  lhe  não  podião  dar 
em  menoi  de  hum  anno. 
Mas  deixados  os  milagres 
a  Deos ,  Sc  recolhendonos 
aos  limites  da  natureza,  fó 
vos  aconfelho  ,  q^e  façais 
com  toda  a  applicaçaô  o 


induftria.  Que  faz  o  Jardi- 
neiro para  confervar  a  re- 
prefentação  das  fuás  ima- 
gens, por  mais  que  tenhaò 
as  raizes  na  terra  ?  Traz 
fempreos  olhos  poílos  na 
figura  quereprefentao  j  8c 
contra  todo  o  Ímpeto  do 
humor, que  as  mefmas  rai- 
zes naturalmente  cômuni- 
cão  à  planta ,  jà  endireita- 
do, jà  dobrando  ,jà  ligan- 
do, jà  decotando,  conferva 
nellas  a  imagem  taó  pro- 
porcionadaj  inteira,  Sc  fem 
mudançajcomo  fe  a  tive- 
ra lavrado  em  mármore, 
ou  fundido  em  bronze. 

3 1 8  Tudo  iílo  he  ne- 
ceíHirio  a  quem  ha  de  re- 
tratar, ou  transfigurar  em 
fy  não  outra ,  nem  menor , 
ou  menos  fagrada  imagê> 
q  a  da  mefma  PeíToa  Real , 
a  quem  reprefenta.  Fia  de 
endireitar,  ha  de  dobrar, 
ha  de  ligarjha  de  cortar :  & 
como.^  Ha  de  endireitar  a 
intenção ,  tendo-a  fempre 
muito  re£ta  de  fervir  fó  a 
Deos,&:  ao  Rey .  Ha  de  do  - 
brar  a  vontade  .,  para  que 
fempre  fe  incline^ 6c  íi ga  o 


X 


^ 


jjfo  Sermão  daT^ammgavrgeJtmafegunda 

juizo,&  ditames  da  verda-     Oraabri  mdhoros  olhos, 


deira  razáo.  Ha  de  ligar, 
&  arar  o  appedte,  que  jun- 
to com  o  poder,  he  muito 
vioIento,&  rebelde,  para 
quefenãodefenírée.  E  íi- 


ôc  logo  a  vereisi  mas  he  ne- 
ceíTario  le\^antar  o  penfa- 
mento.  S.PauIodiZjqueo 
Verbo  eterno  he  a  figura 
dl  própria   fuílancia    do 


nalmente,  fealgum  átí^its.     ^c\ár:Q\ ^ii cum/it fpkndor 
.rr.n^  1.  ...  gloria,^ figura fubftãntU^^ 

(jus.  E  que  he,ou  quer  di- 
zer o  Verbo?  He,  &  quer 
dizer  a  palavra.  Pois  a 
palavra  de  Deos  he  a  fi- 
gura da  fua  própria  íuftá- 
cia  yfi^urafiibílanti£  ejus  > 
bim.  Porque  toda  a  fua  fu- 
ílancia ,  &  todo  o  feu  fer 
imprimio  ,  &:  exprimio 


affedtos  quizer  brotar  no 
que  não  he  decente  a  tão 
foberana  repreíentação  , 
decotalo  logo  ,  &:  cortalo 
para  que  a  não  defcom- 
ponha  j  &  fe  acafo  fe  fente 
por  dentro  ,  naó  apareça 
fora.  A  figura  que  haveis 
de  trazer  fempre  diante 
dos  olhos  ,  he  o  mefmo 


Hebr.i.' 


Rey  de  quem  fois  imagê :  Deos  na  fua  palavra,  como 

6c  náo  como  aufente,fenão  própria,  natural,  &  perfei- 

como  prefente  •,  nem  como  tiífima  figura  de  íy  mefmo, 

inviiivel,  fenão  como  vi-  E  allim  como  Deos  impri-. 


ílo.  Mas  como  pôde  ifio 
fer,feelle  eílà  tão  diftan- 
te?  Muito  facilmente ,  fe 
não  tirares  os  olhos  do  feu 
RegimentOjno  qual  vereis 
ao  mefmo  Rey  tão  natu- 
ral, &  vivamente  retrata- 


me,  &  exprime  a  fua  figu- 
ra na  fua  palavra,  afiim  os 
Reys,  que  fa5  os  Deofes 
da  terra,  fe  imprimem ,  & 
eílampáo  nas  fuás. De  ma- 
neira que  quem  lè  as  pa- 
lavras, a  firma, &  3S  ordena 


do  em  fua  própria  figura,     do  Rey  nos  feu s  Regime- 
como  fea  tivéreis  prefen-     tos,vè  apropria  figura  do 


te.  Dirmchcis  que  no  vof- 
fo  Regimento  ledes  fim  as 
palavrasj&c  firma  do  Rey , 
mas  naó  lhe  vedes  a  figura. 


Rey,  ouve  ao  Rey  em  fua 
própria  figura.  ísTunca  o 
pincel  de  Apcllcs  retratou 
táo  felizmente  a  Alexan- 
dre, 


'Ht^a. 


íi 


foftTentecoJien.  ^fi 

dre,  &  o  reprefentou  aos     quede  Key: In  hac  mepo- 
olhos  taó  próprio  ,  &  taó     tms parte  confpicite  qu^elã" 


vivo,como  os  Reys  no  que 

efcrevenij&ordcnaójíere- 
trataó>ou  reproduzem  a  fj 
mermos.  Sapiens  in  verhis 
producet feipftim  :diz  oEf- 
pirito  Santo. Mas  ouçamos 
a  hum  Rey. 

319  No  tempo  em  que 
os  Godos  dominarão  a  Ita- 
lia,humdos  Reys  que  ti- 
veraó  a  fortuna  de  eícre- 
ver  com  a  penna  deCaíIio- 
doro  ,  defpachando  feus 
Regimentos  a  algunsMi- 
niílrosauíente$,que  nun- 
ca o  ti  n  hão  vin:o,diz  aíTim: 


tetprajentes :  non  eíf  ^obis 
damnum  abfentié  me£ :  titi- 
lius  eft  mente  noffe^  quàm 
corpore.  Folgai  {  diz}  de 
me  ver  antes  no  que  vos 
efcrevo,  que  em  minha 
própria  peílba ,  entenden- 
do que  me  '^ç.àts  melhor 
do  que  os  que  na  minha 
Corte  eítaó  prefentes  j 
porque  vereis  o  queelies 
naóvem  ,  8c  fabereis  de 
mim  o  que  eu  lhe  encubra 
a  elles-  aifi  m  q  por  eíle  mo- 
do nenhum  dano  recebe- 
reis da   minha  au  fencia. 


Yenetefpeculum  cordís^fpe-  nem  a  m inha  prefença  vos 
€ulum  vohmtatis^  ut  qtiibus  fará  falta  ♦  porque  na  pre- 
non  fiímfacie  notus  ,  fiam     fença  ,  como  os  demais. 


msrú  qualitdte  recognitus'. 
Quando  chegarem  a  voííàs 
máos  eâas  minhas  letrasj 
recebei-as  como  hum  ef- 


vermeheiso  roílo  ,  &  na 
aufenciajpelo  que  vos  or- 
deno, vermeheisa  Alma. 
Mas  naó  deixemos  fem 


peiho  do  meu  coração  5  da     póderaçáo  chamar  o  Rey 
minha  vontade,  Sede  mim     às  fuás  ordens  efcritas  et 


mcfmo :  das  quaes,pois  me 
naò  conheceis  pelo  roflo, 
me  conhecereis  pelo  ani- 
mo. Notai  agora  o  que 
acrecenta  com  juízo  ver- 
dadeiramente real,  &  dei- 
criçaó>  6c  agudeza  mais 


pelhos  de  íy  mefmo :  Tene^ 
tefpeculum  corais^  fpeculum 
volufitatis.  A  mais  perfei- 
ta figura,  que  inventou  a 
natureza,  ànao  pôde  imi- 
tar a  arte,  he  a  que  fe  vé  no 
efpeiho.  Porque  o  q  fe  vè 
na,s 


y 


.^ 


^^t  Sermão  da T)omin_ga vigefimafcgunda 

nns  cores  da  pintura,  ou     to  obíervarem  as  ordens 


nojvulto  das  eílatuas  ,  he 
fó  húa  femelhança ,  Sc  re- 
prefentaçaó  dapeílba^po- 
rèm  no  eVpelho  naó  fe  vè 
fcmelhança,  ou  reprefen- 
taçaó,  íe  não  a  mefma  pef- 
foa  por  reflexão  dasefpe- 
cies.  O  efpelho  naó  he  ou- 
tra coufa  que  hum  impedi- 
mento das  eípecies  com 
que  vemos,  o  qual  as  naó 


do  feu  Regimento ,  feráó 
imagens  do  Cefar^  Sc  pelo 
contrario  no  ponto  cm  q 
íenaó  conformarem  com 
ellas,  perderão  a  femelhá- 
ça,  a  íiguraj&:  o  fer  de  ima- 
gens fuás. 

3  2 o  Perguntaò  os Theo- 
logos,  fe  Adam  pela  def- 
obediencia  perdeo  o  fer 
que  tinha  de  imagem  de 


deixa  paírar,^^:  tornaó  para  Deos  ?  £  refpondem  geral- 
os  olhos.  P-  aílim  como  o  mente  que  naó  j  porq  naó 
efpelho  fendo  impedimê-  perdeo  a  memoria,  en ten- 
to da  viíla  por  meyo  da  re-  dimento,  &  vontade, em 
fiexaó  melhora  a  mefma  que  confiftia  a  femelhan- 
vifl:a,aílim  na  aufencia,  çadeDeostrino,&hum,  a 
que  também  he  impedi-  queomefmo  Deosotinha 
mento  da  vifta  ,  por  meyo  criado.  Mas  eíla  repoíla 


da  efcritura  fica  a  mefma 
viíla  melhorada.  Sem  ef- 
critura he  a  aufencia  im^ 
pedimento ,  com  efcritura 
he  efpelho.  Eíle  efpeiho 
pois  dos  Reys  ,  em  que 
mais  vivamente  fe  repre- 
fentaafua  mefma  PeíToa, 
quenafua  própria  figura, 
heo  q  haó  de  trazer  íem- 
pre  diante  dos  olbos  os 
quetempor  obrigação, & 
officiofcrimagcs  do  Rey. 
Entendendo  queemquá- 


tem  neceílidade  de  diíiin- 
çaó.  Omefmo  homem  de 
dous  modos  era  imagem 
de  Deos :  hum  como  ima- 
gem naturai ,  outro  como 
iip.agem  politica.  Em  quã- 
to  criatura  racional  com  a 
fobcranía  do  livre  alve- 
drio cm  três  potencias,  era 
imagem,  que  naturalmen- 
te rcprefcntava  a  Deos  5  a 
qual  de  nenhum  modo  po- 
dia perder  ,  porque  nella 
coníiília  a  fua  própria  cf- 
Icncia. 


Nk» 


poftTeniecõJten.       _  ^^^ 

íència.  Pòrèmem  quanto     comeíle,  comendo  tambe 


fenhor  do  mundo  com  o 
governo  de  todos  os  ani- 
inaes,era  locotenente  do 
mefmo  Deos>  &;  imagem 
politica  rua,8c  efta  naõ  fó  a 


elle  j  logo  perdeo  a  ima- 
gcm^emque  reprefentava 
a  Dcos  politicamente,  & 
osanimaes^q  já  naõ  viao, 
nem  reconheciaó  nellea 


podia  perder  Adam>  fenâo  imagem» que  tinha  pcrdi- 
quede  fadbo  a  perdeo.Mas  do,  por  inftinto  natural  fc 
quandoj&como?  Tinha-  rebelláraó, &  Ihenegáraó 
lhe  Deos  dado  por  Regi--  a  obediência. 
mentOjqueguardaíTeoPa-.  321  Viíles  (^  diz  elc- 
raifOí^cquenem  elle,  nem  gantementenefte  paííb  S. 
lua  mulher  comeíTem  do  Ghryfoftomo^^viítesafo- 
fruto  da  arvore  vedada.  E  geiçáo  có  que  o  voílb  cao 
cm  quanto  Adam  guardou  vos  reconhece,  a  prompti- 
eíle  Regimento  Ç  que  não  dão  cô  que  chamado  aco- 


tc  fabeao  certo  por  quan- 
to tempo  foi  3  confervou 
inteiramente  em  fy  cfta 
íègunda  imagê  de  Deos, 
fendo  venerado  ,  &  reco- 
nhecido por  fenhor>&:obe- 
decidonoar,  no  mar,  & 
na  terra  de  tudo  quanto 
vivia  neftes  três  elemen- 
tos. Porem  depois  que  fal- 
tou àobfervancia  do  mef» 
mo  Regimento ,  antes  o 
quebrantou  em  tudo,  naò 
guardando  o  Paraiíb,  por 


de,  o  amor  com  que  vos  fe- 
gue,&  o  alvoroço  natural 
có  que  vindo  de  fora ,  vos 
faea  receber  ,  &  a  faltou 
vos  feíleja  :  &  pelo  con- 
trario, íe  vos  disfarça ílcs, 
&  cobriíles  o  roílo  com 
húarnafcara,  eííe  mefmo 
cão,  ladrando  ,  remete  a 
vòs,&  como  eílranho,  ou 
inimigo  dà  rebate  contra 
vós  em  voíTa  própria  caía.? 
Pois  ifto  mefmo  fucedeo  a 
Adam  com  todos   os  ani- 


que  deixou  entrar  nellea  maes,depois  que  defobc- 

Serpente,  nem  fe  abften-  decendo,  mudou  a  figura, 

do  da  arvore    prohibida ,  &  perdeo  a  imagê  deDeos, 

porque  confentio  que  Eva  que  era  o  caradter  villvel 

Tom. 7.  Z             do 


I 


^  f4  Sermão  da  dominga  vtgejimafegunda 

do  domínio  do  Uni  ver  fo , 
quenelle  tinha  delegado. 
Tanto  vai  de  guardarem, 
ou  naó  guardarem  o  Regi- 
mento;. &  ordens  do  fupre- 
iiio  Príncipe,  os  que  eile 
fubftituío  em  feu  lugar, 
para  que  como  imagens 
íuas  o  reprefentem.  Eu 
naó  me  queixo  das  imagés 


§.  VIIÍ. 

322  /^Díroatèquiba-i 


(^quãdonaó 
fobeje  3  para  que  os  noíTos 
DO^amenteeicitos  tcnhaó 
entendido  o  modo^co  que 
podem 5  &  devem  íaiísfa-^ 
zer  as  obrigaçoens  de  ima- 


emmafcaradas,  porque fei     gens  do  Ceíar,em  quefem- 
inuito  bem  as  cores,  coque     outro  exemplo  ft  vem  de 


honefta ,  &  modeítamente 
fefabem tingir,  ôc  fingir, 
em  quanto  allim  lhe  im- 
porta a  fuás  pertençoens  > 
mas  a  minha  queixa  ,  & 
de  todos  he  ,  que  depois 
<jue  fe  vem  feitas,ou  enfei- 
tadas em  imagens,  entaó 
tirãoa  maícaraj&  moírraó 
defcubertamente  o  q  eraó, 
êcíempreforaó.  Aílim  que 
jiaòha  outro  meyo  certo, 
&regurode  fe  confervaré 
na  inteira  repreíentaçaó 
de  imagens  do  Cefar,os 
que  por  mercê,  &c  authorí- 
dade  Tua  tem  eílc  nome/e- 
naòa  verdadeira,^  exada 
obfervancia  de  fuás  ordes  j 
&  veremfe,  ficcomporcTe, 
&  rctrataremíc  em  icws 
Regimentosjcomo  em  eí- 
peliios. 


prefente  coníiicuidoí,:  que 
era  o  primeiro  ponto  tia 
noíTapropoira.  Oiegunda 
pertence  aos  íubdicos,  & 
vaíTaliosdo  mefrao  Cefar, 
&he,como  devem  obede- 
cesse reverenciar  as  mef-" 
mas  imagens;  em  que  to- 
das as  diííiculdades5que  no 
primeiro  difcuríò  apontá- 
mos, eííão  facilitadas  ,  6c 
por  iífo  fera  eíle  muita 
breve. 

323  Primeiramente 
nosíubditosnao  occorrea: 
Giiíicuidade  do  acerto  na 
indiíterença,  ourciòluça6. 
do  que  fe  ha  de  obiarj  por- 
que ella  fo  pertence  a  que 
manda  5  6c  não  a  quem  lo 
deve  obedecer:  fendo  pri- 
vilegiofingular  da  ubedi- 
-encia. 


foflTentecoflm.  ^Tf 

cncia,  que  podendo  errar    movero  bem,aíííniíàbem 


quem  manda  5  &  errando 
líiuitas  vezesjfó  o  que  obe- 
dece, ainda  {^ç^^mào  eíTes 
mefmos  erros  ,  fempre 
acerta.  Do  mefmo  modo 
naóeíláo  expoílos  osfub- 
ditos  àquella  terrivel  ten- 
tação,em  que  mete  as  ima- 
gens dos  Cefares  o  eílar 
longe  delles  j  porque  fe  as 
imagens,  que  os  reprefen^ 
tão,eftáo  longe,  os  que  fe 
devem  conformar  com  el- 
!aS)  ainda  que  ellas  fejaô 
disformes,  fempre  as  tem 
àvifta.  Finalmente,©  íè- 
rem  imagens,  que  tem  as 
raizes  na  terra,  tão  fora  ef- 
tà  de  íèr  inconveniente, 
que  he  o  que  mais  convém 
a  toda  a  Republica. Os  que 
nafcéraó,  ou  fecriáraó  na 
mefma  terra,  comoas  qua^ 
lidades  de  cada  húa  faó 
differentes ,  &:  diíferentes 
os  climas,6c  influencias  do 
Ceo  quenelias  dominão , 
&  conhecem  as  inclina- 


os  meyos  efficazes,  &  mais 
provados,com  quefe  pode 
obviar  o  mal.  E  de  todas 
eftaspropriedades,  &  no- 
ticias,na6fó  importantes^ 
mas  totalmente  neceífa- 
riasjcarecem  os  que  vem 
de  novo  ,  Sede  fora,  fem 
lhes  valer,  como  inexper- 
tos, nenhua  ciência  ,  òiÇ^ 
curíb,  ou  juizojpor  agudo  i 
&  bem  inftruido  que  feja. 
Adam  &  Eva  tinhaó  cien^ 
ciainfufa,  &  fabendo,  co- 
mo náo  podiáo  ignorar, 
que  as  cobras  naó  fallavãoy 
por  informação  de  húa 
delias,  tendo-os  Deos  po- 
fto  no  Paraifo  para  gover- 
narem o  mundo,  o  mundo, 
&  o  Paraifo  tudo  perderão 
em  poucas  horas. 

^24  Pelo  contrario, 
quiz  Deos  acodir  ao  peri^ 
go  de  fe  perder  total  men- 
te, em  que  o  Povo  de  If- 
rael  eílava  no  Egypto  5  &  a 
quem  efcolheo  para  eíla 


çoens,&:  coílumeSjOu  bos,     grande emprefa  de  o  con- 
ouviciofos  dos  que  as  ha-     fervar,& livrar  de  taó  po 


bitãOjSc  de  tudo  tem  larga 
experiência  ,  aíTimcomo 
podem  fuavemente  pro- 


derofos  inimigos  }  A  pef- 
foa  que  efcolheo  >  foi  a  de 
Moyfes,  o  qual  poílo  que 


3T<í 

veíhdodcpelles,  &  com 
hum  cajado  na  mão  guar- 
dava ovelhas  em  hum  de- 
ferto,na6  tinha  menos  que 
quarenta  annos  de  vida,  Sc 
experiência  do  mefmo  E- 
gypto.  No  Egypto  nafcé- 
ra  5  entre  os  Egypcios  íè 
criáraj&nasefcolas  do  E- 
gypto  aprendera  quanto 
elles  fabiaó :  &  por  iííb  não 
com  outros  inftrumentos , 
íenáocom  o  mefmo  caja^ 
íio  vcnceo  todas  as  diííi- 
culdades,  &  confeguio  fe- 
lizmente a  emprefa ,  obra- 
do os  maiores  milagres,  q 
jamais  tinha  viílo  ,  nem 
vioomundo.  Então  que- 
remos que  remedee  os  ca- 
tiveiros do  Egypxo:,&  faça 
milagres  no  Egypto,  quem 
nunca  vio  o   Egypto.  O 
Profeta    Abacuc  quando 
Deos  lhe  mandou,  quefof- 
feaBabyloniafoccorrer  a 
Daniel, que  eílava  no  lago 
dos  Leoens ,  prudentiíli- 
mamente  feefcufou  ,  di- 
:2endo,  que  nunca  vira  a 
Babylonia  ,  nem  fabía  on- 
de eftava  tal  lago;  Bubylo- 
raníei.  Tiem  71071  vidjy  ^  lacumnéf- 
^^  ^'^   ^JSi  £ fefoi a  Babyloíiia^Sç 


vige/imafegimda 
tornou  a  Judéa  ,  &  fez  em 
meyo  dia  pelo  ar,o  quehú 
diligente  caminheiro  naó 
podéra  em  meyo  anno,foi 
porque  o  mefmo  Arijojquc 
lhe  deo  o  recado  da  parte 
de  Deos ,  o  levou,  &  trou- 
xe, &  lhe  moftrou  o  que 
nunca  vira  ,  &  enfmou  o 
que  naó  fabia.    Suppofto 
poisque  os  que  vem  de  mil 
legoas  a  eíía  noífa  terra,ta6 
nova  para  elles,  como  Ba- 
bylonia para  o  Profeta,  né 
trazem ,  nem  fao  trazidos 
de  Anjos  em  fuprimento 
das  experiências  que  naó 
tem ,  &  quando  começaó  a 
decorar  os  primeiros  ru- 
dimentos delias  5  fe  voltaõ 
outra  vez  para  oiide  vie- 
raój  muito  melhor  provi- 
dos eftão  hoje  os  lugares, 
que  elles  haviáo  de  occu- 
par,nos  que  com  tanta  ca- 
pacidade de  conhecimen- 
to, juizo,  talento,&  verda- 
deiro amor  da  mefma  ter- 
ra,a  cultivarão  como  pro-' 
priaj&  não  desfrutarão  co- 
mo alhea.  E  quando  de  feu 
cuidado  ,  (Sc  trabalho  co- 
Iháoalgú fruto,  QiYccin^in* 
d^mçno^  ficará  onde  naf- 
<:eo> 


^'k 


m 


põflTentecoJien.  35"/ 

ceo,  mie  he  o  mefmo  que    experiência  do  Teu  erro  os 


femearícde  novo  :  &  na5 
dallo  a  terrajpara  que  o  le- 
ve o  mar. 

32<r  Todas  eftas  razoes 
de  conveniência ,  &  utili- 
dade perfuadem  no  pre- 
feri te  governo  a  prompta 
fogeiçaó,  &:  alegre  obedt- 
cncia  dos  fubditos,  refpei« 
tandoeílas  novas  imagens 
do  Cefar  com  tanto  maior 
propenfaó  ,  &  vontade, 
quanto  mais  tem  denatu- 
raesjdomefticas  5  &  fuás. 
Mas  he  tal  a  protervia  da 
condição  humana  ,  %c  vi- 
cio táo  próprio  da  pátria  ; 
que  por  ferem  naturaes* 
domeílicaSrScfuas  as  mef- 
masimagenS:,  em  vez  de 
conciliarem  maior  vene- 
raçãOjObediencia  ,  8c  reA 
peito,  degeneraó  em  áç^C" 
prezo,  defobedienc  ia,  6cre- 
beldia.  Ailimlhe  fucedeo 
aSaul  ,  &:  a  David,  fendo 
ambos  eleitos  por  Deos,&: 

05  mais  dignos  do  governo 
da  fua  pátria.  Huns  obede- 
céráo^outros  fe  rebelláraó, 

6  em  alguns   durou  a  re 


fogeitou  à  razaó.  E  fe  buf- 
carmos  as  raízes  a  efte  vi- 
cio, acharemos,  que  toda 
elie  nafce  da  igualdade  da$ 
peíToas,  prefumindo  cada 
hum,  que  a  elle  íe  devia   a 
eleição  do  lugar ,  &  a  pre- 
ferencia. A  eleição  do  fum* 
mo  facerdocio  na  peíToa  de 
Aram  foi  tão  mal  recebida 
de  muitos,  que  Datan  ,  A^ 
biron ,  &  Core  levantarão 
tal  tumulto  no  povo  ,  que 
para  Deos  o  focegar,  &  ca- 
ftigar  os  rebeldes,  fe  abrio 
fubitamente  a  terra,  &  vi- 
vos foraó  fe  pui  ta  dos  no 
Inferno  com  todas  fuás  ca- 
fas,&familias  ,  &  abraza- 
dos  com  fogo  do  Çeomais 
dequatorze  mil  homens, 
que  feguiraó  a  mefma  re- 
belliáo.  E  porque  a  fegui- 
rão  .^  Porque  muitos  deli  es 
erâoiguaes,  &  parentes  de 
Aram^,^  náo  fofriaó  que 
lhe  foífe  preferido.    Mas^ 
tanto  fente  Deos,  &  táo  fe- 
vera mente  caíHga   a  ce- 
gueira de  femelhantes  am- 
bíçoens  >  tendo  dado  por 


beldia  naó  menos  que  (ttc    ley  ao  mefmo  povoj  que 
a,nnos  inteiros  i  atè  que  a    quando  em  algum  tempo 
Tom,/,  Z  iij        oa- 


(  J 

■ 

" 

•^  95^  ^^'^i^^ÕdaT^ommgavigefimafegnnda 

j  ouveíTenide  eleger  quem     que   a  repreTentaçaó 5 cm 


Dcur 
1   .«f 


OS  governaíTe  a  todos,  naò 
foíTe  outrem,  fenaó  de  feus 
irmãos,  &  de  nenhum  mo- 
do homem  eftranho  :  N.on 
J)õteris  alterius  gentis  homi- 
nem  Regem f acere ,  qni  non 
fitfrater  tuus.  Fina  1  mente, 
fe  como  diz  Chrifro  .Se- 
nhor noíTo,  o  bom  Paftor 
he  aquelkjque  conhece  as 
fuás  ovelhas, ôc  as  ílias  ove- 
lhas o  conhecem  a  elle: 


Joann. 


queellas  confiílem,  pofta 
em  qualquer  materia,fem- 
preheamefma.  Quê  ver- 
dadciraméte  crè  em  Chri- 
ílo,  tanto  adora  em  hum 
Crucifixo  de  ouro,  como 
cmoutrode  chúbo.  Qiie- 
rem  com  tudo  os  lifongei- 
ros,&:  os  liíbngeados,  que 
fô  íe  devaó  os  governos,&: 
fó  fejaó  aptos  para  elles  os 
nomes  pompofos  >  &:  ap- 


EgoJumTaftor  bónus  5  &  pellidosilluíires:  como  fc 
çognofco  oves  meãs ,  &  cog-  as  acçoens,  &:  feitos  honro- 
nofcuntme  meí^  :  como  as 
poderá  governar,  &  enca- 
minhar bem  o  eftranhoj 
C&mais  fefor  Mercena* 
rio^  que  nem  elle  as  co- 
nhece açllas,  nem  ellas  a 
elle? 


5.  IX, 


31S 


MAs  contra  tu- 
do iílo  fe  le- 

vãtaaquclla  politica  mais 
fcguidapelocoílume,  que 
approrada  pelos  exeplos, 
a  qual  tem  perfuadido  ao 
mundo,  que  fó  olhe ,  ou  fe 
deixe  cegar  do  reíplandor 
das  imagens,  fcm  advertir 


fos  fenaó  hajaó  de  eíperar 
com  maior razaô  daquel- 
les,que  querem  aquirir  a 
honra,que  dos-qiiecuidaó, 
&:  dizem, quejá  atem.  O 
meímo  luílre  dos  illuílres 
lhes  tira  o  temor,  Sc  os  en- 
che, ou  incha  de  inimuni- 
dade,  quelhedaó  confian- 
ça para  grandes  oufadias; 
&  das  ouíadias  grades  naf- 
cem  maiores  ruínas.  O 
mais  illuítre  dos  elemen- 
toSvOmais  alto  por  lugar, 
&:  o  mais  nobre  por  cálida- 
de,  he  o  fogo  ,  &  delle  fe 
acendem  os  rayos  no  Ceo, 
&:featea5os  incêndios  na 
cerra.  O  feu  natural  onde 
chc- 


i 


poJlTen' 


chega,  he  levantar  fuma 
ças,&  fazer  cinzas  :&  nao 
he  acomodado  inftrumert- 
to  para  edificar,  &  confer- 
var  Cidades,  o  que  coftu 


todos  faó  honradoS5mas  da 
nobreza  do  meyo.  Epor-* 
que  não  fizeraó  as  Arvo- 
res eíle  mefmo  ofFereci-* 
mento  aos  Cedros ,  às  Pai- 


jnaabrazarTroyas.Osou-  mas,&aosCiprefies^  Naa 
tros  elemétos  fervem-nos  faó  eítas  Arvores  entre  to-» 
de  graça,&  fó  o  fogo  à  nof-  das  as  mais  altas ,  as  mais 
fa  cuíla,  porque  para  fer-  celebradas  j  as  maisiílu» 
TÍrhadeterque  queimar,  ílres?  Pois  porque  naó  tr\r 
&  fe  naó  queima,  naó  fer-  tráraó  cm  cófideraçáo  pa- 
'"  *  •  '  '  '  ra  querer  a  verde  ,  &  flo-» 
rente  Republica  das  plan- 
tas, que  ellas  a  governaf- 
fem  ?  Por  iíTo  mefm  o  -,  por- 
que eraô  as  mais  altas,  8r 
as  mais  illuílres.  O  alto,  & 


ve.  Tal  he  a  luz  do  mais 
illuftre  elemento  :  &  tal 
muitas  vezes  o  governo 
dos  mais  illuftres.  Naó  era 
illuftre  David,  &foi  illu- 
ílriíiim_o  feu  filho    Sala- 


mão  :  &  o  Reyno,  que  fu-    o  illuftre  he  bom  para  o  hi 
íl:entou,6c  amplificou  o^     zarro,  &  oftentofo  ,  mas 


naó  era  illuftre,  perdeo,  & 

desbaratou  o  illuftriftimo. 

327    NoApologoque 

referimos  da  Efcritura  fa- 

frada ,  em  que  as  Arvores 
ufcáraój&elegérao  quem 
as  governafíe  •  he  muito 


naõ  para  o  útil ,  &  neceíla- 
rio.  As  arvores  nao  as  fez 
Deos  para  bandeiras  dos 
ventos,  fenaó  para  fuften- 
to  dos  homens.  Que  im- 
porta que  a  fua  altura,  ou  a 
fua  altiveza  feja  muita,fe  o 


para  notar,  que  aquellas,  a  íèu  fruto  he  pouco  >  A  quê 

que  oíFerecéraõ  o  gover-  fuftentáraòjà  mais  os  Ce- 

no,  foraó  a  Oliveira ,  a  Fi-  dros,  as  Palmas,  ou  os  Ci- 

gueira,6c  a  Vide,  fem  en-  preftes  ?  Pelo  contrario  a 

trar  outra  nos  pelouros  de-  Figueira  he  a  que  faborea 

íla  eleição.  Reparai  agora  o  mundo,  a  OUveira,a  que 

nosappellidosdc  Figuei-  o  alumia  >  a  Vide,a  que  o 

ía^Vide,  §ç  Oliveira,  que  alegra  i  U  toda»,  entre  as 

Ziiij        plaíi^ 


6o 


Scnnao  duT^on. 


Eoclef. 
^4  »7. 


plantas  as  que  mais  o  fu- 
ílentáo.  O  que  diz  a  Efcri- 
tura  das  ou  trás  tres  arvo- 
res ai  tiírimas3&  illuílriíli- 
mas,  he,  quetodas  bufcaó 
a  fua  exaltação  nos  montes 
mais  levantados:  ^/^C^- 
4rus  exaltatafum  in  Liba^ 
no^  &  quafi  Cyprejjíis  in  m^^ 
teSion:  quajt  Talma  exaU 
tatá  f um  in  Cades.  Hon- 
remfe  embora  com  eflas 
arvores  os  Teus  m5tes>  que 
os  noíTos  valies  naó  hao 
miíter  quem  procure  a  fua 
cxaltação,fenão  quem  tra- 
te do  noííb  remédio.  Os 
Cedros,  as  Palmas,  &  os 
Cypreíles  faó  os  Gigantes 
das  arvores,  &  o  que  trou- 
5teraó  os  Gigantes  à  terra  > 
náo  foi  menos  que  o  dilu- 
vio. Oh  que  duro  feria  o 
governo  daquelle  foberbo 
Triunvirato  no  forte  do 
Cedro,  inflexível  j  no  ru- 
gofoda  Palma,  afpero-,  & 
no  funefto  do  Cipreíle, 
rriíle !  Porém  o  das  outra$ 
arvores  de  meãaeílatura, 
feria  igual,  feria  modera^ 
do,  fcaa  fuavcque  por  iífo 
todas  allegáraò  a  fua  do- 
çura.  Jp,  iíto  he  pelas  mpf- 


^iga  vtgejtmafegit7iãa 
mas  razoens  o  que  deve- 
mos efperar  do  noíTo. 

328  Sendo  poistaó 
particulares  as  conveniên- 
cias do  novo  governo  nas 
imagens,  que  temos  prc- 
fentesjdo  noífo  feliciífimo 
Cefar,  que  Deos  guarde , 
feja  também  noTa,&  mais 
exacta  que  nunca  a  fogei- 
çaó,  refpeito,  &  reveren- 
cia, com  que  todos  os  vaf« 
fallos  da  mcfma  Magefta- 
deos  venerem  ,  &  obede- 
ça õ,  naó  fó  como  fe  a  Real 
PeíToa  eftivera  prefence» 
fenaò  em  certo  modo  ain* 
da  muito  mais.  Tenho  ob* 
fervadoaílim  no  Ceo  co^ 
mo  na  terra,  que  mais  eíti- 
maô  os  fupremos  Monar-r 
cas  os  obfequios  ,  que  fe 
fazem  a  fuás  imagens,  que 
a  fuás  próprias  PeíIbas.Lé- 
brame  haver  lido  em  S. 
Agoílinho  no  livro  dos 
feus  Comentários  fobre  05 
Pfalmos,*quc  reíidindoem 
Romano  tempo, em  que 
ainda  naô  eílava  deílerra.» 
da  de  rodo  a  idolatria  ,  fc 
admirava  muito  de  queos 
homens foíl em  aofTcmplo 
fio  Sol; de  que  hoje  fe  vem 
íiaQ 


põJiTentecõften.  5^1 

naó  pequenos  veftigios,  &     que  naó   mandou,  que  o 


que  alli  de  dia ,  &  naõ  de 
noite  adoraífem  a  imagem 
domefmoSol  com  as  co- 
fias muitas  vezes  voltadas 
a  elle  ?  Pois  fe  tinhaó  o  Sol 


adoraíTema  elie  ,  fenaóa 
fua  Eftatua  ?  Porque  era 
maior  oftentaçaojSc  gloria 
da  fua5que  chamava  om- 
nipotência, fer  venerado, 


prefente,  porque  naó  ado-  &  adorado  na  imagem, que 
ravaôao  Sol,  fenaó  a  fua  oreprerentava,que  em  fua 
imagem  >  Porque  entcn-    própria  PeíToa. 


deo  a  religião,  ou  fuperíli 
çaó  dos  Romanos ,  gover- 
nada pelos  primores  da  fua 
própria  politica  j  aue  mui- 
%o  maior  mageftaac  era  do 
Monarca  dos  Planetas 
fer  venerado  de  taò  longe 
em  fua  imagem  ,   do  que 


529  Soem  huacircun- 
ílancia  obrou  Nabuco  co- 
mo defconfí  ado  ,  que  foi 
cm  fazer  a  mefma  imagetn 
de  ouro.  Faze-a,Rey>  d^ 
pedraj6c  feráó  as  fuás  adoM 
raçoens  pira  ella  muita 
mais  reverentes,  &  para  ú 


adoradoemfymefmo,po-  muito  mais  gloriofa*s.  Na 
ílo  que  viilo.  Ao  menos  af-  Eftatua  de  ouro  podo  pa? 
íimhe  certo,  que  o  julgou  recerque  adoraó  a  mate-» 
a  foberanía  de  Nabucodo-  ria,6cna6  a  forma,  o  preçQ 
riofor,  quando  fe  reputava  do  metal,&na6  a  reprefen-* 
fuafoberbanaõfôfenhor,  taçaódaimagem.Onde  a 
mas  Deos  detodo  o  mun- 
do. Fez  aquella  Eílatua  de 
ouro  de  tão  defmedida 
grandeza  comofabemos, 
&  com  as  fornalhas  acefas 
contra  os  que  a  naó  adoraf- 
fem,  mandou,  que  ao  fom 
de  trombetas  todos  do- 
braíTem  os  joelhos  diante 
delia.  Pois  fe  Na bucodo- 
-|iofor  eílava  prefence,por- 


matéria  das  imagens  he 
menos  preciofa ^  alíi  eftà  a 
fé,'6ca  reverencia  mais  fí* 
na.  Eefta  he  aiineza  do 
noíTo  cafo,  adorando ,  ref* 
peitando,6ç  obedecendo  o 
original  foberano  do  noílo 
CeíarjOaò  nas  imagens  df 
ouro,  que  atègora  cà  fe 
manda vaó,  fenaó  nos  már- 
mores naiuraes  ,  U  dome*- 


^^2  ^^^^^oda^Bomingavígepmafegunda 
íticos  da  noííli  mefina  ter-  to  do  fervico  Real ,  &  Di- 
rá. Seo  eíFeito for  qual fe  vino.que  com  fumma  paz, 
cípera,  &  eu  me  eftou  pro-  quietação,  &  concórdia  fe 
iTietendo  defta  mudança  verifique  em  todo  efteEl- 
tíamacdoAItifiimoiOpre.  tado,oqQe  Chriílo  refpó- 
ícnte  governo  fera  taó  deo  à  pergunta,  que  hoje 
aceitoa  peos,&ao  Rey,  Ihefízeraõno  Evangelho, 
queSuaMageftadcocon.  iftohe^quea  Deosfedèo 
íirme  ,  &  faça  perpetuo :  de  Deos  ,  &  o  de  Cefar  a 
com  menos  á^Ç^t{2.  fua,  Cefar  :  Reddite  quét  funt 
com  grandes  utilidades  C^faris.Cafari.&quafunt 
noílas,  &  com  taó  conhe»  'Dei^^Deo. 
cidas  melhoras,  &  augme- 


SER. 


3<í3 


ààkààÈ  ^à^ààààààààààMà^ 
ffffffffffff^fffffi=ffl'i 

SERMA 

DE  NOSSA  SENHORA. 

DA  GRAÇA. 

ORAGO  DA  IGREJA  MATRIZ  DA  CIDADg 

do  Parájcuja  fefta  fe  celebra  no  dia  da  AíTump- 
Ção  da  mefma  Senhora. 


Mma.  opúmam partem  elegtt .  Luc .  i  o. 


'■'■^BiM^ Rande  día,grã'^ 
È»  de  Feira :,  grande 
Evangelho  :  & 
ííixi»^  grande  difficul- 
dade  também  a  de  cócor- 
dar  com  propriedade  ,  & 
verdade  o  concurfo  deílas 
três  obrigaçoens.  O  dia  he 
grande  i porque  he  aqiielle 
ferniofodia,emquea  Vir- 
gem Maria,  depois  de  pa^ 


gaf  o  tributo  à  morte>  co* 

mo  verdadeira  filha  de  A^ 
damjrefufcitando  logo  co 
mo  verdadeira  Máy  de 
Deosjfubio  ao  Ceo  a  gozac 
para  jfempre  a  gloria  defua) 
viíla.  A  feíla  he  grande  i 
porque  he  da  Senhora  da 
Graça,  titulo  defta  Igreja 
Matriz,  a  primeira,  Sc  ma- 
ior de  húa  tao  dilatada 
Provincia,&  cabeça  de  to>« 
das.Q  Evangelho  he  graiv 
dej; 


j^4  SermaUe 

de >  porque  nelle  debaixo     bridadc  do  me/mo  titulo 

Martha&Mariaferepre-     ção   da   mefma   Senhora, 


íencaó  as  duas  vidas  a£ti 
va,  (Sc  contemplativa  ,  em 
cujo  complexo  fe  contém, 
Sc  côprehende  toda  a  per- 
feição Evangélica.  E  he  fi- 
nalmente grande  a  àim- 
cuidade  de  concordar  o 
concurfo  deRds  três  obri- 
gaçoensj  porque  fendo  a 
gloria  o  fim  ,  &:  a  graça  o 
meyodea  confeguirjante- 
Jori 


naó  confta ,  nem  ficou  em 
memoria.  Mas  neíta  q  pa- 
rece fem-razão,  &  impro- 
priedade, acho  eu  três  gra- 
des propriedades,  &  ade* 
quadas  razoens.  A  primei- 
ra,porqueagraçahe  o  di- 
reito por  onde  le  deve  aos 
Juílos  a  gloria:  aíegunda, 
porque  a  gloria  fe  diílri- 
bue  a  cada  hum  pela  medi- 
por  a  graça  a  gloria ,  &  o     da  da  graça:  a  terceira,por- 
iiieyoao  íim,náo  fó  parece     que  quando  acaba  de     fc 
diíTonancia  ,  fenão  defor-     aperfeiçoar  a  graça ,  entaó 


dem  maníFeíla :  &  porque 
applicando  o  Evangelho  a 
melhor  eleiçaÓ,&:  a  melhor 
parte  à  gloria  da  Senhora, 
em  vez  de  celebrar  a  mef- 
ma gloria  no  dia  de  fua 
Aífumpção  ,  trocala  pelo 
titulo  da  Graça,tambê  pa- 
rece impropriedade,  por 
lhe  naó  dar  nome  de  iniu- 
ítiça. 

331  O  motivo  queti- 
veraò  os  antigos  fundado- 
res,para  que  havendo   Ic 


fe  começa  a  poíluir  a  glo- 
ria. £  como  o  dia  em  que 
fe  cerrou  o  direitojcm  que 
fe  igualou  a  medida,  6c  em 
qucfeconfumou  a  perfei- 
ção da  graça  immenfi  da 
Máy  de  Deos,foio  mefmo 
dia  da  fua  gloriofa  A fi um p- 
çaó  :  Sc  naó  em  ditierentes 
horas  ,  ou  momentos  da- 
quelíe  dia,fenaó  na  mefma 
hora,  &  no  mefmo  momc- 
to,emqueacabou  decon- 
í limar  a  immenfidade  da 


yantado  eíle  Templo  de-  graça,começou  a  Senhora 
baixo  do  titulo  da  bcnhora  a  gozar  a  inimenfidade  da 
da  Graça ,  unilfem  a  ceie-    gloria  j  não  fó  foi  piedade. 


m 


íí: 


Noffa  Senhora  àa  Graça.  3  ^f 
Ôcdevaçaó  particular,  fe-  em  queviveo  neftemun- 
naó  juftiça ,  que  nefte  dia  do,fempre  creceo  mais ,  & 
foífe  celebrada,  co tno  he ,  mais  atè  o  ultimo  inftante 
com  titulo  de  Senhora  da  da  vida.  Logo  em  nenhum 
Graça.  Tanto  aíTim,  q  em  outro  dia,  fenaóno  ultima 
nenhum  outro  dia,ou  fefta  da  mefma  vida,  que  foi  o 
da  Virgem  Senhora  noíTa  mefmodia  da  AíTumpçaá 
fe  lhe  pode  dar  própria,  &  da  Senliora,  fe  podia,&:  de- 
cabalmente  o  titulo  da  via  celebrar  própria,  &  ca- 
Graça/enao nefte.  Epor-  balmente a fua graça 3 por- 
que \  Porque  em  todos  os  que  fó  naquelle  dia  fe  aca^ 
outros  dias  fempre  a  fua  boudeconfumara  mefma 
graça  hia  crecendo,  nefte  graça  em  toda  fua  perfei- 
fó  chegou  ao  fummo  grão  ^aô,&:  grandeza.  E  iftohe 
de  fua  grandeza ,  &  fe  vio  o  que  faz  efta  nofla  \  greja; 
toda  junta,  &confumada.  3^  Masporqagraçada 
No  dia  da  Conceição  foi  a  Virgem  Maria  foi  cófumaJ 
Senhora  còcebida^cm  gra-  da  no  dia,em  que  acabou  a 
ça  ,  mas  eíla  graça  creceo  vida  temporal,  &  a  gloria 
delHe  a  Conceição  atè  o  da  mefma  Senhora  també 
Nafcimêto,derde  o  Nafci-  foi  confumada  no  dia,  em 
mento  atè  a  Prefentaçao  que  começou  a  eterna-,  pa- 
no Téplo,  &  dcfde  a  Pre-  ra  entrar  naaltiflimaque- 
íèntaçaóno  Templo  atè  a  fl:ão,quefe  naó  pode  evitaç, 
Encarnação. No  dia  da  En-  neftes  ternios,&  nefte  dia , 
carnação  efteve  a  Senhora  entre  a  graça ,  &  gloria  da 
chea  de  graça,mas  eífa  gra-  mefma  Senhora,ambas  có^ 
ça  foi  crecendo  até  a  Viíi-  fumadas:  6c  para  refolver  a 
taçaó  ,  da  Vifitaçaó  atè  o  qual  pertence,  conforme  a 
Parto, do  Parto  atè  a  Puri-  noflb  Thema,a  eleição  da 
licação,  da  Purificação  atè  melhor  parte,  Mana  optU 
aMorte,&Refurreição,&  mam partem  ekgit  %  peça- 
Afcençáo  de  feu  Filho ,  &  mos  à  mefma  Senhora  da 
por  tantos  ajançs  depois,  Gloria,&  da  Graça  nosaC- 

6^ 


i 


^65 

áíta  de  tal  modo  com 
graça,  q  a  mereçamos  ver 
na  fua  gloria .  Âve  Maria, 

§.  II. 

Maria  óptima  farte  elegit. 


333  /^^Ccupada  Ma- 

V^ ria  com  toda  a 

fua  attençaó  em  ouvir  as 


Sermão  de 

fua  próprio  ,  applicaa  Igreja 
Catholicaà,prerente  íblé* 
nidade  da  gloriofa  Af-, 
fumpçaó  da  Virgé  Senho- 
ra noíía.  Naó  comparando 
Maria  (^a  Magdalena  }  a 
Martha ,  mas  preferindo 
MariaCaMáyde  DeosJ)  a 
toda  a  Corte  celeílial  An- 
jos, &  homens.  Divide  a 
gloria  doCeo  em  duas  par- 


palavras  de  fcujôc  noíTo  di-     tes,húa,  que  comprehende 
vinoMeftre,  a  (Tentada  a     todos  os  Bemavéturados, 


feus  figrados  pès :  Sc  occu- 
pada  tam.bem  Martha  com 
todo  o  feu  cuidado  nas 
prevençoens,&  policias  da 
inera,em  que  havia  de  fer- 
vir,&  regalar  a  taó  fobera- 
nohofpede:  Maria  enten- 
dêdo,que  ainda  erriley  de 
cortefia  era  maior  obriga- 
ção a  da  fua  aíliílencia:  & 
Martha  queixofa  de  qfua 
Irmãaa  deixaíTe  fó  i  ref- 
pondco  o  Senhora  queixa 
dehúa  ,&  accdio  pelo  fi- 
lencio  de  outra,  pronunci- 
ando como  oráculo  divi- 
no,que  Maria  efcolhéra  a 
melhor  parte:  Marta  opti- 
mampartemelegtt.  Efta  hi- 
íloria  tomada  em  allego- 
ria,por  naò  ter  Evangelho 


outra,que  unicamente  per- 
tence  a  Maria ,  &:  efta  can- 
ta  j&  apregoa,  que  naó  fó 
he  melhor  de  qualquer 
modo  ,  fenao  em  grão  fu- 
perlativo  óptima  ,  Ofti^ 
mam  partem  ekgif. 

334  Poreftemodofé 
concorda  muito  acomoda- 
damente o  Evangelho  cò  a 
gloriada  Virgem  Senhora 
noífa  j  mas  a  fegunda  diííi- 
culdade,  que  refervamos 
para eíle  lugar,  naóconfi- 
fte  em  concordar  o  Evan- 
gelho com  a  fua  gloria ,  fe- 
naó  com  a  fua  graça.  E  que 
feria  fe  eu  d  i iTeífe,q  m  u i to 
mais  própria  mente  fecon- 
cordaóo  mclmo  Evange- 
lho,ôc  as  meíniás  palavras 
com 


Nvffa  Senhora  ãa  Graça,  ^  6j 

çonio  titulo  da  Graça,que     de  quem  confeguio  a  opti- 


com  o  da  Gloria  da  mefma 
Seuliora  Aílimo  digo,  &: 
aílimoprovo.  Porque  tu- 
do o  que  Maria  acquiria 
aospèsde  Chriílo  ,  &  as 


m^Lfiptimam partem  ekgit. 
Na  cóparaçaó  literal,  Ma- 
ria Magda lena  foi  preferi-» 
da  a  Marcha  na  melhoria 
da  graça :   na  comparação 


melhoras  em  que  foi  pre^  allegoricajMariaMáy  de 
ferida  a  fua  Irmáa  ,  hiílo  •  Deos  foi  preferida  a  todos 
rial,literal,&  propriamen-  os  Bemavérurados  na  me- 
te eraó  da  Graça,  &  naó  da  Ihoria  da  gloria.  Porém  na 
Gioria.Cóíirmafe  do  mef-  comparação  noíla,  &  deílar 
mo  Texto,o  qual  ò^iz^  que  Igreja  particular,  em  que  a 
Maria  eíiava  ouvindo  ao  feftejamos  debaixo  do  ti- 


Senhor:  Audiebat  ver  bum 
illiiis.  Naó  díz^que  via,  fe- 
naó  que  ouvia,  &  o  ouvir, 
que  he  o  fenuido  da  fé^per- 
tence  a  eíla  vida^onde a  al- 
ma fe  melhora  pela  graça  , 
&  naó  à  outra ,  em  que  fe 


tulo  da  Graça  ,  nomeímo^ 
dia,  em  que  a  Igreja  uni- 
verfal  a  celebra  debaixo 
do  titulo  da  Gloria :  quan- 
do a  comparada  não  pode 
íèr  fenáo  a  mcfma  Senhora 
comíigo,nêa  comparação 


beatiíica  peia  viíla.  Logo     pôde  íer  outra,  fenáo  entre 
quanto  à  concórdia  do  E-     a  mefma  Graça,&a  mefma 


vangel  ho  to  o  titulo ,  mui- 
to melhor  concordado  o 
temos  CO  o  titulo  da  Gra- 
ça, que  com  o  da  Gloria» 
Porque  à  Gloria  íóCc  attri- 
bueem  parábola  ,  &  por 
acomodação,  &  da  Graça 
falia hifto;ial, própria,  6c 
naturalhi  ente. 

3  5f  S o reíla  a  compa- 
ração de  húa  parte  boa,  &c 
©urra  melhor,  &  a  ventagê- 


Gloria ;  a  qual  deites  dous 
títulos  havemos  de  dara^ 
preferencia,  &  de  qual  ha-  > 
vemos  de  dizer-.  Mar moj?" 
ttmam  partem  elegit  :  de 
Maria  em  quanto  Senhora . 
da  Graça,ou  de  Maria  em 
quanto  Senhora  da  Gioria?^ 
Eíte  íerà  o  altiílimo  ponto 
do  aojílxj  difcurfo.  E  poílo 
que  ambos  os   títulos  na 
Máy  de  Deos  fejáo  iramê- 
fosj 


363  "  Sermão  ãe 

fos  y  para  maiór  gloria  da  do  com  a  fombra  ?  Será  co- 

iTiefma  Senhora,  daremos  mo  hum  homem  compa- 

a preferencia  ao  titulo  da  rado  com  húa  formiga?Se- 

íua  Graça.  Ohfeamefma  rà  como  hum  Serafim  có- 

Senhora  da  Graça  nos  aíli-  parado  com  húa  borbole- 

íliíle  com  a  Tua  para  pene-  ta  ?  Não.  Porque  a  pedra , 

trarmosjou  nos  deixarmos  &odiamante,o  Sol  ,6c  a 


bem  penetrar  defta  verda- 
de! 

§•    IIL 


fom  bra,  o  homem,&  a  for- 
miga,o  Serafím,&  a  borbo- 
leta, tudo  faó  coufas  natu- 
raes ,  6c  criadas  por  Deos 
em  quanto  Author  da  na- 
tureza: &  como  faó  natu- 
raes  ,  nenhúa  delias  tem 
comparação  com  o  quehe 
fobrenatural  Tanto  aílim. 


L  33^  13  Ara  demoftra- 
\  çáo,  &  intelli- 
gencia  delia  [  que  não  he 
fácil  ainda  aos  maiores  en- 
tendimentos] havemos  de 

fuppor,  queaíTim  a  graça  quefeDeos  criaífe,  como 

como  a  gloria,  faó  bensfo-  pôde,  outros  mil  mundos 

brenaturaes.  E  fe  me  per-  mais  perfeitos  que  eíle,  & 

guntardes  [  como  deveis  povoados    de    creaturas 

perguntar,  ou  todos,  ou  muito  mais  nobres ,&  ex- 

quafi  todos  }  que  coufa  he  cellentes,  fempre  o  fobre- 

bem  fobrenatural?  Haveis  natural  as  excederia  incó- 

defaber,quehehumbem,  paravelm ente.  Porque  he 

o  qual  na  nobreza ,  no  pre-  gráo  muito  fuperior  a  tu- 

ço,6c  na  dignidade  excede  do  o  que  comprehende  em 

atodososbens  danature-  fyaesferada  natureza.  E 

íza,aírim  viíiveis,  como  i^-  taes  faó  a  graça,&:  a  gloria, 

viliveis.  E  para  que  decla-  que  fó  fe  podem  comparar 

remos  efte  exceífo  com  ai-  entre  fy,como  nós  as  coni- 

gum exemplo:  fera  como  paramos  neíta  noíla  que- 

hum  diamante  compara-  íláo. 

do  com  as  pedras  da  rua  .^  337  Digo  pois,  outor- 

$erà  como  o  Sol  compara-  no  a  dizer,que  havendo  de 

£a. 


Noífã  Senhora  daGrãç  a.  ^69 

fazer  efcolha  entre  a  glò-     &:adadivadeprerente>co- 


ria,Sca  graça,  coniornieo 
noíTo  TÍiema ,  Maria  opít- 
mam  partem  eíegit  ,  antes 
devemos  efcolíieragraça, 
que  a  gloria.  E  iílo  não  por 
húa  razaó,  fenaó  por  mui- 
tas. Seja  a  primeira  ,  por- 
que a  graça  envolve  com- 
íigo  a  gloria :  &  ainda  que 
poíTa  haver  graça  fem  gío- 
ria,  não  pôde  haver  gloria 
fem  graça.  A  graça  he  fun- 
damêto  da  gloria,  &  a  glo- 
ria he  confequêcia  da  gra- 
ça; a  graça  a  ninguém  he 
devida,  &:  a  gloria  he  devi- 
da a  todo  o  que  eftà  em 
graça.  Diz  o  Apoílolo  S. 
Pedro ,  que  na  graça  ,  que 
hea  forma  com  que  Deos 
nos  faz  participantes  da 
natureza  divina,  nosdeo 
as  maiores5&maisprecio- 
fas  promeíTas.  Eíle  he  o 
fentido  daquellas  pala- 
vras :  Ter  quem  maxima^& 
^^^'^  pretiofa  nobis  promiffa  do- 
*■  navit^  utper  h£c  ejficiamt' 
ni  divina  confortes  natura. 
De  forte  que  na  dadiva 
nos  deo  Deos  a  dadiva,  & 
maisaspromeíFas.  Mas  fe 


mo  nos  deo  as  promeíTas 
nà  dadiva  ?  Porque  as  pro- 
meíTas futuras  faó  a  gloria, 
&  bemaventurança  ,  que 
havemos  de  gozar  noCeo, 
a  dadiva  preíente  he  a  gra- 
ça de  que  jà  gozamos  na 
terra :  ác  porque  na  graça 
fe  envolve  a  gloria5&  bem- 
aventurança ,  que  lhe  he 
devida  ,  por  iíTo  quando 
nos  deo  a  dadiva  ,  nos  deo 
juntamente  as  promeílas: 
Máxima^  Ò']pretiofa  nobis 
promijfa  donavit. 

338  AíHm  declaraóef- 
tefamofo  lugar  de  S.  Pe- 
dro os  mais  doutosjôc  mais 
literaes  Expoíitores  ,  mas 
eu  tenho  outro  melhorEx- 
poíitorque  todos  elles,  o 
Real  Profeta.  ^Àa  míferi-  ^^^^^ 
cordiam ,  &  ver it atem  dili-  83!  1 2^1 
git  'T>euSigratiam  ,  à*  glo- 
riam àabit  T)õminus.  Por- 
que Deos  ama  a  mifericor- 
dia,6c  a  verdade ,  por  ií!Co. 
dará  a  graça,  &  mais  a  glo^ 
ria.  Reparemos  muito  na-^ 
quelie,  ^uia ;  porque.Pois 
porque  Deos  ama  amife-» 
ricordia,6c  a  verdade:  por- 


ás promeíTas  faõ  de  futuro,    que  Deos  hç  xnifericordio- 


^70 


Sermão  í^e 


fo,&  verdadeiro ,  eíTa  he  a 
razaó  ,  ou  eíTas  faó  as  ra- 
zoens  porque  ha  de  dar  a 
graça  ,  &  mais  a  gloria  ? 
Sim.    A  graça  5  porque  he 
mifericordiofojèca  gloria, 
porq  he  verdadeiro.  Co- 
mo a  graça  com  que  Deos 
nos  perdoa  os  peccados,  5c 
nos  reconcilia   comíigo^a 
ninguém  he  devida,  toda 
he  liberalidade,  &  dadiva 
de  fua  mifericordia  :   po- 
rém a  gloriajcomo  Deos  a 
tem  prometida  a  todo  o  q 
efti  ver  em  graça,  toda  per- 
tence à  fua  verdade,  por- 
que como  verdadeiro  naó 
pôde  faltar  ao  que  té  pro- 
metido. Excellentemente 
S.  Agoftinho  :  lllequi  tri- 
buit  mifericordiam  Jervat 
*veritatemy  indulgentia  do- 
fiavitycoronamreddet .  Do- 
nator  efiindidgent  ia  ^debitar 
coron£.    O  mefmo  Deos 
Cdiz  Agoílinho  }  que  na 
graça  nos  moftrou    a  fua 
mifericordia,  na  gloria  nos 
moftrarà  a  fua   verdade. 
Na  graça  a  fua  mifericor- 
dia, porque  nos  deo  a  in- 
dulgência que  naó  devia  > 
&  na  gloria  a  fua  verdade , 


porque  nos  dará  a  coroa 
de  que  fe  fez  devedor;2)í7. 
nator  indidgentia  ,  debitor 
corona:  Sc  o  modo  com  que. 
fe  fez  devedor  naó  he  por- 
que recebeífe  de  nòs  aJgúa 
coufa,que  nos  haja  de  pa- 
gar, mas  porque  elle  nos 
prometeooque  naó  pôde 
deixar  de  cumprir  :  í)^^/» 
l^orem  "Dominiis  ipfefecitfey 
nonaccipiendo  , fed promit- 
tendo.  Non  ei  dicttWyredde 
quodaccepifti-fedredde  quod 
fromififti,  E  como  nos  ar- 
chivos  da  graça  eílaó    de- 
pofitados    os  créditos  da 
gloria ,  vede  fe  fe  deve  an- 
tes efcolher  a  graça,  que  a 
gloria,  poisa  graça  ,  6c a 
gloria  tudo  pertence  à  gra- 


ça. 


339  Por efl:a  conexão 
infaliivel  da  graça  com  a 
gloria  chamou  S.Paulo  bé- 
aventurada  aefperançn,có 
quenefta  vida  efperamos 
a  mefma  gloria :  Expeãan- 
tes  beatamfpem ,  é^  adven-  2 1  j/'^' 
tíim gloria  magni  T>ei.  Mas 
para  que  nos  naó  engane- 
mos com  eíla  efperança, 
como  com  as  demais,  que 
tanto  coílumáo  enganar i 


^ 


Noffa  Senhora  da  Graça.  3  / 1 

hc    neceíTario    advertir  ,  ventagem  à  correfponde- 

que  ha  húa  grande  diífe-  cia  do  amor  infinitamente 

rença  entre  os  fundamen-  defignal,  mas  reciproca  do 

tos  delia.   Olugardaefpe-  homem  para  com  Deos,  & 

rança  he  entre  a  fé,  &  a  ca-  de  Deos  para  com  o  home? 

ridade  ;  Te  a  efperança  fe  A  verdade  deíla  ^-^— 


funda  fomente  na  fé>  nani 
he  verdadeiramente  bem- 
aventurada ,  porque  tem  a 
bemaventurança  duvido- 
fa:  mas  fefe  funda  na  cari- 
dade, que  he  a  graça ,  en- 
tão hc  certamente  bem- 
aventuradaj&fem  nenhúa 
duvida-,  porque  lhe  naó 
pôde  Dcos  negara  bem- 
aventurança, &  gloria  que 
efpera :  Expeõfantes  beata 
fpemy  &  advent um  gloria 
magni  ^Dei. 

$.  IV. 

5^0  A  Segudarazaó 
yl^j^porque  mais 
íè  deve  efcolher  a  graça, 
que  a  gloria  ,  he  tirada  cia 
definição  ,  &  eíTencia  de 
húajSc  outra.  Agraçacon- 
íiíle  em  amar,&fer  amado 
de  Deos,a  gloria  em  ver  ao 
mefmo  Deos :  &:  pofto  que 
o  ver  a  Dcos  feja  a  maior 
felicidade,  quem  negará  a 


fobera- 
nillima  correfpondencia  o 
mefmo  Deos  a  fez  de  fé, 
quando  diífe:  Ego  diligen^ 
tes  me  diligo,M2iS  ainda  cô- 
parado  o  ver  a  Deos  fó  c6 
o  amar  a  Deos    de  noíía 
parte  -,   nenhum  entendi- 
mento haverá  jufto,  &  def- 
intereffado,  que  naó  efco- 
Iha  antes  o  amar.    E  fenão 
tomemos  por  juizes  aos 
q  mais  vem,  6c  maisamão 
a  Deosjque  faó  os  Serafins. 
Ao  lado  do  trono  de  Deos 
noCeo  vio  o  Profeta  Ifa- 
ias  dous  Serafins,  os  quaes 
com  duas  azas  cobrião  os 
olhos,  &  com  outras  duas 
abrião  o  ^Q\to'fDuabus  alis  n^i^^^ 
^oelãbant  faciem  ejus  ,  & 
duabus  volabant.  Todos  os 
Anjos  vem  ,  6c  amão  a 
Deos,6c  quanto  mais  vem^ 
mais  amá05  6c  quanto  mais 
vem ,  &  mais  amáo,  mais 
alto,  ^  mais  eminente  lu* 
gar  tem  cada  hum  na  fua 
Gerarchia.  PoisfeosSe- 
A^aif        raíins 


I 

J 


B7^  Sermão  de 

rafínsfegundoefta  ordem,  Dcos;  porque  mais  fepre- 

aílim  como  tem  o  fupre-  zaò os  Serafins,  &  maisef- 

mo  lugar  na  fuprema  Ge-  timão  na  felicidade  fupre- 

rarchia,   aíTinifaõ  os  que  madofeu  efladoaíingula- 

maisvem,  &mais  amáo  a  ridadedoamor ,  q  a  pree- 

Deos,  como  fe  moílráraó  minenciadover.  PoriíFo, 

ao  Profeta  com  os  olhos  como  nota  S.  Dionyfio  A- 

cubertospara  naõ  ver,  &  reopagita,a  denominação 

lo  com  o  peito  aberto  para  do  entendimento,  queíao 

amarPParaamar  digo,  6c  osolhos  com  que  fe  vè  a 

para  mais  amar  j  porque  o  Deos,  a  deixarão  aosChe- 

movimento  das  azas  [naò  rubins,queeílãohumgráo 

fendo  para  voar  ,  porque  mais  abaixo  ,  &  tomáraó 

eftavão  firmes  )  mais  era  para  fy  a  antonomafia  do 

para  tolerar  o  incêndio  do  incendio,com  que  fe  abra- 


s 


amor,  como  dizem  huns 
S3nchcs  Interpretes ,  ou  para  mais 

Cornei.  í  _  '. 

bic.  oexcitar,&acender,como 
dizem  outros.  Pois  fe  tan- 
to amão,6c  tanto,  &:  tão  ar- 
dentemente eíláo  amado  j 
como  parece  que  api^gaó 


záo  no  amor  do  mefmo 
Deos ,  chamandofe  Sera- 
íins,quequer  dizer  os  ar- 
dentes. A  fegunda  razaó, 
&  muito  mais  alta,  he,  que 
fechaó  os   olhos,  quando 

^         -   -^ 1" 'o-^     abrem  o  peitOí porque  tem 

com  huas  azas  o  mefmo q     por  maior  fineza,  &  mais 
acendem  com  outras;  &     digna   do   mais    perfeito 

r.  ,_-  1        f 


como  negaó  ao  mefmo 
amor  a  viíta  do  objedlo 
amado.^ 

341  Duasrepoflas  tem 
eílabem  fundada  duvida. 
A  primeira,  que  cobriaó 
osolhos  para  não  ver,quã- 
do  abriaõ  o  peito  para 
amar,  fendo  o  objeítoda 
YÍfia,&doamor  o  mefmo 


amor  o  amar  fem  ver,  doq 
amar  vendo.  Heoq  enca- 
receo  S.  Pedro  nos  primei- 
ros ProfeíTores  do  Chri- 
ílianifmo,  dizendo,  que 
fem  ver  a  Deos  o  amavaó  .• 
^tem  chm  non  videritis  di* 
ligitis.  E  he  a  dilFerença  \.%!''' 
verdadeiramcntcScrafica, 
çomqueamao  na  terra  os 
bem- 


Nopi  Senhora  da  Graça.  ^73 

Bemaventurados  da  gra-     eflasduaspalavraSjnãodu 


çaj&  no  Ceoos  da  gloria. 
Os  da  gloria  amáoaDeos, 
masvendo-o:  os  da  graça 
também  o  amaó,  masfem 
o  ver. 

34.2  E  fe  eíla  ventagê 
tem  em  quanto  fomente 
amão  a  Deos,que  he  huma 
parte  da  graçajque  fera  em 
quanto  J^mão  a  DeoS5&  faó 
amados  de  Deos,  em  que 
coníiíletoda  ?  Eíla  reci- 
proca correfpondencia  de 
amor  entre  Deos,  &  o  ho- 
mem, queeftà  em  graça, 
declarou  a  Alma  dosCan- 


nai( 
enTU 


vidou  de  chamar  a  cada 
húa  delias  infolente  ,  &c  a 
ambas  infolentiílimas:  In- 
foLens  ver  bum ,  ò*  ego  iUi : 
nec  minus  infolens  dileãus  r>.^er~ 
meus  mihi :  nifi  quod  utro 
queifífolentius  utrumquefi'^^ 
mui.  Mas  a  Alma  que  ifto 
diíTe,  era  hua  Alma,  q  eíla- 
vaera  graça,  &  he  tanta  a 
alteza5aque  amefma  gra- 
ça levanta  a  Alma,  naó  fó 
em  quanto  ama ,  fenáo  em 
quanto  ama ,  &  juntamen- 
te he  amada  de  Deos ;  que 
o  que  podia  parecer  info 
lencia  da  parte  do  homem 


tares,  quando  diíle  :  'Z>/7<?- 
^  Bus  meus  mihi 'iò' ego  illi:     da  parte  de  Deos  he  jufta 
Deos  he  o  meu  amado,  &     condecendencia  ,  tratan- 


eufouaamadadeDeos.  E 
fendo  Deos  quem  he  por 
íiia  infinita  grandeza, &  fo- 
beranía:  &  fendo  o  home 
quem  he  (^  ou  que  naó  he  3 
por  fua  vileza,  &:  baixeza, 
emrefpeitodeDeos  tam- 
bém infinita ;  quem  have- 
rá que  naó  eílranhe,  &  fe 
aííbmbre defta  confiança, 
&;  igualdade  de  fallar :  iUe 


dofe  com  tal  familiaridade 
Deos  com  o  homem,  &  o 
homem  com  Deos,  como 
fe  foraó  iguaes  :  ^ajtex 
£quo  moremgererey&  repen- 
dere  vicem  ,  como  nota  o 
mefmo  S.Bernardo.  Com- 
paraime  agora  o  amar  a 
Deos  no  Ceo  por  razão  da 
vifta,  com  eííe  fer  amado 
de  Deos  na  terra  por  razão 


mihiy&  ego  tUi'.  Elle  o  meu  da  graça.  Os  Bemaventu- 

amado,&  eu  a  fua  amada  ?  rados  no  Ceo  diráó,  q  por- 

S,  Bernardo  comentando  que  vem  a  Deos,  amão  ne- , 

Tom. 7.  Aa  iij       ceíía- 


^4 


3/  + 

ceflariamente  a  Deos 
nos  diremos  na  terra,  que 
porque  eliamos  em  graça 
de  Deos  ,  fomos  amados 
neceíTariamente  de  Deos. 
Sobre  eíla  minha  propoli- 
çaó,  cabia  melhor  ainda  a 
cenÍLira  de  infolente,  fe- 
nâoforadeféjcomohe.  Se 
a  viíla  de  Deos  neceílita 
aosBêaventuradosa  amar 
aDeosjtambem  a  graça  ne- 
ceílita a  Deos  a  amar  ao 
homem.  A  viíla  neceílita 
aos  bêaventurados  a  amar 
a  DeoSjporque  não  podem 
deixarjnemceíTarde  amar 
a  Deos  vifto :  &  a  graça  ne- 
ceílita aDeos  a  amar  ao  ho- 
mem ,  porque  não  pôde 
Deos  deixar,nem  ceifar  de 
amar  ao  homem  ,  que  eílà 
em 


;raca. 


§.v. 


343 

tagem 


A 


Terceira  ra- 
zão, ou  ven- 
porque  prefcín- 
dindo  a  graça  da  gloria  (  q 
heofcacido  em  que  falhi- 
mos  J  fe  deve  antes  efco- 
Ihera  graça,  he,  porque  a 
graça  faz  ao  homem  íilho 


Sermão  de 

&  de  Deos,  a  gloria  herdeiro. 
Se  os  homens  conhecerão 
o  que  encerra  eíle  nome  fi- 
lho de  DeoSj&  como  a  gra- 
ça não  fó  nos  dà  o  nomejfe- 
não  o  fer  do  que  o  nome 
fignifica  ,  que  difFerente- 
mente  eílimariâo  em  fy,& 
reverenciarião  nos  outros 
efte  nafcimento  infinita- 
mente mais  que  Real!  Sc 
nafcer  de  Felippe  em  Hef- 
panhajOudeLuisem  Fra- 
ca ,  ou  de  Ferdmandoem 
Alemanha,fetemcom  ra- 
zão pela  maior  fortuna  j 
qual  fera  a  daquelles,  dos 
quaesfedizcom  verdade: 
Non  exfangumibíiSy  fed  ex  .^^ 
^eonatifunt^  Os  outros  i  «s-  • 
nafcimentos  eílimãofepe- 
lofangue,  o  dosíilhos  de 
Deos  por  não  fangue.  Mas 
a  caufa  de  os  homens  nam 
fazerê  deíle  altiíllmo  naf- 
cimento a  eílimação  que 
mercccjhejporque  naó  co- 
nhecem a  Deos.  Se  não  co- 
nhecem o  Pay  5  como  hão 
deeíHmarosíilhos.^  Aílini 
o  poaderou  com  profun- 
diílimo  peníiimento  o  E- 
vangeliftaS. Joaó  :  Vídete^]oi% 
qualcm  charitatem  dedit  no^  ^ '  • 


NojJ^ã  Scyih o ra  da  Graça.  Í7'S 

bis Tater^  utfilij  t>ei  nomi-     naó  diz  aíllm,  fenão  que  O 


nemítr^&Jtmus.Tropter  hoc 
mundus  710)1  novitnos^  quia 
nonno^vit  eiim.  Vede  o  que 
chegou  a  nos  dar  a  immen- 
fa  caridade  do  eterno  Pa- 
dre, hum  dom  táo  excel- 
lenteyíScrobre  humano,  & 
hum  foro  táo  chegado  a 
fua  própria  divindadcjque 
naó  fó  nos  chamemos  fi- 
lhos de  Deos^mas  que  ver- 
dadeiramente o  fejamos. 
E  fe  o  mundo  não  eftima 
como  devia  aos  que  fomos 
filhos  defte  Pay,he5porque 
o  não  conhece  a  elle: -Pr í>/- 
ter  hoc  mundus  non  novit 
nosyquia  non  novit  eum.Qo^ 
moíediííera  a  Águia  dos 
EvangeUftas  :  Eu  foudef- 
prezado,  porque  o  mundo 
conhece  o  Zebedeo  de 
quem  fou  filho  por  natu- 
reza,&não  me  eftima  co^ 
mo  devéra,porque  não  co- 
nhece a  Deos,de  quem  fou 
filho  por  graça. 

34.4.     Notai  o  que  diz, 
&  não  diz  S  Joaô.    Parece 


mudo  não  nos  eftima,por- 
que  não  conhece  a  Deos, 
de  quê  fomos  filhos :  Trop- 
ter  hoc  mundus  non  novit 
nos,  quia  non  novit  eum.  De 
íbrte,que  porque  o  munda 
nos  não  conhece  por  filhos* 
de  Deos,  fe  fegue  que  nani' 
conhece  a  Deos  ?  Sim.  E  a 
razão  he^  porque  prefume, 
&  faz  conceito  de  Deos,; 
não  como  de  Deos  j  fenáQí 
como  de  homem.  O  ho'-> 
mê  fóprefilha,  &  faz^her-^ 
deiro  ao  íervojquandõ  náo{ 
tem  filho  próprio.  Aílim;^ 
áií^Q  Abraham  a  Deos,que 
fuppofto  não  ter  filho/ería 
feu  herdeiro  Eliezer  íeu 
fervo  :  Ego  v adam  abf que 
liberis :  &  Eliezer  vernacu-.Pl''''^^; 
lus  meus yh ares  meus  erit.  E  ^  ^ 
depois  que  Deos  deoa  Ar^^ 
braham  hum  filho ,  que  foi:;- 
Ifaac,  difie  Sara  fua  mu- 
lher, que  lançaífe  fora  a  If- 
mael  filho  da  efcrava,pórc 


òi  t 


que  não  ha  via  de  fer  hér-ii' 
deiro  com  feu  filho .'  Ejice^ 
que  havia  de  dizer,  que  o     ancillam^ò' jilium  ejusy  nàn  ^l^f* 
mudo  não  nos  eftima,  por-     enim  erit  bares  fiítus  ancil^^ 
que  não  conhece  que  fo-     la  cum  filio  meo  Ifaac   Iftoí 
mos  filhos  de  Deos  :  mas    he  o  que  fazem  os  homês , 

(Aa  iiij         &o 


Roman 
8  i6. 


37^ 

&  o  mefmo  prefume 
cuida  de  Deos  quem  o  não 
conhece :  ^ma  non  noxtt 
eum.  Como  Deos  tem  íilho 
próprio  5  &  natural,  igual 
em  tudo  a  fy  mefmo, 8c  nòs 
os  homens  fomos  fervos, 
cuida  o  mundo  ignorante, 
que  naó  havia  de  fazer 
Deos  aos  fervos  herdeiros 
com  o  filho.  Mas  he  tanto 
pelo  contrario,  que  para 
que  os  fervos  foíTem  her- 
deiros com  o  filho  ,  fendo 
fervos  por  natureza,os  fez 
primeiro  filhos  por  graça. 
ExpreíTamente  S.  Paulo; 
Ipfe  enirn  fpirltiis  teftimo- 
niumreddit  fpirtttú  nojiroy 
quodfumusfilij  ^et.  Si  fu» 
temfilij^  é^haredes  :  h cre- 
des quidem  T^eiy  coháredes 
éLutem  Chriííi :  fitamen  cÔ- 
Jyatimuryiít  &  conglorifice- 

34^  Neíla  ultima  pa- 
lavra conglorificemur ,  &  na 
palavra  coháredes  declara 
o  Apoílolo ,  que  aílim  co- 
mo a  graça  nos  faz  filhos, 
afiim  a  gloria  nos  faz  her- 
deiros. Para  que  nòs  ago- 
ra vejamos  fe  nos  havemos 


Sermalde  \ 

&  ros,que  de  filhos ,  &  fe  ha- 
vemos de  eftimar  mais  a 
herança,  ou  o  naícimento. 
Cà  onde  os  Pays  faó  ho- 
mens, pôde  fuceder,&fu- 
ctáG  muitas  vezes  fer  o 
nafcimento  tão  baixo  ,  8c 
tão  vil,&  a  herança  tão  co- 
pioíaj&tão  rica,quc  fe  def- 
preze  o  nafcimento,  &  fe 
eftime a  herança;  mason» 
deoPayhe  Deos,  tão  infi- 
nito na  nobreza,  como  na 
eíTencia,  ainda  que  feja  a 
gloria  a  que  nos  faz  her- 
deiros, claro  eítà  que  fem- 
prc  havemos  de  eíhniar> 
naófó  maisjfenaó  infinita- 


mente mais  ,  a  graça,  que 
nos  faz  filhos.  Efie  foi  o  er- 
ro, &  o  acerco  daquelles 
dous  filhos  do  Pay,  que  re- 
prefentava  a  Deos  ,  hum 
louco,outrofezudo.  O  lou- 
co, que  era  oProdigOjem 
vidadoPay  pcdio  que  lhe 
dèfle  afua  herança,  por- 
que eílimava  mais  o  fer 
herdeiro,que  filho:  porem 
ofezudo,  que  era  o  irmão 
mais;velho,  deixoufe  ficar 
fempre  na  cafa  do  Pay  fem 
fallar,  nem  fe  lembrar  da 


de  prezar  mais  de  herdei-    herança,  porque  tanto  me* 

no^ 


Nojfa  Senhor  a 
nos  eftimava  a  herança, 
que  o  nafcimentOjComo  íe 
fora  fó  filho,&  naó  herdei- 
ro. E  ifto  he  o  que  deve  fa- 
zer todo  aquelkjque  com 
juizo  maduro  ,  &  inteiro 
comparar  a  graça,  &  a  glo- 
ria. 

§.    VI. 

1^4,6      A    Quarta  razão 
s' '       Jtlk,  deíla  preferé- 
cia  he  taò  fútil ,  &  bem  ar- 
guida como   feu  Author. 
Aquillo  he   melhor  (  diz 
Efcoto  }  cujo  oppofto  he 
peor :  o  oppofto  da  gloria, 
quecófifteem  vera  Deos, 
he  nao  ver  a  Deos :  o  oppo^ 
Ào  da  graça  ,  queconfifte 
em  amar  a  Deos  ,  he  na6 
amar  à  Deos  :  logo  me- 
lhor he  a  graça  ,  que  a  glo- 
ria ,  porque  peor  he  na6 
amar  a  Deos,  que  he  o  op- 
pofto da  graça  ,  que  naó 
ver  a  Deos,que  he  o  oppo- 
fto da  gloria.    E  que  feja 
peor  naò  amara  Deos,  que 
naó  ver  a  Deos ,  he  mani- 
íeftoj  porque  naó  querer 
ver  a  Deosynáo  fó  pôde  fer 
licito,  fenão  meritório ,  &c 
q^uerer  não  amar  a  Deos^c 


da  Gr  aça,  577 

não  fó  he  íêmprepeccado, 
&  graviílimo  peccado , 
masnãohe  poílivel  moti- 
vojquéofaça  tolera veljOu 
licito. 

547  No  Teft  a  meto  Ve- 
lho, &  Novo  temos  dous 
famofos    exemplos  defta 
Theologia  nos  dous  maio- 
res Heroes  da  caridade, 
Moyfes  &  Paulo. Determi- 
nado Deos  a  acabar  de  húã 
vez  com  o  Povo  de  Ifrael 
pela  idolatria  da  bezcrrói 
oppoz-fe  Moyfes  a  efta  de- 
terminação, que  Deos  lha 
revelara jdizendo:  Aut  di- 
mitte  eis  hanc  nexam ,  aut  gxocf, 
Jinonfacis -ideie  me  de  libro  P-^i^- 
tuoy  quemfcripjifti.  Ou  vos, 
Senhor,  haveis  de  perdoar 
ao  Povo  efte  peccado ,  ou 
fenaó  fazeis  o  que  vos  pe- 
ço,rifGaime  do  voífo  livro. 
Efte  livro,GomQ  confta  de 
muitos^ lugares  da  Efcritir- 
ra,heolivroem  que  efta6 
efcritos  os  que  faó  prede- 
ftinados  para  a  gloria.  Mas 
paremos  aqui,  &  vamos  a 
S.Paulo.    S.Paulo  decla- 
rando o  grande  ^ntímeii-^ 
to  que  tinha   de  ver  como' 
os  da  fua  nação  naôque- 
ria6 


37^  Sermão  de 

mó  crer  em  Chriílo ,  &  fe  vem  que  fe  embarcaó  para 

precipitaváo     obftinada-  eftas  partes,  ou  outras  po- 

mente  a  perpetua  conde-  voadas  de  Gentios,os  Mi- 

nação,  diz  que  por  elles  niftros  Evangélicos  ,  nani 

defejava  fazer  hum  tal  fa-  fe  podem  perruadir,fenaó 

crihciode  fy    mefmoa  queostraz,ouleva  aellas, 

l>»eos,que  Deos  o  privaífe  algum  motivo  de  intercf- 

eternamente  da  gloria,qiTe  fes  temporaes.  E  certo  que 

confifte  na  fua  viíla ,    com  para  desfazer  efte  eno-ano 

tantoquc  a  mefma  gloria,  bailava  a  cófideraçáorque 

de  que  elle  fe  privava,  a  fazia  hum  homem  muito 


ouveíTem  ç\\tB,  de  gozar 

crendo  em  Chriílo  Jfto  he 

o  quequerem  dizer  aquel- 

las  animofas  palavras :  Op-, 

tabam  ego    ipfe  anathema 

IT"'  €e  à  Chrtfto  pro  fratribus 

ç .,,.  meis^  quijunt  cognati  mei 

•  !■■  fecundum  caYnew.    E  aíllm 

entendem  eíleTexto,&:  o 


bem  entendido,  quando  fe 
embarcava  de  Roma  para 
os  defterros  do  Ponto  Eu- 
xino:  Vel  quo  fefiinas  irey 
velundey  -vide :  Olha  donde 
yàs,&  para  onde.  Eífesjcu- 
jos intentos  taó  groífeira- 
mente  julgais,  vede  donde 
vem,&  para  onde:  &  coii- 


de  Moyfes  S  Joaó  Chryfo-  fiderai '(  ainda  têmpora, 

ftomo,  Theofílado,  Ecu-  mente) o  que  làdeixão,& 

meniojRupertOjCaíIiano,  oquecàachaõ.  Mas  a  rarl 

Origenes,  S.Bernardo,  &  zaó   porq  avaliais  taó  bai- 

^ntre  Theologos,  &  Inter-  xamente  os  rifcos  dos  ma 


pretes  he  a  fentença  mais 
literal,&  comum. 

348  Antes  porém  que 
<perremos  efte  ponto  nam 
quero  paíFar  em  filencio 
hua  advertência  muito  ne- 
ceífaria  a  eíla  nolTa  terra. 
Os  que  fô  eftimaó  o  que  fe 


res,  as  incomodidades  das 
terras,  &  a  ellranheza  dos 
climas  a  que  expõem  ávi- 
da, he,porque  não  conhe- 
ceis como  elles  o  valor  das 
almas.  Parecevos  que  fa- 
zia bem  Moyfes,&  que  fa- 
zia bem  S.  Paulo  cm  que- 


vècomos  olhos j  quando    rerem  trocar  a  gloria,  & 

bem 


NojJ^a  Senhora  daGraça.  579 

béaventurãça  do  Ceo  pela     de  Deos  pelo  amor  do  pro- 


falvaçáodas  almas  de  feus 
próximos  ?  Náo  creojq  íeja 
táo  rude  a  voíTa  fé,  que  di- 
gais que  faziáo  mal.  Pois 
muito  menos  he  trocar 
Portugal,  que  o  Ceo,  6c 
querer  falvar  as  almas  pro- 
priasj&  mais  as  alheas,  que 
levar  a  vera  Deos  as  alheas 
à  cufta  de  o  naõ  ver  por  to- 
da a  eternidade.  E  ifto  he- 
o  que  fazia  não  fó  depois 
de  Chrifto  S.  Padlo,fenam; 
antes  de  Ghrifto  Moy fes. 

34.9  Agora  pergunto: 
Eíles  dous  homens  taó  va* 
lentes,&:  táo  deliberados^ 
que  aílim  fe  refolviaó  a 
náo  ver  a  DéoSrfuppunhaô 
também  com  o  impet05& 
fervor  da  mefma  refolu^ 
çáo,  que  o  naõ  haviaó  de 
amar  ^  Abfit :  De  nenhu  m 
Eiodo.  Porque aíHm  como 
por  hum  motivo  tão  pio, & 
de  tanta  caridade  feria  ac- 
ção naó  fó  licita  ,  mas  he- 
róica oíFereceríe  a  naõ  ver 
a  Deos  ,aíllm  feria  não  íô 
iiiicita,  mas  Ímpia  querer- 
fe  expor  ao  não  amar.  An- 
tes he  certo  ,  que  quanto 
mais  renuaciavão  a  vifta 


XI mo  ,  tanto  mais  fortes 
raizes  lança  vão  no  amor 
do  mefmo    Deos.    Ouça- 
mos a  eloquência  deChry- 
foftomo  arguindo     nefte 
cafo  a  S.  Paulo :  ^uid  aisy  „ 
^aule-i   nonne  jam  ãixijU\  835. 
§luis  nos  feparabit  à  charu 
t ate Chrifit> Ehtm  Paulo, 
naófoisvòs  aquelle  quejà 
diíTeftes ,  que  nenhúa  cou- 
fa  vos   fe  pararia  do  âmoÊ 
deChrifloi'Náo  fois  aquel-^ 
leque  quereis,  que  a  voíía 
almafe  defataíTe  do  voífo 
corpo,  para  eítar  fempre 
Gomelle.'^  Pois  como  ago^ 
ra  quereis  carecer  de  o  go» 
zar,&:verpor  toda  a  eter- 
nidade }   Antes   por  iílb 
mefmo,refponde  em  nome 
de  S.Paulo  o  mefrpoChry- 
íbíícMnoV  Porqiíe]  eu  amo 
muito  a  C hrifto  ,  por  iílb 
me  quero  privar  deo  ver^ 
&  gozar,  para  queemlu-. 
gar  de  mim ,  que  fou  hum^ 
fói,o  vejaòy  ac  gozem  vmm 
tos,  Scfegundo  o/^meude4 
íèjo,o  amem^&  louvem  to^ 
dos  :   hnh  cmia  amoChri-i 
ftum^  cupio  fifarari  á  frui< 
tione  Chrífiiy  Mt^lur.eSy  imo 

onh 


380  Sermão  de 
omneseum  amento  &  law  Ceo,  fenáo  também quc- 
dent,  E  quanto  foíTe  agra-  rer  antes  padecer  as  penas 
davel  a  Deos  efte  exceíTo  do  Inferno.  Ifto  não  per- 
de caridade  ,  aílim  em  S.  tendeo  Moyfes,  né  S.  Pau- 
Paulo,comoem  Moyfes,  Jo,mashereroluçáo  famo- 
poílo  que  a  nenhum  delJes  fadeS.Anfelmo,  &àqual 
aceitou  o  ofFerecimento ,  no  meímocafo  eftà  obri- 
íe  vio  bem  nas  mercês  com  gado  todo  o  Chriíláo :  Si 
que  depois  honrou  a  hum ,  htnc  feccatiptidorem^  ò'  il- 
&a  outro:  fazendo  geral-  Imccernereminferni  horro- 
mente,  &  para  com  todos  remy&  neceffarto  uniillorú 
tal  difí^erença  entre  a  fua  haberêimmergi^prmsmem 
graça,&  a  fua  gloria  j  que  a  inferna  immergtrem ,  quàm 
quem^  naó  quer  a  fua  gra-  peccatum  in  me  aamittercm. 


An  fel. 
Hb.  de 
-'■imilin 
cap  1^0. 


ça,caftiga-o  com  oprivar 
da  gloria,  &  a  quem  por  fe- 
melhante  motivo  náo  qui- 
zer  a  fua  gloria,  premia- o 
com  lhe  aumentar  a  graça. 


í.  VIL 


35-0 


MUi  dilatada 
coufa  feria , 
fe  ouvefíemos  de  ponderar 
comoatègoraas  outras  ra- 
zoens  deíía  differéça  ;  mas 
porque naòhe  bem  ,  que 
totalmente  fiquem  em  li- 
lencio ,  de  corrida  as  irei 


Se  de  húa  parte,diz  Anfel 
mojfe  me  puzeíTeo  pec- 
cado,&  da  outra  o  Inferno 
com  todo  o  feu  horror:  & 
me  foíTe  neceíTario  efco- 
Iherhumdosdous  ,  antes 
me  havia  de  lançar  logo  no 
Inferno,  que  admitir  em 
mim  o  peccado.  Mais:  E  fe 
folie  poílivel  (^como  de  po- 
tencia abfolura  não  repug- 
na 3  ver  hum  home  a  Deos 
no  Ceo  eftando  em  pecca 
do :  qual  feria  no  tal  caio 
maisditoíò,  eíle  homem, 
ou  Anfelmo?Náo  hadu- 


Salar 
Tsner. 

Ov.eJ. 
Aniajj. 


apontando.  Seja  a  quinta,  vida,queAnfelmo.Porque 
que  por  confervar  a  graça  Anlclmo  no  Inferno  con- 
náo  fò  he  licito  ,  ôc  louva-  fervava  agraça,ainda  que 
vel  renunciar  a  gloria  do    padecia  as  penas  dos  con- 

dcnados. 


Noifa  Senhora  da  Graça.  ^'Sl;. 

denados, &:o outro  no  Ceo    graça,  nao  fó  mora  Deos 


poíloque  via  a  Deos,  em 
que  confiíle  a  gloria  dos 
Bemavêturados,  naó  cita- 
va em  graça. 

3fi  Maisaindaj&naó 
fuppondo  cafos  extraordi- 
nários, fenaó  o  que  de  fa- 
£to  eílá  fempre  obrando 
Deos  no  Ceo ,  &  na  terra. 
No  Ceo  fempre  Deos  eílà; 
comunicando  a  fua  viíta, 
aos  que  depois  da  morte 
íaó  dignos  da  gloria;  &  na 
terra  fempre  eííà  comuni- 
cando a  fua  graça  aos  vi- 
vos ,  que  fe  difpoem  para 
ella.  E  porque  modo  ,  ou 
com  que  diíferença  de  au- 
thoridade3&  honra  comu- 
nica Deos  a  huns,  &  outros 
a  fua  viíla,  &  a  fua  graça  ^ 
Bemditafeja  a  divina  Bó- 
dadejuuncanas  demoílra- 
çoens  mais  divina  í  Aquel- 
íesa  quem  comunica  a  fua 
gloria,  leva-os  ao  Ceo ,  & 
dalhes  lugar  na  fua  Corte : 
porém  aquelles  a  quem  co- 
munica a  fua  graça  ,  vem 
elleem  peílbaadarlha,  & 
fallos  morada  fua.  Se  hi- 
mos  ao  Ceo,moramos  com 
Deos,  masfe  eítamos  em 


comnofco^,  fenaò  em  nòs. 
E  para  que  em  nada  feja 
menor  eíla  aíHftencia  pef- 
foal  de  Deos  em  nòsjque  a 
vifta  do  mefmo  Deos  nos 
queeftaó  na  gloria  j  con- 
cordaó  os  Theologos,  que 
para  fer  verdadeiramente 
bemaventurado  o  que  vè  a 
Deos,  não  baila  fó  ver  ao 
Padre,  ou  ao  Filho,  ou  ao 
Efpirito  Santo  j  mas  he  ne- 
ceíTario  ver  todas    as  três 
PeíToas  divinas  5  porque  fó 
deílemodo  he  vera  Deos 
como  elle  he :  Tunc  'videbí-  ,  joan. 
museumficutieft.  Pois  af-  í-^. 
íim  como  no  Ceo  osBem^ 
aventurados  da  viíla ,  nam 
fóvêhúa  peílba  da  Trin- 
dade, íènaó  todas  tresj  af- 
fim  na  terra  os  Bemaven- 
turados  da   graça  naó  fó 
tem  dentro  em  fy  o  Padre, 
ou  o  FilhojOu  Efpirito  Sã- 
to,  fenaó  todo  Deos  trino , 
&  hú  em  todas  as  peíToas. 
E  ifto  com  tanta  diíferen- 
ça,&  ventagem,quanta  vai 
deobjeílo  a  morador.  He 
texto  expreíFo  do  mefma- 
Chrifto:  Siquisdilmt  me^  J^^^^* 
JermonemmeumJervamh& 
'  ãd. 


3^  .-  Sermão  de 

ài  eum  njéhiemus^ ér  ma^ijío-    diamfuam  magvam  regcne- 

nem  apiid  ip[um  faciemus.      ravit  nos  in  harcdítatcm  m- 


I.  Pctri 
1.3.4. 


Slui  diligit  me,cis  ahi  a  gra- 
ça :  Et  ad  eum  veniemus , 
eis  ahi  as  três  peíToas  divi- 
nas :  Et  manjionem  apudip- 
fumfaciemusy  eis  ahi  a  mo- 
rada perpetua  5  &  aíTiften- 
cia  permanente. 

35 2  Mais  outra  vezj 
poílo  que  depois  do  que 
acabamos  de  dizer,  pareça 
que  não  pode  haver  mais. 
E  a  razaó  deíla  nova  diffc- 
rença,  ou  ventagem  he: 
que  a  gloria  que  havemos 
de  gozar  no  Ceo  pela  vi- 
íla,  já  apoíTuimos  na  terra 
pela  graça.  Efcrevendo  o 
ApoftoIoS.  Pedro  aos  no- 
vos Chriílãos  do  Ponto, 
Galacia,  Capadócia,  Afia, 
&  Bithinia  ,  aonde  fendo 
Summo  Pontiíice,&  Vigá- 
rio de  Chrifto,  tinha  ido 
pregara  Fè[  para  que  ve- 
jais outra  vez,  qúam  alto 
miniílerio  he  o  da  conver- 
íaó  dos  Gentios,  taó  pouco 
conhecido  da  gente  rude} 
diz  eftas  notáveis  pala- 
vras :  BenedíãíisT>eus  Ta^ 
ter  domint  noftrí  Icfu  Chri- 


corriiptibilem^  Ò'  inconta' 
minatãy  é^  immarcejcibilê^ 
confervatam  in  Cífiis  in  lo- 
bis.  Quer  dizer  :  Bem  dito 
feja  Deos,Pay  de  noíTo  Se- 
nhor Jefu  Chri  ílo  ,  o  qual 
pela  graça  do  bautifmo 
nos  gerou  fegunda  vez  pa- 
ra a  gloria  incorruptivel, 
&perpetua,que  eílà  guar- 
dada no  Ceo,  &  em  nòs. 
Neflasduas  ultimas  pala* 
vras,no  Ceo,&em  nos,  />i 
C  alisto-  in  i;í?^/i-,e  íià  o  rna- 
ravilhofo  deíla  fentença. 
Que  a  gloria  eíleja  guar- 
dada no  Ceo ,  bem  fe  enre- 
de 3  porque  o  Ceo  heo  lu- 
gar da  gloria, 8c  no  Ceo  he 
que  a  havemos  de  gozar 5 
masfeaquelles  com  quem 
fallava  S.Pedro  eílavaó  na 
terra,  como  nòs  eílamos; 
porque  lhe  diz  que  eíía 
mefma  gloria  não  fó  eílà 
guardada  no  Ceo,  fenam 
nelles  mefmos,  &  em  nòs : 
Ser-vatam  in  C^lis^ò'  in  uo^ 
bis^  Porque  acabava  de 
lhes  lembrar,  que  eílavaó 
gerados  fegunda  vez  pela 
fiiyquifecundtim  mifericor-    gradado  bautifmo,  como 

nò$ 


KoJTa  Senhora 
nos  eftamos:  &  eíla  mefma 
gloria  ,  que  depois  have- 
mos de  gozar  no  Ceo  pela 
viíla,jà agora  apoílliimos 
na  terra  pela  graça.  De  for- 
te, que  o  Chriílão  que  eftà 
em  graça,  quando  vai  ao 
Ceo,  naó  fó  leva  o  direito 
•para  a  gloria  comíigo,  íe- 
não  a  poíTe  da  mefma  glo- 
ria em  fy.  Por  iífo  não  diz, 
qeftà  guardada  para  nòs, 
fenãoemnòs,  mC^Us,  & 
invohis.  Veja  agora  cada 
humfeefcolheria  antes  a 
poíTe  do  bem,ou  prefente , 
ou  futura,ou  dentro  em  fy, 
ou  fora. 


§.  viir. 


3f3 


M  Ais  ainda. Diz 
S  JoaÓ  Chry- 
foftomo  ,  que  alíim  como 
não  havemos  de  temer  o 
Inferno  por  horror  das  pe- 
hasjfenãopor  ter  ofFendi- 
doaDeos,&  perdido  fua 
graça :  aílim  naó  havemos 
dedefejar  o  Cep,  princi- 
palmente por  amor  da  glo^ 
ria  ,  fenão  por  gozar  da 
mefma  graça,  éc  amar  ao 
mefmQDeos  eternaméte; 


da  Graça.  ^  g-^ 

Utgehennãm  timere  nonde- 
bemus  propter  ignem  ^Jed  ç;^ 
■  qtáa  offèndimus  tam  bonum  íoft-ho- 
'  Tíominum^  &  ah  íllrnsgra-  Tx^qI}' 
tiafiimus  alieni  :  ita  adreg-  "^^• 
numnobis  fejiinandú  prop- 
ter amarem  in  iUum ,  út  ejus 
gratiafntamur.  De  manei- 
ra que  o  ámor,&  defejo  bê 
ordenado  da  gloria,naò  ha 
de  fer  por  amor  da  gloria , 
fenão  por  amor  da  graça. 
He  erro  em  q  cahio  Moy- 
íç:s^  mas  de  que  logo  fç 
emendou  no  mefmo  aóbo 
com  admirável   retradta- 
çaó  de  palavras.    Tinha 
Deos  dito  a  Moyfes ,  que 
eílava  em  fua  graça  .•  Inve-  exoí 
nifU gr at iam  coram  me,  E^>*^° 
fobre   eíla  fuppolição  de  '^" 
eftaremfua  graça  ,  inílou 
Moyfes  dizendo  :   Si  ergo 
invenigratiam  in  confpeêlu 
tiio  ,  oft^nde  mihi  facien% 
tuam^utfciam  í/,  &  inve- 
niam  gratiam  ante   óculos 
tuos.  Pois  Senhor,  fe  jà  ef- 
tou  em  voíTa  graça,  conce- 
deime  a  viíla  de  voffo  ro- 
íl:õ,paraque  efteja  emvof- 
fa  graça.Quem  haverà,que 
não  veja,6c  note  neftas  pa- 
lavras   como  Moyfes  no 


^84^  Sermão  de 

mefmo  a£to  de  as  pronun-  jo  querer  a  graça  para  go- 
zar a  gloria  >  muito  melhor 
derejojSc  muito  mais  alto 
penfamento  he  defejar  a 


ciar  trocoua  ordem  com 
que  as  começou  a  dizer,  & 
com  que  acabou.  Quando 


começou,  ordenou  a  graça  gloriajpor  fegurara  graça, 

de  Deo1^  para   a  vifta  de  O  primeiro  fez  Moyfes  c6 

Deos :  Si  invenigratiam  in  menos  coníideraçáo ,  quã- 

confpecfu  tiio^  oftende  mihi  ^  do  diíle :  Si  invcntgratiain 


faciem  tuaín-,  &cquádo  aea 
boujordenou  á  meíma  vi- 
ílade  Deos,  para  a  mefma 
graça  de  Deos :  Oftende  mi' 
hi faciem  tmm^  ut  invenia 
gratiam  ante  qcuIos  tuos. 
Pois  a  mefma:  graça  nas 
primeiras  palavras  he  me- 
yo  para  alcançar  aviíla  de 
Deosj&logoa  mefma  vi- 
fta de  Deos  nas  fegunda^ 
paIav.rasliemeyo  para  ai* 
caçar  a  mefrmâ  graça  ?  Sim: 
porque  aílim.  emendou 
Moyfes,&:  melhorou  o  feu 
defejo.  Ordenar-  a  graça 
para  a  glòriajôc  fazer  a  glo- 
ria fim  da  graçajbom  defe*- 
jo  hej  mas  ordenar  a  gloria 
para  a  graça, 6c  fazer  a  gr.ar 
^a  fim  da  gloria  ,  I;e  muito 


in confpeãu  tiio^osfende  mi- 
hi faciem  tuam :  6c  o  fegun- 
do  com  muito  mais  fino,ôc 
prudente  juizo  ,  dizendo.* 
Oftende  mihi  faciem  tuam^ 
ut  inveniam  gràtiam  ante 
óculos  tuos. 

3  f4,  Finalmente,feja  a 
ultima  razaó  de  efcolher 
antes  a  graça,  que  a  gloria, 
a  eíleril idade  da  mefma 
gloria,  6r  a  fecundidade  da 
mefma  graça  A  gloria  no 
Ceo  he  liúa  felicidadegrá- 
<ie,mas  felicidadcque  não 
crece,  porque  hiia gloria 
náx)  cauia  outra  gloria^  po- 
rém a  graça  na  terra  he  hu- 
■ma  felicidade  jou  húabé- 
avcnturança ,  que  femprc 
crece,  porque fempre  húa 


melhor  defeJD>   Porque  ■?     graça  ellà produzindo  ou- 
Porque  a  graça  antes   da     tra  graça.  Depois  que  o  E 


gloria  eftà  perigofa ,  6c  der 
pois  da  gloria  cílà  fegura. 
E  poílo  que  he  bom  deíe- 


vangelilia  S.João  declarou 

a  gloria  de  Chriílo  pela  fu- 

pcrabundácia  de  graça  de 

q^up 


cann 
.14. 


Noffa  Senhor 
quôeílavacheo  :  P^idimus 
gloriam  ejus  quafi  unigeniti 
àTatre^pknum gratiíS ,  & 
veritatis^  áit  que  defta  en- 
chente, coíiio  de  fonte  pe- 
renne  recebemos  todos   a 
graça,  &  não  húa  *fó  graça , 
íenáo  húa  fobre  outra  íem- 
premais,&mais  :  qiieiílb 
quer  dizer  '.^eplenitudim 
ejíis  omnes  accipimns  gra^ 
^^çjiampro  gratia.    Onde  fe 
deve  muito  notar,  que  tê- 
do  fallado  na  gloria,&  gra- 
ça de  Chrifto  jfóda  graça 
diz,  que  recebemos  graça 
por  graça  ,  &  graça  fobre 
graça,6cda  gloria  nãojpor- 
que  noCeonaõ  dáDeos 
gloria  por  gloria,ou  huma 
gloria  fobre  outra.     Efte 
privilegio,  &  efta  preroga- 
tiva  he   fô   da  graça.    £ 
quamfuperior  feja  porií^ 
fo  mefmo  à  gloria  do  Ceo, 
cm  nenhum  outro  dos  que 
muito  crecéraó  na  graçajO 
podemos  ver  melhor,  que 
no  mefmo  S.  Joaó,  Vio  S. 
)ca-  Joaó  no  feu  Apocalypfe  a 
^4«7Deos  aífentadoem  trono 
de  Mageílade,  &que  o  af- 
fiftiaóem  roda  do  trono 
quatro  animaes  myíterio* 
Tom.;. 


'ã  da  Graça.  3  8  f 

fos  todos  cheos  de  olhos,  o 
primeiro     femelhante    a 
Leão,  o  fegúdo  a  Bezerro  , 
o  terceiro  a  Homem  ,  o 
quarcoa  Águia.  Ninguent 
ignora  que    neftes  quatro 
animaes  eraó  reprefcnta- 
dos  os  quatro  Evangeli- 
ítas,S. Marcos  noLeáo,S. 
Lucas  no  Bezerro,  S.  Ma- 
theus  no  Homem,  S.  Joa6 
na  Águia  >  &  todos  cheos 
de  oVciQS^mte^iò'  retroy  por  - 
que  todos  na  parte  poíle- 
Tior  tinhaô  as  noticias  da 
divindade,  &  na  anterior 
as  da  humanidade  deChrí- 
fto,  de  quem  efcrevéraõ. 
Vindo  pois  a  S-Joaôídalhc 
o  Texto  o  quarto  lugar, & 
dizquefóeile  voava  :  Eú 
quarttifn  animalfimtle  aquí^ 
líevolanti.   FoisfeS.  Joaó 
entre  todos  os   Evangeli- 
ílas  foi  o  que  mais  altamé- 
teefcreveo,  porque  fe  lhe 
dà  o  ultimo  lugar  •  Ôc  fe  to- 
dos os  outros  animaes  ti- 
nhaô azas  i  porque  fe  áiz , 
que  fó  elle  voava .?  Primei- 
ramente dáfe  a  S.  Joaó  a 
ultimo  lugar ,  porque  eíle 
efcreveo  depois  dos  ou- 
tros Evangelizas ,  ac  não 
Hb        me-» 


i 


Sermão  de 
annos 


W^ 


§.  IX. 


ss 


ATèqui  temos 
vido  as  ra» 
zoens  porque  comparada 
a  gloria  com  a  graça,  íe  de- 


38^ 

menos  qiic  trinta 
depois  ,  havendo  outros 
tantos  que  S.  Matheus,  S. 
MarcoSjSc  S.  Lucas  eraó  jà 
morros.  Mas  daqui  mefmo 
fe  acrecenta  mais  a  fegun- 

daduvida  •  porque  fe  os     „^ o-  3  - 

outros  três  Evangelizas  veefcolher  antes  a  graça, 
eííaváo  jà  no  Ceo  vendo  que  a  gloria.  E  fe  alguém 
a  Deos,  como  voava  ellefó  cuidar,  que  naó  falíamos 
eílandona  terra  >  PoriíTo  atègora  no  que  principal- 
mefmo.  Porque  os  outros  mente  devíamos  fallar  , 
eflavão  gozando  na  gloria,,  quehea  Virgem  Senhora 
dóde  fenão  fobe,  &  b.Joaó  nofla  da  Graça  ,  cuja  feíla 
eftava  merecendo  na  gra-  celebramos  •,  digo,qo  que 
ça,onde  fempre  ^c  crece.  atègora diíTe,  aflim  coma 
Eu  vos  prometo  ,  diz  S.  foraóprerogativas  dagra- 
Bernardo,qfeDeos  défie  ça,aílimforaòexccllencias 
licença  aos  Bemaventura-     da  Senhora   debaixo    do 

mefmotitulo.  S.  Thomás 
com  feu  Mellre  Alberto 
Magno  diftinguem  na  gra- 
ça Al  Virgem  Maria  três 

^,,^       ^^,...... eltadosdeperfeiçáoiopri- 

gloria,pai  a  depois  voarem  meirodcfde  o  principio  de 
à  mefma  gloria  mais  cheos  fua  Conceição,  a  que  cha- 
degraça;  logofeaefcolha  mão  de  fuíliciencia  :  o  fe- 
fefarianoCeOjOndcrcnaó  guadodefdc  o  pontoem 
pôde  fazer,  porque  fcnao  que  conccbeo  o  Verbo 
fará  na  terra  ? Em  S.  Joa6  eterno,  a  que  chamaó  de 
naó  foi  clciçaô  fua  :  mas  he  abundância:  o  terceiro  por 
certo, que ellc  foi  o  mais  todo  o  tempo  da  vida  atè 
amado,  &  quando  os  me-  a  morte,  a  que  chamáodc 
nos  amados  viao,  cllc  voa-  exccUciicia  fingular.  Por 
va.  to- 


dos, que  o  eíláo  vendo  no 
Cco,para  virem  à  terra  a 
merecer,Sccrecer  a  maior 
graça,que  todos  aceitariaó 
eíle  partido  deixando  a 


Noffa  Senho  i 
todas  as  Vazoens  pois  que 
referimos ,  muito  melhor, 
&mais  altamente  enten- 
didas, comparandofe  a  Se- 
jihora  comfigo  mefma,  co- 
mo aquella  lingulariílima 
alma,  que  fobre  todas  as 
criaturas  amou,&  foi  ama- 
da de  Deos,  também  nam 
pode  deixar  de  eftimar 
mais  a  graça,  que  a  gloria , 
pois  no  mefmo  amor  reci- 
proco coníifte  a  graça.  Eí^ 
timou  mais  a  graça,  que  a 
gloria,  não  por  aíTegurar 
no  Ceo  a  mefma  graça,em 
que  fora  confirmada  defdc 
o  inítante  de  fua  Concei- 
ção ,  mas  por  aumentar 
mais,  &  mais  o  amor ,  que 
là  fe  iguala  com  a  vifta  por 
toda  a  eternidade.  Bata- 
lhava no  coração  daMáy 
deDeos  o  mefmo  amor,por 
húa  parte  com  odefejo  de 
mais  depreíTa  o  ver,  &  por 
outra  com  a  razaó  de  mais 
oamar  eternamente  ,  & 
porque  eíle  motivo  foi  o 
vencedor  ,  poriílbefco- 
Iheo  como  melhor  parte  a 
da  graça:  Maria  optimam 
j.<artemelegit. 
I  j6  Naquellaspalavras> 


'  a  da  Gr  aça.  387 

Indica  mihiyfiení  diligít^^l 
anima  mea^  ubi  pafcas ,  ubi 
cubes  in  meridie  :  manife- 
fíou  o  amor    da  Senhora 
quáto  defejava  ver  a  Deos 
no  meyo  dia  da  gloria :  &  a 
repoftafoi,  q  mais  convi* 
nha  porenta6,quena  au* 
fcncia  de  feu  Filho  fícaífe 
apafcentando  o  feu  reba- 
nho: Abifoft  'veftigiagre-^^-^A,^ 
gum  tuorum&pafce  hados 
tuosjuxta  tabernuctíla  pa- 
fórum.  Aílim  o  fez  a  Sc* 
nhora,  fendo  dalli  por  di- 
ante o  oráculo  de  toda  a 
Igreja,  &:  Meftra  dosmef- 
mos  Apoftoios,  naõfó  em 
Jerufaiem,&  na  Judéa,mas 
peregrinando  a  outras  par- 
tes do  mundo.  Durou,  nao 
digo  eíle  defterro  da  glo- 
ria, mas  efta  aufencia  de 
feu  Filho,  não  menos  que 
vinte  &  quatro  annos  de- 
pois que  elle  tinha  fubido 
ao  Ceojcomo  prova  oCar- 
deal   Baronio  ,    fundado 
no  teftemunho  irrefraga- 
velde  S.  Dionyfio  Areo- 
pagita :  até  que  finalmen- 
te em  tal  dia  j  como  hoje, 
foi  chamada  a  bemditiíli- 
ma  JMãy  a  receber  da  mão 
_Bbij         de 


A^S 


Sermão  de 


Cant 
4.8. 


\im 


defeuFilho  5  &  gozar  por 
toda  a  eternidade  a  coroa 
immenfada  gloria,  que  ti- 
nha merecido  a  fua  graça. 
JE  digo  que  foi  chamada-, 
porque  aílim  o  declaraõas 
vozes  de  toda  a  Santiílima 
Trindadejnão  em  comum, 
masdiílintamente  repeti- 
das  por  cada  hua  das  divi- 
nas PeíToas  :   Vtnt  jfonfa 
mea^vemcie  Libano^vemco- 
ronaberis,  O  Padre  diíTcj 
/^w/,' chamado- a  como  Fi- 
IhajO  Filho  diírej^;2ijcha- 
mandoa  como  MãyjO  Ef- 
pirico   Santo   diíie>^//j 
chamando-a  comoEfpofa. 
Mas  fe  toda  a  Santiílima 
TrindadCí&cadahCia  das 
divinas  Peílbas  poríy,  & 
portão  particulares  moti* 
vosdeíejava  vera  Virgem 
Mariano  trono  da  gloria , 
c^nde  também  como  Filha 
viíle  o  Padre,  como  Mãy  o 
Filho,  &  como  Eípofa  o 
EfpiritoSanto:  Sca  mefma 
Senhora fufpirava  por  eíle 
dia  com  tão  ardentes  defe- 
jos,  &:  violentiílimas  fau- 
dadesjquc  cilas,  ôc  o  amor 
lhe  romperão  os  laços  da 
yida,&:  lhe  delatarão  a  al- 


ma j  como  as  mefmasPer- 
íbas  divinas  ,  que  podem 
quãto querem,  não  íóper- 
mittírao  ,  mas  quizeraó, 
queamefma  Alma  fantif- 
fimacontinuaíTeneíle  mu- 
do privada  do  Ceo,  &  da 
gloria  ,  &  padeceíTe  feu 
amor  efte  largo  martyrio 
por  tantos  annos  ?  Aqui 
vereis,  quam  verdadeira 
hc  a  doutrina  de  todo  o 
no ílb  difcurfo,  &  a*  razoes 
delle.  AíTentou  no  Confi- 
ílorioda  Santiílima  Trin- 
dade o  Padre,que  a  fua  Fi- 
lha,o  Filho,que  a  íua  Mãy, 
^o  Efpirito  Santo,  que  a 
ília  Efpoíli  íe  lhe  dilataíle  a 
vidadeDcos,  6c  a  gloria 
por  cfpaço  de  vinte  6c  qua- 
tro annos,  para  que  em  to- 
do eíle  tempo  mereceíTe 
m ai Sí  6c  m ais, &  creceíTena 
graça  •,  porque  computa- 
dos tantos  annos  de  gloria 
com  outros  tantos  de  gra- 
ça, não  fó  por  eleição  da 
mefma  Senhora,  fenaó  por 
decreto  de  todas  as  Peílbas 
divinas  lhe  convinha,  ^ 
importava  mais  o  crecer 
na  graça, que  o  gozar  a  glo- 
ria. Vt  c  HW  H  lar  es  merita^ 
ejus 


Pct.  Da- 

miau. 

'cimda 

A(>i"ipr. 

Vug. 


Noffa  Senhora  da  Graça,  5  89 

ejus  ajjítmptionem  ad  glo-     Santos  dizem  o  mefmo  c5 


riam  tamdiu  dtjtuhfii ,- 
S.Pedro  Damiaó. 

í.  X. 


1^  K  As  quem  po« 


diz  termos  naó  de  menor  ex- 
preílaó,masde  mais  pro- 
funda intelligencia  ,  que 
por  iílb  naó  repico.  Só  qui- 
zera,  que  todos  os  que  me 
ouvis  foífeis  Theologos , 
para  a  demoílraçaò  dos 
aumentos  de  graça,  a  que  a 
Senhora  creceo  neíles  últi- 
mos annos  de  fua  ia  n  ti  fil- 
ma vida.   Procurarei  po- 


'  "dera  declarar 
quaes  foraó  os  aumentos 
de  graça  com  que  a  Virgê 
Maria  (^  em  todo  efl:e  tem- 
po mais  propriamente  Se- 
nhora da  Graça  ^  acumu-  rèm  de  os  reduzir  às  regras 
lou,  húa  íbbre  outra  ,  as     de  outra  ciência  mais  vul- 


immeníidades  da  fua  .?  S. 
Epiphanio  diífe :  Gratia 
Saneie  Vir gtnis  eft  immen^ 
Dm.  dcT^  •  S.Boaventura :  /^w^»- 


gar5&  maispra£l:ica5pela 
qual  jà  que  nenhum  enten- 
dimento humano  pode 
comprender  efta  immen- 


.audib.  pi  certefuit  gratia  qua  iffa  fi dade^  ao  m  enos  de  ai gu  m 

^om^.  fiiit plena \  Sc  S.  Aníehno;  modo  a   poílamos   todos 

ui?^'  ^^damplííís  dicere  pofiíl) 

íap  f .    T>omina^  immsnfitatè  quip* 

\f^^'pegrati£y  &gloriíe^  érjeli-  le  modo  de  conta,  que  vul 

:ellenr. 
^P3- 


conjedurar. 
358  Todos fabeis  aquel- 


citatis  tii£  confiãerare  inci' 
fienti  &  fenfus  deficit ,  ò" 
linguafatifcit.  Eltes  San- 
tos com  palavras  claras,  & 
expreffas  apregoaó  por 
immenfa  a  graça  da  Virgê 
Maria  .'ÔcS.  JoaóDamaf- 
ceno,  S  Jeronymo^  S.  E- 
frem,  S.Bernardo,  S  Jgna- 
cio  MartyrjS.Pedro  V  ero- 
nenfe  ,  &  /^uaíl  todos  os 
Tom.  7. 


garmentefe  chama  ao  ga- 
larim,  em  que  tudo  oque 
fepoíTue  ,  &  precede  em 
hum  numero,  fe  dobra  no 
feguinte.  Suppondo  pois 
cò  a  mais  aíTentada  Theo- 
logia  C  em  que  ella  naó  eí lá 
pouco  obrigada  ao  doun  í-  .suar.    * 
limo  Soares  de  nolfa  Com-  tom. 2: 
panhia '}   que  os  ados  do  aiip^íg. 
amoriôc  caridade  da  Virgé '^^^-^i 
Bb  iij  fan- 


•■ 


mm 


390  Sermão  de 

fanciíllma,  os  quaes  todos  quinhentos  8c  doze*  no  de- 
cr:ió  perfeitiílimos  ,  con-  cimo,  mil  &  vintC  &  qua- 
tro. De  forte,  que  em  dez 
quartos  de  hoia  ,  6c  com 
dez  a£bos  de  caridade  me- 
receo  a  Senhora ,  Ã:  creceo 
a  mil  &  vinte  quatro  gráos 
degraça.  Agora  faça  cada 


dignamente  mereciao  ou- 
tro tanto  aumento  degra- 
ça, qual  era  o  que  tinhaó 
emfy,5tporiíro  huns  fo 
bre  outros  fempre  mais,  ôc 
mais  hiaó  dobrado  a  mef-^ 


ma  graça  i façamos  agora  humdevagaremfuacafaa 

a  conta  aos  gráos  de  graça,  conta  que  refta   em  todos 

4  a  :'enhora  podia  acqui-  os  quartos  de  hora  de  hum 

rirem  hum  fó  dia,  &  para  dia,  que  faó   noventa    6c 

que  a  conta  proceda  com  féis,  porque  ainda  que  fe- 

toda  a  clareza,  naó  prefup-  gundo  a  forçofa  ley  da  hu- 

ponhamosnaalmadamef-  manidads  alguns  quartos 

ma  \'  irgem  mais  que  hum  da  noite  occupaíle  o    bre- 

gráo  de  graça,  nem  coníi-  viiUmo  fono  os    fentidos 


cleremos  que  fazia  cm 
cada  quarto  de  hora  mais 
que  hum  aâ:o  de  caridade, 
lílo  poílo,no  primeiro 
quarto  de  hora,&  pelo  pri- 
meiro afio  de  caridade, 
dobrou  a  Senhora  o  mere- 
cimento ,  &  mercceo  dous 
gráos  de  graçi  :  no  fegun- 
do  quarto  mercceo  qua- 
tro ;  no  terceiro ,  oito ;  no 
qu  irto,  dczafeis :  no  quin- 
to, trinta  6c  dous  :  no  fcx- 
to,  feífenta&  quatro:  no 
fctimo,  cento  ^Sc  vinte  oi- 
to :  no  oitavo,  duzentos  & 
5;incoeata  <k  fcis ,;  no  wono, 


exteriores  da  Virgem,  eíTe 
fono  naó  interrompia  as 
acçoens  da  alma,  que  fem- 
pre vigiava,amava ,  &  me- 
recia; Ego  dormia  y&  cor  ^^^^^^ 
meumvigtíat.  Mas  porque  a. 
entretanto  naó  íique  cor- 
tado o  íio,  Sc  íliíbenfa  a  de- 
moftraçaòdanoífa  conta, 
eu  a  refu  mirei  breviíFima- 
mente,  repetindo  fò  as  fo- 
mas  de  dez  em  dez  quar- 
tos. 

Nos   vinte  quartos  de 

hora  daquclle   dia  tinhao 

crccido  os  gráos  da  graça 

da  Senhora  a  numero  de 

qui- 


Nopi  Senhora  da  Cr  aça',  g  9 1 

quinhccos  &  vinte  &  qua-     quatro  contos,  fetecentos 


tro  mil  &  duzêtos  &  oi te- 
ta &  oito.  Em  trinta,a  qui- 
nhentos &  trinta  Sc  íetc 
contos,quínhentos  fetenta 
6ç  quatro  mil  nove  cen- 
tos 5c  doze.  Em  quarenta, 
a  mil  6c  trezentos  Ôc  feten- 
ta &  féis  milhoens ,  fetenta 
&  fcis  contos  í  fetccento§ 
&  trinta  &  cinco  mil  qua^ 
trocentos  ^  oitenta  6c  oi- 
to. Em  cincoenta ,  a  hum 
conto  quatrocentos  6c  no- 
ve mil  duzentos  6c  vinte 
niilhocnS)  cento  6c  fetenta 
6c  fete  contos  ,  fetecentos 
6c  fetenta  6c  nove  mil  fete- 
centos ^  doze.  Em  ítÇd^n" 
ta,  a  três  milhoens  de  mi- 
lhoens, duzentos  U,  onze 
contos ,  quarenta  ^  hum 
mil  fetecentos  6c  trinta  & 
cinco  milhoens,6c  quarcn-' 
ta  6c  féis  contos  quatrocé- 
tos  6c  trinta  6c  fete  mil  6c 
oitocentos  6c  oitenta  6c  oi- 
to. Em  fetenta ,  a  fete  mil 


6c  noventa  6c  quatro  mil 
feiscentos6cvinte  6c  qua- 
tro. E m  oiten ta,a  féis  con- 
tos trezentos  6c  oitenta  èc 
cinco  mii  quatrocentos  ^ 
vinte  6c  dous  milhoens  de 
milhoens,  Be  cento  6c  no- 
venta 6c  féis  contos  oito- 
centos 6c  oitenta  &dous 
mil&:  cento  6c  oitenta  6c 
oitomilhoens,cento  èc  fe- 
te contos,  Sc  cento  trinta 
6c quatro  mil  6c  novecen- 
tos &  fetenta  Sc  {^is.  Em 
noventa  6c  féis  finalmente,' 
fazafoma  de  quatrocen- 
tos 6c  treze  mil ,  quatrocê- 
cos  Sc  fetenta  Sc  cinco  con- 
tos ,  quarenta  Sc  oito  mil 
quatrocentos  6c  quarenta 
6c  nove  milhoens  de  mi- 
IhoenSi  feiscentos  Sc  feten- 
ta 6c  hum  contos ,  noventa 
mil  milhoen$,6c  trezentos 
6c  noventa  6c  fete  contos, 
fetecentos  Sc  oitenta  6c  fe- 
te mil  céto  6c  trinta  6c  kiSy 


&duzétos  6c  vinte  6cqua-     que  he  o  ultimo  quarto  de 
tromilhoensde  milhoens,     horadehum dianatural. 


duzentos  &  treze  contos , 
quatrocentos  fetéta  6c  três 
mil  quinhentos  Sc  dezafe- 
te  milhoenSj&  trezentos  & 


35^     Demoftrada  efia 
immeníidade     de    graça 
acquirida  peia  Virgem  Se- 
nhora noííà  em  hú  fó  dia , 
Bbiiii  cui-^ 


m 


392  Sermão  de 

cuidareis  fem  duvida  to-     ceição  tinha  acquírídoem 


dos,  &  eftareisefperando, 
queeu  tire  por  confequen- 
cia  as  immenfidades  da 


trinta  &  quatro  annos  da 
vidadeíeu  Filho  ,  &  qua- 
renta &  oito  da  fua.  Sup- 


mefma  graça,  a  que  a  mef-     puz  em  fegundo  lugar,  que 
ma  Senhora   creceria  no  '  *     ' 

compridiílimo  efpaço  de 
tantos  dias,  mezes,  &  an- 
nos, quantos  fe  contarão 
defde  a  Afcenção  de  feu 
Filho  atè  a  fua  gloriofa 
AíTumpção.  Mas  nao  di- 
go, nem  direi  tal  coufa; 
porque  feria  diminuir,  de 
apoucar  muito  ,  &  Bizer 
grande  aggravo  à  mefma 


em  cada  quarto  de  hora 
fazia  a  Senhora  fomente 
humaíto  de  caridade,  & 
amordeDeos,  fendo  efl:cs 
adbos  tantos,  quantas  eram 
as  refpiraçoens  da  mefma 
Senhora  ,  cuja  memoria, 
entendímcntojéc  vontade, 
nem  por  hum  momento  fe 
divertia  da  attenriíllma 
contemplação  do  divino 


graça.  As  duasfuppoíiçoés     objedbo,  com  que  fua  alma 
que  fiz  na  conta  defte  dia,     iníeparavel mente    eftava 


foraó  fó  ordenadas  à  clare 
za,&  evidencia  da  mefma 
cota,  &  fingidas  como  por 
exemplo  com  dous  defei- 
tos contrários  à  manifefta 
evidencia  da  verdadeira 
fuppofiçaó.Suppuz  q  a  Se- 
nhora no  primeiro  quarto 
daquelle  dia  tiveíTc  hum 
fógráode  graça  ,  &  efta 
fuppoíiçaô  íbi  (ingidajpor- 
que  no  dia  da  Afcençaóde 
Chriílo  tinha  a  Senhora 
tão  innumeraveís  gráos  de 
graça,  quanta  defde  o  in 


íèmpre  unida  ,  amando-o 
de  dia,&  de  noice  fem  cef- 
far  com  mais  intenfos,  & 
efficazes  affecios",  que  os 
Serafins  da  gloria.  Ifro  he 
o  que  entaõ  naò  fuppuz 
para  a  clareza  da  conta,  5c 
o  que  agora  fupponho  pa- 
ra a  confequencia  ,  &con- 
je£lura  da  graça,  na  qual 
como  em  hum  pego  ,  ou 
abifmo  fem  fundo  afoga- 
dos, 6c  perdidos  todos  os 
números  da  Arichmetica, 
fórcílaao  dircurfo,&  en- 


llante  de  lua  puriíllma  Cp-    tcadiméto  humano  o  paf- 


mo 


NoffaSenhoradaGraça.  393 

mo,  &  à  língua  o  filencio ,     fi  mt^L^quod in  ea  divina  ope- 


&  coníiíTaó  de  que  a  graça 
deMaria  he  incomprehen- 
fivel. 

,  35-3  Quê  fomente íou- 
be  achar  paralelo  á  graça 
da  MãydeDeos,  foi  oau- 
tiquiílimo  Aadrès  Crecen- 
fe,oquala  comparou  com 
o  inefFavel  my  ílerio  da  hu- 
manidade do  Filho,  a  que 
chama  inHíiitas  vezes  infi- 
nitamente infinito.  As  fuás 


rata  ejtgratia  tnfih  ties  tyi- 
finitè.  E  como  a  immenía 
grandeza  do  infinito  fó  a 
pôde  comprehender  entê- 
dimento  infinito, qual  he 
unicamente  o  de  Deos-,por 
iíTo  conclue  S.Bernardino, 
fa liando  da  perfeiçam  da 
graça  da  Senhora    neíle  D.Ber- 
mefmo  dia  5  que  o  conhe-  ^^j;^  , 
cimento  delia  fó  eílà  refer-  deAf- ' 
vado  para  Deos  :  Vt  foli  ^ 'J'|;- 


palavrasfaôeílas;JV^///W,     ^20  cogmfcendd   referve- 
quõd  nosfiiperat^  in  eã  divi-     tur. 


naoperata  eft  gratia^  nemo 
Andrjas  mlretur  mttims  ad  novum , 
Crere  '.  ^jyieffdhHe  quod  in  eaper- 
de  Dar-  aVíuM  ejt  myfteriiimyab  omm 
Viíg?"^  Infinitate  infinines  infimte 
èxemptum.  Notemfe  mui- 
to eáesnovos,  &  últimos 
termos  5  ab  oníni  infimtate 
mfimties  infinite  Foi  o  my- 
íleriodeDeos  feito  home 
infinito  fobre  toda  a  infi- 
nidade, exemptum  ab  omni 
infinitate-^  porque  foi  infi- 
nito infinitas  vezes ,  infini- 
tiesy  Sc  infinito  infinitamê- 
tc^ijifimtè.  Eneíla  infini- 
dade, ou  infinidades  fó  fe 
pareceo  com  elle  a  graça 
da  Mãy  infinitamente  in- 


^61  Nodiada  AíTump- 
çaódefceoomefmo  Filho 
de  Deos  a  honrar  o  triun- 
fo de  fua  Máy  ,  acompa- 
nhado de  toda  a  Corte  do 
Ceo,  Anjos,  &  Santos:  os 
quaes admirados  diziam; 
^i£  eft  jfla^qu£  afcendit  de 
defertO:,  delkijs  ajfluens^m-^  ^ 
nixafuperdtleBumfutim^ 
Quem  he  efta,  que  fobe  do 
delertOjnaò  fó  chea,  mas 
inundando  delicias  ,  fu- 
ílentada  do  feu  amado  z'  O 
feu  amado  he  o  bemdito 
Filho  ,  primeiro  motivo 
daquella  admiraçao,o  qual 
para  maior  mageftade  do- 
triunfo  ,  quiz  ellefer  em* 
peíToa 


Canr; 


394  Sermão 

peííbaoqiiclevaíTedebra-     tanto  que  apareceo  aglo- 


m 


ço  a  fua  Máy.  As  delicias, 
ou  inundação  de  delicias, 
que  juntaraente  adrnira- 
vaójéc  das  quaes  naô  fó  hia 
cheajmas  como  de  fonte 
redundante  manavaó  ,  & 
cnçhiaótiido,  naô  poden- 
do Ter  as  da  gloria  para  on- 
de começava  a  fubir  3  eraó 
fem  duvida  as  da  graça, 
que  na  terra,&  na  vida  taô 
immenfaméte  tinha  acqui- 
rido.  Aílim  comenta  eíle 
lugar  o  doutiírimoCardeal 
Hailgrino  :  Affincre  mitím 
dicitur  grattarum  dcUàjSt 
Ó"virtutum\  &  innixafu" 
per  dileõfuwy  ctíjus  inniteba» 


riofa  triunfante  reveílida 
das  immenfidades  de  fua 
graça,  maiores  na  grande- 
za, que  todas  as  delicias, 
que  ate  entaó  fe  tinhaõ  go- 
zado na  gloria,tudo  quan- 
to tinha  decido  do  Ceo  à 
terra  defapareceo  à  fua  vi- 
íla.  Excellenteméte  S.  Pe- 
dro Da  miáo  :  In  illa  inac- 
ccjjibili  Ince  perluc€7is  ,  Jic  p  Pam. 
ntronrmque  fpirituum  Ije-^^^/^^^ 
betabat  dtgnitatem  ^  ut  (mt  Virg,  ' 
quajinon  jmt  y  &  compara- 
tioiíe  tllhis ,  nec  poJJJnt ,  nec 
debeantapparere.  Que  Re- 
gião mais  povoada  (*  hc 
cóparaçaô  do  mefmo  San- 


turgrati£.  Mas  o  que  eu  fo-     to  )  Que  Regiaó  mais  po 
bretudo  admiro  nos  mef-     voada  que  o  Ceo  de  noite? 


mos  admira  dores,  he,  que 
cm  tal  dia ,  &  em  tal  con- 
curfo  chamem  à  terra  de- 
Cant.  8.  ferto :  ^laeft  ifia ,  qu£  af- 
í-  cendit  de  deferto  ?  Se  toda  a 
Corte  do  Ceo  tinha  deci- 
do com  o  feu  Principe  à 
terra  :  Se  defpovoado  o 
mefmo  Ceo,  todo  naquel- 
lediaeííava  junto  na  terra 
donde  começava  a  mar- 
char o  triunfo  ,  como  fe 
chama  deferto  ?    Porque 


Tantos  Planetas  ,  tantas 
conítellaçoens,  tanta  mul- 
tidão de  Éííreilas  maiores, 
&  menores  fem  numero. 
Mas  em  aparecendo  o  Sol, 
o  m  efm  o  C eo  fu  b i  ta  m  en- 
te ficou  hum  deferto,  por- 
que tudo  à  vifra  deilc  fe  fu- 
mioj&defiparcceo,  &  fó 
elle  aparece.  O  melino  fu- 
ccdeo  a  todas  as  Gerar- 
chiasdoCconcíledia  Por 
grandes,  &:  iniiunicraveis 
naò 


Nojfa  Senhora  da  Graça.  3  9  f 

naócabiaôna  terra,  mas  com  osapplaufos  das  vo- 

tanro  que  abalou  o  triun-  zes,  com  os  aíFedbos  dos 

fo,  &  aparecerão  os  fobe-  coraçoens,  &  com  os  jubi- 

ranosrciplandorcs  dagra-  los,&  parabéns  de  toda  a 

ça,ouda'ScnhorLida  Gra-  alma,  que  Maria  em  quan- 

ça,  tudo  o  mius  deíapare-  to  Senhora  da  Graça ,  ain- 

ceo,6c  ficou  hum  deíerto:  da  em  comparação  da  fua 

giuége/hfta.qusafcenditde  mefma  gloria,  cfcolheo  a 

dtfertú ;  porque  codas  eífas  melhor  parte  :  Maria  opti-^ 

Gerarchias  em  iua  prefen-  mam  fartem  elegit. 


§.  XI. 

^6z  T Sto  poílo C  para 
Xque  nos  naó  falte 


çaeraócomoíenaò  fora6> 
ta/mt  tmiquãm  mnfinv  j  & 
porque  todas  em  lua  com- 
paração, nem  podiao,  nem 

de viaò  aparecer,  C''   com"  ^ '■.   ' 

paratiotie  iUiiis^  necpojjtnt^  o  fim  de  taò  largo  difcurfo, 

nec  debeant   apparere  5  fó  quando  o  temos  acabado^ 

aparcceo,  &  fó  fe  fez  men-  perguntara  eu  a  todos  os 

ção  do  fcú.  amado ,  innixa  que  me  ouvirão  >  fe  fariam 

Cant.  Jufer  dikã^mjnum^Q^h&  eftamefma  eleição  :  fe  a 

*'^'      nova  confirmação    deita  temfeitoatèagora,ouíea 

mefma  verdade  j  porque  determinaó  fazer?  De  nm- 

junta  com  a  graça  de  Ma-  guem  creo,  fe  he  Chriílaó, 

ria  fó  a  de  feu  Filho  avulta,  &  tem  fé ,  que  naó  faria  a 

&  aparece  -,  por  ítr  graça  mefma  eleição ,  cftimando 

de  homem  Deos,  abaixo  mais  a  graça  de  Deos,que 

do  qual,  como  diz  S,   An-  a  mefma  gloria,  como  fez, 

fclmo, nenhúa  fe  pòdecó-  coma  maior  luz  de  todas 

íiderar,  nem  entenderina-  asluzesdoEfpirito  SantOj 

ior  que  a  de  lua  Máy:  §lua  fua  fobcrana  Efpofa  Maria 

maior  fub  'D^o  necitieat  m"  Senhora  noíTa  ;  bailando 

telligi.    E  iílo  baile  finai-  para  iífo,  quando  naó  ou- 

mente,para que   todos ce-  vera  tantas razoens,  como 

kbremosj  &  confeAêmos  vimos,  fer  eleição,  ^  refo- 


I 


rlKt 


396  Sermão  de 

liiçaó  fua.    E  digo,  fe  he     daSanciíTimaTrindadcao 


Chriílaójêc  tem  féjporque 
o  contrario  feria  não  dar 
credito  às  Efcrituras  fa- 
gradaS5que  allegamos:  naó 
imitar  ,  nem  venerar  os 
exemplos  dos  maiores Sá- 
tos  de  hum5&:  011  tro  Tefta- 
mento  Moyfes  &  S.  Paulo: 
&:  cerrar  as  portas  da  pro- 


Padre,  ao  Filho,  &  ao  Ef- 
pirito  Santo.  Sò  quem  naó 
tem  fé,  como  dizia  ,  naó 
tremerá  de  ouvir  ,  &c  ima- 
ginar hum  táo  horrendo 
lacrilegio.  Entaó  prezem- 
fe  os  q  lílo  fazem  de  fer  de- 
votos da  Senhora  da  Gra- 
caj6c  de  ter  dedicado  a  fua 


pria  cafa  a  toda  a  Santiíli-     Igreja,  6c  poílo  a  fua  pátria 
maTrindade,  que  em  to-     debaixo  do  titulo,  &  pro- 


dasastres  PeíToas  ,  como 
ouviíles  da  boca  do  mef- 
mo  Chriílo,  vé  fazer  mo- 
rada na  alma,  que  eftà  em 
graça.  Se  quando  tresAn- 


tecção  da  mefma  Graça. 
Como  a  graça  coníifte  em 
amar  ,  &  fer  amado  de 
Deos,  fô  quem  de  todo  co- 
ração eílima   mais  a  fua 


jos  em  figura  das  tresPeA     amifade,  que  a  fua  mefma 
foas  divinas  foraó  fer  hoA     viíia,  pôde  aífirmar  com 


pedes  de  Abraham,  elle 
os  náo  recebera ,  &  agafa- 
Ihára  com  tantas  demo- 
ílraçoens  de  cortezia  ,  & 
amor,antes  os  lançara  de 
fua  cafa  ,  quem  fe  naó  af- 
fombraria  de  tal  defcome- 
dimento  ?  Pois  o  mefmo, 
&  muito  maior  he  o  que 
fazem  a  Deos  os  que  nam 
aceitaóa  fua  graça, ou  fe 
defpedem delia,  naó  dan- 
do com  as  portas  na  cara  a 
três  Anjos  ,  fenaó  verda- 
deiramente às  trcs  Pelfoas 


verdade,  que  faria  a  mef- 
ma eleição,  que  fez  a  Se- 
nhora da  Graça. 

363  MaspaíFandoàfe- 
gunda  pergunta  ,  refpon- 
deinie,fe  fizeíles  efta  elei- 
ção atègora.?  Ohvalhame 
Deos,  que  confufaójiSc  que 
anguftias  feráó  as  voflãs, 
quando  no  dia  do  Juizo  fe 
vos  fizer  eíla  meíma  per- 
gunta !  O  lume  da  razaó 
natural  ,  fem  chegar  aos 
preceitos  da  Ley  de  Deos^ 
ellà  ditando  a  todo  o  ho- 
mem, 


Noffa  Senhora 
mem,  que  entre  o  bem,  & 
o  mal  deve  eleger  o  bem, 
&  entre  o  bom  ,  &  o  me- 
lhor, eleger  o  melhor.  Ve- 
jamos agora  nos  voílbspé- 
fa mentos,  nas voílàs  pala- 
vras, &  nas  voíTas  obras, 
que  todas  aíli  haóde  apa- 
recer publicamente,  que 
he  o  que  efcolheíles:  a  gra- 
ça, ou  o  peccado  ?  Nos  pé- 
íamentoso  peccado  ,  nas 
palavras  o  peccado  ,  nas 
obras  o  peccado  y  &  íem- 
pre,Ôcemtudo  ,  ou  quafi 
tudo  o  peccado ,  com  per- 
petuo efquecimenta  ,  & 
naó  fó  efquecimento  ,  mas 
defprezo  da  graça.  E  por- 
que.? Nas  obras  por  hum 
appetite  irracional,  ou  por 
hum  viliílimo  intereíle: 
nas  palavras  por  húa  mur- 
muração da  vida  alhea^  ou 
por  hum  impeto  da  ira:nos 
penfamentos  por  húa  re- 
prefentaçaó  do  defejo  vaó, 
&  tal  vez  por  húachiméra 
nãofô  fingida,mas  impof- 
íivel.  E  he  poíIivel,que  por 
ifto  fe  troque ,  fe  venda,  & 
fe  perca  a  graça  de  Deos:6c 
fobretudoj  que  fentindofe 
tanto  outras,  que  não  me-^ 


da  Gr  aça.  597 

recém  nome  de  perdasjío 
as  da  graça  fenão  íintão  ! 
Verdadeiramête] ,  que  não 
fei  onde  eftà  a  noííà  fé, 
nem  o  noíTo  entendimen- 
to !  O  que  fó  fei  he,  que  fe- 
melhante  infenfibilidade 
fófeachaem  almas,  que 
eftão  deílinadas  para  o  In- 
ferno ,  6c  jà  nefta  vida  me- 
recem o  ódio  de  Deos,  co-  ^^ 
moEfau:  Efau  autemodio  cÍjj. 
habui,  Vendeo  Efau  o  feu 
morgado  a  Jacob  por  hum 
appetite  taó  vil,&  hum  go 
fto  taó  groíTeiro  ,  &  taõ 
breve  comofabemos,  Ôc 
pondera  a  Efcritura  fagra- 
da,  que  depois  de  fazer  ef- 
ta  venda  fe  apartou  dalli : 
TarvipendenSymàdprimo^  Gere^ 
genita  vendidijfet ,  fem  fa«  ^^^^ 
zercafo  do  que  tinha  fei- 
to, nem  pefar  o  que  tinha 
vendido.  AíHm  acontece 
aos  que  perdem  a  graça  d$ 
Deos ,  &  muito  mais  fe  t 
vendem  por  aigúa  coufa 
defeugoíl:o.Por  qualquer 
outra  perda  fe  enrrijflecé, 
&poreíla,&com  efta  ra6 
fôraeíláo  de  le  entriíle- 
cer,  que  antes  íealcgraôí 
Latantur  cu  malefecermt. 


i 


35)8  SermaÕde 

3^4     Aos  que  atègora     tima  a  ambição   humana, 
fizeraótammàj&taóerra-     &  nenhum  pendor  faz  em 


da  eleição  como  efta,  fó 
peço  que  tomem  a  balan- 
ça na  mão,  &  pefem  o  que 
Efau  não  pefou.  Dizeime: 
Quaes  faó  as  coufas  neftc 
inundo  pelas  quaes  os  ho- 


refpeito  de  hum  fó  gráo  de 
graça  ,  como  também  o 
não  faria,  ainda  que  Deos 
levantaíTe  hum  novo  Im- 
pério, no  qual  hum  home 
dominaíTe  a  todos  os  ho- 


mens coílumão  perder,  ou     mens,&atodos  os  Anjos, 
vender  a  graça  de  Deos  ?    Finalmente,  fobrc  as  ri- 


Geralmente,diz  S.  Joaô 
Evangelifta,raó,  oudefejo 
de  riquezas ,  ou  defejo  de 
honras,  ou  defejo  de  go- 
ílos,  &  deleites  dos  fenti- 
dos.  Pondeme  agora  tudo 
iílo  em  húa  parte  da  balã- 
ça,&  da  outra  hum  fó  gráo 
de  graça,&  vede  qual  pefa 
mais.  Ponde  todo  o  ouro, 
toda  a  prata,todasaspero- 


quezas,  &  honras  acumu- 
lemfe  todos  os  goftos,  to- 
das as  delicias ,  todos  os 
prazeres,  nao  fó  quantos  fc 
gozáraó,  &  podem  gozar 
nefte  mundo ,  fenaó  tam- 
bém os  que  fe  perderão  no 
Paraifo  Terreal  3  &  para 
que  vos  não  admireis  de 
que  pefe  muito  mais  hum 
gráo  de  graça  ,  fabei  que 


las,  &  pedras  prcciofas,     ainda hc mais  digno  de  fe 
que  gera  o  mar ,  &  a  terra,     appetecer,  que  tudo  quan- 


&  hum  grào  de  graça,  nam 
fó  pefa  mais  fem  nenhúa 
comparação  ,  mas  omef- 
mo  feria  fe  toda  aterra 
foífe  ouro  ,  &  todas  as  pe- 
idras  diamantes.  Acrccen- 
taimaisà  balança  todas  as 
honras  ,  todas  as  dignida- 
des, todos  os  Cetros  & 
Coroas,  todas  as  Mitras  & 


to  gozãOj&  quanto  hão  de 
gozar  por  toda  a  eternida- 
de com  a  viíla  clara  de 
Deos  todos  os  Bemaven- 
turadosdoCco  ;  &:  fendo 
iíío  aílim  ,  pôde  haver  ma- 
ior locura,  que  por  húa  on- 
ça de  intereíTc  ,por  hum 
pontinho  de  honra  ,&:por 
num  inítantc  de  golto  per- 


STiaraf ^ ^ tud9  quantQef-    der,  naó  hum  fó  gráo  de 


Nojfa  Penhora  da  Graça.  5  99 

graça  de  Deos,  fenão  toda     Pois  ifto  he  o  que  fazeis, 


Píalfti. 


fem  o  entender,  todas  as 
vezes  q  defp rezais  a  graça 
de  Deos.  Ouvi  ao  mefmo 
Chrifto  como  jà  fe  queixa- 
va defle  defprezo  por  boca 
do  Profeta :  Tretíum  meum 
deo,erao  temporal,queel-    cogitaverunt repeUerc.QhQ-  €1.^ 
le  herdou  de  feu  Pay  Ifaac,     gáraó  os  homens  a  tal  ex- 
tremo de  cegueira,  &mal. 
dade,  diz  Chrifto,  que  en* 
tráraó  em  penfa mento  de 
regeitar  ,  Sz   defprezar  O 
meu  preço.  Ah  Senhor,que 
os  mefmos,  que  crem  em 
vòs  ,  &  fe  chamaó  Chri- 
ftãos,não  fó  chegarão  a  en- 
trar  em  taô   abominável 
penfamento  ■-,  mas  com  os 


a  fua  graça  ? 

365  Mas  para  q  aca- 
bemos depefaro  que  ain- 
da naó  eftà  pefado  ,  torne- 
mos ao  morgado  deEfau. 
O  morgado,que  Efau  ven- 


o  qual  indo  a  fer  facriíica- 
do,  não  chegou  a  derra- 
mar o  fangue:  o  morgado, 
que  nòs  vendemos, he  o 
fobrenatural,  &  da  graça, 
do  qual  o  Filho  de  Deos 
nos  fez  herdeiros,  tendo -o 
comprado  com  todo  o  fan- 
gue ,  que  derramou  na 
Cruz.  E  eíle  preço  infini- 


to he  o  que  nòs  taó  vil,  taó  penfamencos,  com  as  pala- 

impia,ôc  taó  facrilegamê-  vras,  com  as  obras,  &  com 

te  defprezamos,  Dizeime,  tudooquecuidão,  6c   fa- 

fe  quando  na  MiíTa  fe  leva-  zem,defprezão,  &  daó  por 

ta  o  íangue  de  Chrifto  no  nada  eíle  voílb  preçoí  No 


Caliz,ouveíIe  algum,  que 
em  vez  de  o  adorar,  &  ba- 
ter nos  peitos ,  lhe  voltaíle 
o  roílo  ,  lhe  fechaíTe  os 
olhos  3  &  com  o  geíto  de 
ambasasmãos  o  regeitaf- 
fe^&lançaííede  fy,quem 
haveria  que  não  abomi- 
naíle  tal  homem ,  &  fe  po- 
deífe,  o  queimaíTe  logo? 


ta  aqui  Hugo  Cardea],quç 
em  tudo  o  que  fe  vende,ou 
compra  naó  ha  hu  fó  pre- 
ço, fenaó  dous.  Hú  o  pre- 
ço da  coufa  comprada,  ou- 
tro o  preço  daquilío  com 
que  fe  compra :  ^od  emi- 
tur^é'quo  emitur.  Eíles  íàõ 
os  dous  preços,  q  defpre- 
za  todo  aqueile  que  pecca, 
acYeU' 


400 
&  vende  ,  ou  troca 
peccado  a  graça  de  Deos. 
Hum  o  preço  da  graçajque 
Chriílo  nos  comprou  com 
feufangue,&  outro  o  pre- 


Sermão  de 
pelo  á\^no  de  fer  abominado: 
Et  fajiguhicm  teftamenti 
plhitum  dtixerit  :  Sc  do 
mefmo  Chrifto  com  ex- 
preííàó,&  reflexão  de  fer 


ço  do  mefmo  fangue,  com  Filho  de  Deos,  o  qualpi- 

quenoscomprou  a  graça  za,  &  mete  debaixo  dos 

It  le me  perguntais  atèon-  ^hs'.^i FiltumT>ei Loncul- 

de  chega   eíte  defprezo  ?  caverit. 


Tremo  de  o  dizer,  mas  he 
bemqueo  ouçais,  &  fai- 
bais.  Chega  eíle  defprezo 
naó  fô  a  dcfprezar  de  qual- 
quer modo  a  graça  de 
r)eos,&ofanguede  Chri- 
ílo,  mas  a  meter  debaixo 


^66  Chegada  a  verda- 
de, Sc  evidencia  do  noíFo 
difcurfoaeíle  extremo  de 
impiedade,  &  horror :,  que 
fenáo  podéra  crer,  nê  ima- 
ginar, fenáo  fora  de  féi 
bemcreo  que  não  haverá 


dos  pès,&pizar  a  mefma  alma  tão  perdida,  nem  có- 

graça, 6c o  mefmo fangue,  ciência  tão   defefperada, 

6c  o  mefmo  Filho  de  Deos.  que  conhecendo  o  erro,  & 

Sa6  palavras  exprelTas  ,  6c  cegueira  em  que  atègora  a 

tremendas  doApoíloIoS.  fofreo  a  paciência, 6c  mi fe- 

Paulo :  ^uifdium  'Dei  con-  ricordia  divina , fem  a dei- 


Hcbr.  culcaverity  &fangíii7icm  te- 
^'''^^  JiamentifolUitum  duxerit^ 
inquojanâlificatus  ejt  ^  & 
fpiritíú  gratine  cÓtumeliam 
fecerit  }  vede  fe  falia  no- 
meadamente da  graça,  no- 
meadamente do  langue,  Sc 
nomeadamente  de"Chri- 
ílo.  Dagraça,aquefazta6 
grande  injuria  :  Spiritui 
grátis  co7it  ume  liãfn fecerit : 
doíàngue ,  que  reputa  por 


tar  mil  vezes  no  Inferno, 
como  pondera  o  mefmo  S. 
Pau  Io,  Sz  como  hú  tal  def- 
prezo do  íhngue  de  Chri- 
llo,6cdopreçodo  mefmo 
finguc  merecia^  bem  creo, 
digo,  que  ninguém  havc- 
ni,qucnão  tenha  mudado 
derciòluçáo,  Sc  com  ver- 
dadeiro arrcpendimenco , 
6c  dor  do  paOjdo,  a  não  te- 
nlia  feito  muito  firme  ác 
an-' 


Nojfa  Senhor, 
antepor  a  graça  de  Deos  a 
tudo  quanto  pôde  ter  ,  ou 
defejarneíle  mundo,  em 
quanto  no  mefmo  mundo, 
excepta fó a fua  graça, lhe 
pôde  dar  o  mefmo  Deos. 
E  para  que  iílo  naó  íique 
íó  em  bonspropoíltosjque 
podem  eíquecer,  &  tornar 
a  fer  vencidos  do  mao  co- 
llume  i  acabo  com  decla- 
rar a  todos,&  lhe  proteftar 
da  parte  do  mefmo  Deos , 
fobpena  de  faivar,  ou  nao 
falvar,  o  que  devem  fazer. 
3Ó7  Tudo  fe  reduz  a 
três  pontos,  &  muito  bre- 
ves, para  que  vos  fiquem 
na  memoria.  O  primeiro, 
que  logo,  &  fem  dilação  o 
queeftiver  empeccado  íe 
ponha  em  graça  de  Deos 
por  meyo  do  Sacramento 
da  Penitencia,fazendo  taó 
exado,  8c  taò  fiel  exame  , 
&  confiíraó  de  toda  a  vi- 
da paífada,  como  fe  aquel- 
la  foífe  a  ultima  para  ir  dar 
conta  à  divina  Juftiça.  O 
fegundo,hum  total,  6c  fir- 
miflimo  propofito  de  con- 
íèrvaramefma  graça  ,  & 
perfeverar  nella  ,  lem  fa- 
zer cafo  de  fazenda^  hoíi" 
Tom  .7. 


ida  Gr  aça.  401 

ra  ,  ou  qualquer  outro  m- 
tereífe  ,  &  conveniência 
humana,  &  com  refoluçao 
de  antes  padecer  mil  mor-' 
tcsy  que  cometer  hum  pec* 
cado  mortal.  Terceiro^ 
naófóconfervar  a  mefma 
graça,  mas  procurar  com 
todo  o  cuidado  de  a  aumê- 
tar  comoexercicio  con- 
trario de  virtudes, &  obras 
Chriftáas :  com  obfervan- 
cia  dos  preceitos  divinos, 
com  a  frequência  dos  Sa- 
cramentos, com  a  oração, 
com  a  efmola,  com  o  jejú> 
6c  mortificação  de  todas 
as  paixoens  dacarne,com 
amor  dos  inimigos,  com  o 
pèrdaó  das  injurias,  com  a 
paciência  dos  trabalhos,& 
conformidade  com  a  von- 
tade de  Deos  em  todas  as 
eoufas,  que  nefta  mtfera- 
vel  vida  ordinariamente 
faó  ad verfa s :  &  como  dan- 
tes com  os  penfamentos , 
palavras,  6c  obras  oífendia 
ao  mefmo  Deos,  ailim  da- 
qui por  diante  as  ordene 
todas  com  reála  intençaa 
a  feu  divino  ferviço,  6c  au- 
mento de  fua  graça  ,  na 
qual  taõ  brevemente  co- 
Cc  mo 


402  Sermão  de 

mo  vimos,  pôde  acquirir,     daGraça  vos  pedimos  uni- 


&  multiplicar  muito  gran- 
des theíòuros^  &  recupe- 
rar em  poucos  dias  de  ver- 
dadeira contrição,  Sc  amor 
deDeostudoo  queefper- 
diçouj&rperdeoem  toda  a 
yidapaíTada. 

368  E  porque  delibe- 
rada, &  reduzida  a  alma  a 
eíle  fegundo,  &:  feliciflimo 
citado,  he certo,  que  nam 
le  defcuidarà  o  Demónio 
em  procurar  de  a  derrubar 
delle  com  tentaçoens-,aqui 
entraopatrocinio,  &:  am- 
paro da  Senhora  da  Gra- 
ça ,  6c  feu  fantiílimo  nome 
terrivel  fobre  todos  ao 
mefmo  Demónio ,  nome- 
andoa,  &  invocado-  a  mui- 
tas vezes  no  meímocon- 
ílido  5  &;  dizendo  ;  Maria 
M^tergratKCt  Mater  mi  fe- 
rie ordiíT^tu  nos  ab  hoflt pro- 
tege :  Maria  Máy  da  graça, 
Maria  Máy  da  mifericor- 
dia,vòsque  fó  podeis  for- 
talecer a  noíTa  fraqueza , 
nos  defendei  deílc  cruel 
inimigo. 

369  AíTim  poftrados 
diante  de  vofib  foberano 
acatamento, como  Trono 


camente  efta,  que  vos  efti- 
maíles  fobre  todas.  E  con- 
íiadamcnte,Senhora,  vos 
fazemos  efta  petição  de- 
baixo da  promeíla  do  vof- 
fo  Apoftolo  :  Adeamus  er- 
20  cíim  íiducta  ad  thror.nm  „  , 
gratt£  5  ut  mtjericordiam  » 6. 
confeqttamur^à^gratiã  in- 
veniamus  in  auxilio  oportu- 
no. Graça  ,  &  mifericordia 
nos  promete  debaixo  do 
voíFo  amparo.  E  como  nos 
pôde  faltar  a  graça,  ou  a 
mifericordia  ,  fendo  vòs 
Maria  Máy  da  graça  ,  & 
Máy  da  mifericordia:  iWíí- 
ria  Mater  grátis  ,  Mater 
mifericordia  ?  Com.oNJáy 
àà  graça  não  fó  tédes  abú- 
dantiíllma  graça  para  vòs, 
fenaó  para  voílbs  íilhos , 
quefomoso.9  peccadores. 
O  mefmo  Anjo,  que  vos 
faudou  dizendo  ;  Gratia 
pLna^-àQYQccntou  logo,<S/>/- 
ritus  Sanãiis  fuper-veniet  in 
te  :  porque  naó  fó  foftes 
chca  de  graça,fcnaó  fobre- 
chea :  'F/ena  (ibi^iiper plena 
7/í>^/>5  como  diz  voíFo  de- 
voto S.Bernardo:Cliea  pa- 
ra vò§)  Çc  para  nos  fobre- 
cheaj 


UNMft 


NojTa  Senhora  ãa  Graça.  40  3 
cíieas^om  que  deitas  fu-  bemanòs^&nospertende 
perabundancias  de  graça  vencenpelo  que,  Senhora 
náo  podeis  deixar  de  par-  da  Graça,a  vos  vos  perte* 
tir  liberalmente  com  nof-  ce  defendernos  de  fuás  te- 
co como  Mãy  da  graça,  taçoens,8caftucias:rí^;í^^ 
Mater  praM.  ^  muito  me-  ah  h  o  fie  protege,  t.  nam  lò 
nos  o  devemos  defconfiar  vos  dizemos,  Tu  nos  ab  ho- 
devoíFa  mifericordia  ^  co-  /^/r^r^^^  ,  mas  para  qu€ 
mo  Máy  de  mifericordia ,  eíla  protecção  leja  perpe- 
pois  temos  razaÓ  de  vos  tua,&fegura  atèa  morte, 
pedir,ou  demandar  a  mef-  acrecetamos,  Ethoramor^ 
ma  graça,  naÓ  fôde  mife-  tisfufcipe.  Eíle  ditoío  dia, 
ricordia,  fenaòdejuftiça.  Senhora  5  foi  aquelíe,  em 
Omefmo  Anjo  vos  diílè  :  que  pagando  como  filha 
Invemftigratíãapud  "Deu :  de  Adaó  o  tributo  à  mor- 
Que  vòs  achaftes  a  graça.  te,na  mefma  hora  em  que 
Quem  achaoperdido,tem  começou  a  voíla  gloria ,  fe 
obrigação  de  o  reftituir  a  confumou  a  voíTa  graça: 
quemoperdeo,  &:fe  Eva  pelo  que^Senhora  da  Gío- 
nos  perdeo  a  graçajvòs  co-  ria,&  da  Graça,  por  voíTa 
moKeparadora  de  todas  as  fantiílí  ma  morte,  nos  con- 
fuás  perdas  5  a  deveis  nam  cedei  para  a  noíTa  húa  tal 
fó  por  mifericordia,  fenaó  hora,  em  que  acabando  ef- 
porjuítiça,  acporreílitui-  tamiferavelvidaem  Gra- 
çaó  a  feus  filhos.  O  mefmo  ça,  na  eterna,  &  feliciílima 
inimigo,  que  a  ella  tentou,  poíTamos  acópanhar  voíTa 
&  venceo,  nos  tenta  tam-  Gloria. 


Ccij 


SER^ 


40+ 


■mm 


VO 


SERMAM 

DE 

SJOAM  EVAlSIGELISTA 

Fefta  do  Príncipe  D.Theodoíio  na  Capella 
Real,  anno  1(^44. 


ConverfusTetrusviditillumdifàpiihm,  quem  ddigcbat 
Jefusyfeqnentem.  Joann.21, 

ff.  I. 

Uidava  eu,  que 

fó  dos  que  íèguê 

ao  mundo  havia 

venturofos  ,  & 
deígraçados.  Também  na 
fantidade  ha  fortuna.  S. 
Joaó  Bautiíla  foi  dcfgra- 
çado  com  Reys,  S,  Joaó 
Evangelilla  foi  venturofo 
Gom  Principes.  S.  Joa6 
.Bautiíla  foi  aefgraçadocõ 


Reys 5  porque  hum  Rey  o 
fez  nafcerem  húa  monta- 
nha, 8c  outro  Rey  o  fez 
morrer  em  hum  cárcere. 
S.  Joaó  Evangelifta  foi  vé- 
turofo  com  Principes,por- 
queo  PrincipedoCeo,  & 
oPrincipe  da  Igreja,  am- 
bos andaó  em  competên- 
cia neíle  Evangelho  íbbre 
qual  fe  lhe  ha  de  moílrar 
mais  afeiçoado.  Fez  Chri- 
{ío  a  S.  Pedro  Principe 
uni- 


A 


|o3nr. 

M.2I. 


[bid.2:^. 


Sermão  de  S.loaõEvangeUfla,  405- 
univerfalda  faa  Igreja, &  porque  fe  moftra  fenrido 
apontando  S.  Pedro  para  Chriílo  do  cuidado  ,  que 
S  Joaó,  diíTe :  T>omine,  htc  moftrava  Pedro  ?  Os  fenti^ 
autem quid?  Senhor ,  fe  a  mentos  eraó  diverfos,  mas 
mim  me  dais  o  Pontifica-  a  caufa  era  a  mefma.  Sen- 
do, fe  a  mim  me  entregais  tiãofe  ambos ,  porque  am- 
as chaves  do  Ceo,  aos  me-  bos  amavaó  muito  a  S. 
recimentos  de  Joaó,  que  João.  Pedro  fentiafe  da 
lhe  haveis  de  dar?  Que  ref-  dignidade  ,  que  lhe  dava 
ponderia  Chrifto  a  S.  Pe-  Chritlo;  porque  como  Pe- 
dro? Sk  eum  voio  manere  dro  amava  muito  a  Joaó, 
donecveniam.qtiidadte^Sè  queria  a  dignidade  para 
eu  quero  que  Joaó  fe  fique  elle,&:  não  para  fy  :  Chri- 
aíTim,  quem  vos  mete,  Pe-  fto  fentiafe  do  cuidado, 
dro,  a  vòs  nilTo  ?  Quem  vos  que  moftrava  Pedro ,  por- 
fez  procurador  de  Joaó  ?  que  como  Chrifío  amava 
^///í?í2í//^é'? Notável repo-  mais  que  todos  a  Joaó, 
fta de Chrifto,  &  notável  naó  queria  que  ouvefle 
propofta  de  Pedro!  Chri-  quem  fe  moftraíFe  mais 
fto  &  Pedro  ambos  parece  cuidadofo  que  elle.  Onde 
que  eftaó  queixofos  pelo  eftà Joaó,dizia  Pedro,por- 
quehaviaõ  de  eftar  agra-  quemehaóde  dar  o  Pon- 
decidos.  Na  repartiçam  tificado  a  mim  ?  Hic  autem 
dos  lugares  fentemfe  as  ^íí/V.?Ondeeftoueu,dizia 
dignidades,  que  fe  dão  aos  Chrifto,  porque  ha  de  ter 
outros:  nos  negócios  dos  outrem  cuidado  de  Joaó? 
amigos,  fentefe  que  haja  ^idad  te  ?  De  maneira,  q 
defcuidados,masnam  que  o  Príncipe  da  Igreja,  &:  o 
•liaja  cuidadofos.  Pois  fe  Principe  da  Gloria  anda- 
Chrifto  era  amigo  dejoaó, 
6c  Pedro  eftava  feito  Pon- 
tifice  :  porque  fe  moftra 
fentido  Pedro  da  dignida- 
de, quelhedava  Chrifto? 
Tom. 7. 


vão  ambos  em  competên- 
cia fobre  qual  havia  de 
amar  mais  a  S  Joaó  ,porq 
fer  amante  do  Evangeli- 
fla  amado ,  ouhe  deftmo, 
Ce  iij        ou 


40  6 


Sermão  de 


"^  ■•^\ 


ou  he  obrigação  dp$  ma- 
iores Príncipes. 

371  Taó  qualificada, 
Senlior,5c  taó  authorizada 
comoiílotem  V.  A.  ade- 
vaçaó  do  feu  amado  Evá- 
gcliílaSJoaó:  authoriza- 
da com  os  cuidados  do 
Príncipe  da  Igreja,&  mais 
authorizada  com  as  emu- 
laçocns  do  Príncipe  da 
-Gloria.  Com  tudo  ,  Se- 
nhor, eu  quando  confide- 
ro  a  V.  A  .Príncipe  de  Por- 
tugal 5  naó  deixo  de  ter 
meus  efcrupulos  neíla  de- 
vaçaó.  S.Joaó  foi  o  valido 
deChriíloi&:  hum  Prín- 
cipe de  Portugal  logo  em 
feus  primeiros  annos  aíFei- 
coado  a  validos!  Devaçaó 
a  valido,  ainda  que  Santo, 
cm  hum  Príncipe !  Efcru- 
puíofa  devaçaó.  Là  diziaó 
os  Ifraelitas  aDeos,que 
lhe  naó  havíaó  de  chamar 
Baalim  ,  que  quer  dizer, 
Senhor  meu  j  porque  ain- 
da que  Baalim  era  nome 
de  Deos,  equivocavafe  cp 
Baal  ,  4  ^^^  "O"^^  do  ído- 
lo. Pois  feonome  do  ído- 
lo, ainda  pofto  cm  Deos, 
craperígoíbi  o  nome  de 


valído^ainda  que  pofto  em 
S.Joaó  ,  porque  o  naó  fe- 
ra? Valido  ainda  que  feja 
S.  Joaõ,he  valido ;  &  aifei- 
çaó  a  valido  no  noífo  Prín- 
cipe! Pois  por  certo,  Se- 
nhor, que  não  faó  ç,^^s  os 
exemplos,que  V.  A.  vè: 
náo  he  eífa  a  doutrina  com 
que  V.  A.  he  criado.Quan- 
to  mais  que  havendo  de 
haver  valido ,  parece  que 
naó  havia  de  fer  S.  Joaó. 
Os  validos  inventáraóíc 
para  os  Príncipes  defcan- 
çarem  nelles  j  &  S.  Joaó 
era  hum  valido ,  de  quem 
diz  o  Evangelina  :  Recu^ 
hmtfupra  peãuí  ^Dominii]cihi^. 
Queeíteve  encoítado  íb-***^ 
breopeitode  feu  Senhor. 
Lindo  talento  de  valido! 
Em  vez  de  o  Príncipe  dç;{* 
cançar  nelle,  elle  defcança 
no  Príncipe/ 

§.  II. 

373  /"^Omiftoferc- 
V^>prefentar  af- 
íim,  cu  acho  duas  razoens 
muito  forço fas  para  o 
Príncipe  N.S.fe  affeiçoar 
a  elle  grande  valido  de 
Chri- 


A 


S.loãdEwtígeVfia.  ,      .    4^7 

Chriílo.  Aprimeira,pelas     porque  o  foi  pnmeiro  do 
partesdo valido :  a  fegun-     SereniíTimo D.  Theodoíio 
da, pela   authorídade   de    feuAvo:  EttamT>omtno 
quem  o  inculcou.    Quiz    anja  noftro  lauãabútter  aã- 
ElRey  Athahrico  tomar     hsfiffe.  Sendo S.A.demui- 
porfeuvalído  a  Tholoni-     to  menos  annos  fonhou> 
CO  patrício  Romano  ,  &     qire  lhe  aparecia  o  Senhor 
cfcreveolhe  aíTim  em  húa    Dom  Theodoíio  >  &  que 
Epiílola,  que  he  a  nona  dó    lhe  encomendava  muito , 
livro 8.de  Cafriodoro :  Ad    que  foíFe  grande  devoto 
relevandãjlorenúfmaata*    de  S. JoaÓ  Evangeliflra ,  de 
tis  mftr/folíCítudinem  vé^    quem  eíle  toda  a  vida  fora 
fumeftte  wum  prudentif^    devotiíTimo.  Náo  foieíia 
fimum adhibere,  quem  con*    a vèz primeira  5 quetelíci. 
f{atetíamT>omino  dvo  no-    dades  de  S.  Joaò  tiv^-ao 
0rô  laudabiUter  adhafijf^.    principio  em  fonhos.  Eíte 
Querovos  por  cópanhei-    íbnho  myftcriofo   toi  o 
rono  governo  deftes  meus    principio  defta  devaçao:ôc 
primeiros  annos,dizAtha-    efta  herança  dmna  foi  a 
larico  a  Tholonico,  por    que  deixou  a  hu  tal  Meto 

.  duas  razoens-.porq  tendei  hum  Cal  Avo. 
prudência  para  o  fer  ,  &  ^n  Jà  outrji  vez  ao 
porque  o  foíles  primeiro  pé  daCruz  foi  S.  João  is- 
do  Senhor  Theodorico  vangeliíla  deixado  em  he- 
meu  avo  :  ^em  conftat  rança;  Sc  a  meuver,eftehe 
etiam  Domino  avo  noftro  hum  dos  grandes  louvores 
laudahiliteradhajiJfe.^E^^s  doDifcipulo  amado  :  ler 
mefmas  faó  asrazoens,que  hum  am  Jgo,de  quemiepo- 
oPrincipe,queDeosguar-  deteftar.  Hum  dos  gran- 
de,tcm  para  fer  taô  affei-  desefcandalos,  que  tenho 
coado  a  eíle  grande  valido    do  mundo,  he ,  -porque  íe 

•  àe  Chriílo.   A  primeira^    nãohade  teftar  dos  ami- 

porque  tem  grandes   par-     gos?  Na  morte  teílaò  os 

tes  para  o  fer  :  a  re<5unda ,     homes  de  todos  feus  bens, 

^  "  Ce  iiij         &pojs 


a 


(>; 


Joann. 


408 

&  por  eíTa  mefma  razaó 
parece,  que  haviaó  de  te- 
ftar  dos  amigos  em  pri- 
meiro lugarj  porque  entre 
todos  os  bens,  nenhú  bem 
ha  maior  que  os  amigos, 6c 
entre  todas  as  coufas  nof- 
fas  ^nenhuahe  mais  noíTa 
que  os  amigos.  Pois  fe  os 
amigos  faó  os  noílbs  ma- 
iores bens ,  &  os  bens  mais 


Sermão  de 

rusmortuuseft:  Lazaro  he 
morto.  Notável  diííercn- 
ça!  Quando  Chriílo  diz 
que  Lazaro  dorme  ,  cha- 
malhe  amigo  noíTo  :  La- 
zartis  amicus  no/ter  dormit-, 
quando  diz  que  Lazaro 
he  morto,  naô  lhe  chama 
amigo  :  Lazaras  mortuus 
efl.  Pois  fe  lhe  chama  ami- 
go quando  diíTe  que  dor- 


rbid.14 


noíTos,  porque  naÓ  tefta-     mia,  porque  não  Ihecha 
mos  delles  ?  A  razáo  heef-     ma  amigo  ,  quando  diíTe 


ta  j  porque  os  bens  de  que 
teftaó,&  podem   teílar  os 
homens,  faóaquelles,  que 
permanecem    depois    da 
morte  j  &:osamigos,ainda 
quefejaó  os  noíTos  maio- 
res bens,  faó  bens  que  fe 
acabaócomavida.  O  ma- 
ior amigo  permanece  ate 
a  morte,  depois  da  morte 
ninguém  he  amigo.  Mor- 
reo  Lazaro  eftando  Chri- 
ílo aufente  i  &  he  muito 
de  reparar  o  modo  có  que 
Chriílo  Senhor  noíTo  deo 
efta  nova  aos  Apoílolos. 
A  primeira  vez  diíTe:  La- 
zarus  aniicus  nofter  dor  mi  t. 
Lazaro  nofib  amigo  dor- 
me.   Dahi  a  pouco expli- 
coufe  maisjôc  diíle:  La;^a' 


que  morrera  .^Porq  quan 
dodiífe  que  dormia,  íu- 
punha-ovivo;  que  o  dor- 
mir em  rigor  he  de  quem 
vive  >  quando   diífe  que 
morrcrajdeclarava-o  mor- 
to :  &  o  nome  de  amigo 
acabafe  com  a  vida  :   de- 
pois da  morte  ninguém  he 
amigo.     Lazaro  vivo  he 
amigo  :  L  azar  lis   amicus 
nofter  y  Lazaro  morto  he 
Lazaro :  Lazarus  mortuus 
eft.  E  como  as  amizades 
humanas  faó  bens  que  naó 
permanecem    depois    da 
morte,  por iíTo  os  homens 
naó  teílaó  deíles  bens,  por 
iílòfcnaódeixaò  os  ami- 
gos cm  teíiamento.  Sò  S. 
joaóEvãgcliihi  foi  cxcei- 
çáo 


à 


■^- 


|oinn 
ip  ió 


S.loaÕEi^angelifta.  409 

çaõdefta  regra,  como  de     com  a  morte:  as  finezas  do 


todas.  Fez  Chriftofeutc- 
ftamentonahora  da  mor- 
te, &  a  principal  herança 
de  que  teílou ,  foi  S.  Joaó : 
Mu líer^eccefilius  tuus .  S a- 
bíaqoamor  do  feu  ama- 
do naófe  havia  de  acabar 
com  a  vida  j  por  iííb  foi  a 
herança  principal  de  feu 
tefta  mento. 

374,    No  Sacramento 
da  [^luchariftia  confagrou 


fangue  de  Chrifto  ainda 
depois  da  morte  perfeve- 
ráraó.  O  corpo  de  Chrifto 
concorreo  a  redempçaó, 
padecendo  j  o  fangue  de 
Chrifto  concorreo  à  re- 
dempçaó,  derramandofe: 
pois  por  iíTo  teílou  Chri- 
íto  de  feu  fangue, &  náo  te- 
ílou de  feu  corpo ,  porque 
o  corpo  depois  da  morte 
naópadeceo,  o  fangue  de- 


Chrirto    igualmente  feu     pois  da  morte  ainda  fe  der- 
corpo,&  fangue  ;  mas  no     rzmo\x'.Exivit  Janguis.EÇ- 


modo  da  confagraçáo  re 
paro  eu  em  húa  differen- 
ça  grande.  A  confagraçaó 
do  CalizjchatnoulheChri- 
fto  teftamcnto :  Hic  Cálix 
Lnc.22.  novum  teftamentum  eji  tn 
^'      me  o  fangume  :  à  confagra 


fa  foi  a  caufa  porque  ad-  ip^^".' 
vertidamente  o  E vangeli- 
ftafallando  da  lança,  naò 
diíle  que  ferira,  fenaó  que 
abrira :  Latus  ejm  aperuit :  ''^'^■ 
porque  a  lançada  nam  foi 
ferida  para  o  corpo  ,  foi 


Ibid-ip. 


çaó  do  corpo  naó  lhe  cha-     porta  para  o  fangue :  nam 
mouteílamento  ;  Hoc  eft     foi  ferida  para  o  corpo, 


corpus  meum-t^  nam  diíTe 
mais.  Pois  fe  Chrifto  cha- 
ma teílamento  ao  fangue, 
porque  naô  chama  teíla- 
mento  ao  corpo  >  6c  fe  te- 
ílou do  íàngue,porque  naó 
teílou  do  corpo  ^  A  razaó 
muito  a  noíTo  intento  hc 
eílaj  porque  as  finezas  do 


porque  o  corpo  naô  a  {cri- 
tio ',  foi  porta  para  o  fanr 
gue,porque  o  fangue  fahio 
por  ella :  Exivitfanguis.  E 
como  no  corpo  áç^^ois  de 
morto  naó  havia  fentimê- 
to  para  padecer,  &  no  fan- 
gue depois  da  morte  ainda 
havia  impulfos  para  fair. 


corpo  de  Chriílo  acabarão     por  iífo  ^teílou  Chriílo  de 

feu 


41  o  Sermão  de 

fcu  fangue,&não  de  feu     noíTo  Senhor.  Provo  em 


corpo  :  Hic  Cálix  novum 
tejlamentumeft  in  meofayf 
guine-.  Oh  divino  JoáOjque 
bem  moftrais  fer  Tangue 
de  Chriíto  na  fineza  de 
voíla  amizade!  Náo  fe  aca- 
barão roflas  finezas  coma 
morte,  antes  depois  que 
Chriftomorreo  por  vós, 
morreíles  vòs  mais  por 


próprios  termos.  Quando 
Chrill:ofezo  feu  teftamc- 
to  n^  Cruz,  teve  duas  cou- 
fas  de  que  teílar  r  teílou  do 
Reynoj&teíloudeS.íoão. 
Saibamos:  E  a  quem  dei- 
xou eíles  dous  legados  ?  O 
Reynodeixou-oa  Dimas, 
S.  loão  deixou-o  a  fua 
Máy.  Pois  como  aíIim,Se- 


elIc-poriíToteílou  de  vòs    nhor,  parece  que  fe  ha  viaó 
voílbMeftre  :  por  iíío  te-    de  trocar  os   legados  :  o 


ílárãódevòs  noíTos  Prin 
cipes. 

37f  Ora  eu  me  puz  a 
confiderar  em  razáo  de 
herdeiro  ,  a  qual  devia 
mais  o  Principe,  que  Deos 
guarde,  fe  a  ÈlRey  noíTo 
Senhor,  fe  ao  Senhor  Dom 
Theodofio  .?  Em  quanto 
herdeiro  delRey  noííb  Se 


Difcipulo  bailava  deixalo 
a  hum  amigo  ,  o  Reyno 
convinha deixalo  à  Máy: 
pois  porque  deixa  o  Difci- 
pulo à  Máy,  &  o  Reyno  a 
Dimas  .^  Porque  a  quem 
Chrift-o  amava  mais,  era 
bem  que  deixaíFe  o  me- 
lhor legado.  E  có  o  Reyno 
de  Chriílo  fer  o  melhor  do 


nhor,  a  herança  heoRey-  mundo,  àMáy,a  quê  a  ma- 
no de  Portugal :  em  quan-  va  mais,  deixou  a  íoaó ,  a 
to  herdeiro  do  Senhor  D.  Dimas,a  quem  amava  me- 
Theodofio,  a  herança  he  nos,  deixou  o  Reyno.  Por- 
S.Joaó  Evangelifta.  Poisa  que  muito  menor  herança 
qual  deve  mais  S.  A.em  ra-  era  o  Reyno,do  queloaó. 
zaó  de  herdeiro  .<*  Naó  ha  S.  Ambrofioexpreííli  ,  & 


duvida  5  Senhor,  que  em 
razaó  de  herdeiro  deve  V. 
A.  mais  ao  Senhor  Dom 
Theodofio  ,  qucaElRcy 


eftremadamentc  .•  Matri 
dixit-.Ecce filius  títtis: :  La^  ^^, 
troni  dixit-  liodic  mccií  eris 
in  Taradifo :  plurisfinans^ 


í.  III. 


5*.  haõ  Evangelifia.  '  41 1 

qiiodpietatts  officia  divide- 
bat^  quàm  quod  Reg?iu  C^- 

kãe  donabat.  A  May  ,  a  -n  •      •     t 

quemamava  mais,  deo  a  37^  A  Pnmeiraboa 
loaó,  a  Dimas,  a  quê  ama-  't\  parte,  que  eu 

va  menos,  deo  o  Reyno :  reconheço  em  S.Ioaò para 
porque  pondo  em  fiel  ba-  valido,  he  fer  E  vangelifta. 
lança  de  húa  parte  o  Rey-  Os  validos  haó  de  fer  E- 
no  do  Ceo ,  de  outra  parte  vangeliílas.  O  oíficio  dos 
a  S.Ioão ,  entendeo  Chri-  Erangeliftas  he  dizer  ver- 
fto,que  dava  mais  a  Ília  dade  5  &  os  validos  haó  de 
Máy  em  lhe  dar  a  Joaó,  do  ter  o  dizer  verdade  por  oh 
que  a  Dimas  em  lhe  dar  o  ficio.  Alguns  homens  tem 
^  —'    ^  ^  '    havido  Evangelizas,  mui- 

tos homens  tem  havida 
vahdos :  mas  valido,  6c  E- 
vangelifta  juntamente  fó 
S.Ioaóo  foi.  A  razaó,ou 
fem-razão  diílo  he  ;  porq 
os  q  faó  validos  não  que- 
rem fer  Evangelizas:  &  os 


É^cjaoiTlíirisputans^qmd 
pietatis  oficia  diviaebaty 
fuàm  qmd  Regnum  Cdtlefle 
dynabat.  E  feSJoaó  fem 
lifonja  he  melhor  herança, 
que  o  Reyno  do  Ceo,  fem 
ingratidão  podemos  di- 
zer, que  he  melhor  heran-    

ca  também,  que  o  noífo  de  que  faó  Evangeliftas  nam 

Portugal.  chegaó  a  fer  validos.   Sq 

Efta  he  a  primeira  ra-  em  S.  loão  feajuntáraó  ef- 

zão,&;  mui  juftiíicada,  que  tas  duas  propriedades,  das 

S.  A.  tem  para  fer  mui  af-  quaes  fe  compõem  a  ma- 

fedo  ao  grande  v  alido  de  ior  prerogativa  fua.  Sabeis 

Chrifto,  por  fer  herança  qual   he   a  mais  finguiaif 

do  Senhor  Dom  Theodo-  prerogativa  do  Evaugelir 

fiofeuAvo.  Aíegundahe,  ftaamado?  Heferamado 

pelas  boas  partes,  que  em  íendo  Evangeíiíla.  R^P^- 

S  Joaó  fe  achaó  para  vali-  ro  eu  muito  no  noíTo  Evã^ 

dp>como  agora  veremos.  gelho  em  húa  coufa  em 

que  naó  vejo  reparar.   ^^ 


^12  Sermão  de 

joann  jc^j^^s  quid  veTum  efl  tefti-     Ter  amados.  Oh  que  gran- 


W^: 


monmme]us\  diz  S.  Joaó 
por  fim  de  feu  Evangelho, 
que  tudo  o  que  diz  nelle 
he  verdade.  Ociofa  adver- 
tencia,ao  que  parece,  por 
certo.  Leãofe  todos  os  E- 
vangeliftas,  &  nenhum  fe 
achará,  que  fízeíTe  feme- 
Ihante  advertência. Pois  fe 
Gs  outros  Evágeliftas  naó 
dizim  que  he  verdade  o 
que  efcrevéraó  5  porque 
cizS  íoão,  que  he  verda- 
de o  q  le  efçreveo  ?  Náo 


de  gloria  de  Chrifto!  óq 
grande  gloria  de  loáo  í 
Grande  gloria  de  Chnílo, 
que  o  feu  amado  feja  hum 
>  vangelifta  :  grande  glo- 
ria de  loaó,  que  fendo  E- 
vangeliíla  feja  o  amado. 
Masiílo  naó  fe  acha  em 
toda  a  parte:  fó  na  Corte 
do  Ceo,&:  na  de  Portugal ; 
íóno  Principe  da  Gloria, 
&no  noífo  Principe.  O  q 
importa, Senhor  ,he,que 
feja  fempre  aílim.  Os  ama- 


tij  ha  Igual  authoridade  ?     dos  fejaó  fó  os  Evangeli- 
Náo  era   Evangelifta  co-     ftas:  Sequem  naó  for  Evá- 


mo  os  demais  ?  Sim  era, 
mas  era  Evangeliíla  ama- 
do •,&  porque  o  amor  po- 
dia fazer  foípeitofa  a  ver- 
dade, advertio,  que  ainda 
que  era  amado,  era  verda- 
deiro: 'Dífcipulum  quem  di- 
ligebat :  (^fcimtis  qnia  ve- 
rum] e/l  tejimonhim  ejus. 
Ordinariamente  nas  Cor- 
tes dos  Principcs,  os  que 
contrafazem  a  verdade, 
faó  os  q  grangcáo  o  amor. 
Na  Corre  de  Chriílo  naó 
heaflimios  que  tem  por 
profiífaó  fer  verdadeiros, 
iàó  os  que  tem  por  premio 


gelifta,  naò  feja  amado. 

377  Equalhca  razão 
porque  os  Evágeliíhs  de- 
ve fer  os  amados.^  A  razaó 
he  evidente:  porque  o  ma- 
ior merecimento  para  fer 
amadojhe  amar,6c  a  maior 
prova  de  amar  ,  he  filiar 
verdade.  Perguntou  Dali- 
la a  Sanfaó  por  trcs  vezes, 
em  que  parte  tinha  vincu- 
lada fua  fortaleza,  iSc  que 
remédio  podia  harcrpara 
fer  vencido  ^  Rcfpondco 
Sanfaó  a  primeira  vez, que 
fc  o  atalfcm  fortemcnrc 
com  nervos :  a  fcgúda  vez, 
que 


S.loaÕ  Evangelifta.  41 1 

que fe o ataíTem  com  cor-  'vices mentitus esmihi.  Pela 

das :  a  terceira  vez,  que  fe  primeirafalfidade  em  que 

o  ataíTem  com   oscabel-  ovaíTailofor  achado  ,  ha 

los  5  mas  de  todas  as  três  de  cair  logo  da  graça  do 

vezes  rompeo  elle  çom  fa-  Principe,  &  cair  para  fem-. 

cilidade    as    ataduras.  E  pre.  Parece  demafiado  ri- 


que  faria  Dalila  vendofe 
aílim   enganada  ?   C^ei- 
xoufe  muito  de  Sanfaó : 
diíTe^que  fabia  de  certo, 
que  a  n^ió  amava ,  ^  fez- 
Ihe  efte  argumento,*  ^ííí7- 
modo  dicis  quod  amas  me  ? 
per  três  vices  mentitus  es 
mihi\  Como  dizes  tUjSan- 
íàój  que  me  amas,  fe  me 
mentifte  três  vezes  ?  Bem 
tirada  confequencia :  mê^ 
tifl:eme,logo  naò  me  amas. 
A  confequencia  he  clara: 
porque  amar  he  entregar 
o  coração  ,  mentir  he  en- 
eobrilo:  bemfe  fegue  lo- 
go, que  quem  nao  falia 
verdade,  naó  ama ;  porque 
como  ha  de  entregar  o  co- 
ração, quem  o    encobre? 
De  maneira ,  que  da  ver- 
dade de  cada   hum  pòdc 
julgar  o  Principe   o  feu 
amor  :  com  advertência 
porém  ,  que  naó  deve  ef- 
perar, como   Dalila,  pela 
terceira  mentira ;  Ter  três 


gorjporq  agraça  deDeos 
naô  fe  perde  por  qualquer 
mentira:  bem  pôde  hum 
homem  naò  fallar  verda- 
de, &  mais  ficar  em  graça 
de  Deos.  Com   tudo  no 
Principe  naò  he  bem  que 
fejaaííim.  Porque  ?  Por(| 
para  Deos,  que   conhece 
os  coraçoens  ,  bem  pôde 
haver  mentiras  veniaes, 
mas  para  quem  os  naò  co- 
nhece, todas  he  bem  que 
fejaò  mortaes,&  que  por 
todas  fe  perca  a  graça.  A 
graça  confiíle   no  amor: 
quem  naò  falia  verdade^ 
naó  ama-,logo  onde  fe  pro« 
va  o  defamor ,  bem  he  que 
fe  perca  a  graça.  Percafe  a 
graça ,  onde  fe  provar  o 
defamor,  que  hea  menti* 
ra  :  ganhefe  a  graça,  onde 
fó  fe  provar  o  amor^que  he 
a  verdade:  &  andem  jim- 
tos  çomoem  S.Ioaò  o  titu- 
lo de  Evani^eliíla  com  jò 
de  amado, 

Naé> 


f 


4,144  SermaÕ  de 

lf%     Naó   fou  amigo     cas ,  diíTe-as  S. 
de  deixar  duvidas  na  mi- 


nha doutrina.  Todos  me 
eftaó  pondo  contra  efta 
húa  grande  inftancia.  S. 
Alatheus,  S.Marcos,S. Lu- 
cas também  foraó  Evan- 
geliftas  j  com  tudo  não  al- 
cançarão privilegio  de 
amados:  logo  S.Joaó  naó 
foi  amado  por  fer  Evan- 
geliíla;  &  fe  foi  amado  por 
Evangelifta,  qual  he  a  ma- 
ior razão  ?  A  maior  razaó 
he  efl-a:  porque  S,  loaó  E- 
vangelirta,  como  notou  S. 
leronymo,  diíTe  no  feu  E- 
vangelho  muitas  coufas, 
que  os  outros  Evangeli- 
rias  deixarão  de  dizer :  & 
dizer  as  verdades ,  que  os 
outros  dizem  5  não  he  ac- 
ção que  mereça  ílngular 
amor  i  mas  dizer  as  verda- 
des, que  os  outros  deixaó 
de  dizer  ,  quem  iíiofaz, 
merece  fer  fingularmente 
amado.  As  verdades  que 
diífeS.  Mathcus,  diíTe-as 
S.  Marcos,  diíle-as  S.  Lu- 
cas :ns  verdades  quediíTe 
S.  Marcos,  diflè-as  S.  Lu- 
cas, diíle-asS.  Matheustas 
verdadçs  quç  diffç  §,  Lu,- 


Matheus, 
diíle-as  S.  Marcos  :  mas 
muitas  verdades  quedifle 
S.Ioão,naóasdine  S  Ma- 
theus, nem  S.Marcos,nem 
S.Lucasj  elle  fó  as  diíTe. 
E  quem  fabe  dizer  as  ver- 
dades, que  todos  os  outros 
callão,  elle  fó  merece  fer 
mais  amado  que  todos. 
Não  ha  de  fer  o  amado 
quem  calla  as  verdades, 
que  os  outros  dizemjfcnaó 
quem  djz  as  verdades,que 
os  outros  callão.  AíTim  o 
fez  S.  Ioão,&  por  iíTo  foi  o 
íingularméte  amado:  T>if' 
cifulum  qtiem  dtligebat. 


§•  IV. 


379 


ASegúda  qua- 
lidade de  va- 
lido que  teve  S.  loão,  &  a 
que  cu  admiro  muito  nc- 
ííe  grande  Santo,  he  fer  hú 
valido,quc  ficou  aflim  :  S/c 
etim  'uolo  mancre.  Pergun- 
tou S.  Pedro  a  Chriflo; 
domine ,  hic  atitem  qiúd  ^ 
Senhor,fc  a  mim  me  fazeis 
Principcda  voíTli  Igreja, 
S.loaòjovonb  valído,que 
hwi  de  fer  ?  Keípondeo  o 
Se- 


S.loaÕE^vangeliJia.  415' 

Senhor:  Si c  eiím  volo  ma-     mais  acomodada    para  o 


iíére  :  Quero  q  fique  aílim. 
Eíla  he,  a  meu  ver,  huma 
das  grandes  excellencias 
do  Evangelifta  ,  fer  hum 
valído,que  ficou  aílim.  Ser 
vali  do,&- ficar  logo  de  ou- 
tra maneira  ,  iíTo  acontece 
a  todos,  mas  fer  valido,  & 
ficar  aílim  como  dantes, he 
íingularidade  de  S.  loaó. 
S.  Pedro,  que  media  a  S. 
loáo  pelos  outros  validos 


que  Deos  pertendia.  Deos 
de  hiãa  pequena  parte  de 
Adaõqueria  fa^er  fubita- 
mente  húa  Eva,  que  foífe 
taó  grande  como  elle;  pois 
por  iíTo  a  formou  do  lado, 
&c  naó  doutra  parte  j  por- 
que he  propriedade  dos 
lados  crecer  muito  em 
pouco  tempo.  Ainda  ago- 
ra coíla,6c  jà  Eva  ?  Ainda 
agora  húa  parte   taô   pe- 


imaginava  que  havia  de     quenadoladode  Adáo,  & 


crecer  muito  com  o  vali 
mento  :  Hic  autem  quid^ 
Mas  S.  íoaó,  que  fe  media 
confígo  ,  ficoufe  aíIIm  co- 
mo dantes  era :  Sic  eum  v&' 
lo  manére. 

380     Húa  das  circun- 
ílancias   em   que  reparo 


tà  taó  grande  como  o  mef- 
mo  todo  de  que  era  parte? 
Sim  :  porque  a  colla  era 
parte  do  lado  de  Adão. 
Adaó  era  Principeuniver- 
fal  de  todo  o  criado:  &  naó 
hacoufa  que  mais  creça, 
nem  mais  depreíTa,  que  os 


muito  na  criação  do  mun-     lados  dos  Principes.  Veja 
dojheformarDeosa  Eva     feem  lofeph  com  ElRey 


do  iado  de  Adão-  ;  naó  a 
pudera  formar  da  cabeça , 
para  que  fora  entendida.^ 
Não  a  pudera  formar  das 
mãos,  para  que  fora  exe- 


Faraò  :  vejafe  em  A  mão 
com  ElRey  AíTuero  :  ve- 
jafe em  Daniel  cõ  ElRey 
Dário.  E  que  fendo  taô  na- 
tural o  crecer   nos  lados 


cutiva  ?  Não  a  pudera  for-     dos  Principes,  que  S.Ioaô, 
mar  dos  pès,  para  que  fora     que  era  o   lado  do  maiov 


diligente  ?  Pois  porque  a 
forma  do  lado  .^  Porque  o 
lado  de  Adáo  era  a  parte 


Priticipe  do  mundo>nam 

trataíTede  screcentamen- 

to^&fç  deixaíie  iicar  aili  m: 

Sic 


f 


^m 


Cant. 
7-7' 


*^i 


4IÓ 


■Sermão  de 


Síc  etim  vólo  manère  ?  Gra- 
de excellencia  do  Evano;e- 
Ma! 

381  Trescoufas  hane- 
íte  múdojque  fempre  cre- 
cem,  &  nunca  ficáo  aíllm : 
húa  faz  a  natureza  ,  outra 


-rli 


melhorando  yàclaritntein  -  ^p 
clarttatem  ,  como  diz  S. 
Paulo.  Eíla  he  a  cílatura 
das  palmas  alentadas  pela 
natureza  j  eíla  he  a  eftatu- 
ra  dos  Santos  infpirados 
pela  graça  -,  &  efta  he  a  ef- 


fiiz  a  graça,  outra  faz  a  for-     tatura  dos  validos  aíTopra- 


tuna.  A  natureza  as  pai 
mas:  a  graça  os  Santos:  a 
fortuna  os  validos.  A  eíla- 
tura  da  Alma  Santa  diziaó 
as  outras  Almas  fuás  com- 
panheiras ,  que  erafeme- 
Ihante  à  palma  :  St  atura 
tuaafftmilata  eji  palma.  E 
porque  mais  à  palma  ,  que 
a  outro  corpo  bizarro,  Sc 
viftofo  de  quantos  criou 
nos  campos  a  natureza  ? 


dos  pela  fortuna.  Eílatura 
que  por  mais  crecida  ,  & 
por  mais  remontada  atè 
as  nuvens  que  a  vejamos, 
fempre  crece  mais,&mais. 
E  fenão  lembraivos  dos 
três  que  agora  dizia,  Deo 
Jacob  por  béçáo-a  Jofeph> 
que  creceíle  fempre  :  Fi-  cca^c 
Ims  accr t/cens  lo feph,  f/ms  i?  -»• 
acere/cens:  &:ondefecum- 
prio  cila  benção  ?  Na  pri- 


Porquc  todas  as  outras  ar-     vança,Sc  valimento  de  Fa- 
vores, ainda  que  fejaó  os     raò.  Amam  graó  privado 


cedros  mais  gigantes  do 
Libano,tem  limite  no  cre- 
cer ,  &  termo  na  cílatura : 
fó  a  palma  náo  ,  fempre 
crece.  Taes  faó  as  almas 
dos  Santos.  Como  a  vir- 
tude não  tem  termojcomo 
a  perfeição  náo  tem  limi- 
te, fempre  eltão  crecendo 
na  virtude  ,  fempre  eílaó 


de  AíTuero  ,  atè  o  dia  em 
que  acabou  creceoj  &  por- 
que não  teve  mais  para  on- 
de crecerjacabou.  Pareceo 
defgraça5&  foi  natureza; 
que  aíllm  acontece  à  pal- 
ma, ou  crecer,  ou  acabar. 
Daniel  na  privança  de  Dá- 
rio, tendo  fubido  a  fer  hú 
dos  três  fuprcmos  Princi- 


fubindo  na  perfeiçào,fcm-     pes  de  toda  a  Monarchia , 
prefeeítáQ  renovando,  6ç    ainda  q  Rcy  queria  que 

cre- 


S.loão  Evangelifta,  41 7 

crcceílc  mais ,  &  que  foífe     crece  a  eftatura  dos  mef- 

_  ..       .  1  iTTt 


cUefófobre todos  -.Torro 
Rex  cogitabat  conflituere 
etm  fuper  omne  Regnum, 
Offenderaòfe  os  grandes 
de  tanto  crecer :  5c  o  remé- 
dio que  inventarão  para 


mos  adorados.  Hontem 
Pygmeos,  hoje  homens, à 
menháa  Gigantes,  o  outro 
dia  ColoíTos  Pefamedeíla 
ultima  comparação,  por- 
que quando  lhe  acrecentei 


qiicnaó  creceíTe  mais  Da-  a  grandeza,  lhe  tirei  a  ai- 
mel,  foi  bufcaremlhe  oc-  ma.  NáoaíTimomaiorv^ 
cafiaó  com  que  o  tiraíTem  lido  do  maior  Príncipe  b, 
doladodoRey.  Na5  he  ]Q2.Q'.Sic€umvolo  manére. 
frafefódanoíTalinguajfe-  Sempre  ficou  na  mefma 
naó  do  meímo  Texto  fa-  eílatura,  fempre  fe  confer- 
s;rado  :  Vnãe  Trincipes,  &  vou  do  niefmo  tanianho, 
fatraP£  qiiarebant  occafio-  &  nem  apparencias  de  ma- 
nem^ut  mvtnirent  Tímielí  ioría  lhe  grangeou  o  lado. 
èlatere  Regis.  Do  lado  o  Levantoufe  queíláocn- 
querião  tirar,  porque  do  treos  Apoftolos,qualde.^ 
lado  lhe  vinha  o  crecer.  lesfoíTemaiorP^/^^m/^^íLuc 
Não  fei  que  influencias  té  vtderetur  effe  mmor  >  Efta  ^^• 
o  lado  do  Príncipe  ,  que  queílão,ameujuizo,  foi  o 
cm  todo  ea-e  elemento  em  maior  louvor  de  S.  loão. 
que  vivemos,  náo  ha  parte  Que  feja  S.  loãoremquc- 
táo  fértil  ,  &  táo  fecunda  ftão  o  valido,  &:  que  ainda 
comoaquellesdouspèsde  efteja  em  queftáo  quem 
terra ;  tudo  alli  fe  dà,  tudo  he  o  maior  !  Grande  lou- 
■      ""  vor  de  valido  í  Naquella 

mefma  hora  ,  &naquelle 
mefmo  lugar  em  que  fe  le- 
yantou  a  queftão,que  foi  à 
mefa  da  cea,  tinha  Chriílo 
feito  publica  entrega  do 
feuladoa  S.  loão  5  ac  na- 


alli  medra,  tudo  alli  crece. 
Crecem  os  parentes  ,  os 
amigos,  os  cnados.xrecem 
as  honras,  os  poílos ,  os  tí- 
tulos :  crece  acafa,a  fazen- 
da, o  regalo  :  crece  o  po- 
der, o  dominiojO  refpeito. 


a  adoração ,  &  fobre  tudo     quella  mefma  hora ,  &  na- 
Tom./,  I>d         qucHa 


4^S  Ser  mau  de 

quella  merma  mefa  fe  ú-     retiir.  E  tinha  crecido,  & 


4 


nha  S.Pedro  valido  defua 
valia ,  para  faber  por  elle  o 
fegredo  do  traidorj&elle  o 
tinha  perguntado  a  Chri- 
ílo.  Pois  íe  o  valimento  de 
S.  Joaó  eílavataó  declara- 
do, fe  o  lado  do  fea  VáwQx.- 
pe  lhe  eílava  taó  publica- 
mente entregue  todo  ,  & 
fóa  elle  ;  como  duvidaó 
ainda  os  Apoílolos,  &  có- 
tendem  fobre  qual  dos  do- 
2eheomaior.?  Náo  eílà 
claro,  que  o  maior  entre 


medrado  taó  pouco  S. 
loão  com  o  feu  valimento, 
que  todos  os  outros  Apo- 
ííolosnaó  fó  podiaó  plei- 
tear com  ellea  maioría,re- 
não  amda  as  apparencias. 
De  forte  que  no  cume  da 
fua  privança,  Sr  no  mais 
fubido,&  remótado  do  feu 
valimento,  naófónaóera 
maior,  mas  nem  o  parecia: 
^ús  eoYum  videret  ur.  S  o 
iftohe  ficar  aíilm. 

382   Mas  nefte  ficar  af- 


todoshejoaó  ?  AíTim  ha-     fim  de  S.  loão,  quem  ficou 
via  de  fer,feJoaó  naó  fora     mais  acreditado,  o  lado,ou 


hum  valido,  que  ficou  af- 
íim.  EraS.  loáo  tanto  do 
feu  tamanho  fempre  ,  taó 
medido  com  a  fua  eílatu- 
ra,sS:  taò  igual  fó  configo, 
que  por  mais  que  creciam 
os  valimentos  ,  elle  fem- 
pre fe  ficava  afilm  como 
dantes  era:  na  valia  era 
fem  contenda  o  maior, 
mas  na  maioria  como  os 
demais:  ^ús eorum  víd^.' 
retureffe  maior.  E  notai, 
que  a  contenda  em  rigor 
naó  foi  fobre  quem  era  o 
maior,fcnaó  fobre  quem  o 
parecia  : .  ^is  eoriim  vide- 


o  valido  ?   Eu  cuido  que 
ambos.    Afilm  como  nos 
validos,  que  náo  ficão  af- 
fim,  tanto  heo  deícredito 
dos  validos,como  o  dos  la- 
dosi  afiim  nefie  grande  va- 
Jídojque  ficou  aílim  ,   taó 
acreditado  ficou   o  lado, 
como  o  valido.   Não  fiava 
taó  delgado    como  ifio  a 
máy  de  S,  loão,  &  fiada  no 
fangue    que    corre  pelas 
veas,pedioa  Chrifiopara 
cada    hum  de  feus  filhos 
hum  dos  lados,  &  hua  das 
maiores  cadeiras  do  Rey- 
no  :  "Dic  iitjcdeant  hi  duo 

fijj 


tfhtfli 


S.loao.E 
filij  mel ,  iinns  addexteram, 
é'  alitís  aãfiniftram  in  Reg- 
no  r//í>.  NaódiffirioChri- 
ílo  porentaó  ,  mas  a  feu 
tempo  de  a  metade  deíla 
petição  fez   dous   defpa- 
chos  :  deo  hum  lado  a  S. 
loâoj&cdeo  húa  cadeira  a 
S.  Pedro.  Pois fe  a  mãy  pe- 
dia para  S.Ioão  a  cadeira, 
&  mais  o  lado,  porque  lhe 
naódeoChriftoo  lado^Sc 
mais  a  cadeira  ?  E  jà  que 
lhe  naòquiz  dar  ambas  as 
coufas  que  pedia  ,  fenaó 
hua  fó,  porque  lhe  na6  deo 
a  cadeira  ,  fenaó  o  lado  ? 
Deolheolado,&naó  a  ca- 
deira, para  acreditar  o  la- 
doj&deolheo  lado  fem  a 
cadeira,  para  acreditar  a  S. 
loaó.Sc  Chrifto  amando  a 
S.  loaó   mais  que  a  todos 
lhe  naó  dera  o  ladojfcnaó  a 
cadeira,  moftrava  que  eíti- 
mavamaisa  cadeira,  que 
o  lado  J&:  era  defacreditar 
o  lado :  &  fe  lhe  déíTe  o  la- 
do,&:a  cadeira  juntamen- 
te, moftrava  que  S.  loaó 
naõ  fò  eftimava5&  queria 
o  lado  ,  fenaó  também  a 
cadeira  5  &  era  defacredi- 
tar a  S»l9áo.  PoriiTolhe 


Vãngeliftd.  ^  4^^ 

naó  deo  a  cadeira,  fenaó  o 
lado,  &poriírolhe  deo  o 
ladofem  a  cadeira.  Que- 
rer antes  a  cadeira,  que  o 
lado,  he  afrontar  o  lado: 
querer  olado3&;  mais  a  ca-  ^. 
deira,he  afrontarfe  o  va- 
lido: querer  o  ladoj&nao 
querer  a  cadeira,  he  honra 
do  v,alido,8c  mais  do  lado. 
Ifto  he  o  queninguê  faz, 
iftohe  o  que  fez  S  Ioaò,& 
iílo  o  que  Chrifto  queria  ; 
q  foíTe  feu  valido  S.Ioaó,& 
que  fendo  valido  feu,  fe  íi- 
caíTe  aíTitn  :  Sic  eum  volo 
manére. 

§.  V. 

38 j     A  Terceira  qua- 
jnLlidade   admi- 
ravel,que  refpíandece  no 
Evangelifta,  foi  fer  hum 
valido,  que  fez  do  fegredo 
ignorância.   Hum  dos  ar- 
gumentos de  feu  valimen- 
to,que  S.Ioáoallega  nefte 
Evangelho,  foi pergun^tar 
a  Chrifto :  ^h  í>ft,qui  tra-  j^^^^ 
dette  ?  Quem  era  o  trai-  21-^0. 
dor,que  o  havia  de  entre- 
gar? Refpondeolhe  o  Se- 
ílhorjque  era  Judas:&acre- 
Ddij        centa 


420 


ccntao  Evangelifl"a :  Hoc 


Sermão  de 
dãoofeí 


Teclo 


a  memoria, 
joann.  atitem  nemo  jcivit  íHfcum-     fendo  que  o  haviaó  de  en- 
'^^  '  beríthim-.Q^M^i^íonm^vxm     comendaraoefquecimen- 
ofoubedos  que  eftavso  à     to.    O  fe.s;redo  encomen- 


mefa:logo  náo  o  foubc  o 
jnefmo  S.  loão,  que  era  híi 
dosqueeftavãoa  ella.  He 
confequencia  de  S.  A^p- 
ílinho.  Pois  fe  Chrifto  o 
difleaS.  loão  ,  comohe 
poíTiveli  que  S.  loão  o  naô 
íbubeíTe?  Claroeftàqueo 
foube  .-pois  íe  o   foube  S. 
loaój  como  diz  que  o  nam 
foube  ?  Hoc  atitem  nemo 
fciíit  ?  A  razão  he  eíla  : 
porque  o  que  Chriíto  diflc 
a  S,  íoaó  5  diílelho  em  fe- 
gredo,6cS.íoãooquefabe 
cm  fegredo  naó    o  fabe. 
Nos  outros  homens  o  ia- 
berem  fegredo  he  fabcr, 
em  S.  íoaó  o  faber  em  fe- 
gredo he  ignorar  :   Nemo 
fcruít. Nenhum  ícgredo  he 
fegredo  perftitOjfenam  o 
que  paífa  a  fer  ignorância ; 
porque  o  fegredo  que  fe 
íiibevpodefe  dizer,  o  que 
feignorajnaò  íepode  ma- 
ni  fcilar.  [{ lia  he  a  cau ía  de 
os  homens  comummente 
não  fíbcrcm  c;uardar 


dado  à  memoria  corre  pe- 
rigo j  o  fegredo  encomen- 
dado ao  cíquecimento  eílà 
feguro.  A  razão  he:  por- . 
que  o  fegredo  encomen- 
dado à  memoria  he  caute- 
la, &  oquefe  guarda  com 
cautela, podefe  perder:  o 
fegredo  encomendado  ao 
cíquecimento  he  ignorân- 
cia, &  o  que  fe  ignora  to- 
talmente, não  fe  pode  ma- 
nifeftar.  Logo  o  perfeita 
fegredo  heíó  o  que  chega 
a  fer  ignorância  ,  &  tal  era 
odeS.  loão  :  IJoc  aiium 
nemo  fcivit  difiumbentjum. 
Bufqueiprovaa  eíle  pen- 
famento,&:fó  em  hum  ho- 
mem Deos  a  achei. 

384  Falia  Chriílo  da 
incerteza  do  dia  do  luizo , 
&:  diz  aflim :  T>edie  auttrn  Marc. 
ilía  ru-inofctt^  neqtte  Ârigeli^  '  ^^^ 
neque Filnts.  Odiado! ui- 
20  ninguém  o  fabc.nem  os 
Anjos,  nem  o  mclmo  Fi- 
lho do  homem.  EAc  tex- 
to hc  hum  dos  m:iis  diffi- 


grcdos ;  porque  cncomcn*    cukofos,  que  tem  o  Tclla- 

mcn- 


S.loãÕ  E'vangelifla '.        ^  421 

mento  Kovó-,  tão  diffiçul-     quando  havia  de  fer  o  dia 


tofo,  quefe  canfárão  nelle 
todos  os  quatro  Doutores 
da  ígreia  contra  a  herefia 
dos  Arrianos.  Dizer  Chri- 
íloquenê  o  mefmoChri- 
ílo  ílibe  quando  ha  de  fer  o 


doíuizo,  fabia-odema 
neira,  que  não  queria  re- 
velar efte  fegredo  aos  A- 
poftolos :  &  nas  PeíToas  di- 
vinas, como  Chriftojofa- 
ber  em  fegredo  he  igno- 


dia  do  luizo :  notável  pro-  rar.  S.  Hylario :  ^od  Fi- 

pofição!  Chriílo  em  quan-  Ihís hominis  nejcit^  facra- 

toDeos  fabe   quando  ha  meraumeft^quodraceat.  O 

de  fer  o  dia  do  íuizo  ,  por-  que  Chriílo  chama  igno- 

que  a  Ciência  á'iYÍa2i  he  rancia  do  dia  do  luizoj 

comua,  &  igual  em  todas  nãohe  ignorância,  he  fer 

as  três   divinas    PeíToas:  gredo •, mas chamafe  o  fe- 

Chrifbo  em  quanto  home  gredo  ignorância  ,  porque 

também  fabe  quando  ha  nas  Peílbas  divinas  o  en- 

de  íer  o  dia  do  mizo ,  por-  cobrir  he  como  o  ignorar. 

que  ainda  que  a  Ciência  O  mefmo  paíTou   em    S. 

de  Chriílo  em  quanto  ho-  Ioaò(que  delle,&  de  Deos 

memnãoheinfmita  ,  he  fallaô  com  o  mefmo  efdlp 

univerfal,  ScperfeiriíTima,  os  Evangeliílas  )  quiz  di- 

^  conhece  todos  os  futu-  zer  que  encubrira,  &  diífe 

ros,  &  decretos  divinos,  que  ignorara  :  Hoc  atitem 

Pois  fe  Chriílo  em  quan-  nemofcivit  dtfcumbenthm. 

to  Deos,  &  em  quanto  ho-  385   Ainda naô  eílà  en- 

mem  fabe  quando  ha  de  carecido  o  íino  do  fegredo 

fero  dia  do  luizo,  porque  deS.Ioaó.  Tornemos  ao 

diz  que  o  naó  íabe  ?  T>e  die  noíTo  Texto.  §^1  recubuit 

mitem  tila  nemo  fcit ,  neque  fuprafjeãiis  T>ominh  &  di- 

,Fãíus>  A  expoíiçáo  deíle  xfn^iiseji^^qui  tradet  ie> 

"paílb  mais  recebida  de  to-  Diz  S.  loaó,  que  vio  S.Pe- 

dosos  Doutores,  he  eíta:  dro     aquelle      difcipulo 

porque  ainda  que  o  Filho  amado  do  Senhor,  o  qual 

de  Deos  fabia  muito  bem  naCeaeíle\^ereclinadofo- 

Toni.;.  Dd  iij            bre 


42  2  Sermão  de 

brefeu peito,  8c  lhe  per-    os  perguntara,  íTm  ;  que 


guntou  quem  era  o  trai- 
dor? Reparo.  Parece  que 
S.  Joaõ  naó  havia  de  di- 
zer, que  era  aquelle  que 
perguntou  a  Chriílo ,  que 
era  o  traidor  ,  fenaó  que 
era  aquelle  a  quem  Chri- 
ílo diíle,  quem  era  o  trai- 
dor. Fundo  a  duvicla:por- 
^ue o  intento  de  S.Joaó 
era  provar ,  que  elie  era  o 
amado  de  Chriílo  ,  &  o 
amor  de  Chriílo  para  com 
S.Joaó  naó  fe  prova  com 
S.Joaó  perguntar  o  fegre- 
doa  Chrilio  ,  fenaó  com 
Chriílo  revelar  o  fecíredo 


lhos  diíFeraó  ,  não.  Não 
dizer  hum  homem  o  íè- 
gredoquefabe,  he  muito. 
Masnãodizer  quefabe  o 
fegredo ,  he  muito  mais. 
Porque.^  Porque  nró  di- 
zer o  fegredo  que  íabe,  he 
guardar  fegredo  às  coufas  : 
mas  naó  dizer  que  fabe  o 
fegredo,  hc  guardar  fegre* 
do  aoíegredo.  A  viíla  de 
S.  Paulo  fe  verá  melhor 
eíla  fineza  de  S.  locão.  A 
S.Paulo  arrebatou- o  Deos 
ao  terceiro  Ceo ,  &  revê-  ^-.^^^' 
ioulhe  grandes  íegredos :  1 2.4.' 
Au divi  arcana  vcrhay  qua 


•a S.Joaó   Pois  fe  Chrifbo     7ionlicethominiloquí\Ouvi 
revelou   o   fegredo   a   S.     fegredos,  q  fenaó  podem 


Joaó  ,  porque  nam  diz 
S.  Joaó,  que  Chriílo  lhe 
revelou  o  fegredo.^  Porque 
diz  fomente,  que  elle  lho 


contar.  Ora  vede  quanto 
vai  de  S.  Paulo  a  S.  loaó. 
S.  Paulo  naó  diíTe  os  íe- 
gredos que  ouvira  ,  mas 


perguntou :  Et  djxit:  G^uis     diílè  que  ou  vira  fegredos : 
ejl^qui  tradct  te  ?  Naó  fe     Audivi arcana  verba  ,  qua 


podiafubira  mais  em  ma- 
téria de  fegredo.  Foi  taó 
efcrupulofo  valido  em 
matérias  de  fegredo  S. 
Ioaó,quenem  quiz  dizer 


non  lie  et  homini  loqui.  S. 
loaó  não  diíle  os  fegredos 
que  lhe  diíTeraó,  nem  á\^z 
que  lhe  diíícrão  fegredos, 
que  os  perguntara  íò  diíTe: 
■os fegredos,  que  lhe  diíTe-  Et  díxit\§luis ejl^qui  tradcP 
raó,  nem  quiz  dizer  que  TeP  S.Paulo  guardou  fegre- 
Ihe  diíferaó  fegredos.  Que     do  às  couíàs  ,  porque  nam 


Axkii 


S.lõaõEn)àngeliJla. 
dííTe  as  fevelaçoensi  mas  fem  a  fuftanck 
náo  guardou  fegredo  ao 
fcígredo ,  porque diíTe  que 
lhas  revelarão.  S.  loao 
guardou  fegredo  às  cou- 
íiiSjporque  não  diífe  quem 


423 
de  paó. 
Pois  fe  com  menos  mila- 
gres íe  podia  fazer  cabal- 
mente o  myílerio  ,  Deos 
que  fempre  acurta  de  mi- 
lagres >  porque  náo  quiz 


não  vos  direi  a  verdadeira 
razão ,  mas  dirvoshei  húa 
moralidade  muito  verda^ 
deira.  Todos  os  Sacra  me- 
tos  faõ  inftrumentos  da 


era  o  traidor  j  Sc  guardou  queficaífea   fuítancia  do 

fegredo  ao  fegredo,  por-  pão  no  Sacramento  ?  Ea 
quenãodiíTe  que  lhe  dcC- 
cubriráo  quem  era.  Que 
muito  logo,  que  feado  taó 
fecretario  S.IoãOjfoíTe  taò 
yúiáolDifcipulum^quem 

diltgebathfus,&aixit\^is  graça,&:  efte  de  mais  graça 

eft,quitradette>  que  todos  :   &  não  qui^ 

§.     VI.  Chriílo,queagraçafedef- 

2S(J    A  Quarta,&ul-  fejunta  com  o  pão  ,  nem 

/\tima  boa  par-  que  o  pão  andaífe  junto  ca 

te  que  admiro  em  S.  loaÓ,  a  graça.  O  maior  abufo,  & 

hefer  valido  ,  que  quiz  a  o  maior  nfco  que  tem  a 

graça  por  amor  da  graça,  graça  dos  l'rincipes,he  an- 

Logo  me  explicarei  mais.  darem  o  pão,  &a  graça  ju- 

No   Sacramento  da  Eu-  tos.  Seno  Altar  federa  o 

chariílía  deixou  Chrifto  pão  a  moyos  ,  amda  que 

asfontes  de  fua  graça  j  mas  não  fora  confagrado ,  mui- 

he  muito  de  reparar,  que  tascómunhoens  fe  havia»^ 

não  quiz  Chrifto  que  íi-  de  fazer  por  amor  do  paó, 

caífe  alli  a  fuftancia   do  qfenão  fazem  por  amor  da 

pio.  Fundoo  reparo.  Me-  graça.  Querer  a  graça  poi? 

iTos  milagres  eráo  neceífa-  amor  da  graça,he  devaçáo, 

riospara  eítar  o  corpo  de  querer  a  graça  por  ainorf 

Chrifto  ,  &  a  fuftancia  de  do  paójhe  fome.Por  líio  ha 

pão  juntamente ,  que  para  tantos  famintos,  ou  tantos 

cftaro  corpo  de  Chriílo  esfaimados  da  graça,  lo- 

^  Ddiiij        dos 


T   Co- 

ri  a  th. 

14. IO 


m 


424  Sermão  de 

àos  querem  fer  cheos  de     dio  Chriílo  a   eíle  íncon- 


graça  ,  mas  não  de  graça 
vazia.  Gratia  T>n  í7i  me 
'vactianonfíiit^áizidi  S.Pau- 
lo em  bem  mais  honrado 
fentido.  A  graça  ha  de  fer 
para  vòs  encheres  as  obri- 
gaçoens  da  graça  ,  &  nam 
para  a  graça  vos  encher  a 
\òs^  ou  vòs  vos  encheres 
com  ella.  Entáo  íeria  a 
graça  menoscuftofaa  quê 
adàj&mais  bem  avaliada 
em  quem  a  logra.  Por  líTo 
Chriílo  não  quiz  que  o 
pão  andaíTe  junto  com  a 
graça.  Mas  porque  os  om- 
nipotentes do  mundo  não 


veniente.  No  mefmo  Sa- 
cramento ainda  que  nam 
ella  pão  quanto  a  fuílan- 
cia,eílà  pão  quanto  aos  ac- 
cidentes  :  porem  a  graça 
não  fe  mede  com  o  pão. 
Muitas  YQzts  quem  co- 
munga húa  hoília  muito 
grande,  leva  pouca  graça  > 
&quem  comunga  húa  par- 
ticula  muito  pequena, leva 
muita  graça :  para  que  en- 
tendão  os  homens,  que  a 
graça  não  fe  deve  medir, 
com  o  pão. 

387     Oh  que  bem  go- 
vernado andaria  o  mudo. 


fazem  eíla  feparaçáo  co-     feviíTemos  pobres  de  pão, 
mo  poderão  lem  grande     os  que  vemos  ricos  da  gra 


milagre  i  chegou  a  graça  a 
transfuílanciaríe  tanto  no 
pão,  que  ninguém  bulca 
jà  a  graça  por  amor  da  gra- 
ça, íenão  a  graça  por  amor 


ça  í  Mas  íb  na  de  Oeos  he 
lilo :  na  graça  dos  homens, 
querem  eiícs  que  íeja  de 
outra  maneira.  Ninguém 
teve  mais  graça  com  o  leu 


do  pão,  &:  pela  medida  do     Puncipe,  que  David  com 
j)ão,  ou  peio  pão  lèm  me-     lonatas:^:  qu.i  1  ibi  a  prova 


dida,  fe  avalia  a  graça.Por- 
que  tem  hoje  mais  pão 
que  todos  ,  quem  ontem 
não  tinha  hum  pão  ?  Por- 
que eílà  mais  na  graça,que 
todos.    Oh  q  groíicna  taó 


defia  graça  .^  O  Texto  fa- 

grado  o  diz  :   Spoliavit  fe 
ionatbas  túnica  qua  erat  uv^  '  ^eg:. 
dtitus.sí^dtáiteauí  'David:  '^'^' 
Defpojoufe     lonatas    de 
Icusveíhdos,  (Sc  dco  os  a 


grande  í  jMas  que  bé  ucu-     David.  Defoitc  que  a  pro- 
va 


'^i^i:...i 


S.  lo  ao  Enjangeítjla,         ^  4.2  f 

va  da  graça  do  Príncipe     nelle  o  rendido  ,  &  naó  o 


faóosdefpojos  :  Spoliavít- 
fe.  Notável  coufa  í  que 
cuidem  os  homens ,  q  não 
tem  a  graça  do  Príncipe, 
fenão  quem  lhe  leva  atè  os 
velHios  !  E  que  tenha  a 
graça  defpojosjcomo  fe  fo- 
ra guerra !  Os  defpojos  faó 
íinaes  de  haver  vencido  ao 
inimigo:  &  que  a  graça  dos 
amigos  dos  Principes  te- 
nha os  mefmos  llnaes !  Por 
iíTo  eu  temo ,  que  eíle  mo- 
do de  conquiílar  a  graça 
he  fazer  guerra  :  fó  quem 
faz  guerra  quer  defpojos. 
Quem  conquiíla  a  graça 
pela  graça  ,  contentafecó 
o  coração.  Vejafe  no  noíTo 
Evangeliilia.  Conquiftou 
a  graça  de  Chriílojá:  veio- 
fe  a  rematar  a  conquiíla 
em  que  ?   Em  lhe  render 


rendofo.  Sò  S.  loãofoube 
eílimaragraça  do  Prínci- 
pe, como  le  ha  de  eílimar: 
a  graça  por  amor  da  graça , 
&  nada  mais. 

388  Três  5  ou  quatro 
vezes  falia  S.  loão  em  fy 
neíle  Evangelho ,  &:  fem- 
pre  fe  chama  aquelle  Dif- 
cipulo  ,  nunca  fe  chama 
loaó ;  ^ífcipulus  ille.  Pois 
porque  fe  não  chama  S. 
loaò  pelo  feu  nome?  Aper- 
temos a  duvída.S.Ioáo  ne^ 
fce  Evangelho  falia  em' 
Ghriílo,  falia  em  Pedro,& 
fállaemfy:  aChriftocha- 
jnalhe  Chrifto ,  a  Pedro 
chamalhe  Pedro,  mas  a  fy 
não  fe  chama  loaó :  pois  le 
a  Chrifto  chama  Chrifto, 
&  a  Pedro  Pedro,  a  loaò 
porqlhenáo  chama  loaó  .^ 


Chriíloo  cor^2iO  :  Recu-  Arazaóhe  ,  porque  loaó 

buit_  fuprapeõfus  ejids.  Mui- '  qu er  dizer  graça   &  amou 

toeílimou  S.  loão  o  cora-  S.  loaó  a  graça  tanto  por 

ção  do  feu  Príncipe  ;  mas  amor  de  fy  meíma ,  que  né 

eftimou-o,  porque  fe  lhe  o  nome  de  graça  quiz  ter 

rendeo,&:  não  porque  lhe ~.  cí)èi  ella.  Os  ^ue  amão  a . 

rendia. O  coração  do  Prin-  graça  dos  Principes  mais 

cipeha-fede  eftimar  pelo  defen tereílada mente  ,  ao 

rendimento  ,  &  não  pelas  menos  querem  com  a  gra- 

rendas  :  ha-fe  de  eílunar  çaonome^  querem  com  a, 


Ul 


i  .J 


.14. 


42  (í  ^ermaÕde 

graça  as  vozes:  mas  S.Ioaã    de  gloria:  &  S  Joaó  amava 

amou  a  graça  dofeuPrin-     a  gloria  de  Deos  ,  como 


cipetaó  finamente  átÇ^a- 
tereíIado,que  quiz  a  graça 
aindafemo  norne>  quiza 
graça  ainda  fem  as  vozes. 
Por  iíTo  callou  o  nome  de 
Joáo,  porque  era  nome  de 
graça.  A  graça  por  amor 
da  graça  ;eftehe  o  timbre 
do  Êvangelifta. 

385?  O  mais  fino  amor 
da  graça  confente  configo 
outro  amor,que  he  amar  a 
graça  por  amor  da  gloria. 
Sò  S.JoaópaíTou  adiante, 
6c  atè  do  amor  da  gloria 
quiz  feparar  o  amor  da 
graça.  Moy fes  dizia  a 
Deos :  Si  invenigratiam  in 
ocultstíãSy  oflende  mihi  fa- 
dem tuamiSç.nhoT^ÍQ  achei 


gloria  de  hum  Deos  cheo 
de  graça.  Vai  muito  de  húa, 
confideraçaõ  a  outra :  por- 
que amar  a  graça  por  amor 
da  gloria,  he  querer  gozar 
o  premio:  amar  a  gloria 
por  a  mor  da  graça,he  que- 
rer fegurar  o  amor.  Qual 
he  a  melhor  couía,que  tem 
a  Bemaventurança?  A  me- 
lhor coufajque  tem  a  Bem-^ 
aventurança,  naôhe  o  go- 
zar a  gloria,  he  o  fegurar  a 
graça  j  porque  o^sBem- 
aventurados  naÓ  podem 
perder  a  graça  de  Deos ;  & 
ifto  he  o  que  confiderava 
S.Joaõ.  Moy  fes  confidera- 
va a  graça  como  penhor 
da  gloria,  S.Joaóconfide* 


graça  em  voíTos olhos, mo-  rava  a  gloria  como  feguro 

ItraimeovoíTo  rofto,  em  da  graça. "O  amor  de  Moy- 

que  confifte  a  gloria.  E  S.  fes  era  intereíTado,  porque 

Joaó  que  dizia  ?  yidimus  ordenava  a  graça  à  gloria, 

gloriam ejus , gloriam  cjuafi  enca minha va  o  amor à  vi- 

unigeniti  â  Tatre  pknum  fta.  O  amor  de  S.  Joaó  era 

grati£\  Vimos  a  fua  gloria,  fino,&  puro ,  porque  que-r 

como  gloria  do  Vnigenito  ria   a  graça  por  amor  da 


do  Padre  cheo  de  graça. 
De  forte  qu  e  M  oy  fes  a  ma- 
va  a  graça  de  Deos  ,  como 
graça  de  hum  Deos  cheo 


graça  •,  queria  amar  lem  at- 
tencáo  a  ver. 

g9o     Daqui  fe  enten- 
dera hum  myílerio  gran- 
de. 


^JoaoE^vangeliJla. 


de,&  nunca  aíTaz  entendi- 
do, do  noíTo  Evangelho: 
*ÍDifcipuhm  ,  quem  dilige- 
bat^  qui  &  recubuit  in  cana 
fuprapeãus^úmini.  Enca- 
rece S.Joaó  o  amor  que 
havia  entreelle,  8c  Chri- 
íto  ,  &  para  prova  deíle 
amor,  diz  que  adormeceo 
fobreo  peito  do  Senhor. 
Boa  prova  de  amor ,  por 
certo!  Amar  he  defvelo, 
adormecer  he  defcuido: 
pois  como  pôde  fer,  que  o 
-defcuido  feja   prova   de 
defvelo;  &  que  o  adorme- 
xer  feja  prova  do  amar? 
Adormeceo  ,  logo  amou: 
he  boa  confequencia  efta? 
Sim ;  porque  S.  Joaó  ador- 
meceo com  o  peito  recli- 
nado fobre  o    peito  de 
Chrifto:  &  não  pôde  haver 
mais  fino, nem  mais  pro- 
vado amor  ,  que  aquelíe 
que  entrega  o  coração ,  & 
fecha  os  olhos.  Entregar  o 
coração  có  os  olhos  aber- 
tos, he  querer  a  vifta  por 
premio  do  amor :  entregar 
o  coração  com  os  olhos  fe- 
chados, he  naó  querer  no 
amor  nem  o  premio  da  vi- 
íta.  Donde fe  infere  ckra- 


mente,  que  teve  mais  per- 
feitas circunílãcias  o  amor 
de  S.Joaó,  que  o  amor  dos 
Bemaventurados  j  porque 
os  Bemaventurados  amão 
com  os  olhos  abertos,  S. 
loaò  amou  com  os  olhos 
fechados.  Os  Bemaventu- 
rados amão  com  as  fatisfa- 
çoens  da  viíla,  S.  loaõ  ama 
fem  osintereíles  de  ver. 
Se  he  boa  a  minha  coníe- 
quencia,  digaó-no  os  mef- 
mos  Serafins  da  gloria.  Vio 
Ifaias  os  dous  Serafins,  4 
alliítem  ao  trono  de  Deos , 
6c  diz  que  com  duas  azas 
voa  vaô ,  &  có  outras  duas 
cobriaó  o  rofto  :  Uuahus 
.  volabant ,  ó*  duahus  veU^ 
bant  f aviem.  Pois  fe  todos 
os  Anjos  eftão  fempre  ve- 
do a  Deos,  como  cubriam 
efíes  Serafins  os  olhos?  He 
que  como  os  Serafins  no 
Ceofaó  por  antonomaíia 
os  amantes  ,  qucriaó  ao 
menos  na  reprefentaçam 
oíFerecera  Deos  hú  amor 
mais  fino  que  o  dos  outros 
Efpiritos  bemavêturados. 
Eamor  mais  fino  q  o  amor 
dos  Bemaventurados,  he 
abrir  o  coraçaõj  6c  fechar 
os 


4^8 


Serma^dê 


os  o\\\os'fDuahus  Võlabant: 
eisahio  coração  aberto: 
*íDudbus  velabant  :  eis  ahi 
os  olhos  fechados.  Os  ou- 
tros Bêaventurados  amaó 
com  o  coração  aberto  ,  & 
comos  olhos abertosrmas 
os  Serafins,  que  os  vencem 
noamor,amáocom  o  co- 
ração aberto ,  &  com  os 
olhos  fechados.  Bem  aílim 
como  S.  Joaó,  de  quem 
aprenderão  eíla  fineza: 
iJífiípuluy  quem  dilígebat^ 
qui  rectibittt  fitara  pecfus 
T>omini. 


S'  VIL 


391 


T^  Como   em  S. 

Cloáo  havia  ta- 
tás qualidades  de  amante, 
&  taó  grandes  partes  de 
valido  ,  que  muito  que  o 
amaíTe  tanto  o  Principe 
da  gloria  Ch ri ílo:  q  muito 
que  o  amaíle  tanto  o  Prin- 
cipe da  igreja  Pedro!  Para 
que  acabemos  por  onde 
começamos  :  o  maior  en- 
carecimento, que  fe  pode 
dizer  de  hum  valido,  hco 
qucdiífe  Curcio  de  Epa- 
ininondas  privado  de  Ale- 


xandre  Magno :  Multaiík 
fine  Rege profpere ,  Rexfine 
illo  nihil  maguce  rei  gejjít. 
Foi  taó  grande  homem  E- 
pamínondas  ,  que  fendo 
valido  de  Alexandre  Mag- 
no, elle  fez  muito  grandes 
coufasfem  Alexandre,  A- 
lexandre  nenhúa  coufa 
grande  fez  Tem  elle.  Outro 
tanto  podemos  dizer  de 
S.Ioaócó  toda  a  proprie- 
dade :  fendo  valido,  nam 
de  Alexãdre ,  mas  do  mef- 
mo  Chrilí  o.  loaò  fez  mui- 
tas coufas  grandes  íem 
Chriílo  vifivelmentepre- 
fente,  Cbrifto  naó  fez  as 
maiores  coufas  fem  loaó. 
SJcáoTem  Chriílo  vêceo 
os  tormentos  de  Roma, 
fcm  Chriílo  bebeo  os  ve- 
nenos de  Efeíb,  fem  Chri- 
ílo padeceo  os  deílerros 
de  Pa  d  mos,  fem  Chriílo 
converteo  ,  ^  rcduzio  a 
Chnílo a  Afia,  fem  C hri- 
íloenfinoua  todo  o  mun- 
do, éy-  propagou  a  Ley  do 
amor  de  Chriílo.  Grandes 
coufiis  fez  S.  loaó  ícm 
C  hní  i  o :  Multa  tile  fine  Re- 
ge pr  o  fperc.  Pelo  contrario 
Cliriíio  icm  S.Ioão  apenas 
fc2 


LUí:...  l 


S,  loaoEvangelifta. 
fez  coufa  grande.  Fez  guncou 
Chrifto  o  primeiro  mila- 
gre nas  vodas,  &  ahi  eftava 
S.JoaóiRefufcitou  Chri- 
11o  a  filha  do  Principe  da 
Sinagoga  ,  &  levou  coníi- 
go  a  S.  Joaó:  Inílituío 
Chriílo  o  Sanciílimo  Sa- 
cramento da  Euchariftia, 
que  foi  a  maior  de  fuás 
maravilhas,  &  tinha  a  S. 
Joaó  fobre  o  peito :  Trans- 
%uroufeChrifto  no  Ta- 
bor,  &  S.  Joaô  aíHílio  na- 
queila  gloria  :  Derramou 
fangue  Chriílo  no  Horto, 
&  S.Joaó  acompanhou-o 
naqueilapena.-emíini,  re- 
mio  Chriílo  o  mudo  mor- 
rendo na  Cruz,&  naó  teve 
outrem  a  feu  lado,  fenáo 
S-Joaó:  Rex  (ine  illo  nthil 
magn£  reigejjit, 

392     Efe  iílo  fucedeo 
ao  Principe  da  gloria ,  que 
muito  que  ao  Principe  da  ^Íi:)S€om  a  efpad: 
Igreja  aconteceíTe  o  mcf-     Deo  a  fortuna  a ' 


mo?  Arrojoufe  S.  Pedro 
ao  mar  para  bufcar  a  feu 
Meílre,  mas  S.  Joaó  foi  o 
que  lhe  moílrou  a  Chri- 
fbo :  Quiz  faber  S.Pedro  na 
Cea,  quem  era  o  traidor, 
mas  S.Joaó  foi  o  que  o  per- 


429 
Atreveofe  S.  Pe- 
dro a  entrar  no  átrio  dbi 
Pontiíice,  mas  S.  loáo  foi; 
o  que  o  introduzio :  Re  foi- 
veofe  S.Pedro  a  reconhe- 
cer a  fepultura  de  Chrifto, 
mas  S.  Joaó  foi  o  que  o 
guiou.  De  maneira  que  o 
Principe  da  gloria  ,  &  o 
Principe  da  Igreja  ambos 
fevaliaó  à^^.  Joaó  •,  mas 
com  eíla  diíFerença  :  o 
Principe  da  gloria  valia fe 
de  S.Joaó  como  de  yalído* 
o  Principe  da  Igreja  valia- 
fe  de  S.Joaó  como  de  va- 
Jedor.  E  o  noíTo  Principe 
como.^  Por  ambos  os  titu- 
los.  Tem  V.A.Senhor,em 
S.Ioaó  valido ,  &  valedor : 
valido  para  a  devaçaó,  va« 
ledor  para  a  neceíHdade. 
Reílicuío  Deosa  V.  A.  a 
feus  Reynos  em  tempo 
que  he  neceífario  defende- 

a  na  maó. 

V.  A.  por 


competidor  hum  Princi 
pe  Balthafar,  taó  poderoío 
como  o  de  Babilónia.  Mas 
fibida  coufa  he,  que  bafrá- 
raó  três  dedos  com  iiuma 
pcnn apara fi z ç r  t r e m e r  a 
Bakhaíar.  Oh  que  acomo- 
dada 


430  Sermão  de 

dada  emprefa  para  o  noílb     ras  de  noíTa  confervaçaõ : 


Príncipe!  Três  dedos  de 
S.Joaócom  húa  penna,  & 
húaletra,que  diga  :  Con- 
tra  Balthafaremfatís\Com 
amor  ,  &  entendimento 
tudo  fe  acaba.  Eíta  penna 
hedaFenizdoamor  :  cfta 


com  eíla  penna  fe  faráó 
autênticos  os  varicinios, 
que  taó  gloriofamence  fal- 
láo  da  Coroa  de  V.  A.ne- 
íle  felicereynado.  Final- 
mente Q  que  finalmente 
aqui  vem  a  parar  tudoj) 


penna  he  da  Águia  dos  en-     com  efta  penna,  que  he  de 
rendimentos.    Com   efta    hum  Evangelifta,  que  tem 


penna  fe  efcreverà  a  kn- 
tença  de  hua  demanda 
taòjufta:  com  efta  penna 
íè  confirmarão  as  Efcritu- 


por  nome  graça,  fe  firma- 
rão aV.A.depoisdecum- 
pridiílimos  annos  ,  os  de- 
cretos da  Gloria. 


S£K<> 


451 

âââiâi  #â=iââáiiâi  -àààààà 

SERMAM 

DA  SEGUNDA 

DOMINGA 

DA    QVARESMA. 


AJfumpJit lefusTetrum^é'  l^cohum^  &loannem^  &  du- 
xit  tUos  in  montem  excelfumfeorfum^  &  trans- 
figiiratuseftanteeos,  Matth.17. 


S  portas    quaíl 


'§M  da  terra  de  Pro- 
miííaó  mandou 
M  oy  fes  apre- 
goar em  dous  montes  al- 
tos, &  oppoílos  (^  com  vo-^ 
zes,  que  todo  o  exercito 
immenfodos  filhos  delf- 
raei  eílendido  pelos  cam- 
pos mil  agrofa  mente  ou^ 
via  }  em  hum  chamado 
Garizim  ,  as  felicidades 
dosqueguardaíFema  Ley 


de  Deos  ,  8c  em  outro  que 
fe  chamava  Hebel,  as  mal- 
diçoens,  &  defgraças  dos 
qanaó  guardaílem.Taes 
fe  me  afíguraÔ  nefta  entra- 
da da  Quarefma  os  dous 
montes  também  muito  al- 
tos, 6c  não  íó  opp  oitos,  mas 
totalmente  contrários,  cu- 
ja hiíloria  Evangélica  ne- 
íle Domingo, <Sc  no  paífa- 
donosreprefcntou,  U  re- 
prefenta  a  Igreja.  Nopri. 
meiro monte  o  Demónio, 
4  ainda  fe  chamava  Prin- 
cipe 


Matth. 


Matth. 
»;.2. 


Si  rmão  dafegunda  IDomin^a 
mundo  ,  mo-     cio  eílão  aparelhadas  para 
osquedefprezaó 


cjpc  deíle 

li  mu  a  Chriílo  todos  os 
Reynos  do  mefiiio  mun- 
do ,  &  codas  íuas  glorias : 
OHéndit  et  omnia  Regna 
fmmdi  ^  (^gloriam  eorum. 
Nofegundo  Chriílo  ver- 
dadeiro Rey>  6c  Senhor  do 
Ceo  moílrou  a  alguns  Dif- 
cipulosfeus  mais  familia- 
res, naó  todo  o  Reyno,  nê 
toda  a  gloria  do  mefmo 
Ceo,  porque  não  eraó  ca- 
pazes de  a  ver  os  olhos 
humanos  3  mas algúa  parte 
delia :  Ettransfguratus  efi 


5  &:  que- 
brantãoa  mefma  Lev  ,  a 
que  o  Demónio  tentador 
nos  incita  com  a  falia  ap- 
parencia  das  glorias  do 
mundo. 

394     Como  ambos ef- 
tes montes  faó  de  gloria, 
poíioquetaó  diverías  ,  a 
cada  hum  deiles  refpondc 
afiia  aíiUmpçaó.  Ao  ^ri- 
mQivo^AjJumpJit eum  T>ia'  Matth, 
bolíis:  ao  íègundo,  Affiimp-  '^^• 
fit  Icjus Tetruniy  &  laco-  ^^^, ^^ 
bum^  Ò'  loannem,  E  certo  171- 


anteeos.  Oh  quanto  vai  de     qbaftava  fer  húa  aíTump 


monte  a  monte !  o  quanto 
vai  de  Reynos  a  Reyno ! 
ò  quanto  vai  de  glorias  a 
gloria  !  Também  hum  de- 
ites montes  ,  &  com  mais 
razaô,  fe  podia  chamar  o 
das  felicidades,  &  outro  o 
das  maldiçoens.  E  tam- 
bém eftà  bradando  o  pre- 


çaò  do  Diabo,  8c  outra  af- 
fumpçáodejefu,  para  to- 
dos amarem,  6c  defejareni 
aaflumpçáo  de  leíu  ,  & 
abominarem  ,  6c  renega- 
rem da  aíTumpçáo  do  Dia- 
bo. Mas  que  heo  que  ve- 
mos ?  O  caminho  do  mon- 
te Tabor,por  ondeie  vai  à 


gaó  em  cada  hum  deiles :     gloria  do  Ceo  ,  deferto ,  6c 
Que  as   felicidades  eílão     quafifem   haver  quem  o 

pize :  ^  a  cílrada  do  outro 
monte fem  nome,  por  on- 
deie vaias  glorias  do  mu- 
do, chca,Sc  rebentando  de 
gente  de  todos  os  eílados» 
amda  daqucUcs  que  pro-» 
feíTaó 


guardadas  para  os  que 
guardarem  a  Ley  de  Deos, 
a  que  Chriílo  transíigura- 
do  nos  anima  com  a  viíla 
da  gloria  do  Ceo  :  6c  as 
maldições  dp  mcfmpmQ- 


1». 


da  §luarefmA, 

íc^xo  o  defprezo  do  mef-  dio  a  cíioraó.  ^ 

mo  mundo  !  Là  diíTe  Da-  porei  hum  monte  a  viíta 

vid,  que  todo  o  homem,  do  outro  monte  ,  &  huaâ 

que  tem  fé,&:  entendimen-  glorias  a  vifta  da  outra  glo- 

to,  o  que  faz  muito  de  pro-  ria :  o  monte  da  tentação  a 

pofitoneílevalledelagri-  viílado  monteda  Trans- 

mas,  he  difpor  a  fua  afccn-  figuração ,  Sc  as  glorias  do 


çaó :  Afcenfiones  in  corãe 
Taim.  /uodíípofuít^invaUe  lacry 
^i-^7-  marum^inloco^  quempoftiit. 
Pois  fe  todos  defejamos5& 
efperamos  que  a  noíTa  af- 
cenção,  &  aíTumpçaó  feja 
para  gozar  eternamente 
as  verdadeiras  felicidades 
da  Bemaventurançajcomo 
deixamos  o  caminho  do 


mundo  à  viíla  da  gloria  do 
Ceo  :  comparando  nao 
bens  có  males  5  fenáobens 
com  bens.  Por  efte  meyo 
mais  clara  ,  &  manifeíla* 
mente  ,  que  por  nenhum 
outro,  fe  vera  a  diíferença 
dos  falfos  aos  verdadeiros : 
6í}àqueos  noífos  enten- 
dimentos, &:  vontades  an- 


monte  por  onde  Chrifto     dáotaó  enganados,  ao  me- 
nos guia  à  gloria  do  Ceo,6c     nos  nos  defenganaráó  os 
feguí  mos  com  tanta  anciã,     olhos.  A  luz  da  divma  gra- 
&  contenda,  não  digo  jà  a     çafe  firva  de  noios  abrir, 
eftrada,  feiíáo  os  preci-     &  allumiar  por  interceíTao 
picios,  por  onde  o  Demo-     da  chea  de  graça.  Ave  Ma^ 
nio,  debaixo  do  fali  o  no-,     ria, 
me  de  glorias  do  mundo  , 
nos  levaàsmaldiçoens  do 
Inferno? 

39  f  Ora  cu  c5  a  graça 
divina  quizera  hoje  desfa- 
zer eíla  cegueira,  que  tan- 
tas Almas  tem  enganado, 
&  perdido ,  as  quaes  neíla 
vidaanaó  conhecerão ,  6c 


agora  fem  nenhum  reme-    diíferença  dos   bens,  que 


396  OOdo  o  monte 
Ji  da  tentação  co 
as  glorias  do  mundo  à  vi- 
ílado monte  da  Transfi- 
guração com  a  gloria  da 
Ceo5quemnos  moílraràa 


3 


4  5  4»  Sermão  déifegtmda^ominga 

íe  prometerr^õ  no  primei-     tão  claramente  como  a  luz 


Pfalm. 
46. 


romontejP^  fe  prometem 
no  fegun'do5fenão  quem  fe 
achou  tm  ambos ,  tentado 
em  hum,  &  transfigurado 
no  outro  ?  Efta  mefma  du- 
vida tiveráo  muitos, que 
refere  David  ,  os  quaes 
perguntava©  :  Quem  nos 
moíírarà  os  bens  ?  Multi 


Ihiij. 


Matih. 

17-2. 


Itid. 


do  mefmo  Sol  nos  podem 
moftrar  a  grande  diíFeren- 
ça,  que  ha  entre  os  bens  da 
gloriado  Ceo,  &  os  que 
também  fe  chamão  bens 
das  chamadas  glorias  do 
mundo.  O  lume  do  Sol  he 
puro ,  8c  fem  mancha :  he 
tanto  para  cada  hum  ,  co- 


dicunt:  ^is  oftendit  nobis     mo  para  todos :  &  todo  fc 
bo7ia  ?  E  refponde  o  mef-     goza  juntOjôc  náo  por  par- 


mo  Profeta,queo]umedo 
roílo  do  Senhor  nolos  mo- 
ítraria :  Signattim  efl  fuper 
nos  lúmen  vultus  tui  ^omi- 
Nunca  o  rofto  de  Chri- 


ne 


ílo  Senhor  noíTo  efteve 
mais  allumiado5&  mais  lu- 
minofo,  que  nefte  dia  de 
fua  Transfiguração  ,  em 
que  refplandeceo  o  fcu  ro- 
fto como  o  Sol  :  Refpltn' 
duit fácies  e jus ficiít  Sol.  E 
emíinal  de  que  logo  aqui 
fe  virão  os  bens  ,  diíFe  S. 
Pedro  em  nome  de  todos : 
Bonum eft nos  hic ejje.  Sen- 
do pois  o  lume  do  rofto  de 
Chrifto  o  que  nos  ha  de 
mofcrar  os  bens,  &  fendo  o 
lume  do  mcilno  rofto  co- 
mo o  do  Sol  ,  três  coufns 
acho  no  lume  do  Sol,  que 


tes.  Neftas  três  proprie- 
dades pois  do  lume  do  Sol, 
nos  moftrarà  o  rofto  de 
Chrifto  três  diíferenças 
dos  bens  do  Ceo  aos  do 
mundo,que também  feráó 
os  três  pontos  do  noííb 
difcurfo.  No  primeiro  ve- 
remos,que  os  bensdo  mu- 
do laó  bens  com  miftura 
de  males ,  &  fó  os  bens  do 
CeopuroSjôcfem  miftura: 
nofegundo,  que  dos  bens 
do  mundo  ,  quando  mui,ro 
logra  cada  hu m  os  feus,*6c 
nos  bens  do  Ceo  logra  ca- 
da hum  osfeus,  &  mais  os 
de  todos :  no  terceiro ,  que 
os  bens  do  mundo ,  fc  che- 
gão  a  fe  gozar  todos  ,  he 
fuccírivamenrc,&  por  par- 
tes >  porem  os  bens  do  Ceo 
fcm- 


iam 


çaó  afará  taò 
o  mefmo  Sol. 


fempre,  todos,  &  junta-  bens feffl  males  ,•  na  terra 
mente.  Prometi  que  tudo  ha  bens,&  males  juntame- 
ifto veríamos có os  olhos,  te.  E porque  razão  ?  No 
&  pofto  que  a  matéria  de  Inferno  ha  fó  males  j  por- 
aleunsdeftes  pontos  feja  que  ha  fô  mãos :  no  Ceo  ha 
fuperior  a  todos  os  fenti-  fó  bens,porque  ha  fó  bonsí 
dos,  a  luz  da  Transfigura-  &  na  terra  onde  andão  de 
clara  como  miílura  os  bons  com  os 
máos,  era  jufto  que  andaf- 
fem  também  mifturado» 
^.  IH.  osbens,&osmales. 

398  A  primeira  me- 
307  r^Iza  primeira  ílira  deíla  verdade  he  a 
JL/diíferençada  mefma  natureza  em  tudo 
noíTapropoíla,  que  todos  o  que  criou  para  o  home. 
os  bens  do  mundo  faô  bens  No  maior  mimo  dos  fen- 
com  miftura  de  males  ,  &  tidos,  que  he  a  Rofa ,  cer- 
fó  os  bens  do  Ceo  bens  cando-a  de  efpmhos,  nos^ 
puros,&  fem  miftura.  E  aí-  deixou,  diz  S.  Ambrofio, 
fim  he.  Quando  Deos  nof-  hum  claro,  Sc  defengana- 
fo  Senhor  fabricou  efte  doefpclhodeftadeliciofa, 
grande  edifício  doUniver-  &  dolorofa  miftura :  Spma  ^^^^^ 
fo,  dividio-o  cm  três  par-  fepjítgratiamflõns  tanqua  ,b  í. 
tes :  húa  na  terra  ,  que  he  humana fpeculumprceferens'^^^;^ 
cfte  mundo  em  que  vive-  vita ,  qu£  Juavtt atem  per- 
'  '  '  '  funãionis  fu£ finitimis  cu* 
rarumfpinisjá^pè  compun- 
gat.  A  mefma  coníidera- 
çaó  feguio  ,  &  adiantou 
Boecio,  o  qual  ajuntando 
ao  exemplo  da  belleza  o 


mos  5  outra  debaixo  da 
terra,que  he  o  Inferno,ou- 
tra  acima  da  terra ,  que  he 
o  Ceo  :  &  cm  todas  eftas 


três  regioens  repartio  os 
bens,&  os  males,  mas  com 


grande  juftiça,  ôc  diff'eren-     da  doçurajcantou,  ou  cho- 
ca. No  Inferno  hafó  ma      rou  elegantemente  :  Ar- 
íe^  fem  bens  3  no  Ceo  ha  fò    matfpina  Rofam ,  mella  te* 

Eeij  giint 


43^  Sermão  da fegunda^omifiga 

gunt  apes.  E  aílim  como  encia  ,  diíTeraò  que  Deo5 
naó  ha  neíla  vida  Rofa  tinha  dous  tanques ,  hum 
fem  efpinho,  nem  mel  fem  de  meljoutro  de  fel,  6c  que 
abelha  iaílimiião  ha  pêro-     nenhua     coufa   mandava 


la  fem  lodo,  nem  ouro  fem 
fezes,  nem  prata  fem  li- 
ga, nem  Ceo  fem  nuvem, 
nemSolfemfombra ,  nem 
lume  fem  fumo,  nem  tria- 
ga fem  veneno,  nem  mon- 


aos  homens,que  naó  vieíTe 
paíTadapor  ambos  :6c  que 
efta  era  a  caufa,  porque  em 
todas  as  que  chegaváo  à 
terra  ,  vinha  a  doçura  do 


bem  miílurada  có  a  amar- 

te  fem  valle ,  nem  quanti-  gura  do  mal.  Naó  podéraõ 

dade  fem  peio,  nem  en-  fallar  mais  ao  certo,  fe   ti- 

chente   fem    minguante,  verão lidoa  David.  Dizo 

nem  trigofem  palha,  nem  Real  Profeta  ,  que  Deos 

carne  fem  oíFo,  nem  peixe  tem  na  mão  hum  Caliz, 

femefpinha  ,  nem   fruta,  pelo  qual  dà  de  beber  aos 

porfaborofaquefeja,  fem  homens,cheo  de  vinho  pu- 

caroço,  ou  cafca  quedei-  ro,&:  miílurado  :  CaUx  mvcúvtx, 

tarfóra.  No  mefmo  tem-  manu^ominivinimeripU'''*''^- 

po  de  que  fe  compõem  a  nus  mifto.  Repara ,  Scper-  ^^,.,,^ 

nofla  vida  ,  naó  ha  veraó  guta  S.  Agoílinho:  piorno-  ibit^ 


fem  inverno,  nem  dia  fem 
noite.  E  neíla  mefma  fe- 
melhança  he  tanta  a  diífe- 
rença,  que  para  haver  ve- 
raó,6c  inverno,  he  neceíTa- 
riohumanno,  6c  para  ha- 
ver noite,6c  dia,  faónecef- 
farias  vinte  òç  quatrç  ho- 
ras j  mas  para  haver  mal, 6c 
bem  ,  baila  hum  fò  mo- 
mento. 

395)     Os  Gentios  fem 
fé  enfinados  fó  da  experi- 


do  mert^jtrnixto^Sz  o  vinho 
era  puro,  como  era  miílu- 
radoi6cfeera  miíturado, 
cosno  erapuio  .^  Porque 
naó  ha  bem  natural,  Si  de- 
fi:c  mundo  ,  ainda  que  da- 
do pela  mão  de  Dcos,por 
mais  purOjôc  defecado  que 
fcja,  que  não  traga  cm  fy, 
6c  configo  algúa  miílura 
de  mal. O  vinho  hc  aquclle 
cordcal  ílm  pi  ez,  medicado 
pela  natureza  para  alegrar 
oco- 


da§uarefma.  437 

o  coração  humano  :    mas     íhor  que  Salamáo,  vede  o 


não  ha  alegria,  ou  cauíà  de 
alegria  tão  contraria  ,  & 
alhea  de  toda  a  triííeza, 
que  não  dè  que  penar  ao 
coração.  Se  ri,  o  rifo  fera 
miílurado  com  dor :  íe  go- 
íla,  o  goílo  fera  metido  en- 
tre pezares.  Aífim  o  dei- 
xou em  provérbio  Sala- 
mãoide  prefente  como  ex 


que  faria  ?  Fabricou  hum 
Palácio  real  ernjerufalé, 
que  depois  do  Templo 
queelle  edificara,  foi  o  fe- 
gundo milagre:  no  monte 
Libano  traçou  vários  reti- 
ros,8c cafas de  prazer,  em 
que  de  mais  de  fe  ver  jun- 
to todo  o  raro  ,  &:  curiofo 
do  mundo  ,  a  amenidade 


primentado  ,  &  de  futuro     dos  jardins,  a  frefcura  das 
CO  mo  Profeta :  Rifus  dolo-    fontes,  a  efpeíTura  dos  bof- 


remifcebitur  ,  &  extrema 
gaudij  luBus  occupat. 

400  E  pois  nomeámos 
o  mais  fabio  de  todos  os 
homens ,  &  o  mais  opuíen- 
to,&  deliciofo  de  todos  os 
Reys,  elle  nos  dirá  o  ver- 
dadeiro conceito  que  fez , 
6cnòs  devemos  fazer  dos 
hcns  do  mundo.  Eu  me 
refoi  vi,  diz  Salamâo ,  a  m  e 
dar  a  todas  as  delicias  ,  & 
gozar  todos  os  bens  dcfta 
viá-x-fDíxi  ego  in  cor  de  meoy 
Vãdara,  &  ciffluam  delictjs , 
é^fruar  bonis.  Com   eíle 


prefuDofto  querendo ,  po-  menlos :  os  gados  maiores, 

dendò  ,  ^  íabcndo  fazer  6c menores,  que  naqu elle 

quanto  quizeíTe ,  porque  tempo  também  eráo   ri- 

niní^^uem  pode  tanto,  nem  queza  dos  Reys  ,  não  ti- 

Guiz  mais,  nem  foube  me-  nháo  numero :  os  cavallos 
Tom./,               ^  .     Eeiij 


quês,  a  caça  ,  &  montaria 
de  aves,  8c  feras,  &  atè  as 
fombras  no  veraó  ,  &os 
Soes  no  inverno  excedião 
com  a  arte  a  natureza :  o 
trono  de  mar^m  em  que 
dava  audiência,  5c  a  carro - 
ça  chamada  Ferculo  ,  em 
quepaífeava,  eraó  de  tal 
architectura,  &:  preço,  que 
faz  particular  defcripçam 
dellesaEfcritura :  às  galas 
deSalamãoomefmoChri- 
ftolhe  chamou  gloria:  os 
thefouros  de  ouro ,  &:  pra- 
ta,que  ajuntou  ,  eraó  im 


i  ' 


Sermão  da  fegunda  Dominga 
repartidos  em  coufa  viraó  léus  olhos  ,n€ 
inventarão  feus  penfamé- 
tosjnem  appetecéraófcus 
defejos,  que  lhe  negaíTe : 
Omnta  qu<e  de[ideraverunt 
oculi  mei  non  ncgavl  eis^  nec  ?.cá. 
prohihiú  cor  meum  qitin  om-  *°* 


438 
eílavaó 

quarenta  miJ  prefepios :  a 
fumptuoíidade  da  mefa, 
para  a  qual  concorriaódi- 
verfas  Províncias,  &  a  ma- 
geftade,  grandeza  ,  &  or- 
dem dos  OiHciaes,  &  Mi- 


niftrosjcomqueera  fervi-     nivoluptatefrueretur.  Ef- 
^o  j  foi  a  que  encheo  de     tandopois  neílas  felicida 


pafmoaRainha  Sabà  :  as 
baxel]as,&:  vafos  eraóde 
ourOjas  muíicas  de  vozes 
exquiíitas  de  ambos  os  fe- 
Xos,&os  cheiros  ,  &  aro- 
mas com  que  tudo  recen- 
dia,  quanto  cria ,  &  exhala 
o  Oriente.  Não  fallo  na 
calidade,  &  gentileza  das 
Damas  ,  filhas  ácl^nnci- 
pes,5c  €fcolhidas  em  diíFe- 
rentes  naçoens,  entre  as 
quaes  ÍÒ  as  que  tinhaó  no- 
me, ôceílado  de  Rainhas, 
eraofeíTenta,  fervidas  to- 
das com  appararo,  &  mag- 
nificência Real.  Tudoif- 
to  gozava   Salamaó    em 


des  de  Salamáonaó  fó  re- 
copilados, mas  eíiendidos 
todos  os  bens  do  mundo , 
faibamos  por  fim ,  que  có- 
ceitofezdelíesr  Elíeodiz, 
&  em  bem  poucas  pala- 
vras: C//j^Wt^  convertijjem 
aduniverfdopera^  cjuafece^  ibid 
runt  manus  meay&  adlabo^ 
res  in  qtúbus  fru  ira  fiída- 
veram^  vtdi  in  omnibus  va- 
nlt  atempo*  afjllEíione  m  ani- 
mi:  Voltando  os  olhos  a 
tudo  quanto  tinha  feito, 
em  que  de  balde  tinha  tra- 
balhado, &  faado  (  feito 
diz,& trabalhado,  v*^  fua- 
do,&  náo  gozado ,  porque 


fummapaz,&  com  igual     tudooque  gozou,  foi  de 
fama,  fem  inimigo ,  ou  re-     húác^frujlra  )&ío  que  vi , 


ceoquelhedéífe  cuidado, 
&  em  tudo  fe  empregava 
comtalapplicaçaó,  &  ex- 
ceíTojquecllemefmo  con- 
feíla  de  íy  ,  que  nenhuma 


&  achei  em  tudo,  hc,que 
tudo  hc  vaidade,  ícafíiic- 
çaó  de  animo ;  i-^anitatem , 
&  affliãwntm  animi.ho-^o 
fe  todos  os  bens  do  mundo 
.        laõ 


da§íuarefma.  4^^ 

faó  vaidade,  como  podem  dados,  afflicçoens  ,  &  do- 

fer  verdadeiros  bens  ?  E  TQs:Setoto  Regm  temfore 

ià  que  lhe  concedamos  o  nec  ad  unum  qmdem  hor^ 

nome  de  bens  >   fc  todos  quadrantempuram  habml' 

caufaóafflicçaó  do  animo,  fe.meramque  Utttiam^  jed 

como  podem  fer  bens  fem  multis  tilam  curis ,  angon- 

miítura  de  males  ?  bus,  dolonhusque  fermtx- 

401     Mas  porque  nam  f/^;».  Efeeílatriíle  miftu- 

cuidealguem,que  do  tem-  raexprimentáraó  nas  ma- 

pode  Salamaó  para  cate-  iores felicidades  do  mun 

ráó  mudado   os  bens  do  do  entre  os  Reys  Salamaó 

inundo,  ou  melhorado  de  &  entre  os  Emperadores 

natureza;  ouçamos  outro  Carlos;  que  poderão  di- 

erande  oráculo  quafi  de  zer  das  fuás  particulares, 

noífos  dias.  Quando  o  Em-  ainda  os  mais  bem  viítos 


perador  Carlos  Quinto 
fezaquella  grande  acçaó, 
em  que  teve  poucos  a  quê 
imitar,&  terá  menos  imi- 
tadores ,  de  renunciar  o 
Império  j  dando  as  caufas 
defta  retirada  depois  de 
tantas  vitorias,  confeíTou 
eom  lagrimas  diante  de 
todo  o  Senado  de  Bruxel- 
las,  que  a  principal,ou  hu- 

nia  das  principaes  fora;     , ^ 

porque  em  todo  o  tempo  &  na  Coroa  o  precedia  o 
C  diz)  de  minha  vida ,  de-  Rey .  Tudo  governava,tu- 
pois  que  puz  na  cabeça  a  do  mandava Jofeph ,  tudo 
Coroa,  nem  hum  fó  quar-  lhe  obedecia ,  com  nunca 
to  de  hora  tive  de  pura,  &  vifta,nem  efperada  f-elici- 
verdadeira  alegria,  fenaó  dade  5  mas  onde  ?  INo  b- 
fempre  miílurada  có  cui-  gypto.  Nmguem  he,  nem 
^  -      Eeiiij        pode 


da  fortuna  ? 

S.  IV. 

4.0Í  I^^Randesforaó 
l^as  q  fonhou 
Jofeph  ,  &  faíraólhe  taó 
verdadeiros  os  fonhos,que 
de  vendido,  &  efcravo  íe 
vioVifo-R.ey  doEgypto, 
&  com  tal  authoridade,  & 
poderes,  quefôno  nome, 


3 


44°  Sermão  dafegttnda  dominga 

pòdeferfelicecoma   Al-    achará  que  andaõnelletao 


ma  noutra  parte.  O  cor 
po,  o  poder,  &  a  dignida- 
de eílavâo  no  Egypto  ,  a 
iVlmajO  amor,  &  a  faudade 
andavão  peregrinando  em 
Canaan  5  com  que  toda 
aquella  apparencia  dos 
maiores  bens  da  fortuna 
vinhaõ  a  fer  fuplicio  ,  & 


contrapefados  os  males 
com  os  bens,que  ainda  em 
comparação  dos  maiores 
fe  pôde  por  em  balança  fe 
pelaómais  os  males. 

40^  De/oíeph  foiPay 
Jacob  também  aíFáz  dito- 
fo.  Aquejacob  teve  pela 
raaior  ventura  de  fua  vida. 


deíterro.  No  Egypto  vi-  foi  quando  ao  cabo  detá- 

vo,  na  pátria  morto    :  no  tosannosdefervir    alcan- 

£gyptoapplaudido,napa.  çouDor premio  a  compa- 

tnachc^rado  :    no  Egypto  nhiadeRachel.  Seo  que 

dandode  comer  ao  mun-  muicoledefeja,  muito    fe 

dp,  na  pátria  comido  das  preza  jfe  o  porque  muito 

feras: no í^^gypto tudo,  na  fetrabalha,  muito  fe  eíli- 

patria  nada.     Ainda  que  ma3nenhum  goílo.ncnhúa 

J ofeph  naÓ  fora  levado  ao  alegria  teria  jà  mais  quem 

Egypto  para  efcravo,  fe-  tanto  amava,  quefe  igua- 

nâo  para  Vifo-Rey,  igual-  laíre;com  efta.  Mas  vede 

mente  hia  vendido  :  por-  quam   penfionados  dà  o 

que  muito  melhor  fortuna  mundo  os  í^oílos  ,  &  bens 


era  para  elle  eílar  em  cafa 
de  Jacob  ,  fendo  o  filho 
maismimofodo  Pay,  que 
na  Corte,  &:  no  Palácio  de 
Faraó  ,  fendo  o  primeiro 
Miniíiro,  &o  mais  valido 
doRcy.  Abra  os  olhos  o 
mundo,&:naó  fe  contente 
com  ver  os  homens  por  fo- 
ra,pcncrre-os  também,  & 
coniidcrc  ospordumo,<5c 


defta  vida.  A  felicidade 
foihúa,as  penfoens  forao 
três,  &  todas  aíTáz  psfa- 
das.A  eílerilidade  da  mef- 
ma  Rachel,  os  enganos  de 
Labam,  &  os  ciúmes  de 
Lia.Por  mais  amadas,  & 
por  mais  pertendidas  que 
iciaó  as  que  chamamos 
venturas,  todas  no  cabo 
fao  Racheis.  Náo  ha  ila- 
chcl, 


da^arefma.  44.1 

€hel,  que  naÓ  tenha  o  feu  de.  Muito  eílimão  os  ho- 

Labaó,&  a  fua  Lia.  Se  Ra-  mens  a  gentileza  ,  muito 

chel  agrada,  Labatn  mole-  eftimaóovalor, muito ef- 

íla:fe Rachel  dàgoftojLia  timão   o    entendimento: 

da  pena.  Qaanto  mais  que  mas  perguntem  os  fermo^ 

para  moleftar,  Sc  dar  pena,  fos  a  Abíalam,  os  valentes 


baftalhe  a  Rachel  fer  Ra- 
chel.  Lede  a  hiftoria  ía- 
grada,  êc  achareis  que  foi 
taó  mal  acondicionada 
aquellarermofara5que  era 
neceíTario  todo  o  amor  de 
Jacob  para  atarar,Sc  fofrer 
feusantojos.  Muito  mais 
trabalho  lhe  deo  depois, 
do  que  tinha  trabalhado 
porella  antes.  Tão  trava- 
dos andao  nefta  vida  os 
goílos  com  os  defgoílios, 
tão  mi  (lurados  os  males 
com  os  bens.  Se  Rachel 
tem  bom  roílo  ,  tem  nià 
condição :  fe  Lia  tem  boa 


a  David,  os  entendidos  a 
Achitofel,  que  penfaó  pa- 
gou o  primeiro  à  fua  genti- 
leza, o  fegundo  ao  feu  va- 
lor,^  p  terceiro  ao  feu  en- 
tendimento. Era  Abfalam 
taó  galhardo  mancebo , 
que  do  pè  atè  o  cabello  da 
cabeça,  como  falia  a  Efcri- 
tura,  nenhum  pintou  a  na- 
tureza mais  bello.  As  Da- 
mas lhe  compravaó  os- 
cabelíos  a  peio  de  ouro,  & 
dos  mefmos  cabelíos  ihe 
teceoamortco  laço,  com 
que  pendurado  dos  ramos 
de  hum  carvalho,  acabou 


condição,  tem  máo  rofto :     infamemente a  vidajpaílà- 
&  não  ha  bem  nenhum  taó    do  pelos  peitos  com   três 


inteiro ,  que  poífa  encher 
os  olhos  ,  &  mais  o  cora- 
ção. 

Eftendei  a  viíla ,  ou  o 
penfamcnto  por  todas  as 
coufas  do  mundo,&  vereis 
que  não  achais  húa  fó  in- 
ííanciiíjnem  hum  fó  exem- 
plo contrario  a  eíta  verda-r 


lanças.  E  eíla  toi  a  penfaój 
que  pagou  Abfalam  à  fua 
gentileza.  Era  tão  valente 
David,que  tremendo  todo 
o  exercito  de  ífrael  á  vifta 
do  Gigante  Golias  ,  elie 
fó,&  defarmado  aceitou  o 
defaí]o,&:  derrubado  a  feus 
pés,com  a  fua  própria  ef- 
pada 


44  ^  Ser^^Õ  dafegunda  dominga 

pada  lhe  cortou  a  cabeça  feu  entendi  mento.  Fiai- 
Masfoitala  inveja  ,  &  vos- là  de  entendimentos, 
ódio,  que  defde  aquella  fazei làcafo  de  valentias, 
hora  lhe  cobrou  ElRey  &  prezaivos  de  gentile- 
Saul,  que  mais  de  húa  vez     zas  í  Tem  os  males  taó  vi- 


ço ma  lança,  que  trazia  na 
máo  por  cetro,  o  quiz  pre- 
gar a  húa  parede.  De  ma- 
neira que  1  he  foi  neceíTario 
a  David  homiziaríè  pela 
mor  te  do  Gigante  ,como 
fe  matara  hum  Hebreo,  & 
fugir  da  fua  vitoria ,  como 
fe  fora  delito.  E  eíla  foi  a 
penfaõ,  que  pagou  David 
ao  feu  valor.  Era  taó  en- 
tendido Achitofel,  &  taó 
prudentes  ,  &  fabios  feus 
confelhos  ,  queporteíle- 


ciados,&  corrompidos  os 
bens,  que  a  gentileza  he 
laço,  o  valor  delito  ,  &  o 
entendimento  locura. 

404  Mas  para  que  he 
irmos  bufcar exemplos  ao 
Teíta mento  Velho, fe  no 
Novo,6c  no  noííb  Evange- 
lho temos  o  maior  de  to- 
dos. Transfígurouíe  Chri- 
ílo  no  Tabor,  apparecéraó 
alli  Moy fes,  &  Elias  >  & 
quádo  parece  que  haviaó 
de  dar  o  parabém  ao  Se- 


munhodo  Texto  fagrado     nhor,  da  gloria  com  que  o 
feouviaó  como  oráculos     viáonaquellemonte,oem 


do  mefmo  Deos.  Seguio 
as  partes  de  Abfalam,quã- 
do  fe  rebellou  contra  feu 
Pay,  aconfelhou-o  como 
lhe  convinha  5  &:  porque  o 
moço  fatal  naó  quiz  fe- 
guirfenaóoquejà  o  leva- 
va ao  precipicio,  foi  tal  a 
fua  defefperaçaójque  atan- 
do a  banda  ao  pefcoçOsSc  a 
húa  trave,  fe  afogou  a  fy 
mefmo.  E  efta  foi  a  peníliô, 
que  pagou  Achitofel  ao 


que  lhe  falláraó  ,  foi  da 
morte  que  havia  de  pade- 
cer no  do  Calvário  :  Lo- 
que bantur  de  exceffti,  quem  \'i'^' 
completiiTus  erat  in  leru fa- 
lem. Pode  haver  pratica 
mais  alhea  da  occafiáo  que 
efta.?  Qu^^ndo  o  roflo  de 
Chrifto  eftá  rcfpíandccen- 
tccomoo  Sol,  então  lhe 
fallãonoccclypfc?  Quan- 
do as  fuás  roupas  cli-áo 
brancas  como  a  neve,  en- 
tão 


da^arefma.  443 

tàõ  lhe  fallaõ  nos  lutos?  E     fazermos  taó  pouco  cafo 


no  dia  que  tem  mais  ale- 
gre na  fua  vida ,  entaó  lhe 
fallaó  na  morte  ?  Sim.  Por- 
que naó  ha  alegria  nefte 
mundo  taó  privilegiada, 
que  naô  pague  penfaó  à 
triíleza.  Atè  no  monte  Ta- 
bor,  atè  na  Peífoa  de  Chri- 
fto  ,  atè  no  milagre  da 


dos  feus  chamados  bens, 
pela  miftura  que  fempre 
trazem  demales^comofe 
verdadeiraméte  foraò  pu- 
ros males  fem  nenhúa  có- 
poíiçaójou  temperamen- 
to de  bens.  He  doutrina, 
que  defpedindofe  do  mun- 
do o  Redemptor  dellenos 


Transfiguração ,  por  mais     deixou  eftampada  com  feu 
foberanos   que  fejaó    os     exemplo  no  meímo  mon- 


bens,  húa  vez  que  tocáraó 
na  terra,  naó  pode  haver 
gofto  fem  pezar,  nem  glo- 
ria fem  pena.  Tanto  affim, 
que  fe  faltar  o  motivo  na 
prefença  do  que  he ,  have- 
lo-ha  na  memoria  do  que 
ha  de  fer  :  transfigurado 
agora,  mas  crucificado  de- 


te  Calvário.  Duas  vezes  no 
Calvário  deraô  fel  a  Chri- 
ftoj  húa  antes,outra  depois 
de  crucificado.  Antes  de 
crucificado  ,  quando  lhe 
deraó  vinho  miftura  do  có 
fel ;  'Dederunt  ei  vinum  cum  Matrh; 
felle  mixtum  :  depois  de^^'^"^'- 
crucificado,  quando  dizê- 
pois.  £  fendo  a  Transfígu-     do  na  Cruz ,  que  tinha  fe- 
raçaójcomo  logo  áiílh  o     de,  lhe  deraó  fel,  Sc  vina- 
mefmoChrifto,  parecida     gre  :  ""Dederunt  in  efcam 
com  a  Refurreiçaó,  &  naó     meamfel^ò' infiti  meapota- 1^^^^' 
com  a  morte  3  viráó  dous     verunt  me  aceto.  E  como  fe     '^' 
homens  do  outro  mundo,     ouve  o  Senhor  em  hum,& 
que  mifturem  a  morte  có     outro  cafo  ?   Em  ambos 
a  Transfiguração,  &  con-     provou  hiia,  8c  outra  bebi^ 
fundaò  oCalvariocom  o     da,&emambosanaóquiz 

beber.  Aíli  m  o  referem  da 
primeira,  &  dafegunda  os 
Evágeliílas  pelas  mefmas 
palavras  :  Cíè;f/^///?^/f/,  i.^3^/ 


Ta  bor. 

405-  Seja  pois  a  con- 
clufaó  dcftas  expericcias , 
& defenganos  do  mundo, 


44-+  Sermão  da  fegnndaT)omingd 

noluit  blbere.  Na  primeira     ambas  as  bebidas  hia  fcí. 


I 


bebida,  he  cerco  que  hia  o 
amargo  do  fel  moderado 
com  o  doce  do  vinho, & 
nafegunda  hia  o  mefmo 
fel  naó  moderado  ,  fenaó 
exafperado  com  o  azedo 
do  vinagre.Pois  í^q  o  fel  hia 
táo  differentemente  tem- 
perado em  húa,  &  outra 
bebida,  porque  igualmen- 
te as  regeitou  o  Senhor 
ambas,  fem  nenhúa  diíFe- 
rença?  Porque  na  primei- 
ra o  vinho  mifturado  com 
o  feI,&o  doce  com  o  amar- 
go ,  era  o  bem  miílurado 
com  o  mal :  na  íegunda ,  o 
fel  junto  com  o  vinagre, 
era  hum  mal  fobre  outro 
mal,  fem  nenhua  miílura 
de  bem:&  provando  Chri- 
llo,&  reprovando  igual- 
mente húa,  &  outra  bebi- 
da ,  quiz-nos  deixar  por 
doutrina ,  &  por  exemplo 
naconfufaò  dps  bens  ,  & 
males  de  que  fe  compõem 
efte  mundo,  que  tanto  de- 
vemos defprezar,  &  abor- 
recer o  bem  miíhiradocó- 
o  mal,  como  fe  o  bem,&o 
mal  tudo  fora  m:jl,fcm  ne- 
nhua mitlura  de  bem.  Em 


em  húa  juntamente  com 
vinho,  em  outra  juntamé- 
te  com  vinagre,  que  he  vi- 
nho corrupto;  &  he  tal  a 
corrupção,  que  caufa  nos 
bens  a  companhia,  &  mi- 
ftura  dos  malesjque  o  bem 
miílurado  com  o  mal  fe 
converte  totalmente  em 
mal ,  &  perde  todo  o  fer 
que  tinha  de  bem.  Faça- 
mos pois  de  todos  os  cha- 
mados bens  defte  mundo  a 
eftimaçaò,  &  conceito  que 
elles  merecem  :  indigno, 
qualquer  que  feja ,  de  fer 
amado  como  bem  ,  fenaó 
abominado,  &  aborrecido 
como  verdadeiro,  &  puro 
mal:&  pela  miUura  que 
tem  de  doce,  ainda  mais 
abominado ,  &  mais  a  bor- 
recidojcomo  mais  falíò,<5c 


enganoío. 


§.  V. 


4,06 

cclcffia 

quei 

da  gloiia 


SOo 
que 


os  bens  dá- 
lia    pátria 
íó  os  bens  da- 
a  terra  de  Promiffiõ 
fó  os  bcjiS  da- 
quclic Taborda  Berna vc- 
turança, 


^a^arepma.  44  f 

turança  ,  fó  aquellesuni-     arvore   da  Ciência  ,  &:  a 


camcnte  fe  podem  cha- 
mar bens  ,  porque  fó  faó 
bens  fem  miftura  de  ne- 
nhum mal.  He  o  Ceo  co- 
mo o  Templo  de  Sala- 
máo,  em  que  nunca  fe  ou- 
vio  golpe  de  martello, 
porque  là,  como  diz  o  E- 
vangelifta  Profeta,  nao  ha 
coufa  que  caufe  dor  ,  ou 
pena,  nem  tire  da  boca 
hum  ay :  &  faó  os  morado- 
res do  mefmo  Ceo,  como 
as  Eílrellas  fixas  do  Fir- 
mamento ,  onde  naó  che- 
gao  fumos  dos  vapores  da 
terra  ,  que  as  offufquem : 


arvore  da  Vida.  Mas  a  da 
Ciência  continha  dous 
contrarios,a  da  Vida  naó  : 
porque  a  ciência  era  do 
bem,&  juntamêtc  do  mal, 
que  he  o  contrario  do  bê : 
&  a  da  Vida  era  da  vida  fó- 
mente,&  naó  da  vida,&:  da 
morte,  que  he  o  contrario 
da  vida.Pois  fe  ambas  craó 
arvores  do  Paraifo  ,  por- 
quê havia  nellas  efta  gran- 
de differença  >  Porque 
também  o  Paraifo  naó  era 
abfolutamente  Paraifo,fe- 
naò  Paraifo  terreal :  &  por 
iífohúa  das   fuás    plantas 


gozando  todos  em  fumma  era  parecida  às  delicias  da 

paz  a  pátria  do  fummo  terra,  &:  outra  femelhante 

bem  ,  que  naó  feria  fum-  às  do  Ceo.  A  parecida  às 

mo,  nem  bem  ,  fenaó  ex-  da  terra  ,  era  da    ciência 

cluiífe  todo  o  mal  por  mi-  do  bem,&  do  mal  j  porque 

nimo  que  feja.  E  por  iíTo  fó  na^rerra  fempre  o  mal  anda 

os  bens  naturaes  da  mefma  miílurado  com  o  bem  :  âc 

pátria  faó  puros,  finceros,  a  femelhante  às    do  Ceo, 

&    perfeitamente    bens ,  era  de  vida   fem  morte } 


fem  corrupção,  contrarie- 
dade,nem  miftura  de  mal. 
407  Entre  todas  as  piá- 
tas  do  Paraifo  terreal  ou- 
ve duas  arvores  maisin- 
;íignes  5  &dequefófabe- 
;nosonome,  que  foraó  a 


porque  no  Ceo  todo  o  bê 
liepuroj^c  íincerofem  mi- 
íl:ura,nem  companhia  de 
Aílim  o  diz  S.  João 


maj 


defcrevendo  a  Jerufalem 
da  gloria:  &  naó  dà  outra 
p;2ão  deftâ  djjíFerença  de 

CQB- 


} 


4^'^'  Scrmaodiíug 

cottfíis  ,  íeti.io  ierein  húas 
as  Í€giindas,  que  faó  as  do 
Ccoiôc  outras  as  primei- 
rasvquefaó  ,  ou  foraó  as 
deíle  mundo:  Et  mor  sul' 
tranon  erity  neque  luãttsy 
Apoc.  neque  dolor  erit  ultra ,  quia 
21.4.    prima  abierunt. 

408  Para  prova  dos 
bens  deíle  mundo  fempre 
mifturados  com  males, 
tomei  por  teílemunha  a 
natureza;  &  para  prova 
dos  bens  do  Ceo  puros,  & 
fcm  miftura,  tomemos  por 
teftemunha  a  arte.  A  arte 
para  purificar  o  ouro,  co- 
mo elle  he  o  mais  preciofo 
metal  ,  aplicalhe  também 
o  maisefficaz,  ^poderofo 
elemento,  que  he  o  do  fo- 
i'.yf^*  go :  Aurum  quod per  ignem 
probatiir.  Alli  o  purga,  &; 
alimpa  das  fezes  ,  alli  o 
prova, &  lhe  apura  a  fineza 
dos  quilates  j  &  entaó  fe 
reputa  entre  nòspor  ouro 
purifiimo.  Mas  para  que  íe 
veja  o  noíTo  engano  ,  po- 
nhamos eíTe  meímo  ouro 
noCeo.  Diz  S.Joaõ,  que 
as  ruas  da  Cidade  do  Ceo 
VlpfK.  faó  de  ouro  limpo :  ^toí^^ 
2i.ai.  Ci<uiía^}s  aurum  mundum. 


'iridá  ^ominjra 
\í  íe  perguntarmos  y  eíla 
limpeza  ,  &  pureza  cfo ou- 
ro do  Ceo  em  que  confi- 
íle?  Depois  de  dizer  au- 
rum munaum ,  acrecenta ,  ibij, 
tanquam  vitrum  ferluct- 
dum^  que  he  puro  ,  &:  lim- 
po, porque  he  diáfano,  Sc 
tranfparente  como  vidro. 
Logo  fe  o  ouro  entaó  he 
puro  ,  &  limpo  ,  quando 
chega  a  fua  fineza  a  fer 
diáfana  ,  &  tranfparente 
como  o  vidro  i  bem  {ç^íq- 
gue,que  o  noíTo  ouro  craf- 
fo,  eípefix),  opaco ,  &  que 
nenhúacoufa  tem  de  diá- 
fano, nem  tranfparente, 
por  mais  que  nos  lifongee 
comafuacor  ,  &  nòs  nos 
enganemos  com  elle  ,  de 
nenhum  modo  he  ouro 
limpo,  Sc  ;puro.  De  ma- 
neira, que  comparado  o 
ourodaterra,queos  Rcys 
põem  febre  a  cabeça,  com 
o  ouro  do  Ceo,  queosBé- 
aventurados  trazem  de- 
baixo dos  pès,  platea  ejus ; 
todo  o  da  terra  eílà  pene- 
trado de  fezes,  &cheo  de 
efcoria,  poílo  que  nòs  a 
nao  vejamos  ^  èz  íó  o  do 
Çeohepuro  ,  Sc  limgo. 


aurum  mundum 
do,  fe  pedirmos  ao  mefmo 
Evangelifta,  que  nos  diga 
com  que 


ingredientes 


fe 


purifica  tanto  efte  ouro  do 
Çeo  ?  Refponde,  que  fó 
com  entrar  no  mefmo 
Ceo :  Nonintrabit  in  eam 
ibiiz;.  aliquod  coinquinatum,  E 
como  aquella  he  a  nature- 
za do  Ceo,  &eíla  a  da  ter 


ãa§luarefma,  44.7 

Sobre  tu-  da  noíTa  vontad  e,  e  m  quá- 
to  quer,  he  o  bera  j  '&  o  ob- 
jedoda  mefma  v<ontade, 
em  quanto  não  quí^r,  he  o 
mal  :&  como  tudo  o  que 
ha  no  Ceo  he  o  bem,  &  o 
que  não  ha  no  Ceo  he  fó  o 
mal  j  por  iíTo  ha  no  Ceo 
tudooque  quizermos,  & 
fó  não  ha  o  que  naó  qui- 
zermos.  Se   nos  bens  do 


ra  j  a  mefma  diíFerença  de     mundo  ouvera  eíla  fepara- 
ouro  a  ouro  nos   eníiua,     çaó,  também  na  terra  po 


que  aílim  como  na  terra 
naó  pôde  haver  bem,  que 
careça  da  miftura  de  mal, 
afllmtodososdo  Ceo  faó 
puros,&fem  miftura. 

409  Se  quereis  faber 
de  mim  ("  dizia  pregando 
S.  Agoftinho  }  o  que  ha  no 
Ceo  ?  Naó  vos  poíTo  dizer 
o  que  ha,  fem  dizer  tam- 
bém o  que  naó  ha.  Ihl  erit 
quidquidvoles ,  &  non  erit 
quidquid  nolles.  No  Ceo 
ha  tudo  o  que  quizerdes, 
&  fó  naó  ha  o  que  naó  qui- 
zerdes.  Logo  parece  que 
o  Ceo  he  feito  pela  medi- 
da da  noífa  vontade.?  Naó. 
A  noíTa  vontade  he  a  fei- 


derao  homem  querer,  & 
gozaro  bem  fem  o  mal: 
mas  por  mais  que  queira, 
naó  pôde  5  porque  fempre 
o  mal  anda  naó  fó  junto, 
fenaó  penetrado,  &  infe- 
paravel  do  bem.  E  para 
que  acabemos  de  conhe- 
cer a  futileza  com  que  os 
mefmos  chamados  bens 
nos  lifongeaô,  &  alegrão  9 
&  com  falfas  aparências 
degoílo  disfarçaó  o  mal, 
que  fempre  levaó  comll- 
go,  levemolos  nós  ao  exa- 
me do  Ceo,  &làfe  defco- 
brirà  o  feu  engano. 

410     Diz  o  mefmo  E- 
vangelifta  S.  Joaó  [  o  qual 


ta  pela  medida  do  Ceo :  &     he  força,  que  tornemos  a 
porque  .^Porque  o  objeâro    ouvir, fuppoílo  que  S.Pau- 
lo, 


448  Sermão  da  ftgiinda  dominga 

lo, que  também  vio  o  Ceo,     ÍI05&  as  da  grande  alegria. 


nos  naó  quiz  dizer  nada.^ 
Diz  pois  o  Evangeliíla  t?ó 
notável  no  que  diz  ,  como 
nas  palavras  com  que  o 
dizjqueatodos  os  quede- 
íle  mundo  paíTaó  ao  Ceo , 
lhe  enxuga  Deos  os  olhos 
de  toda  a  lagrima ;  Etab- 
Apoc  7.  Ji^^g^^  T>eus  omnem  lacry- 
*7-  mam  ab  oculis  cortim.E  que 
quer  dizer  toda  a  lagrima? 
Quer  dizer  todo  o  género 


que  fó  a  grande  alegria,  6c 
o  grande  gofto  fazem  re- 
bentar os  olhos  em  lagri- 
mais j  porque  fe  naó  haò  de 
admitir  no  Ceo  ?  Porque 
todas  eíTas  lagrimas  foraò 
deíle  mundo.  E  lagrimas 
defte  mundo  5  ainda  que 
foíTem  de  alegria,  &  gran- 
de alegria  5  nunca  podiaó 
fer  de  pura  alegria,  &  ain- 
da que  foíTem  de  goílo,  & 


de  lagrimas  [como aguda,  grande  goílo  ,  nunca  po- 

&  literalmente  comenta  S.  diaó  fer  de  puro  goíl  ojpor» 

Ambrofio)  porq  neíle  mu-  que  no  mundo  naó  ha  go- 

do  naó  fó  ha  lao;rimas  de  ftofemmiílura  de  pezar, 


dor,&  triíleza,  íenaó  tam- 
bém lagrimas  degoíto5&: 
alegria :&:  aíTim  de  híias 
como  de  outras  enxuga 
Deos  CS  olhos  dos  que  vaó 
ao  Ceo.  As  palavras  do 
grande  Doutor  da  Igreja 
laóeílas;  jihjlerget  ''Dctis 
omnem  lacry  mam ,  71  am  iri- 
fiitia  jdpe  lacrymas  edu- 
cit^fapè&  Utúia^jape  & 
gaudium.  Mas  que  as  lagri- 
mas da  triíleza,  &  da  dor 
naó  tenhaó  lugar  no  Ceo, 
bemeflà:  porém  as  lagri- 
mas da  alegria, 6c  do  golto, 
&  mai^  ^s  do  graiidc  go- 


nem  alegria  fem  miítura 
de  triíleza  :  &  femelhantes 
miíluras  de  nenhum  modo 
tem  lugar  no  Ceo,  onde  as 
alegriasj&:  osgoílos  ,  co- 
mo todos  os  outros  bens, 
faó  puros,  6c  fem  miílura 
de  mal.  A  alegria  no  Ceo 
hc  lem  trifteza,  o  goílo  he 
fem  pezar,  o  defcanfo  hc 
fem  trabalho,  a  fegurança 
he  fem  receo,o  focego  fem 
fobrefalto,  a  paz  íem  per- 
turbação, a  honra  fem  ag- 
gravo,  a  riqueza  fem  cuí- 
dado,a  fartura  íem  faílio> 
a  grandeza  fem  cnveja  ,  a 
abuji- 


ãa  ^arefma.  44^ 

abundância  fem  mingua,a  abundantiafine  indigentia : 
companhia  fem  emulação,  oãavus  pax  fine  perturba^ 
a  amizade  fem  cautela,  a     tione  :  nonusjecuntas  alTJ^ 


faudefem  enfermidade,  a 
vida  fem  temor  da  morte  \ 
emfím  todos  os  bens  pu- 
ros, &:  fem  miít  ura  de  mal, 
&  por  i^o  verdadeiros 
bens.  O  Bemaventura- 
dosdoCeo,olhailàde  ci- 
ma capara  eíle  mundo,  & 
tende  nova  gloria  accidê- 
taldos  bens  que  gozais, 
naò  digo  em  comparação 
dos  malesjfenãodos  bens, 
quenôs  padecemos. 

411  Mas  confirmenos 
cila  corrente  de  bens  fem 
males  hum  compédio  dos 
mefmos,  &  femelhantes 
âttributos  5  com  exclufaó 
cada  hum  do  feu  contra- 


que  timore :  decimus  cogni- 
tio  abfque  ignorantia :  unde- 
cimus gloria  (me  ignomima: 
duodecimus  gauàium  fine 
trifiitia.  Atè  aqui  o  Dou- 
tor Seráfico,  o  qual  neftas 
doze  prerogativas  de  bens 
fem  males  nos  defcreveo 
hum  inefável  zodiaco  de 
glorias  ,  o  qual  todos  os 
Berna venturadosnaó  nos 
dozemezes  doanno,nem 
nas  doze  horas  dodia,mas 
fempre,&  fem  ceifar  eftaã 
correndo,  &  gozando  im- 
movel mente  no  circulo 
fem  fim  da  eternidade.  Di- 
tofos  elles,  que  gozaô  tan- 
to bem ;  &  nòs  também  di- 


rio,  os  quacs  reduz  S.  Boa-    tofos,fe  nos  difpuzermos 
ventura  a  numero  de  do-    ao  nao  perder. 


2C,  como  outros  tãtos  fru- 
tos da  Bemaventurança. 
Trimus  eft  fanttas  abfque 
infirmitate-.fecundusjuven^ 
tus  fine feneãute :  tertiusfa- 
tietasfmefafiidio  :  quartus 
libertas  fine  fervitute :  quin- 
tus  pule  hritudo  abfque  de- 
formitate  \fextus  impaffibi- 


41a  A  Segunda  dif- 
jCjkS^réí^^  da  nof- 
fa  propoíta ,  he,  que  dos 
bens  do  mundo  quando 
muito  logra  cada  hum  os 
feus :  dos  bens  do  Ceo,  & 


litas  abfque  dolore  '.feftimus    no  Ceo  Ipgra  cada  hum  os 
Tom.  7.  Ff  feus, 


45 ^  Sâr//:ao  dafegunda 'T>om'mga 

íeus,  &  mais  os  de  todos,  cida  a  verdade,  fe  lhe  nam 

DiíTe quando  muito;  por-  reftituiíFe.Suaeraafazen- 

que  muitas  vezes  naó  ba-  da  doPay  de  familias  do 

fta,  que  os  bens  deíle  mun-  Evangelho,  encomendada 

do  íejaó  noíTos,  para  que  o  a  hum  feitor,  para  que  ar- 

mefmo  mundo  nolos  dei-  '  ^ 
xe  lograr.  Sua  era  de  Na- 
both  a  vinha,  &  naó  fó  fua 


ZI.2. 


por  todos  os  direitos  hu- 
manos, mas  por  diftribui- 
çaó,6cdoaçaó  divina,  & 
por  mais  que  elle  a  quiz 
Iograr,&  defender,  baftou 
queElRey  Achab  tiveíTe 
appetite  de  pi  atar  no  mef- 
mofitionaòhum  bofque, 
ou  hum  jardim,  fenaóhúa 
horta  de  verduras  popula- 
res, Hortum  o  ter  um  s  para 
que  em  adulação  do  mef- 
mo  Rey  lhe  fofle  tirada 
poriuftiçaavinha,&  mais 
ávida.  Sua  era  de  Miphi- 
bofeth  a  herança  de  feu 
Pay  Siíul,em  que  vivia  pri- 
vadamente, quando  tinha 
direito  para  afpirar  à  Co- 
roa,6í  bailou  o  falfo  teíle- 
munhodebura  criado  in- 
fiel, para  que  acufado  fal- 
famente  de  crime  de  lefa 
Magcílade,  lhe  foíTc  con- 
fífcadaamcfma  herança, 
&z  ainda  depois  dç  conhe- 


recadaíTe  as  rendas  dos 
que  a  cultiva vaó,  &  nam 
baftou  que  conííaíTe  por 
efcritos  o  que  cada  hum 
devia  ,  para  que  o  mefmo 
feitor  naó  roubaíTe  grande 
parte  das  mefmas  rendas 
com  tal  aftucia  ,  que  nem 
demandar  o  pode  o  Se- 
nhor, &  em  vez  de  o  acu- 
far,  o  louvou.  Mas  q  mui- 
to que  a  cobiça,&:  inHdcli- 
dade  alhea  nos  naó  deixe 
lograr  os  bens  deíle  mun- 
do.por  mais  que  fejaó  nof- 
fos-,  fe  nos  mefmos  lem 
outro  inimigo,  ou ladraó 
bailamos  ,  &  por  noíTa  vó- 
tade  ,  para  nos  deípojar 
dellesí  PozDeosa  Adam 
noParaifocom  obrigação 
de  que  o  cultivaílc&guar-  ^^^^ 
dalle:  ^t  operarctur^&  cu-  ;.if. 
flodiret  íllum  Sc  eíla  fcgú- 
da  parte  quando  menos 
parece  que  naó  tinha  lu- 
gar naquclle  eíiado. Outro 
homem,  de  quem  Adam 
ouvefie  de  guardar  o  Pa- 
ra ifo. 


raifojnaòohaviano  mun-     MasnaóíicaíTim.  Fupara 


do.  Para  os  animaes  tam- 
bém naó  era  neceílaria  a 
o-uarda,  porque  todos  por 
inftinto  natural ,  &  foge i- 
ção  inviolável  o  obede- 
ciaó:  logo  de  quem  havia 
de  guardar  Adam  o  Parai- 
fo^Dequem  o  naò  guar 


lograr  o  meu ,  heime  dé 
guardar  de  vòs:  &  vòs  pa- 
ra lograr  o  vpííò ,  haveis^ 
vos  de  guardar  de  mim. 
Poriílbchamao  Santo  ao 
meuj&teu  com  elegância 
verdadeiramente  áurea, 
palavra  fria :  Meum^ac  tuu 


dou .  Havia-  o  de  guardar    frjgidíim  illud  ver  hum.  E 
defymefmo:  &  porque     quefrieza50u  frialdade  hc 


Adam  o  naó  guardou  de 
Adam,  fendo  os  bens  que 
poíTuia  todos  os  do  mun- 
do, elle  mefmo,&  fó  elle  fe 
defpojou  de  todos,fem  ha- 
ver outro,  que  lhe  impe- 
diífe  o  logralos. 

4,1  g  Dando  a  razaó 
defta  differença  entre  os 
bens  do  mundo,  6c  os  do 
Ceo  S.Joaó  Chryfoílomo, 
diz  em  húa  palavra,  que 
he,  porque  no  mundo  ha 
ineu,&:'  teu,&  no  Ceo  naó: 
Vbi  non  eft  meum  ,  ac  tmim 
frigidíim  illud  njerbum.An- 
tes  parece,que  porque  no 
inundo  ha  meu,&  teu,  por 
iíTo  havia  de  lograr  cada 
humofeu  pacificamente, 
&  fem  cótenda :  eu  o  meu^ 
porque  he  meu  ;  &:  vos  o 
voífo ,  porque  he  voífo. 


efta  do  meujfic  teu  ?  He  taí 
frieza,&  tal  frialdade,  que 
naô  ha  amor  no  mundo 
tão  ardente  por  natureza , 
&:táointenfo  por  obriga* 
ção,  que  logo  não  esfrie. 
Em  havendo  meu,  &  teu, 
não  ha  amor  de  amigo  pa- 
ra amigo,nem  amor  de  ir- 
mão para  irmão,  nê  amor 
de  filho  para  pay,né  amor 
de  pay  para  jfilho  ,  nem 
amor  de  próximo  ,  por 
líiais  religiofo  que  feja,pa- 
ra  outro  próximo  ,  nem 
amor  do  mefmo  Deos  pa* 
ra  Deos.  Antes  de  haver 
meu ,  &  teu ,  havia  amor, 
porq  eu  amavavos  a  vòs,Sc 
vòs  a  mim:  mas  tanto  que 
omeu,&  teufe  meteo  de 
por-meyo,8cfe  atraveíTou 
entre  nòs,  lo2;o  fe  acabou  o 
Ffij        axiioti 


4-52  Sermão  ^afegunda  dominga 
amor  5  porque  vòs  jà  me  mitesdecadahum,inven- 
nãoamaisamim  jfenaó  o  táraóos  marcos  j  &  para 
meu  5  nem  eu  vos  amo  a  guardara  vinha  ,  &  o  po- 
vos, fenão  o  voílb.  No  mar,  inventarão  os  vala- 
principiodo  mundo  ,  co-  dos,  asfylvasjas  {ç.Yts^^ 
mo  gravemente  pondera  as  paredes  de  pedra  liga- 
Seneca,  porque  nao  havia  da,  ou  foi  ta  >  mas  tudo  lílo 


guerras  ?  Porque  ufavaó 
os  homens  da  terra  como 
do  Ceo.  O  Sol ,  a  Lua  ,  as 
Eftrellas  ,  &  o  ufo  dafua 
luz he comum  a  todos,  & 
aíHm  era  a  terra  no  princi- 
pio: porem  depois  que  a 
terra  fe  dividio  em  diífe- 
rentesfenhores,  logo  ou- 
ve guerras,  &  batalhas,  & 
fe  acabou  a  paz ,  porque 
ouve  meu,&  teu. 

414  Que  direi  dos  me- 
yos, &  dosremedios,  das 
induftrias,  das  artes,  ^m- 
fl:rumentos,que  oshomês 
tem  inventado  ,  para  que 
€ada  hum  podeíTe  poíluirj 
&  lograr  o  feu  íegura  ,  6c 
quietamente  -,  mas  fem 
proveito  ?  Para  guardar  a 
cafa  inventarão  as  portas, 
Ocas  fechaduras  i  mas  pela 
mefma  abertura,poronde 
cncra  a  chave,  deixa  tam- 
bém aberta  a  entrada  para 
ii^azua.  Para  finalarosli- 


fe  rompe,  &  fe  efcalla.  Pa- 
ra guardar  as  Cidades  in- 
ventarão os  muros  ,  os  fof- 
fos,  as  torres,os  baluartes  > 
as  fortalezas,  os  preíidios, 
a  artelharia  ,  a  pólvora; 
mas  naó  ha  Cidade    taó 
forte,  que  por  bataria ,  ou 
por  aíTalto,  ou  minada  por 
debaixo  da  terra,  ou  pela 
ar,  fe  naó  expu  gne,  &  ren- 
da. Para  guardar  os  Rey- 
nos,  &  os  Impérios  inven- 
tarão as  Armadas  por  mar, 
&  os  exércitos  por  terra , 
tantos  mil   foldadosa  pè, 
tantos  mil  acavallo,  com 
tanta  ordem,&:  difciplina , 
com  tanta  variedade    de 
armas,  com  tantos  artifí- 
cios,&:machinas  bellicas; 
mas  nenhum  deíles  appa- 
ratos  taó  eílrondofos,  & 
formidáveis  tem  bailado, 
nemparaqucos  Aílyrios 
guardalTcmo  fcu  Império 
dos  Perfis,  nem  os   Perfas 
o  fcu 


o  feu  dos  Gregos,  nem  os 
Gregos  o  ícu  dos  Roma- 
nos, nem  os  Romanos  fi- 
nalmente o  feu  daquelles  a 
q\iem  o  tinhaó tomado, 
tornando  a  fcr  vencidos 
áos  mefmos  que  cinhaô 
vencido  ,  Ôc  dominado. 
Mais  inventarão ,  &  fize- 
raô  os  homens  a  eílemcf- 
mofimdc  coníervar  cada 
hum  o  feu.  Inventarão,  & 


guim  com  a  chuça  ,  todos 
foraó  ordenados  p::ira  con- 
fervarem  a  cada  hum  no 
feu ,  &  todos  por  diíFeren- 
tes  modos  vivem  do  voíTo. 

§■  vn. 

41  f  TT  Sta  he  húa  das 

^,  razoens,a  qual 

o  divino  Meftre  Chriílo 

Senhor  noíTo  nos  allcga> 


firmarão  Leys,  levantarão     para  que  façamos  os  nof- 
Tribunacs  ,  conílituiraó     íbs  thefouros  dos  bens  do 


Magiílrados,  deráo  varas 
às  chamadas  Juíliças  com 
tanta  multidão  de  Mini- 
ílros  maiores,  &  menores, 
€c  foi  com  cífeito  tão  con- 


Ceo,&  no  Ceo,  &  naô  dos 
bens  do  mundo,  &  na  ter- 
ra }  porque  na  terra  ha  l^^-uiath, 
droens  ,  &  no  Ceo  n2LO'.^^^<^' 
Nõlite  thefaufízare  vobis 


trario,  que  em  vez  de  dc«    interra^  ubi arugo^à'  tinea 
Ôcrrarcm  osladroens,  os    demoUtur^  &  ubi  fures  efo-. 


nictéraõ  das  portas  adcn* 
•troi^c  cm  vez  dcos  extin- 
guirem, os  multiplicarão  í 
éc  os  que  furtatáo  com 
ínedojéc  com  rebuço,  fur-* 
táo  debaixo  de  ProvifoéSa 
&:  com  imra unidade.  O 
Solicitrdor  com  a  diligen- 
cia, o  Efcriváo  com  a  pcn^ 
na,  a  Tcftcmunba  com  o 
i^ramcnto^  o  A  vogado  có 
a  allegaçâo,  ojulgador  cô 
f  fçaten,ja  ,  êc,  atè  oBeii-. 


diunt^&furantur^  Thefam 
fizate  atitem  imbis  in  O^. 
ki  ubi  neque  arugo-^nequetiÀ 
nead^moíitttr  ,&  aht fures, 
non  effoimnU  necfttmntur. 
Nas  quaes  palavras  fe  de- 
ve notar  m  uito,  quenáo  fó. 
nos  aconíelha,  &:  manda  í>> 
Senhor,que  guardemos. ^^^ 
noííbs  bens  dos  ladroensv 
da  cobiça  ,  fenãotambem 
dos  ladroens  da  nattirezar  : 
VkidrugOy&tinea  demoU^ 
Ff  iij  tur^ 


4  í  4  Sermão  ãafegtinda  'T^ominga 

tur.  Os  bens  deíle  mun-     Que  faó  todos  os  eíemen* 

tos,  fenáo  huns  roubado* 
res  unívcrfacs  de  tudo  o 
que grangea,&  trabalha  o 
género  humano  ?  O  fogo 
nos  rouba  com  os  incên- 
dios, a  agua  comasinun- 
daçoensjoarcomas  tem- 
peib  des,  &  a  mefma  terra 
com  os  exércitos  innumc- 


do,como  faó  corruptiveis, 
ainda  que  náo  haja  ladrão, 
que  os  furte,  el!es  mefmos 
fcnosroubáoi  porque  as 
roupas,  por  preciofas  que 
fejáo,  come-asa  polilha, 
que  nafce  das  mefmas  rou- 
pas j  &  os  metaes  ,  ainda 
que  fejáo  ouro,  &  prata, 
roe  os  a  ferrugem,que  naf-  ravcis  de  pragas  ,  que  co- 
ce  dos  mefmos  metacs.     mo  femcada  comos  den* 


Porém  os  bens  doCeo,quc 
faô  in corrupd veis  ,  nem 
dclles  fe  pôde  gerar  vicio 
de  corrupção,que  os  gaite, 
nem  a  lima  furda  do  tem- 
po, que  tudo  confomc,  lhe 
pòdc  meter  o  dente  j  por- 
que a  fua  dureza  he  como 
a  fua  duração ,  &  faó  bens 
eternos.  Oh  quanto  mais 
nosenfinou  o  divino  Mc- 
ftrc  neílas  paIavras,do  que 
cilas  dizem!  Quando  não 
ou  vera  Coííàrios  no  mar, 
nem  falteadores  nos  cami- 
nhos, nem  ladroens  publi- 


tesde  Cadmo,  nafcem,  & 
fe levantão  delia ,  para  ou- 
tra vez  nos  roubar  o  que 
nos  tem  dado.  Ouçamos 
ao  Profeta  Joel.  Rtjiduum 
eruca  contídit  locujia  :  re- 
fiduum  locujla  comtdtí  ^í-H 
bruchus  :  re fiduum  bruchi 
comeãitrubigo.  V'icráo,diz 
JoeI,quatro  pragas  fuccef- 
íivas  à  terra,  hãa  fobre  a 
outra  E  que  íizerao  ?  To- 
talmctcdevaíUráoa  mef- 
ma terra,  íèm  perdoar  a 
quanto  ella  dà  cultivada, 
ou  cfpontanca mente  cria  , 


cos ,  &  fccreros  no  povoa-     &  fem  cultura.  O  que  áni- 
do  i  qucmjia  tão  podero-     xou  a  lagarta,  come  o  o  íza 


fojqucpoffaconfervar,  & 
lograr  o  que  poíTue  ncíle 
mundo  contra  os  roubos 
inevitáveis  da  natureza? 


fanhoto;  o  que  deixou  o 
gafanhoto,  comeo  o  pul- 
gão; &  o  que  deixou  o  pul- 
gão, comco  a  ferrugem. 
De 


BB 


De  forte,  que  para  ferem     eftecafo,os  cuidados,  os 


defpojados  os  nomens  dos 
maiores  bens,  &  mais  ne- 
ceílàriosàvida,  quacs  fao 
aquellesdc  queella  fe  íii- 
ftcnra,náo  depende  a  fua 
perda,&  defgraça  das  ho- 
llil  idades  ,  &  roubos  dos 
Sabéos,&dos  Chaldêos, 
que  deriruirào  as  terras,  os 
gados ,  &  as  herdades  de 
Job  5  mas  baftão  fó  as  pra- 
gas naturaes  da  mefma 
terra  corrupta,  para  que 
cm  hum  momento  fique 


trabalhos,&  osfuoresdos 
que  toda  a  vida,  &  todo  o 
amorempregáo  em  acqui- 
rír,&  aumentar  os  chama- 
dos bens  dcfte  mundo,  fc 
no  mefmo  tempo  cm  que 
cuidâo  que  faò  feus,  ná© 
fabem  para  quem  traba- 
lhão ?  He  ponderação  do 
frande  Rev  ,  &  Profeta 
)avid,  trifte  verdadeira- 
mente,&digna  de  quebrar 
as  mâos,&  os  ânimos  a  to- 
dos os  que  debaixo  defta 
tão  pobre  como  Job,  qual-     ignorância  fe  canção.  Lhej  pr^w 
querquefoífe  tão  rico,  &    fmrizau&ignotat  cm  ca-  387. 
abundante  como  elle.  Tu-    gregabtt  ea  :  Acquirem, 
dooquenafcena  terra,  o     ajuntão,  enthefourao,  & 
SoI,&:achuvaocria;  mas     não   fabem   para   quem. 
o  mefmo  Sol,  fe  he  dema-    Cuidáo  que  he  para  fy  o 
fiado,  o  queima^  &  a  mef-     que  chamaó  feu,  &  nao  he 
ma  chuva,  fe  he  muito  cò-     feu,  nem  para  fy  •,   porque 
tinuada,  o  afoga :  para  que     he  para  outrem,  &  tal  vez 
acabemos  de  nos  defenga-     paraomaior  immigo.Af- 
-mr  da  pouca  firmeza ,  ou     fim  lhe  aconteceo  àquelle 
fegurança  ,que  pôde  ha-     Rico,  a  quem  o   Evange- 
ver  nos  bens,  que  não  faó     lho  canoniza  com  nome 
do  Ceo  ,  pois  as  mefmas     nâofó  de  nefcio  ,  mas  de 
caufas,  que  os  dão ,  os  ti-     eftolido,/«/í^.  Dava  o  pa- 
rlo, &  as  mefmas  que  os     rabem  à   fua  Alma  pelos 
produzem,os  matão.  muitos  bens,  que  tinha  jii- 

416    E  como  ficáo  bal-     tos  para  muitos  annos  ;  A-  r^^^.^ 
4a4os,  ainda  fcm  chegar  a    nima  nita^habes  multa  hcna  -  9. 
.  ''^  Ffiiij         m 


4S^  Sermão  da  fegunda,  dominga 

in  anrwsplurmos,  E  fendo  jamos,  que  ouve  bum  hc 

mandado fair  deíle  mun-  memcaó  mimofo  da  for- 

donaquella  mefma  noite,  tuna  ,  que  todos  os  bens 

obidao.  ^  P^^g""^^'  9.^1^  i^^e  iize-  que  poíTue  deftc  mundo , 

t^o.íov.  Et  qu£  parafti^  ou  herdados,  ou   acquiri^ 

cujuserunt^-^   todoseíTes  dos,os logrou  pacificamc. 

bens,queajuntafte,&cha-  te,fem  que  a  inveja  dos 

mas  bens,  cujos  feráó  ?  O  iguaes,nem  a  potencia  dos 

trabalho  foi  teu,  Sc  os  bens  maiores  lhe  inquictaíFe  a. 

lerão  d^  quem naô   fabes.  poíTe,  ouduv^idaíTeo  do^ 

Nao  aíTim  os  h^m  do  Ceo,  m inio ;  que  felicidade  hc  a 

}>ra]m.  GIZ  o  mefmo  Profeta.  La-  defte  homem  ?  Primeira- 

ia/a.  hresmanuumtuarum.quia  mente  com  fer  fingida   &: 

manducabis,  beatus  es ,  &  nao  ufada ,  fe  os  bens  faó 
^ene  tibi  ent.  Vos  tra  balJia- 
icis  neíla  vida  -,  mas  na  ou- 
tra fereis  Bem  aventurado, 
porque  comereis  o  fruto 
<ios  voííbs  tra  bal  hos,ou  os 
mefmos  trabalhos  de  vo€- 
fas  máos;  Labores  manuum 


poucos,  nãodevedeeílar 
contentei  6c  fe  Çàò  mui* 
tos,  quem  duvida,que  ain- 
da defejamais.^  Sendo  ccr- 
to,queemhum,  &  outro 
caio  mais  vem  a  padecer, 
loerai 


que  a  lograr  o  qae  tem 
titarum,  Aquelle  foi  cano-  Mas  íê  por  graça  efpcciai 
nizadopor  nefcio,  &  eííe     de  Deos  he   eíTe  homem 


por  Berna  venturadoj  por 
que  fó  os  que  trabalhão 
pelos  bens  do  Ceo  fabem 
de  certo  ,  que  trabalhão 
paraf^^&parao  quehe,& 
hadeferfeu  eternamente. 


5-  VIII 


417 


M 


As  conceda- 
mos 3  ou  hn- 


táo moderado,  &taó  fe- 
nhor  de  feus  appetires,quc 
com  o  fcu  pouco,  ou  o  feu 
muito,  fe  dà  por  ratisfei- 
tojpoíTue,  &  logra  mais 
algúa  coufa  que  o  fcu  / 
Não.  Pois  eíhi  he  a  ditfc- 
rença,que  ha  entre  os  bens 
do  C  eo,  &  os  u  o  n  1  u  n  d  o. 
Os  do  mudo  quando  mui- 
to,^ por  nula^rc,  tanto  d* 
xia- 


JM 


da^arefma.  45-7 

natureza,  como  da  fortu-  portionem  fubftantia^  qua 
na,Iogra  cada  hum  os  feus:  TpÊcontingit.  E  eíle  pecca- 
os  do  Ceo  naó  fó  logra  ca-  do  cometido  em  prefença 
da  hum  os  feus/enaó  tam-    do  Pay,  coram  te ,  confeííà 


bem  os  de  todos.  Oh  fe  en- 
tendeííemos  bem  eílepõ- 
tOy  que  pouco  caíb  faría- 
mos dos  bens  da  terra] 
Arrependido  o  Filho  Pró- 
digo do  mal  aconfelhado 
que  havia  íido  em  fua  vi- 
da paíEida  ,  veyo  bufcar 
outra  vez  a  caía  do  Pay-)  & 
lançado  a  ícuspèsjlhedif. 
íè :  'Pater^Decvavi  in  Caiu , 
ér  coram  te:  Pay  meu  j  eu 
em  voíTa  prefença  pequei 
contra  o  Ceo.  Os  pecca- 
dos,  que  fe  condenaó  no 
Pródigo )  todos  foraó  co- 
metidos em  aufencia  do 
Pay,âc  muito  longe  dellei 
ibid.  x^i^  regionem  knginquam: 


IrUC. 


que  peçca do  foi  I ogo  eíle  gra  cada  hu  m  o  feu ,  fena  ni 
de  que  principalmente  fe  o  de  todos,  Nomefmoca- 
acufa,  cometido  em  pre- 
fença do  Pay,  5c  contra  o 
Ceo  ?  O  único  peccado, 
que  cometeo  o  Pródigo 
em  prefença  do  Pay  ,  toi 
pedir  que  lhe  déífe  em  vi- 
da a  parte  da  herança,  que 
lhe  tocava,  porque  queria 


lograr  o  ít^x^Ti^miida  mihi    es ,  ^  omnm  mea  tmfunt : 


o  Filho  arrependido,  que 
foi  peccado  contra  o  Ceo : 
^eccmnin  C^lum  ?  Sim; 
porque  pedir  fóafua  par- 
te, &  querer  lograr  iòm  en^ 
te  o  feu,  foi  igualar  o  Ceo 
com  a  terra.  Na  terra, 
quando  muito,  logra  cada 
hum  a  porçaó  dos  bens, 
que  tocáo  a  cada  hum :  ^a 
mihi  portionem  fubfianti£^ 
qíi£  mecontingtt ;  &  quem 
he  filho  do  Pay  do  Ceoj  & 
criado  para  o  Ceo  ,  con- 
tentarie  fó  co  m  o  feu  ,  h e 
injuria,  he  aggravo  ,  be 
peccado  grande,  que  co- 
mete cot  ra  o  mef  mo  Ceo, 
porque  no  Ceo  náo  fó  lo 


íb  o  temos. 

4 1 8  Eftranhando  o  fi- 
lho mais  velho  as  fedas 
com  que  o  Pay  celebrava 
a  reftituiçaó,6c  vinda  do 
mais  moço ,  as  palavras^ 
com  que  o  confolou,foraó 
eílas :  Fili^tufemper  mecum 


45"^  Sermão  dafegunãa  n^omlnga 

Fiiho\  vos  fempre  eftais     hum.  Sedfic  à perfecíis^é' 


coraigo  ,  &  tudo  quanto 
tenho,  he  voíTo.  Nefte  tu- 
do repara  muito  S.  Ago- 
ítinho  :  porque  tendo  o 
Pay  outro  filho,  &  o  Pró- 
digo outro  irmáo  ,  como 
podia  o  Pay  dizer  a  hum 
dellcs,quetudoo  que  ti- 
nha era  feu  ?  ^tdfibi  vult, 
omniameatuafunt^  quafi 
nonfint  &  fratris  ?  Nem 
obáa  ,  que  hum  dos  filhos 
nunca  íahiífe  da  cafa  do 
Pay ,  &  o  outro  fora  delia 


immortalíbus  filijs  haben  - 
tur  omnia^  utjmt  ò*  omniu, 
jingula^  ét  omrúa  Jingulo- 
rum :  rerpondeelegante,& 
doutamente  o  mefmo  S. 
Agoftinho.  Nefte  mundo, 
onde  os  homens  faó  mor- 
taes  ,  &  os  bens  também 
mortaes,  cada  hum  logra 
fomente  o  feu  •,  porem  no 
Ceo, ondeos  homens,  & 
os  bens  faó  im mortaes,  ca* 
da  hum  lograodecodos,& 
todos  o  de  cada  hum,  O 


viveíTctaò  perdida mente>     peccador  arrependido  lo- 
porquejà  eftava  arrepen-     gra  a  gloria  do  innocente, 


didodeíTamefma vida:  Sc 
onde  oPayhe  Deos,tan- 
to  direito  tem  à  herança 
dos  fcus  bens  os  arrepen- 
didos,como  os  innocentes. 
Aílim  que  a  duvida  toda 
eíl:à,ondea  põem  Agofti- 
nho,quc  he  no  omnia :  Om- 
ma  mea  tuafunt.  Pois  fe  os 
herdeiros  ,  &  os  irmãos 
craó  dous-,  como  diz  o  Pay 
que  tudo  era  de  hum  ir- 
mão ,  fendo  também  do 
outro  ?  Porque  fallou  co- 
mo Pay  do  Ceo  ,  &  dos 
bens  do  Ceo,onde  tudo  he 
de  todos  >  &  tudo  de  cada 


que  nunca  pcccou,  &  o  in- 
nocente, que  nunca  pec- 
cou,  logra  a  do  peccador 
arrependido:  &  nem  o  in- 
nocente por  innocente  cx- 
clue  o  peccador  ,  nem  o 
peccador  por  peccador 
defmerece  o  que  logra  o 
innocente  i  mas  todos  go- 
zaóodecadahum,  &  ca- 
da hum  o  de  todos  :  Om- 
niumjingíday  ô'  om/.ia  Jin» 
gulorum. 

419     Haverá  por  ven- 
tura na  terra  algum  exem- 
plo, que  nos  declare  cfta 
reciproca,  &  total  còmu- 
meação^ 


nicaçaõ,  taõ  total,  &  toda  também 
em  todos ,  como  total ,  & 
toda  em  cada  hnm?  Nun- 
ca ouve,  nem  podia  haver 
tal  excmplojou  íemelhan- 
ça  na  terra  -,  masfó  a  ouve 
depois  que  deceodo  Ceo. 
Equalhe?  O  diviniílimo 
Sacramento :  Tanis^  qui  de 
í^jT  ^^^^  àefcendit :  o  diviniíli- 
mo Sacraméco  lie  penhor 


4fP 

a  íèmelhança  $ 

porque  fem  femelhança 
não  pôde  haver  figura. Lo- 
go fe  o  Sacramento ,  em  q 
não  vemos  a  Deos,he  figu- 
ra da  gloria  5  que  confífte 
emveraDeosi  onde  eftà 
efta  figura ,  &  efta  feme-í 
Ihança?  Admiravelmente 
o  dizem  as  mefmas  pala- 
vras da  Igreja :  ^íam  pre- 


da  gloria,  ôr  figura  daglo-  tioficorporis  ,  &  fmguinií 
ria.  Húa  ,  &  oucra  coufa  tui  têporalisperceptio  pra- 
nos  enfina  a  Igreja:  pe-  J%"íír<2í.Notefe  muito  apa- 
nhar da  gloria ,  future gío-  la  vra  perceptio :  náo  confí- 
Ti^noms  pigniis  datm  :  ^^  íle  a  figura,  &  femelhança 
gura  da  gloria  ,  quam  pre'  do  S:icramento  com  a  g1o^ 


tiõficorpjns ,  ér  fmgumis 
tiii  têporalis  perctpttoprafi^ 
gurat,  O  penhor,  para  íèr 
penhor,  náo  be  neceífario 
que  ren  ha  a  íè m e  1  ha í i  ca , 
fenáo  o  p  reco,  &  va  I  or  do 
que  aíTegura.  Aífim  ve- 
mos, que  a  baxella,  outa- 
peceria  he  penhor  de  tan- 
ta quantia,  quanta  fe  nos 
fia  debaixo  delia  :  &  ifto 
mefino  tem  o  valor, &  pre- 
ço infinito  do  Sacramen- 
to, em  quanto  penhor  da 
gloria,  ^^las  para  fer  figu- 
ra da  gloria^  naó  bafta  fó  o 
valor ,  &  o  prejo  j  fcjoam 


na  no  que  recebemos,  po- 
lio  que  feja  o  mefmoDeos; 
mas  confiíí  e  no  modo  com 
que  o  recebemos  :  Tempo- 
r di s per  ceptttpr  afigurai.  E 
porque,^  Porque  a  ilim  co- 
mo no  Sacramento  tanto 
recebe  hum,como  todos, 
&  tanto  recebem  todos, 
como  cada  hum  i  aílim  na 
gloria  tanto  lograó  todos> 
como  cada  hum,  &  tanto 
cada  hum,como  todos.  Cà 
na  terra,  como  ha  a  divifaó 
de  meu  a  teu^cada  hum  lo- 
gra os  feus  bem,  mas  nam 
participa  os  dos  outros? 


» 


Luc. 
3) 


Mattb. 
17.4- 


46^0  Sermão  dafé^\ 

porém  no  Ceo  os  pro- 
prios,  &  os  dos  outros  ta  ri- 
to Hió  comuns  de  todos, 
como  particularesde  cada 
hum,  porque  là  nao  tem 
lugar  cita  divifaó. 

4Í0  Daqui  fe  enten- 
derá o  fundamento,  por- 
que  S.Pedro  noTaborfoi 
notado  pelos  dous  Evan* 

feliílas  S.  Marcos  ,  &•  S. 
,ucas  com  húa  ccnfura 
taò  pcfada  como  de  naó  fa- 
beroque  diíTc  :  Ntfiims 
quiddíceret.  O  que  áiííi^  S. 
redro,  foi ,  que  fizeíTcm 
alli  três  tabernáculos,  hum 
para  Chrifto  ,  outro  para 
Moyfes,  outro  para  Elias  : 
Faciamm  hic  tr^a  ta^erna^ 
culãitibiimumyMoyJi  tmurrh 
&Elf£imufn.  E  cm  que 
efteveo  erro,  ou  dcfacerto 
digno  de  taò  notável  ,  6c 
declarada  cenfura?  Eílcrc 
cm  que  íendo  o  Tabor 
naòíó  hum  retrato  da  glo- 
ria do  Ceo,  fenaò  hCia  par- 
ticipação própria ,  &  ver- 
dadeira do  que  nella  íe  go- 
za vquizS.  Pedro  introdu- 
zir 5  &  cítabelecer  noTa- 
borhua  couía  taô  impró- 
pria, &  alhea  da  meíaia 


haf 


unda  Vomivga 
gloria,  como  teu,  &:tcii: 
Tíhi  unum^  Moyfi  unnm^  & 
Eliaunum.  Excellentemé- 
tc  S.  Pafc  ha  fio.  Error  in 
céLíífa  eft^quta  triafipromit-  m^' h'." 
titf acere  tabemacuUy  unu 
Jciltcetj  ac  privai  um  Jofu  ^ 
alterum  Môyfi^  &  ídiud  E- 
Itíf^ua/inon  eos  caperet  usu, 
tahemaculunf  jfeu  in  unop^ 
mulconfiperenonpojjent.  S. 
Pedro  como  deíIntereíTa- 
donaóquiz  introduzir  na 
gloria  o  meu  »  &onofíb, 
porque  naó  diíTc  que  faria 
tabernáculo  para  Ç^^  ncid 
para  os  companheiros,  6< 
a tè  aqui  naó  errou  callan- 
do:  porem  tanto  qne  fal-i 
lou,&  difíe  v^ntum  ttvi ,  naó 
parando  alii,  mas  queren- 
do dividir  os  tabernacu-» 
los ,  &  fazer  outro  para 
Moyfcs,  &  outro  para  É^ 
liasj  como  fc  todo?}  naa 
coubeílem  no  mcfmo  ta-^ 
bernaculoj  ou  o  niefmo  ta- 
bernáculo naó  foíTc  capaz 
de  todos  i  aqui,  ^  ncíla  ái^ 
vilaò,  he  que  cilcvc  o  íeu 
çno,  porque  na  gloria  do- 
Cco,  que  o  Tabor  rcprc- 
fentavajO  tabernáculo  de 
Moyfes  hc  de  Elias,  &  o  do 
Elia^ 


da  ^arefma.  4^1 

Elias he  deMoy fes, fico  de  borem.  Os  indoutos',  por- 
Moyfes  ,  &  Elias  hè  de  que  também  muitas  vezes 
Chriftb,  &  o  de  Chrifto  hc 
de Moy fes,& he de  Elias, 
^hede  Pedro  ,  &  he  de 
João,  6c  he  de  DiogOjfem 
excluir  a  ninguém  ,  mas 
cómunicandofe  naó  fó 
univerfalmente  a  todos/e- 
naó  particularmente  a  ca- 
da hum. 


í.  IX. 

421  /^^Ontraefta  dou- 


trina porem , 
poílo  que  taó  provada,  me 
parece  que  eftão  replican- 
do naó  fó  os  doutos,  &  in- 
doutos  da  terra^fenaó  tam- 
bém os  Bemavencurados 
do  mefmo  Ceo.  Os  dou- 
tos, porque  muitas  vezes 
leraó  no  Evangelho :  Tunc 
redàet  tmkutque  fecundum 
opera  ejm:  Et  in  qua  menfu- 

Marc.4.  ra  menfifuerttis^  remetietur 

^       'uobis :  &  em  S.  Paulorj^i 

■X.  Co-  farcèfeminati  parcè  éy  ine- 

úrxt.^.e.fef  .^^  qui  femmat  in  beyie-  aífímlà  por  dentro  ha  m:^- 
dí5íionibíiSy  de  benediõíio-  ior es, 6c  menores  dignida- 
nibus  i^metet  :   Etunuf-     des,  maiores,  &  menores 

'»:  Co-  quifquepropriam  mer cedem  coroas,  maiores,  &  meno- 
accipietjecundím  Juum  la"^    res  lumes  da  viíta  de  Deos, 

&na 


Match 
■6.27. 


tem  ouvido  na  interpreta- 
ção deftes  textos  ,  que  os 
prémios  do  Ceo  fe  haó  de 
diílribuir  a  cada  hum  por 
jufl:iça;&que  a  medida  la 
do  gozar  ha  de  fer  a  meí~ 
ma  que  cà  foi  do  fervir :  6c 
que  quem  fêmea  pouco , 
colhera  pouco,  6c  quem 
muito,  muito :  6c  queapa- 
ga,que  ha  de  receber  o  tra- 
balhador, ha  de  fer  confor- 
me o  feu  trabalho.  OsBê- 
aventurados  finalmente  j 
porque  he  certo ,  que  no 
Ceo  ha  muito  differentes 
grãos  de  gloria,  como  fo- 
raó  diíferentes  na  terra  os 
da  graça:  6c  que  aílim  co- 
mo cà  por  fora  vemos  que 
no  mefmo  Ceo  húa  he  a 
claridade  do  Soljoutra  a  da 
Lua,  outra  a  das  Eftrellas: 
Alia  dar it as  Solis^alia  cla^ 
ritas  Luna^  &  alia  ciar it as  ^  ^ 
Stellarum  :  Stella  enim  ^if.^x! 
Stella  differt  in  ciar  it  ate  5 


^6i 
&na 

rança  maiores,  &  menores 
participaçoens  ,  ou  como 
diz  S.  Paulo  ,  pefos  delia. 
Pois  fe  os  BemavenCura- 
dos  na  gloria,  &  as  glorias 
dos  Bemaventurados  naó 
•faó  iguaesj  como  pôde  fer 
primeiramente  ,  que  em 
tanta  deíigualdade  do  que 
poíTuem  ,  eftejaõ  todos 
igualmente  contentes  :  & 
que  fendo  o  que  cada  hum 
poíTue  próprio  de  cada  hú, 
gozem  todos  igualmente 
o  de  cada  hum  ,  &  cada  hú 
igualmente  o  de  todos  ? 


Sermão  dafegunda  T>ominga 
mefma  bemaventu-  nefta  mefma  differenca, 
pofto  que  deíigual ,  toáos 
refpedbivamente ,  &  cada 
humeftaó  igualmente  có- 
tentes  -,  porque  nenhum 
quer,  ou  defeja  mais  do 
que  tem  :  fundandofe  a 
igualdade  do  mefmo  con- 
tentamento na  medida  da 
própria  capacidade,  &  na 
proporção  da  juftiçajconi 
que  fe  vem  premiados.  Cà, 
onde  todos  apetecemos 
fer  maiores,naô  fe  entende 
iílo  j  mas  fácil  mente  fe  pô- 
de comprehender  por  va- 
rias femelhanças.  Levai  ao 
422  Para  declaração  de-  mar  três  vafos,  hum  gran- 
'fíe,que  parece  enigma,  ha-     de,  outro  muito  maior,ou- 

tro  muito  mais  pequeno, 
&  ene  hei- os  todos  ;   nefle 
cafo  o  vafo   menor  tem 
menos  agua,  o  grande  tem 
mais  ,  èc   o  maior  muito 
mais:&    com  tudo  neíia 
mefma  dcfigualdade   ne- 
nhum admite,  nem  pòdc 
admitir  mais  do  que  tem  ^ 
porque  cada  hum  fegúdo  a 
ília  capacidade  eílà  igual- 
mente cheo.     Tem  hum 
pay  três  filhos,  hum  mini- 
no,  outro  moço  ,  outro  jà 
homem  feito :  velho  a  to- 
doí. 


vemos  de  fuppor,  que  no 
Ceo  ha   ver  ,  &  gozar  a 
Deos ,  em  que  coníiíle  a 
gloria  eífencial :  &  ha  go- 
izarfe  da  mefma  gloria  dos 
que  vem  a  Deos,  &  o   go- 
■záo,  que  faó  duas  coufas 
muito  díverfas.  Na  gloria, 
que  confiíle  em  ver,  &  go- 
zar a  Deos  ,  ainda  que  al- 
guns poífaó  fer  iguaes,  ha 
-muitos  grãos  de  differen- 
«ça,&  exceílb  ,  fcgundo  o 
maior,  ou  menor  mereci- 
mento de  cada  hum,  Mas 


da^arefma.  j^,6^ 

dos  da  mcfma  tela:  &  qual     porque  aílim  o  pede  a  na- 


eftà  mais  contente  ?  Por 
ventura  o  que  levou  mais 
covados  ?  De  nenhum  mo- 
do. E  fe  naó  trocai  os  vefti- 
dos,  &  vereis  fe  queralgú 
o  do  outro.  Mas  cada  hum 
fe  contenta  igualmente  do 
feu,  porque  he  o  que  lhe 
vem  mais  jufto  ,  &  mais 
proporcionado  à  fua  eíla- 


tureza  das  partes,  &  a  ar- 
monia  do  todo.  E  fe  eíla 
uniaó  j  conformidade  ,  & 
ordem  fe  acha  era  hum 
corpo  natural,  &  corrupti- 
vel,  qual  fera  a  do  corpo 
celeílial  daquella  fobera- 
na,&  fobrenatural  Repu- 
blica,onde  a  vontade  do 
mefmo  Deos,  que  o  beati- 


túra.  O  mefmo  paífa  nos     íica,hea  Alma,  que  o  in 
Bemaventuradosdo  Ceo.     forma. 


Porque  aílim  como  a  glo- 
ria da  vida  clara  de  Deos 
os  enche  por  dentro  aílim 
os  vefte  por  fora.  Nem 
obftaa  capacidade  maior, 
ou  menor  do  merecimen- 
to, nem  a  eílatúra  mais,  ou 
menos  alta  da  dignidade, 
para  alterar,  ou  diminuir  a 


423  E  quanto  à  fegúr- 
da  parte  da  objecção,  em 
que  parece  diíHcultofo  go- 
zarfe  cada  hum  das  glorias 
de  todos,  &  gozaremíe  to- 
dos da  gloria  de  cada  hum. 
aílim  como  fatisíizemos  à 
primeira  diííicu  Idade  com 
a  proporção  da  juftiça,  af- 


vic.cap 
30. 


igualdade  deíla  fatisfaçaó,     íim  refpondo  a  fegunda  cò 

a  extcnçáo  da  caridade. 
O  Ceo  he  húa  Republica 
immenfa^  mas  onde  todos 
feamão  :  &  cfik  là  a  cari- 
dade tanto  no  auge  de  fua 
perfeição,  que  todos,  & 
cada  hum  amaó  tanto  a 
qualquer  outro,  como  a  fy 
mefmo.  Donde  fe  fegue^ 
que  ainda  que  os  gráos  da 
gloria  fejaò  deíiguaes  fe- 
gun- 


&  contentamento  década 
hum  no  feu  eítado  j  por- 
que como  bem  declara  có 
Auguft.  outra  femelhança  S.  Ago- 
decí-  ftinho,  também  a  cabeça 
he  mais  nobre  que  amaó, 
^  amaó  mais  nobre  que  o 
pè,  &  nem  por  iífo  o  pè 
defeja  ler  maójnem  a  maó 
defeja  fer cabeça,  nem  a 
cabeça  defeja  fetcoraçaôi 


4^4 

gundo  o 


Sermão  da fegunda  T>om'inga 
merecimento  de     todos ,  &  cada  hum,  como 


Laurét. 
Juftin. 
deLôg 
ti  tas 


cada  hum,  a  alegria,  &o 
goílo  deíTa  mefma  gloria  , 
ou  glorias,  he  igual  em  ro- 
dos, porque  todos  as  eíli- 
maó  como  próprias,  &  ca- 
da hum  como  fua.  Expreí^ 
famente  S.Lourenço  Ju- 
ílmiano.  Tanta  vis  Í7i  illa 
calefti pátria  nosfociat^  ut 
quod  infequifquenonaccí' 
pit^  hocjeaccepíjfein  altero 
exultet.  Vna  cunãis  erit 
beatttudo  latitia ,  quamvis 
non  unajít  omnihis fublimi' 
tasvtta.  Notefe  muito  a 
palavra  beatttudo  U titia , 
em  que  o  Santo  diftingue 
na  mefma  bemaventuran- 
ça  duas  bemaventuranças, 
húa  da  gloria  ,  outra  da 
alegria :  a  da  gloria  he  par- 
ticular ,  òc  determinada, 
porque  coníiftc  na  viíla 
de  Deos,  que  fc  mede  com 
o  merecimento  ,  &  graça 
defta  vidaj  porém  a  da  ale- 
gria naó  tem  termo, nem 
limite,  porque  he  immen- 
fajôcfem  medida,  fegundo 
aextençaõ  da  caridade:  a 
qual  comprehendendo ,  &: 
abraçando  a  todos  ,  fe  ale- 
gra ,  &  goza  da  gloria  de    ao  fogo  cm  que  ardia  o  feu 


fefora  própria.  Eefl:e,co- 
mo  fe  fora   própria  ,  naó 
quer  dizer,  que  naó   tem, 
nem   pofiiie  cada  hum  a 
gloria  dos  outros,  porque 
verdadeiramente  a  tem,& 
poíTue  3  diz  o  Santo ,  naó 
emfy  ,  mas  nos  que  ama  ^"l***- 
como  a  fy  mefmo ;  ^^t  quod  Civit. 
infe  quijque  non  accipit^  hoc  JJ  ^caiu 
fe  accepijfe  in  altero  exultet.  gci. 
Efta  mefma  razaó  he  de  hí^^i* 
S.  Agofl:inho,de  S.  Boa- '''i"^'i't 
ventura,  deS.Anfelmo,  &  *^'^^*' 
de  todos. 

424  E  para  que  o  ufo, 
ou  abufo  da  pouca  cari- 
dade deíle  mundo  nos  naó 
efcureçaaintelligécia  dep- 
ila verdade,com  dous  ex- 
emplos deíle  mefmo  mu- 
do a  quero  declarar,  hum 
lingularem  S.PauIo,ourro 
univerfal  em  todos  os  ho- 
mens. Erataó  immenfa  a 
caridade  de  S.Paulo,  que 
elle  padecia  os  males  de 
todos  os  homens,  &  nenhu 
mal  temporal ,  ou  efpiri- 
tualfucedia  nefte mundo, 
que  naó  acrecentaflc  no- 
va, &  particular  matéria 


ãã§luarefma.  ^       4.6  j 

coração.  §uis  infirmatuTy     abrazavaó,  &  quêimavaó  : 

Cor.  i^  ego  non  infirmor  >  Quis     ^ihfcãndalizatuT-^&ego 

' -^-    ^       '  '■  '  fíi?;^ /^r^r?  Efe  a  caridade 

de  Paulo  o  fazia  padecer 
os  males  de  todos  ,  fcindo 
mais  natural  à  natureza 
humana  gozarfedos  bens , 
que  padecer  os    males  i 


'^'  fcandalízatur  ,  &  ego  non 
urorl  Aílim  como  todo  o 
pcfo  da  redondeza  da  ter- 
ra pefa,  Sc  carrega  para  o 
•centro  •,  aíllm  todas  as  en- 
fermidades ,  todas  as  do 


fes,  todas  as  penas  ,  todos  quem  duvida,  que  a  cari- 
es trabalhos  ,  todas  as  af-  dade  de  qualquer  bemavc- 
flicçoens,  ^  tribulaçoens ,  turado,  a  qual  no  Geo  he 
iniferias,pobrezas,trifte-  mais  perfeita,  que  a  dos 
zas^anguftiasjinfortunios,  maiores  Santos  na  terra 3 
defgraçasj  emfim  ,  todos  excite,  aíFeiçoe,& obrigue 
os  males  do  género  huma-  naturalmente,&fem  mila- 
no  carregavaò  de  toda  a  gre,acada  hum,  a  que  fe 
parte  fobre  o  coração  de  alegre,&  goze  dos  bens  de 
Paulo,  adoecendo  elle  de  todos  ? 
todos,&com  todos :  Quis  42  f  E  fe  naô  C  para 
infirmatur^  &  ego  non  infir-  que  cada  hum  fe  p^rfuada 
Wí?r?E  aíTim  como  no  mef-  peio  que  exprimenta  em 
mo  centro  eftá  o  fogo  do  fy  mefmo  }  pergunto  a  to- 
Inferno,  em  que  ardem  os  dos  os  que  fois  pays  ,  ou 
condenados  ,  pagando  as  máys.  Náo  lie  certo,  que 
penas  das  culpas ,  que  co-  ospays  ,  &  as  mãys  tanto 
metéraóneftavida;  aílím  amão,  &  eftimaóos  bens 


ardia  no  coração  de  Paulo 
*o  fogo  da  caridade  taó 
forte,  8c  intenfa  rnente,que 
'todos  os  efcandalos,&  cui- 


de fcus  filhos  ,  como  os 
próprios  ?  Atè  as  feras 
mais  feras,  fe  fe  lhes  fizer 
efta  pergunta  ,  refponde- 


pas,qiiedenovofe  come-  ráóquefim.  Eeuacrecen- 

tiáo,naófó  o  atormenta-  to,quenaó  feràverdadei- 

vaó  de  qualquer  modo>  ropay  ,   nem  verdadeira 

mas  verdadeiramente  o  mây,oquenaóeftimarme-i 

Tom.  7.  Gg          nos 


4^6  Sermão  ddfegundaT>ominjia 

nos  os  feus  bens ,  que  os     que  fe  o  amor  de  todos  os 


de  feus  filhos.  Por  iíTo  os 
Corcefáos  de  Jerufalem, 
quando  David  renunciou 
a  Coroa  em  feu  filho  Sala- 


paySj&  mãySj  quantos  ou- 
ve defde  o  principio  do 
mundo ,  &  haverá  atè  o 
fimjfe  uniíTe  em  hum  fó 


maója  lifonjacomquebe-     amor,  comparado  eílecò 

o  amor  do  menor  Beni- 
avenmrado  do  Ceo,naó  fo 
o  naó  igualaria  ,  mas  nem 
pareceria  amor.  Vede  ago- 
ra, conclue  S.  Boaventura, 
quamimmenfaferà  a  glo- 
ria dos  que  aílimíe  amaó, 
fendo elles  infinitos,  &a 
gloria  de  cada  hu  m,as  glo- 
rias de  todos  I 

426  Oh  bcmaventu- 
rados  vòs  ,  &  bemaventu- 
radas,  naó  digo  a  yoílajfe- 
naóas  voíTas  bemaventu- 


jarao  a  mao  ao  mefmo 
David,  foi,  dizendo  todos 
a  hua  voz,&  com  o  mefmo 
conceito,  que  Deos  fizeíTe 
o  trono  5  &:  Reyno  do  Fi- 
jho  maior,  &:  mais  felice 
ainda  queodoPay.  Epor 
iííba  Mãy  de  Nero,  tendo 
ouvido  de  hum  oráculo, 
que  fe  chegaífe  a  ^ç;r  Em- 
perador  feu  Filho,  a  havia 
de  matar,  refpondeo :  Ocr 
ctdat  ,  dummodo  imperet : 
Matemeembora,com  tan- 
to que   feja   Emperador, 


ranças!  Là  eílà  gozando 


Afilm  eftimou  mais  a  Mãy     elta  verdade,  quem  a  diífe 
a  hQnra,&  Império  do  Fi-     na  primeira  palavra  ,  que 


lho,quea  vida  própria.  E 
feaeíles  extremos  íè  ef- 
tende  o  amor  natural  da 
terra,  que  fera  o  fobrena- 
turaldoCeo?  Hetaógrã- 


efcreveo.  A  primeira  pa- 
lavra do  primeiro  Pfalmo 
de  David  he,  Beattisvir ,  píài». 
Bemaventurado  o  home.  »■»•. 
E  qual  he  a   bemaventu- 


dc,ou  por  fallar  mais  pro-     rança,queofaz,&lhedà  o 
priamente  ,  he  taó  perfei-     nome  de  Bemaventurado? 


to,  taó  puro ,  &  taó  fobre- 
humanoo  amor,  com  que 
todos  os  Bemavcnturados 
reciprocamente  fe  amaó} 


Naóhehúa,  nem  fó  mui- 
tas, fenaó  todas  as  bem- 
avcnruranij-as  de  todos  os 
Bcmaventurudos)  porque 
todas 


da^arefma. 
bemaventuran-     vòs  í^ozais   os 


t%>das  as 
çasde  todos  concorrem  a 
fazer  Bemaventurado  a 
cada  hum.  Aílimo  decla- 
ra expreíTamence  o  mef- 
mo  texto  original  Hebrai- 
co, em  que  Diviá  efcre- 
yeojoqualtem  em  lugar 
dcBeatm  vir^  Beatitudi- 
nes  virii.  fe  cada  hum  pe- 
la fua  gloria  particular  he 
perfeitiílima mente  Bem- 
avènturado,  &  gloriofo  , 
que  fera  peias  glorias,  & 
bemarcnturanças  de  to- 
dos ?  Pela  fua  gloria  Bem- 
aventuradocada  hum  pe- 
lo que  elle  mereceo,  &  pe- 
ks  glorias  de  todos  fobre 
bemaventurado  também 
pelo  que  elles  merecerão. 
Exceíib  verdadeiramente 
de  comunicação  de  bens , 


¥-7 
frutos  de 
feus  trabalhos,  pois  gozais  . 
oqueelles  merecerão  5  & 
vòs  naó  mereceftes. 

427  Vòs  (^  ponderem 
os  da  terra  bem  o  que  di- 
go 3  vòs  naó  foftes  Patri- 
arcas, &  gozais  a  gloria 
dos  Patriarcas  :  vòs  nao 
foftes  Profe tas,  &  gozais  a 
gloria  dos  Profetas  :  vòs 
naô  foftcs  Apoftolos  ,  & 
gozais  a  gloria  dos  Apo- 
Solos ;  vòs  naó  padeceftes . 
martyrio,  &  gozais  a  glo- 
ria dos  Martyf es :  vòs  naó 
foftes  Doutores,  nem  eníi- 
naftes,  &  gozais  a  gloria 
dos  Doutores :  vòs  naó  vi- 
veíles  nos  defertos>6c  gOf^ 
zais  a  gloria  dos  A  naco-" 
retas :  vòs  nàó  profeíTaíles 
continência  ,  &  gozais  a 


que  podéra  parecer  inju-  gloria  dos  Virgens:  vôs  fo- 

fío,  fe  a  gloria  naó  fora  fies  peccadores,  &tal  vez 

premio  da  graça.  De  vòs  grandes  peccadoresj^  go- 

pois,&  de  todos  vòs,  ò  fe-  zais  a  gloria  dos  innocen- 

liciílimos  habitadores def-  tes  :  vòs  finalmente  fois^ 

fa  Pátria  celeftial ;  de  vòs  5  homens  com  corpo,  &  naó 

&.a  vòs  fe  pôde  dizer  com  efpiritos ,  jSc  gozais  as  glo- 

t-sãAÒ-.AUjUboravenmt^  rias  de  todas  as   Gerar - 


(^vos  in  labore s  eorum  m- 
troiftis :  Que  os  outros  me- 
fecéraõjôc  trabalharão?  & 


chias  dos  Anjos.    Aíílm  o 

difcorre  ,  &  contrapõem 

admiravelmente  o  Sera- 

Ggij        fim 


S.Bona' 
vent.  ii 
Solilo- 


4<>  8  Sermaõ  dafegunda  T>omínga 

fim  dos  Doutores  da  Igre-  acomodar  à  brevidade  do 

jaS.Boaventurajpoftoque  tempo,  &  fuppondo  que 

com  a  ordem  mudada,  mas  baftaó  as  demoílraçoens 

com  o  mefmo  fentido.  Ibi  deílesdous  difcurfos  para 

virgo  gaudebit  defan6f<e  vi-  fundar  fobre  ellas  húa  grá- 

duítatis  mérito:  ibi  njiduA  derefoluçaó  ;  acabo  com 


exultabit  de  cafto  virgini- 
tat  is  privilegio :  ibi  Confef- 
for  de  Martyris  jucundabi- 
tur  triumpho  :  ibi  Martyr 
tripudiabit  de  Confefforum 
hravio :  ibi  ^ropheta  lauda* 
kit  de  Tatriarcharum  pia 
conver/atione :  ibi  Tatriar- 
chaexultabitde  Tropbeta- 


fazer  a  todos  os  que  me 
ouvirão  húa  fó  pergunta. 
Gredes  ifto  que  ouviíles  , 
ou  naó?  Quem  cré  o  pri- 
meiro, 6c  fegundo  ponto, 
he  Chrifíaó,  quem  naó  crè 
o  fegundo,he'Gcntio-,mas, 
ou  íejais  Genriosjou  Chri- 
ílãos  ,  fe  totalmente  nao 


rumfide  :  ibi  Apoftoli ,  &  tendes  perdido  o  entendi- 
Angeli gaudebunt  de  mérito  mento,&:ojuizo,  não  po- 
»mniuminferiorum:ibiom'  deis  deixar  de  eflar  pcr- 
nes  inferiores  Utabuntur  de  fuadidos  do  que  ou  viftcs , 
gkria^&coronafiiperiorum,     ou  a  defprezar  a  falfidade 

de  huns  bens,ou  a  defejar 


428  inAltavanos  ago- 
£"^  ra  o  terceiro  pó- 
toda  noíTa  propofta  ,  & 
mofl-rareomo  tudoiftofe 
goza  no  Ceo,  naõ  fucceíli- 
vamertte,fenaó  por  junto, 
reduzindo  toda  a  eterni- 
dade a  hum  inftante,  & 
eftendcndo  eíTc  mefmo  in- 
Hante  por  toda  a  eternida- 
de. Send©  porém  forçofo 


juntamente  a  verdade  dos 
outros. 

429  O  Gentio  naõ  fa- 
be  que  a  Alma  heim mor- 
tal, nem  crè  que  ha  outra 
vida.  E  com  tudo,  fe  ler- 
des os  livros  de  todos  os 
Gentios,  nenhú  achareis, 
nemFjlofofo,  nem  Ora- 
dor,nem  Poeta,  que  lo  c6 
olumedarazaó ,  &  expe- 
riência do  que  vem  os 
olhosjnãocúdcneo  amor,' 
ou 


da§íuarefmã\  4^^ 

iDucoÈiça  dos   chamados     tcdo  vérda-deiro  mal^qu 


bens  deite  mundo,  &:naó 
louve  o  derprezo  delles. 
Gentio  ouve  ,  que  redu- 
zindo a  dinheiro  hú  gran- 
de património  ,  que  poí^ 
fuía,  o  lançou  no  mar  ,  di- 
zendo :  Melhor  he,  que  eu 
te  afogue  ,  do  que  tu  me 
percas.  Deixo  os  rifos  de 
Piogenes,  que  metido  na 
fuacuba  zombava  dós  A^ 
lexandreSjScfuas  riquezas. 
Deixo  a  fobriedade  dos 
Sócrates,  dos  Senecas,  dos 
Ep  ide  tos,  6c  fó  meadmi- 


gozar  a  do  falfo  bem.  Não 
feria  louco  o  que  pela  do- 
çura da  bebida  tragaíTe  jú.- 
tamente  o  veneno  i*  Efta 
pois  era  a  razaó ,  &  a  evi- 
dencia, com  que  fem  féj 
nem  conhecimento  da  ou- 
tra vida  fe  defenganavaó 
os  Gentios  ,  &  huns  pelo 
peio  fe  defcar regava ò  dos 
falfos  bens  ,  outros  pelo 
défprezo  os  iiictiaó  debai-i 
xodospès.  -^'f 

430     EfeaíHm  os  tra- 
ta va  o  Gentio,  que  naó  te- 


raj&  deve  envergonhar  a  mia  delles,  queolevaíTem 

todolChriíláo ,  o  exemplo  ao  Inferno,  nem  lhe  impe- 

domefmo   Epicuro  neíle  diíremoCeo3quedever€-' 

conhecimento,  fendo  elle,  folver,&  fazer  o  Chriftão , 


&  a  fua  Seita  a  que  mais 
profeífava  as  delicias. G'^/i^ 
ãsbis  mi^íus  F  mintis  aolébis: 
dizia  oComico  Gentio,  & 
fali  ando  com  Gentios :  Se 
tiveres  menos  goílos,tam- 
bem  ceras  menos  dores.  E 
porque  na  miftura  desfal- 


que não  fó  reconhece  nós 
bens  domtmdo  a  vaidade 
do  prefente,  fenaó  tambê, 
écm.uitomáiso  perigo  do 
futuro  }  Será  beai,  que  por 
hum  inílante  de  goílo  me 
arrifque  eu  a  hua  eterni- 
dade de  pena,  &  por  hua 


ibs, 5c  enganofos  bens,  di-  âpprehenfaó  de  bèrri  mi- 

vidiaóobemdo  mal,  &:  llurado  com  tantos  males, 

coiitrapeíavaó   o   que  ti-  perca  a  gloria  da  viíla  de 

nliaódegofto,com  o  que  Deos,&ogozar  naó  íó  a 

caufavaó  de  dor  %  antes  minha  bemaventurança , 

queriaó  naó  padecer  a  par-  ítnzóíi  de  todos  os  Bem- 

Tom.j.  Ggiij       avcn- 


4^7  o  Sermaã  dafegunda  'Domivza 

aventurados?  O  fé,  ô  en-     aolosagloriado  Cco.  O- 


rendimento  ,  onde  eftás  ? 
Mas  o  certo  he,  que  nem 
entendimento  tem  os,  pois 
naó  fazemos  o  que  íizeraó, 
&  entenderão  tantos  Gen- 
tios :  nem  fé,  fenáo  morta, 
&  fem  acção  vitaI,pois  el- 
la  nos  naó  move  a   viver 
como  Chriftãos.  Se  o  que- 
remos fer,  &  emendar  o 
deslumbraméto  defta  taó 
enorme  cegueira,  eu  naó 
vejo  outro  remédio,  que 
nos  abra  os  olhos  ,  íenaó 
tornar  pelos  mefmos  paf- 
fos  deftes  noíTos  dous  dif- 
curfos  aos   dous  montes 
donde  eiles  fairaó.  Oh  que 


Ihai,  &  notai  bem, quanto 
vai  de  monte  a  monte :  ve- 
de, &  coníiderai  bemjquá- 
to  vai  de  glorias  a  gloria. 
Naquelle  monte  eítáo  os 
males  fobre -dourados  có 
nome  de  bens  :  neíle  eíláo 
osbensfemfombra  ,  nem 
apparencia  de  mal.    Alli 
eftàofalfo  ,  aqui  o  verda- 
deiro •  alli  o  du  vidofojaqui 
o  certo:  alli  o    momenta- 
neo,aqui  o  eterno  ;  alli  o 
que  vai  parar  no  fogo  do 
Inferno, aqui  o  que  nos  le- 
va a  fer   Bera  aventurados 
no Ceo.  Vede, vedei  &CÓ- 
íiderai  bem  o  que  deveis 


duas  eílaçoens  taó  pro-  efcolher;  porque  qual  for 
prias  de  hum  tempo  taó  a  voíTa eleição  neíla  vida, 
íanto  como  o  da  Quaref-     tal  fera  a  voíla  remunera- 


ma !  Húa  ao  monte  da  ten- 
tação,  outra  ao  rnonte  da 
transfiguração  :  húa  ao 
monte, onde  o  Demónio 
jffioftrou  a  Chriílo  as  glo- 
lias  do  mundo,  outra,onde 
jChrii&ç^moílrouaos  Apo^ 


ção  na  outra:  ou  padecen- 
do fem  íim  todas  as  maldi- 
çoens  com  o  Demónio,  ou 
gozando  na  eternidade  tO' 
das  as  felicidades  eoxm 
Chrillo. 


SEX^ 


1    .  4*71 


SERMAM 

DE 

S  BARBARA- 


SimtleeH RegnumCalorum  thefauro  abf condito  in agro 

^uem  qui  invenit  homo^  abfcondit^  é^pr  a  gáudio  il- 

Uusvadít-i&vendituniverfa.i  quahabety 

&emitagrumiUum,M2itth,i'3^. 


5.    I. 

Síim  como  ha 
huns  homens , 
que  nafcéraófó 
parafy,  &  ou- 
tros, que  naícéraó  parafy, 
&  para  a  Republicai&  por 
iílb  faó  os  mais  beneméri- 
tos do  género  humano,  Sc 
celebrados  da  fama  :  aíllm 
ha  huns  Santos,  que  foraó 
cfcolhidos  fó  para  louvar  a 
Dcos,  6c  outros  para  lou- 


var a  DeoSjSc  favorecers^c 
ajudar  aos  homens.  E  fen- 
do eíla  fegunda  prerogati- 
va  taó  parecida  ao  mefmo 
Deos,  que  não  nafceo  para 
fy,fenãoparanós5  &  tão 
femelhance  aos  Anjosjque 
juntamente  vem  a  Deos 
no  Ceojôc  nos  guardão  na 
terra:  fe  fizermos  compa- 
ração no  mefmo  gener® 
entre  todos  os  Santos ,  & 
Santas,facilmente  achare- 
mos j  que  não  fó  igualou, 
Gg  iiij         ma^ 


i 


r ' 


4.72 

mas  excedeo  a 
Quem  ?  Aglorioía  Santa 
Barbara,  a  cuja  protecção, 
&  memoria  com  tanto  ef- 
trondo,&  abalo  dos  ele- 
mentos, fe  dedica  eíle  ale- 
gre dia. 

432  Nas  palavras,  que 
propuz,  diz  Chrifl-o  Me- 
/l-redivino,&:  Senhor  nof- 
fo,  que  he  femelhante  o 
Reyno  do  Ceo  a  hum  the- 
íburoefcoadido  no  cam- 
po ,  o  qual  como  achaííe 
hum  homem  venturofo,  fe 
foi  logo  a  vender  quanto 
tinha,para  cóprar  o  cam- 
po, ôc  fe  fazer  fenhor  do 
thefouro.  Para intelligen- 
ciadequethefouro  efcon- 
dido  foíTe  efte ,  he  neceíTa- 
rio  faber  primeiro,quaI  fe 
ja  o  Reyno  do  Ceo  ,  que 
Chrillo  chama  femelhan- 
te a  e'  le :  Simile  efi  Regmim 
Calorum  thefauro  abfcon- 
dito.  S. Gregório  Papa  ad- 
verte aqui  doutamente? 
que  o  Reyno  do  Ceo  nas 
divinas  letras  fe  divide,ou 
diftingue  em  dous  Rey- 
nos,  hum  eterno,  outro  tc- 
poral,  hum  futuro  ,  outro 
prefente ,  hum  na  Jgi  cja 


Sermão  de 
todos  :  Triunfante,  que  defcança 
em  paz  no  Ceo,  outro  na 
guerreira, &:Militanre,que 
ainda  trabalhaj&:  peleja  na 
terra.  Daqui  fefegue,  que 
aílim  como  ha  dousRey- 
nos  fcmelhantes  ao  the- 
íouroefcondido,  aílim  ha 
dous  thefouros  efcondi- 
dos,  femelhantesahum,& 
outro  Reyno  :  &  eftes 
faó  osdous  thefouros ,  que 
S. Barbara  comprou  com  o 
preço  de  quanto  tinha: 
i^^endit  tmiverfíi^qua  ballet  > 
&  emit  agrum  tUum. 

433  Tinha  S. Barbara 
como  filha  única  ,  &  her- 
deira de  Diofcoro  feu  Pay, 
fenhor nobiliífimo  da  Ci- 
dade de  Nicomedia,  hum 
riquiíll mo  património  dos 
bens,  que  c  ha  mão  da  for- 
tuna. Tinha  mais  outro 
maispreciofo,  &  mais  ri- 
co, que  era  ode  todos  os 
dotes  da  natJreza  ,  &:  gra- 
ça, fermofura,  diferirão, 
honel}idade,  &as  demais 
virtudes,  por  onde  o  dcíc- 
jo,&  emulação  de  todub  os 
Grandes  a  procuraváo  por 
eípoíà.  E  tendo  ja  conla- 
gradotudoiíloa  Dcos  na 
ílor 


S.  Bar  bar  a.  47^ 

flordaidade-,  atè  a  liber-     primeiro,  que  para  publi 


caros  poderes,  &  louvores 
deSBarbarajadlm  como 
ostrovoens  dâ  artelharia 
faó  mudos,  afiim  as  vozes 
mais  polidas  dos  Prégado- 
res5&toda  a  noíTa  eloquê^ 
cia  he  barbara.  Ave  Ma- 
ria, 

§.  II. 

Simik  eft  Regnum  delorum 
t  he J aur  o  abf condito, 

43  f  T  T  Uma  das  cou- 
jt  Jlías  admirave- 
isj  que  fez5&:  tem  Deos  ne- 
íle  mundo,  &  dequefua, 
fabedoria,  &  grádeza  mui- 
to fe  preza,  faó  os  feus  the- 
fouros  efcondidos.  Por 
ventura  (^  diz  Deos  a  Job  3 
entraftetu  nos  meus  íhe- 
fouros  da  neve,  ou  viíle  os 
meus  thefouros  da  farai- 
vajos  quaes  eu  tenho  guar-» 
dado  para  o  tem  po  dos  ini- 
migos 5  &  para  o  dia  da 
guerra^Sc  da  bataIha?iV//»^ 
quid  ingreffu 


dade,  &  avidalhe  facrifi- 
cou  a  fua  fé,  &:  o  feu  amor : 
a  liberdade,  em  hum  dila- 
tado martyrio  prefa  por 
muito  tempo,  &  afferro- 
IJiada  em  hum  Caftello:  & 
a  Vida,  em  outro  martyrio 
mais  breve  ,  mas  muito 
mais  cruel  ?  fendo  varia- 
mente atormentada  com 
todos  os  géneros  de  tira- 
nias,&:  finalmente  degola- 
da com  a  maior  detodas,^ 
por  máo  de  feu  próprio 
Pay. 

4,^4  Eíle  foi  o  preço 
verdadeiramente  de  tudo 
quanto  poíTuia  ,  com  qae 
Barbara  comprou  os  dous 
thefouros, hum  para  fy, ou- 
tro para  nós.  Para  íy,  o  da 
eterna  coroa,que  goza  em 
paz  na  Igreja  Tnunfante 
do  Ceo  :  para  nòs ,  o  do 
perpetuo  íoccorro  ycom 
que noj> ajuda  a  batalhar, 
&  vencer  naiVIiluante  da 
terra.  Defic,quehe  oque 
hoje  vimos  reconhecer  di- 
ante de  feus  alçares  em  quidingreffm  es  ihcf aures 
ptTpetua 2C. áo  de  graças ,  mviS'i ant thtfatírosgraiidi" 
he  o  de  que  rrararei  fómé-  nis  vidjdi s  ^U£pr^paravi  \^^^^' 
te,    Coiíteíiando    porem    intemfmhoJttSyO'  indicm     -' 


474                             Sermão  ^s 
pfgn^.òheíii^  Porvenru-  thcfoiiros   efcondicíos  ti- 
ra podeacègora  a  efpecu-  nbaja  profetizado  Jacob  ; 
laçaó  dos  Filofofos  defco  -  Imindat  tonem  mar  is  quaft  d  'if 
briraorigem,&  verdadei-  lacfiigent,&  thefaurosabf '''  ^ 
rascaufasdos  ventos,  taò  cayiditos arenarum. 
inconílantes,6cleves  zWqs^ 


43  (í  De  maneira,  que 
na  terra,  na  agua,  no  ar,co- 
moemdiíFerentes,  &  va- 
íliflimos campos,  téDeos 
efcondidos  feus  thefouros. 
Mas  nenhum  deftes,  com 
ferem  táo  grandes  ,  &  taó 
vários,  he  o  que  o  rnefmo 
Deos  defcobrio  a  S.  Barba- 
ra, Sc  de  que  el  Ia  co  m  os  ca- 
bedaesdefeu  merecimen' 


6c  taó  encontrados  nas 
fuás  opinioês,como  oNor- 
te,&  o  Sul?  Mas  por  iíTo  os 
defenganou  David,  que  fó 
Deos  ,  que  criou  os  ven- 
tos, lhe  conhece  o  nafci- 
mento ,  &  os  tira  quando, 
&  como  he  fervido ,  do  fc- 
creto  de  íeus  thefouros; 
Pfaim.  guíprodiícit ventos  dethe-  ^.-....^...^  ni^iccuucn- 
'•^*'  *  Jaurisftás.  Naó  he^  menor  to  fe  fez  fenhora. O  maior, 
maravilha,  que  naó  crecê-  o  mais  nobre  ,  o  mais  ma- 
doafuperfíciedo  mar  hu  ravilhofojócomais  efcon- 
dedo  com  todas  as  corren-  dido  thefouro  do  \Jn  i  ver- 
tes dos  Rios,  que  nelíe  de-  fo,  he  o  quarto  eIemento,o 
faguaó,  fejaó  taes  as  inun-  fogo.  He  tão  efcondido, 
daçoens  do  rnefmo  mar,  que  Pitágoras  ,  &  outros 
que  tenhaó  afogado  Cida-  que  refere  S.  Agoílinho, 
des,  &  fepultado  Provin-  porque náo  vemos  a  esfe- 
cias  inteiras.  Mas  todos  ra  dofogo,  aneo-áraõ  to- 
eftes  dilúvios  particulares,  talmente.  Os  lugares,em 
íem  ferem  ajudados  do  que  a  natureza  collocou 
Ceo,  nem  das  nuvens ,  os  os  elementos,  occupaó  to- 
tem depofitado  Deos  nos  dooefpaço,quefe  eftcndc 
ocultos,6c  profundos  abif-  defde  o  centro  do  mundo 
mos  dos  feus  thefouros :  atè  o  Ceo.  A  terra  ao  re- 
Toncns  in  the [auris  abyjfos.  dor  do  ccn tro  ,  a  a  c^u a  fo- 
Finalméte  deites  mefmos  brç  a  terra  ,  o  ar  íobrc  a 

iigua, 


Pfâlm 
32-7. 


S,  Bàrhm-a. 

agua,  o  fogo  fobre  o  ar  atè  fez  mençaô  dos  ou  tros  três 
o  concavo  da  Lua,  ou  do  elementos,  a  naô  íq7.  tam- 
bém do  quarto  ?  Se  í^z 
niénçaó  da  terra ,  da  agua , 
&  do  ar,  porque  a  naó  fez 
ta  m  b  e  m  do  fogo  ?  Forque 
Moyfes,  como  notaó  S, 
Logo  final  he  (^inferiaó  ef-  Baíilio,  S.  João  Damafce- 
tes  Authores^que  o  fogo  no,&  Béda,fó  faJlou  das 
naó  tem  esfera.  Mas  fendo  coufas  manifeftas ,  &  que 
evidente  por  outras  de-  fe vem.  E  aílim  como  caí- 
moílraçoens,  que  a  perfei-  lou a  criação  dos  Anjos, 
çao  do  Univerfo   naó  po-     porque  faó  im\Ç\vQ,is  ,  af- 


Empireo.  Masfe  a  esfera 
do  fogo  he  taó  immcnfa, 
&  o  fogo  naturalmente  lu- 
niinoío  ,  como  a  naó  ve- 
mos ao  menos   de  noite? 


dia  carecer  deíle  thefou- 
rojo  que  deviaó  inferir, 
como  nos  dizemos,  he,que 
íenaó  vè,por  fer  thefouro 
efcondido.  E  porque  o  naó 
poííaó  contradizer  FiJofo- 
tos^  nem  Mathematicos, 
kaófe  as  primeiras  pala- 
vras, com  que  a  Efcritura 


lim  nãofaJlou  do  fogo  ele- 
mentar, porque  eílà  efcon- 
dido a  noílbs  olhos. 

437  Efte  thefouro  pois 
taó  propriamente  efcon- 
dido, he  o  que  Deos  defco- 
brio,&  de  que  deo  o  domi- 
nio  a  S.Barbara,fazendo-a 
governadora,  protedora , 


fagradadefcreve  a  criação  6c  defeníbra  do  fogo.   Oh 

do  mundo  ,  &  acharemos  gloriofa  filha  de  Eva,  ma- 

nellas  expreíTamente  a  ter-  ior  fenhora  que  a  primeira 

ra,  a  agua,  o  ar,  maso  fo-  mulher,aindanoeíl:adoda 


go  naó :  Terra  mtem  erat 
geoeí:  ínaníSy^vacua^&Jpiritus 
^^'  KDomirã  ferebatur  fuper 
aquas.  Terra  autem,  eis  ahi 
a  terra :  Super  aquas,GÍs  ahi 
^  agua :  Spiritm  Tíomini , 
^i^  ahi  o  ar.  E  porque  ra- 


innocencia,&na  felicida- 
de do  Paraifo  !  O  maior 
poder,ou  poderes,que  nu- 
ca Deos  deo  a  algum  hof 
mem,  foi  a  Adam.  E  que 
poderes  lhe  deo  ^  Sobre  a 


terra,  íòbre  a  agua,  fobre  o  ^^ 
.2a_ó  Moyfes  aíÈim  €omo    ^y\Ftpr^Jitpifàl?mynaris^i^' 


D 


Sermão  de 


^  volatUibus  CcU^  &  áe- 
Jlijs  ,  ac  tmi-verfjj  terr£. 
Tudo  o  que  fe  move  neíle 
mundo, ou  andando  na  ter- 
ra,ou  nadando  na  agua,  ou 
voando  no  ar,  fera  íbgeiro 
a  teu  império.  Mas  aílini 
como  Deosdeoa  Adam  o 
domínio  dos  três  elemen- 
tos inferiores,  o  do  quarto, 
&  íiipremo,  porque  lho 
naódco?  Se  ao  império  da 
terra  ajuntou  o  da  agua,6c 
ao  da  agua  o  do  ar  ;  ao  do 
ar  porque  naô  ajutoutam- 


nis  ante  Ipfum pT£cedet'l^-x^ 
ra  qualquer  parte  que  vol- 
te o  rofto,  lliem  dclle  cha- 
mas de  fogo :  Ignis  à  facie 
ejmexarfifSQ  oIha,he  com 
olhos  de  fogo  :  OcuH  ejns 
tanquamjícimMa  jgnis  :  Se 
ouve,  com  ouvidos  de  fo- 
go :  'Dem^qui  exaudiet  per 
ignem :  Se  falia,  com  vozes 
de  fogo  :  Audijii  verba  ti- 
Uns  de  médio  igrds ;  E  ate  o 
mefmo  Deos  Te  cria  vul- 
garmente ,  que  era  fogo: 
"^Den  s  nofter  ignis  cohfumcns 


pr?im. 
96  J. 

Pialm. 

Apocal. 
1  14. 


36. 


Ibidi-f. 


bem  o  do  fogo  ?  Forque  ef-     eft.  íílo  hc  o  que  viraó  os 
fe  refervou-o   Deos  para     Profetas  no  Ceo,  &tam- 


fy.  Lede  os  Profetas,  que 
faó  os  que  vivendo  na  ter- 
ra fópodiao  entrar,  &  ver 
a  Corte  do  Ceo  ,  &  acha- 
reis, que  todo  o  apparato 
da  Mageítade  de  Deos  he 
fogo  5  &  tudo  quanto  de- 
creta,&:  executa  ,  por  in- 
ílrumentos  de  fogo.  Se  ef- 
tà  aíTentado,©  feu  trono  he 
Daniel,  dc  fogo  ;  Throiius  ejíís 
7  9-ío.  jlamma  tgnis :  Se  fae  a  paf 
fearcomoem  carroça,  as 
rodas  laó  de  fogo  :  I^or^ 
eJHsignrs  accerij.is:  Se  leva 


Exod. 
9.18- 


bem  o  vio  todo  o  Povo  na 
terra,  quãdo  Deosdeceo  a 
lhe  dar  a  Ley  no  Monte 
Sinai :  'Totus  autem  mons 
Smaifnmabat :  eo  quod  def^ 
cendijfet  T)omin7ísJuper  eip 
inigne:  De  todo  o  monte 
faiáo,  &  fubiaó  nuvens  ef- 
peflas  de  fumo  ,  porque 
Deos  tinha  decido  fobre 
elleemfogo.  Tudo  o  que 
feouvia,eraótrovoeRS,  tu- 
do o  que  fe  via,  relâmpa- 
gos :  Et  ecce  c^ptrunt  andi- 
ri  tom t rua  ,  cr  micarefitUwná.xô. 


k 

'mm 

diante  a  fua  guarda  reai,os    gura.  Atèos  Gentios,  por 

chi- 


archeirosfao  de  fogo:  Jg 


eíles  cftcicos,ao  ítujii  pi  ter 


«y.  Barbara 


chamarão  tonante ,  &  lhe 
deraó  por  armas  osrayos, 
cantando  os  feus  Poetas 
do  falfo  Deos  o  mefmo, 
nem  mais,nem  menos,que 
David  aííirmou  do  verda- 
deiro: Intonuit  de  Calo  ^o- 
pfaim.  minuSy  ò"  AltiJJirmis  dedit 
ipi^t-   vocemfuam  \  gr  ando  ^ò"  car  - 
bonés  íffnis.  È  eíle  he,como 
dizia,  o  Império, &  gover- 
no do  quarto,  Sc  fupremo 
elemento,  que  Deos  refer- 
vou  para  fy,  &  tendo  o  ne- 
gado a  Adam,  &naó  con- 
cedido a  algum  de  tantos 
famofos  Heroes ,  que  paf- 
íaraó  em  tantos  feculos ,  o 
delegou  finalmente  em  S. 
Barbara,  fogeitando  a  ef- 
fera  do  fogo,  &  feus  prodi- 
giofos,  &  temerofos  eíFei- 
tos  ao  arbitrio  de  feus  po  - 
deres,  &  o  foccorro ,  &  re- 
médio delles  à  invocação 
4efcunome. 

í.  III. 

'  438  C  Se  m«e  pcrgu- 
Eí  tardes  quando 
lhe  deo  Deos  a  envefti du- 
ra deíleímperio,ou  a  poífe 
defte governo^  &  de  que 


477 
modo  ?  Refpondojque  por 
meyo  de  dous  rayos  fataes, 
pouco  depois  da  morte  da 
mefma  Santa.  Concorre- 
rão para  a  morte,  ou  para  o 
triunfo  de  Barbara  dous 
bárbaros,  hum  menor,  ou- 
tro maior  tyrano,  ambos 
crueliílimos.  O  primeiro 
tyrano3&:  menor  foi  Mar- 
ciano ,  que  martirizou  o 
corpoinnocente3&  virgi- 
nal da  Santa  com  os  mais 
exquifitos  tormentos  :  o 
fegundo  tyrano,  &  maior 
foi  Dioícoro  feu  Pay ,  que 
com  entranhas  mais  feras:, 
que  as  das  mefmas  feras, 
defembainhou  a  efpada,& 
lhe  cortou  a  cabeça.  Que 
faria  àviíta  deíle  eípecba- 
culoofogo  ,  que  com  in-' 
ftinto  oculto,  &  mais  que 
natural,  jà  fentia  naquelles 
fagrados,&  coroados  deff 
pojos,6c  jà  começava  a  re- 
conhecer a  no  va  íogeição, 
&  obediência,  que  depois 
de  Deos  lhe  devia  ?  Rat- 
gaófe  no  mefmo  tempo  as 
nuvens,  ou vemfe  dous  te- 
merofos trovoens ,  dçfpa- 
raòfe  furiofamente  dous 
rayos,  os  quaes  derí u-ba  a- 

d©, 


^^ 


'47  S  Strmã^^dê 

do,  abrazando ,  te  coiifu-     íem  ufo  de  razaó ,  com  ou- 


mindo  os  dous  tyranos5eni 
hum  mo  mento  os  desíize- 
raó  em  cinzas.  Ah  mifera- 
veis  idolatras ,  &:  tyranos 
impijílimosjquc  íe  no  mef- 
mo  tempo,  em  que  os  dous 
relâmpagos  vos  ferirão  os 
olhos,  invocaíTeiso  nome 
da  mefma  vidlima,  a  quem 
tiraftes  a  vida,  ella  fem  du- 
vida vos  livraria  da  mor- 
te! Mas  nem  os  tyranos 
cegos  foubéraó  conhecer 
onde  tinhaó  o  feu  remé- 
dio: nem  os  mefmos  rayos, 
que  nefta  execução  come- 


tros  dous  rayos  racionaes  y 
&  de  grande  entendimen- 
to. Aos  dous  irmãos  S.Tia-r 
go,  &  S.  João  mudouihe 
Chriftoonome  ,  ou  acre- 
centoulho  ,  chamandolhe 
r^yos-.Jacohum  Zebedaiy 
&  loarmemfratrem  lacobi^  Maicj. 
C^  impofiiit  eis  nomina  Boa- '  ^'  • 
nerges^quodefifilij  tonitrui. 
Boanerges  propriamente 
quer  dizer  filhos  do  tro- 
vão ,  &  porque  do  trovão 
nafce  o  rayo  ,  Boanerges 
em  fraíi  Hebrea,  ou  Syría- 
ca,  qual  era  a  vulgar  da- 


çavaô  jàaprofcílar  o  cul-     quelle tempo, íigniíicara- 
to,&  veneração  de  Barba-     yos.   E  que  fízeraó  eílcs 


ra,  efperáraõ  fcu  impeno , 
ou  cófentimento  para  vin- 
gar fuás  injurias  j  porque 
naóobravaó  como  caufas 
naturaes  por  próprio  im- 
pulfo,  mas  guiados  por  de- 
ílino  oculto  ,  &  entendi- 
mento fuperior,  que  os  go- 
vernava. 

439  E  para  que  veja 
inos,quam  entendidamen- 
teferviraóaS.  Barbara,  ôc 
fem  efperar  fua  obediên- 
cia lhe  obedecerão  ;  com- 
paremos eítcs  dous  rayos 


dous  Rayos  tão  entendi- 
dos? Negando  os  Samari- 
tanos a  Chriflo  a  entrada 
da  fua  Cidade  ,  quizeráo 
ambos  caftigar  eíle  á^Ç- 
prezo,&.  vingar  cila  inju- 
ria de  feu  Mcílre,  fazendo 
com.o  rayos  ,  que  deccíTc 
fogodoCeo,&  abrazaíTc 
os  Samaritanos  :  mas  eílc 
fogo,  eíie  zclo,&:  eílc  pcn- 
famcntotáG  bravo,  &:  tão 
bizarro  tudo  ficou  no  ar; 
porque  ?  Porque  confultá- 
rão,  6c  pedirão  licença  a 
Chri- 


-Vm 


t^- 


Luc.p. 


S.  Barbara.  ^yp 

Chrifto :  Domine^  vis  dict-    eílà ,  que  lhe  não  havia  de 


mtiSy  ut  defcendat  ignls  de 
Cxlo  ,  ò"  confumat  illos ? 
Refpondeo  o  Senhor,  que 
elle  não  viera  ao  mundo  a 
homens  ,  fenam  a 


conceder  a  licença.  Mas 
o  mefmo  Senhor,  que  nam 
havia  de  conceder  a  licen- 
ça pedida  ,  depois  que  a 
Magdalenafcm  a  pedir  lhe 
fal vaIlos,&  que  elles  como  fez  aquelle  obfequio ,  não 
feus Difcipulos havião  de    fódefendeoaobra,mas  a 


matar 


perdoar  injurias  ,  &  não 
vingallcis.  O  mefmo  havia 
de  refponder  S.  Barbara,fe 
os  noíTbs  dous  rayos  a  con- 
fuItáraó,ou  lhe  pedíraó  feu 
confentimento  para  vin- 
gar as  fuás  injurias,  &  ma 


approvou,&:  louvou  :  Bo- 
num  enim  opus  operata  eft  in  ^^f^^- 
me.  Omefmohaviade  fu-  '"^■'°' 
ceder  aos  dous  rayos  do 
Apoftolado,  fe  elles  abra- 
zárãoos  Samaritanos,  co« 
mojuftamcnte  mereciãoj 


tar,&  abrazar  os  tyranos.  Mas  o  que  elles ,  fendo  ta6 

Mas  elles  fendo  rayos  fem  entendidos,  não  entende- 

entendimento  entenderão  rão,  nem  íizerão  ,  fizeraó 

melhoro  cafo.  Ha  cafos,  fem  entendimento  os  nof- 

€m  que  por  pedir  licença  fos  rayos,  porque  eraô  go- 

fe  perdem  as  mais  glorio-  vernados  por  outra  intel- 

fas  acçoens.  Notou  difere-  ligencia  mais  aJta. 


tamente  S.  João  Chryfo- 
Itomo,  que  fe  a  Magdalena 
pedira  licença  a  Chriílo 
para  lhe  derramar  húa  yez 
aos  pès,  outra  fobre  a  ca- 
beça os  feus  preciofos  un- 
guentosCque  erão  as  aguas 
de  Córdova,  ou  de  Âmbar 


440  No  cafo  da  prifaõ 
de  Chrifto,  S.  Pedro  fem 
pedir  licença  tirou  pelaef- 
pada  ,  enveftio  os  inimi- 
gos ,  &  começou  a  cortar 
orelhas  :  os  outros  Difci- 
pulos pelo  contrario,  che-r 
gáráofe  ao  Senhor,&  pedi- 


11- 
daquelle  tempo  3  como ef-     tsio  Ucguç^:  domine, Ji j^err  ^       ^ 
te  regalo  foíFe  tão  contra-     ctitimus  ingladlo  ?  F  quem  a^-'*^' 
rio  à  mortificação, que  o     fe moftxou mais  íiel fervo. 
Senhor  profeíTava  ,  claro    maisvalenre,  6c  mais  zelo- 

fQ 


4,8  ò  Sermão  i^e 

íoda\^id;i,&  da  honra  de     IheniandaíTem.  Mas  com 


razão  he  regeitada  de  to- 
dos efta  fucileza  ,  como 
alhea  do  texto,&  da  conò^x.^ 
ção  do  rayo  ;  porque  os  ra- 
yos depois  de  caliíicarem 
a  fua  obediência  com  a 
execução,  então  he  que  a 
proteftâo  com  dizerem. 
Aqui  efba  mos ;  i^«%í,e^r^^ 
'vertem ia  dicent :  Adftimus. 
lílo  he  o  que  íizcrão  os 
dous     rayos    vingadores 


3í 


feu  Senhor  ?  Na6  ha  duvi- 
da, que  Pedro,  &  co mo  tal 
olouvão  todos  os  Santos. 
Entre  os  outros  Difcipulos 
tcUiibem  fe  achavão  os 
dous  Boanerges  ,  os  dous 
Rayos,  masquem  fe  por- 
tou como  rayo  foi  Pearo, 
porque  eíTa  he  a  bizarra 
natureza  dos  rayos,  ferir, 
&  executar  primeiro  ,  & 
depois  proteftar  a  fua  fo- 

geiça6,&  obediência.  He  das  injurias  de  S.  Barbara, 
texto  excellente  no  livro  começando  a  proteftação, 
Job.  í8.  ^Q^Q]^\]\[^iyiquídmittesful'  &  reconhecimento  da  fua 
gura-i&ibunt^Ò' rever ten-  obediência,  &  íbgeição  à 
tia  dicent  tibi  :  Adfiífnus?  Santa,peiaanticipadaexe* 
Porventura,  diz  Deos  a  cuçáo  doquedeviáoàfua 
Jobjfaótaesosteus  pode-  honra,femefperaroman- 
res,comoosmeus,quedcf-  dado,  ou  licença  do  feu 
pidas  do  Ceo  osrayos,&  império.  EJl  nirnirum  h^c 
elles  depois  de  executa-  circumlocntio  obfequeyitif- 
rem  tornem  a  ti  ,  &  te  di-  Jímnrum  famulorum :  diz  cõ 
gão:  Aquieftamospromp- 
tospara  obedecer  o  que 
nos  mandares.*^  Caietano 
demaíiadamente  fútil  ne* 
ftepaíTo,  diífe,  que  eftão 
aqui  as  palavras  trocadas, 
&  que  primeiro  fe  havião 
deprcíentaros  rayos  obe- 
dientes,&  dizer,  Adfumus^ 
6c depois  exccucar  o  que 


S.  Gregório  Papa  o  doutif- 
fimoPineda. 


441 


§•  IV. 

T 


Emosvifto  co- 
mo S.  Barbara 
dominou  o  mais  efcondi- 
dothefouro  da  natureza, 
q  hc  o  fogo,  6c  como  Dcos 
lhe 


S.  Èarbara.  48 1 
Ike  fogeitou  as  mais  vio-  efta  flngiilar  prerogacira 
lentas ,  &  temeroíàs  par-  de  S.  Barbara  ,  qualquer 
tes,  ou efFeitoscícIIc  ,  que  outra  Virgem,  &  Martyri 
faó  os  rayos.  Dizendo  po-  mcr eceo  igualni  tm.^^  por- 
tem o  Evangelho,  que  os  que  deo  o  mefmo  preçoi 
thefouros,  de  que  falia,  A mefma  natureza  parecd 
ninguém  os  alcança  de  também  que  confirma  eílç 
graçajfenão  comprados,&  direito  em  duas  exceiçoê^j 
comprados  có  tudo  quan-  oulimitaçoens,  com  que 
to  poííiie :  Vendit  univerfa^  produz  os  rayos.  Não  fó  os 
quahabet  ,  &  emit  agrum  Poetas ,  que  merece  pou- 
íY/a^/jfeguefejquc  vejamos  co  credito,  mas  os  Autho- 


qual  foi  o  preço  propor 
cionado ,  &  juftojcom  que 
anoíla  Santa  ,  &  ella  fó, 
comprou,  &  mereceo  efte 
extraordinário  dominio. 
He  queílão  curiofa,  &  naó 
fácil.    Para   inteiligencia 


res  da  hiíloria  natural,  co- 
mo Piinio,  &  os  mais,  ex- 
ceptuáo  da  jurdição  dos 
rayos  entre  as  aves  a  A- 
guia,6c  entre  as  arvores  o 
Louro.  E  aílim  como  a 
Águia ,  &  o  Louro  náofaô 


delia,  havemos  de  fuppor  dominadas  ,  fenão  predo- 

que  eftes  thefouros, quaef-  minantesao  rayo,  aflim  à 

quer  que  fejão,  ou  os  com-  Virgemj&à  Martyrpare- 

praó  os   Santos  por  mãa  ce  queJie  devido  efte  pre- 

propriajoupormáo  alhea.  dominio :  à  Virgem  ,  em 

Os  ConfeíTores  compraó  quanto  Martyr  ,  como  à 

por  mão  própria,  com  as  Águia, pela  Coroa  ,  &  à 

virtudes,&boasobras,quc  Martyr,em  quanto  Virgê, 

elles  per  fy  mefmosexer-  como  ao  Louro,  pelaLau- 


Citáo  :  os  Martyrcs  com-, 
práo  por  mão  alhca  ,  co m 
os  tormentos,  &  cruelda- 
des ,  que  lhe  fazem  pade- 
cer os  tyranos.  Mas  daqui 
parece  que  fe  fegue>  que 
,  Tom,/» 


reola.  Que  cauía  ha  logo , 
ou  que  razão  de  diíFerença 
entre  tantas  Virgens  ,  & 
Martyres,  para  que  a  íin- 
guiar  prerogativa  deftc 
dominio  a  dèíle  a  ^lymã. 
Hh       Ju. 


i  mi' 


!    \ 


^ .«.  f  1 


482  Sermão  de 

Juftiçajcomo  premio   de  fez.  Os  equleos  ,  as  cata- 

feu  merecimento,  única-  ílas^os  efcorpioens,&  pen- 

mente  a  S.  Barbara?  tes  de  ferro,  as  laminas  ar- 

442     Arazaó  manifc-  den tes,  os  chumbos  derre- 

ftahc}  porque  o  martyrio  tidos, os  peitos  cortados, 

de  S.  Barbara  entre  todas,  os  dentes,  &:  voracidade 


&  todos  os  Martyres,foi 
o  mais  violento,  &  furiofo 
de  quantos  fe  padecerão  a 
mãos  dos  tyranos.   Os  ou- 


das  feras,  tudo  fe  expri« 
mentou  em  Barbara:  não 
havendo  parte  faã,  &  de 
que  não  correíTe  fanguc 


tros  Martyres  padecerão  a  em  todo  o  delicado  corpo,, 

mãos  dos  Ncros,    &   dos  &fcrindofejà  não  o   cor- 

Dioclccianos  }  S.  Barbara  po,  fenão  as  feridas  huas 

a  mãos  de  feu  próprio  Pay;  fobre  outras.  Vencido  pois 

género  de  martyrio  pela  Marciano,  &  vendo efgo- 


atrocidade  dcfta  circun- 
ílancia,naó  fó  lingular,  & 
inaudito  ,  mas  não  imagi- 
nável. Soube  Diofcoro, 
quefua  íilha  era  Chriftãa, 
&  porque  nenhum  meyo 
lhe  bailou  de  promeífas, 
ou  ameaças  ,  de  benevo- 
lência, ou  rigorjcom  que  a 
podeífe  apartar  da  Fè ^pri- 
meiramente  a  entregou  ao 
Prefidente  Marciano  de- 
baixo de  juramento  ,  que 
todos  os  tormentos,  &  gé- 
neros de  martyrios ,  quan- 
tos atè  então  fc  tinháo  in- 
ventado, os  havia  de  ex- 
primentar,&  executar  nel- 
ia:  Sc  ajiiai  o  jurou,  Ôc  fe 


tados  em  vão  todos  feus 
tormentosj,  pronunciou  fi- 
nalmente a  ultima  fenten- 
çaa&  mandou  aosverdu- 
gos,que  cortaíFem  a  cabe- 
ça a  Barbara.  Os  verdu- 
gos.^ replicou  o  Pay,  iíTo 
não.  Eu  fou,  &  com  eftas 
mãos,  o  que  lhe  hei  de  ti- 
rar a  vida.  lílo  diíle  de- 
fembainhando  a  efpadajôc 
deícarregando-a  com  toda 
a  força  na  garganta  inno- 
ccntc,  comhum  golpe  lhe 
apartou  a  cabeça  dos  hom- 
bros.  Oh  efpedl.iculo  ,  ô 
portéto  de  deshumanida- 
de,nQca  viílo,  como  dizia, 
né  ouvido,  nê  iinagin.-ído  í 
Hum 


S.  Bar  bar  a.  4^^ 

445     Hum  fó  Pay   le-     fejava  a  vida  ,  outro  tiraa- 


mos  nas  F  fcricaras,  que  ti- 
raíTe  a  vida  a  fua  filha,  que 
foijeptejem  comprimen- 
to de  hum  voto,  que  tinha 
feito  a  Deos.  Mas  que  có 


do-a  a  quem  a  tinha  dado» 
Hum  com  o  maior  exem- 
plo da  fé,  outro  com  o  ma* 
iorefcandaIo,&  horror  da 
natureza.  Em  fim  ambos 


paraçaó  tem  aquelíe  caio  pays,&  ambas  filhas,  mas 

com  eík?  Aqueile  foi  hum  com  tal  diflPerença  em  hú , 

cxccíTo  de  Religião,  efte  &  outro  efpedtaculo,  que 

humprodigiode  cruelda-  vendo  o  facrificio  dejep* 

de.  AlJio  Pay  era  Sacer-  te  choravão     de  laftima 


dote,  aqui  facrilego,  ím- 
pio, 6c  blasfemo.  Humfa- 
crificava  a  filha  amada  a 
Deos,  outro  a  filha  aborre- 
cida aos  Ídolos.  Humdcr- 
retendofelhe  as  entranhas 
de  compaixão  como  cera, 
outro  com  o  coração  mais 
duro  que  os  mármores. 
Hú  correndo]  he  dos  olhos 
lagrimas  de  piedade  ,  & 
amor  ,  outro  vomitando 
pela  boca  labaredas  de 
ódio, &  ira.  Hum  derra- 
mando o  fangue  da  filha 
CO  mo  próprio,  outro  naó 
fó  como  alheo ,  mas  como 
do  maior  inimigo.  Hum 
tremendolhe  a  máo  da  ef- 


mulhcrcs,&  homens ,  &  a 
vifta  do  parricidio  de 
Diofcoro  pafmavão ,  &  ef- 
ta  vão  atónitos  os  leoens,& 
os  tigres.  E  como  o  mar- 
tyrio  de  Barbara  foi  o  mais 
violento,  &  furiofo  de  to- 
dos os  martyrios  ,  por  iííb 
mereceocomelleo  domi- 
nio  do  mais  violento  ,  6t 
furiofo  de  todos  os  Ele- 
mentos. 

444  Cóparaimc  o  Pay 
de  Barbara,  na  violência , 
&  fúria  defta  fua  acção  9 
com  o  fogo,&:  vereis  quam 
parecidos,  &  femelhantes 
íaó  hum, &  outro.  Notou 
advertidamente   Séneca ,  5^^^.^ 


pada,  outro  triunfando  de    quehe  natural  da  violen- 
d  ver  tingir  na  purpura,     cia,  &  efficacia  do  fogo, ; 
que  lhe  íaíra    das    veas.     nãoconfentirque  as  cou- 
Hi^m  matando  a  quem  de-    fas  fejáó  o  que  faó  |:  Ignis 

Hhij        mhit 


:i||i; 


4^4-  'Sermão  de 

nihileffey  ^uoãfit ,  patitur,     tureza,&:  ellas  por  inditu- 
EraDiofcoroPayde  Bar-     to,  fem  geração.     Ouça- 
bara,masa  violência  ,  &     mosao  Authordo  feu  Ri- 
furia,  ou  por  melhor  dizer     tual  no  livro  dos  Faílos. 
o  fogo  da  fua  tyrania  não     Nec  tu  aliudVtftam ,  quam 
coníentio  que  fofle  o  que         ^iva  intelltge  flammam, 
era.   Era  Pay,&:  deixou  de       Nataque  de  flamma  cor- 
lerPay.     Mas  allim  havia        poranulla  vides. 
de  fer ,  ou  deixar  de  fer  o     lure  igttur  Vtrgo  eji.quafe- 
que  era,para  mais  própria-         minanulla  remittlt 
mente  íer  como  o   fogo.       Neccapit 
Entre  tod©s  os  Elementos         E  como  o  Pay  de  Bar- 
fó  o  fogo  não  hePayitodos     bara,  fendo  Pay  por  natu- 
os  outros  geraó,&faÓ  fe-     reza,deixoudeferPaypor 
cundos,fóofogohc   efte.     tyrania,&  tendo-a  verda- 
ril,&nao  gera.  EíTa  he  a     deiramente  gerado,  lhe  ti- 
propriedade  da  etimolo-     rou  tão  cruelmente  a  vida, 
gia,com  que  os  Latinos  fa-     como  fe  a  não  gerara ,  em 
biamente    lhe  chamarão     perpetua  memoria  át^ç: 
/^«/j.XJompoemfeonomc    portento  da  deshumani- 
igmsá^m,^àç^gigno,co-    dade  lhe  deo  juílamente 
moi^ái^tr^çi.nongignens,     Deos  o  dominio  do  Ele- 
o  que  não  gera :  porque  as     mento,  que  fó  não  he  Pay, 
Salamandras,  que  alguns     nem  gera  :  &   aílimcomo 
lhe  perfílhaó,  faó  fabula,     dia  padeceo  a  violência. 
Mais  fízerão.  Para  guar-     &furiado  mais  violento. 


Ovid  ia 
Faftis. 


dar  perpetuamente  o  fo 
go,  que  chamavão  fagra- 
do,  inítituirão  a  Religião 
das  Virgens  Veftaes.  E 
porque  razão  Virgens  ? 
Para  que  ellas,  &  o  fogo,  a 
quem  guardavão  ,  foíTem 
femclbantes  :  clle  por  n^- 


&  furiofo  de  todos  os  mar- 
tyrios,  aífim  dominaffe  a 
violência,  &  fúria  do  mais 
violento,  &  furiofo  de  to- 
dos os  Elementos. 

4+f     E  fe  a  íingulari- 
dade  do  martyrio  de    S. 
Barbara  mercceo  eítc  do- 
mínio 


\J'JÁ 


S.  Barbara]  4^/ 

mmiocómumfobre  o  fo-  das  as  criaturas  irracio- 
go,  não  foi  menos  devido  naes,  nenhúa  traz  maisim- 
à  caufa  do  mefmo  marty-  preíTo ,  &  expreíTo  em  fy 
rio  o  dominio ,  &  império     efte  carader,  que  o  rayo , 


particular  fobre  as  partes 
mais  violentas ,  &  furiofas 
do  mefmo  fogo,  que  faó  os 
rayos.  Quaíido  o  Pay  jà 
cruel  encerrou  a  Santa  na- 


oqual  he  hum  tridente  de 
fogo  dividido  em  três  pó- 
tas,  &  por  iíTo  chamado 
trino,  ou  trifulco.  i//^ /»^- 
ter^Reãorque^eúm  ^vui 


quella  torre,  mandou  que     dextra  trifulcis  ignibus  ar 
feabriíTem  nella  duasja-     mataeft^  diz  Ovidio  i3c 


nellas  ;  &  como  depois 
viíTe  abertas  três  ,  &  fou- 
beílc da  mefma  filha ,  que 
cila  tinha  acrccentado  a 
terceira  em  hora  da  Trin- 
dade do  verdadeiro  Deos, 
trino,  &  uno  ,  que  adora- 
va ;  efta  fé,  &  proteílaçáo 
conftante  foi  a  caufa  do 
feu  marty  rio.  Vamos  ago- 
ra ao  miíterio,  &  propor- 
ção do  premio  ,  com  que 
Deos  o  remunerou.  Ém 
todas  as  coufas  ,  que  Deos 
criou,  como  marca ,  ou  ca- 
radber  próprio  Ç  a  modo 
dos  grandes  artifices  3  im- 
primio  alguns  veftigios  do 
íeuíòberano  fer,  trino  ,  & 
hum,  poílo  que  muitos  os 
naóconheção,  comodiíTe 
David :  Et  veftigia  tuanon 
cognojcentur .  Mas  entre  to- 
Jom./. 


Séneca :  Opifex  trifulciful- 
minis Jenfit^ eus.  Por  ou- 
tra parte  a  mais  natural 
hoftilidade  dos  rayos,(que 
íèmpre  bufcão  o  mais  al- 
to} hecombater,&  efcal- 
lar  as  torres.  Tanto  af- 
fim,  que  em  alguns  lugares 
de  Itália  ,  que  refere  Píi- 
nio,  foi  vedado  noteppo 
da  guerra  levantarfemfe 
torres,  porque  todas  ba- 
tiaós&deftruiãoos  rayos : 
Turres  bellicis  temporihis 
defierejieri^7iuUa  non  earMm 
fulmine  diruta.^  como  a 
caufa  do  martyrio  de  S. 
Barbara  foi  a  Fé,  &  prote- 
ílaçáo da  SantiíUma  Trin- 
dade efculpida,  oa  decla- 
rada nas  três  janellas  da 
fua  torre  ♦,  para  que  o  pre- 
mio foíTe  proporcionado 
Hh  iij  naò 


Pliniuv 

lib.  2. 
cap.4. 


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^'^  Sermão  de 

mo  fo  ao  martyrio,  fenaó  4^7     He  tal  a  bondade 

TS^T^^^^^^A^A^"^"^.^'  ^^Í^^^^^C   o  qual  ainda 

moriadaTrindadedeolhe  quando  mais  irado  fc  náo 

o  doniinio  dos  rayos ,  que  efqtiece  de  fua  mifencor. 

reprefentaóamefmaTriii.  dia  Jquequando  quer  ca- 

dade  nas  fuás  três  pontas :  íligar  os  homens  ,  o  que 


&  cm  memoria  da  torre 
fella Tutelardes  torres,  8c 
dos  caftelíòs,  para  que  as 
guarde  ,  &  defenda  dos 
mefmosrayos. 


mais  fente  he,não  haver 
algumiquefe  lhe  oponha, 
&lherefifta.  Efta  he  a, 
queixa,  que  faz  por  boca. 
delfaiasno  Capitulo  cin- 
coenta  &  nove  ,  onde  o 
Profeta  defcreve  ao  mef- 
^    '        ■_.    '■     ■  y"  moD^os  irado  contra  os 

í>íi446   pAra  >=bem  vos     cativos  de  Babilónia  ,  & 
^  1     fejaórodopo-     armado  de  juíhça,de  zelo» 

oeroío,  &  todo  piadofo     de  indignação,  òc  vingan- 
DcosCque  me  naó  quero     ca  para  os  caíligar  ,  ò^^^dc- 
congratular  neíle  caíò  có      ' 
anoíTají^voíra  Santa,  fe- 
naó com  a  voíía  iníinita 
bondade.  jPara  bem  vos 
fejaó  eíles  m cfrn os  pode- 
res ,  que   cómunicafces  à 

Ç      p    ^  ,  icrva,  Cv   ue-        w,,,t»í.^^í,;>,,^  c^aují  uurci.r luu- 

tenlora  noíia,  para  que  te-  t tonem  hoíiihusjtiis ,  &  ^^/- 

nha  a  voíTa  miíericordia,  cifíuudimm  immicis  fuis 

quem  modere  os  rigores  Eítascraóasarmas,deque 

de  voO-ajuí^iça,  &  quando  Dcosjà  cílava  veítido  de 


íiruircomo  inimigos 


.  In- 


duíusejíjuftitía,  iit  loricuy 
&  galea  falutis^  zn   capite  s^  ^p. 
eJHs:  hidíLtus  c[l  vejUmen-  •7-»5i- 
tis  ultionis  y  é-  opertus  ejl 
quaji palito  zeli  :  Jictit  ad 
vindtãam  quaJi  adretribu. 


a  voífa  maõ'  armada  de 
rayos  queira  fuhninar  o 
nuindojou  vos  tenha  maó 
nobraço^ouosapague,  & 
divirta,antes  de  chegarem 
à  terra. 


ponto  em  branco  ,  para 
executar  o  caíligonaquel- 
les  homens.  £  a  fua  quei- 
xa, no  meyo  deíla  mefma 
dehbcraçáó  ,  qual    era  > 


S.  Barbara]  4^7 

Bédita  feia  tal  bondade,ac  nal  Hebreo,  non afcendtftts, 
tal  amor !  Et  vidit  quia  non  infraãuras,  &  interrufUo- 
efl  'Vir :  &  aporiatiis  eft.quta  nes  ]  neque  oppofuiftis  mu- 
nonefíqui  occurrat.  Aílim     rumpro  domolfraeU  utfta 


provocado  de  íiiajuíliça, 
aíllm  irado,  aílim  armado, 
aíTím  deliberado  a  caftí- 
gar,&  jà  com  os  inftrumê- 
tos  da  vingança  nas  mãos: 
o  que  Deos  mais  fentia,  o 
que  mais  o  magoava  ,  o 
que  mais  o  aíHigia,  &:  qua- 


retis  in  pralio  ir.die  T>omi^ 
ni.  Foi  o  cafoj  qiie  tinha 
Deosficiado  a  Gidade  de 
Jerufalemcoín  o  exercito 
dos  -Chaldeos  para  a  ca- 
íligar,&  deílruir:  ^  tendo 
jà  aberto  brechas  para  o 
aíTalto  real  (^  que  iíTo  quer 


fi  defefperava,  (  que  tudo  áizGtfiaãuras,&  innrrup 

iíTo  fignifíca  aporiatus  eft  }  tknes  )  queixafe  Deos  de 

emfim  o  de  que  fó  fe  quei-  queos  cercados  nam  fizef- 

xava  o  bom  Senhor,  he  de  fem  contramuros  ás  mef- 

naó  haver  hum   homem,  mas  brechas,   Neque  oppo* 

que  Te  oppuzeíTe ,  &  con-  fuiftis  murunii  &  naó  fahif- 

trariaíTe  a  fua  mefma  deli-  fem  a  defender  fortenien- 

beração,  &  acodiíTe  pelos  te  a  entrada  dos  inimigos. 

que  queria  caftigar,&ro-  Pois  íè  o  fitiador  era  Deos, 


gaíTe,  &  intercedeífe  por 
ellcs:  &  com  efficacia  de 
razoens,  como  Moy fes ,  o 
perfuadiíTe  a  perdoar  :  ou 
lutando   com  elle  ,  como 


&  o  exercito  de  Deos  ,  & 
de  Deos  havia  de  fer  a  viv 
toria,  &  o  eaíligo  ,  In  'dm 
^omini  s  porque  fe  queixa 
o  mefmo  Deos  de  nao  ha- 


Jacobjà  força  de  braços,  &     ver  quem  fe  lhe  oppuzeíFe^ 

a  braços  o  reduziíre,&  ren-     &  refifí:iíre,iVd/?í  afcendiftis^ 

'^  ex  adverlo^nequeojjpofmjiis' 

murum^  Forque  lendo  a 
condiç^\ódeDeos  naó  có- 
denarjfenaó  perdoar,  nam 
aíTolaryfenáo  confoiarjiiaò 
matar  ,  fenaó  dar  vida  5 
íiii  iiij        9.uan« 


deífe 

448  A  mefma  queixa 
fez  outra  vez  Deos  pelo 
Profeta  Ezechiel ,  dizen- 

Eiech   do ;  Non  afcendijtis  ex  ad- 
'i  í-    verfo  [  ou  como  lè  o  origi* 


i 


iRcg. 


488  Sermatde 

quando,  a  mais  naÓ  poder,  rabit :  carbmesfucceyinfunt 

toma  as  armas  para  nos  ca-  abeo.  Inclinavit  cJos ,  & 

itigar.oquemais  defeja,&  defcendif.  &  caligo  fub  pe- 

reíifta,& o  obrigue  a  em-  conCpenu  eJHs,fuccenfi  funt 

quando  da    femelhantes  Calo'Domrms,&  excelíus 

poderes  contra  fy ,  ou  fo-  dabrt  ■vocemfuam.  7mZ 

brefy  mefmoa  Barbara  ,  gittas,& dépavtT  fui- 

naoaeIla,nemanòs.fpnaó  *       i. ,1   r-     ^ 'J"i 


guT,  é-  conjumplit    eos.  Et 


naó  a  ella,nem  a  nòs,  fenaó 

C;sdtirAr°"^;^'  ^^'''"'  ^'^^à-revdatJ  rum  funda. 

^^«.rr^í&fe  queixava  de  neT>omini,  ai tnfptr atice 

raoter  hum  homem,  que  fpiritusfurons  eius.    Nam 

felheoppuzeíTe  ,  jàagora  tz  lingua.  quepoíTa  decl™ 

terá  hua  mu!her,que  p.  «é-  ,„  a  profopopea  tremen- 

ça,&odefarme.„,,,,,,.v..^  da defta defcripçaó ,  S 


As  mais  temerofas,  & 
formidáveis  armas  deDeos 
faó  os  trovões,  &  os  rayos  : 
Vomimmformídabtmt  ad^ 
verjartj  ejits :  &  fiiper  ipfos 
in  Calís  tonabit.   Armado 


emudecendo.  'Inclinará 
Deos  os  Ceos,&  avilinhar- 
fehamais  à  terra  para  ca- 
íligar  feus  habitadores  : 
debaixo  dos  pès  trará  hum 
remoinho  de  nuvens  ne- 


deitas  armas  nos  pinta  Da-  gras,  efcuras ,  &  caJigino- 
vid  ao  meímo  Deos  com  {:,s',  das  ventas  lhe  fairáó 
tal  horror  de  palavras,  que  fumos  efpeíTos  de  ira  ,  de 
ate  pmtado  faz  tremer,  indignação ,  de  furor  :  da 
Lormnota  eft,  &  contremuit  boca,como  de  fornalha  ar- 
dente, exhalarà  hum  vol- 
cáodefogotragador,  que 
tudo  acenda  em  brazas,  & 
converta  em  carvoens: 
atroará  os  ouvidos  attoni- 


Urra  '.fundamenta  montium 
^l^eg.  coricuJfaJunt,&  conquaffa. 
tayqiLoniarn  iratus  eji  eis, 
Afcenditfurmis  de  naribits 
ejusy&ignisdeore  ejíis  vo- 


S.  Barbara.  489 

tos  com  os  brados  medo-     nome,  por  mais  que  as  nu- 


nhos  de  fua  voz,  que  faó  os 
trovoens  ;  cegará  a  vida 
com  o  fuíilar  dos  relam- 


veiis  fe  rafguem  em  tro- 
voens, fe  acendaó  em  re- 
lâmpagos ,  &  fe  desfaçaò 


pagos  alternadamête  ace-     em  rayos,(S. Barbara!  )em 
fos,  abrindofc  ,  &  tornan-     fe  invocando,  &foandoef- 


dofe  a  cerrar  o  Ceo  teme- 
rofa mente  fendido :  defpa- 
rarà  finalmente  as  fuás  íàt- 
tas,  que  faó  os  rayos,5c  co- 
rifcos :  abalarfehaó  os  mo- 
tes, retumbarão  os  valles, 
aífundarfehaó  atè  os  abif- 
mosos  mares  ,  defcubrir- 
feha  o  centro  da  terra  ,  & 
«parecerão  revoltos  osfú- 
damentos  do  mundo.  Eno 
meyodefta  confufaó,  af- 
fombro,terror,&defmayo, 
quaes  eftaráó  os  coraçoens 
dos  homens  ,  &  que  fera 
delles  ?  Confumilos  ha 
Deos,  diz  David ,  Et  cm- 
fumpfit  eos.  Mas  ifto  fe  en- 
tende do  tempo  ,  em  que 
David  efcreveo  ,  muitos 
feculos  antes  de  hai''er  na 
terra  a  gloriofa  defenfora 
deílas  baterias,  &  ácí^cs  ti- 
ros do  Ceo  ,  atè  entaóin- 
venci veis.  Porém  depois 
que  no  mundo  foi  conhe- 
cido aquelle  nome  fagra- 
áoy  ou  o  fagrado  daquelie 


te  poderofo,  Ôc  portenrofo 
nome,  os  trovoens ,  os  re- 
lâmpagos, os  rayos  tudo  fc 
diílipou,&  aquelles  eílron- 
dos,  medos,&  ameaços  do 
Ceo,  não  fó  paráraó  fem 
efFeito,&  fe  desfízeraó  fem 
danoi  mas  donde  a  terra 
temia  fer  abrazada,fc  vio 
regada,porque  os  rayos  fe 
refõlvéraó  cm  rios,  &  o 
fogo  fe  có verteo  em  agua :  Píaim. 
Fulgura  jnpluviamfecit,      ^^'^'^' 

449  E  u  naó  quero,  nê 
poíTo  dizer  ,  que  depois 
que  no  mundo  ouve  Si 
Barbara^  os  rayos  naó  fof- 
fem  nocivos  aos  homens  > 
ou  aíFom  brando- os  fó  com 
o  ar,ou  tirandolhe  a  vida , 
êc  fazcndo-os  em  cinza 
com  o  fogo  ;  pois  eftáo 
cheasas  hiftorias  de  mor- 
tes notáveis  de  grandes 
perfonagens  feridas ,  &  ef- 
pedaçadas  com  rayos. Mas 
oque  fó  quero  dizer  he, 
que  de  peilbajque  inyocaf- 


490  ScrmaUe 

fea  S.  Barbara     &  algum  podem  evitar  :  outros  faò 

hiíWha,nemcomolo-  nos,&?ópara  eftespode^ 

go  direi,a  pode  haver.  Se^  aproveitar  as  oracoens ,  t 

raes^d^oi^d    ;r  "T  "^  -^os:i^W^.^.,,;i._ 

aesdepoisdedifputarro-  ^^.  tynmonahhus  ttafur^^^^-' 

hua  fentença  verdadeira-  preces fuennt,  &  vota  íL 

mente  Eftoica  :  Maloful^  ^./.^/Atèaqui^eneeact 

men  non  Umere,  quàrn  r:ofe :  Jo  grande  Filofofo  'mas 

fintes  quero  não  temer  6  fem  fé.  Para  nos  porenTI 

rayo  que  conhecelo.  Tu,  fabemos  que  naõ^ha  fado 

i.ucilio,enrina  aos  outros  mais  que  a    Providencia 

comoosrayosfe  fazem  eu  divina^emprelivre,  &  t^l 

para  mim  fo  quizera  faber  do  Doderofa :  digo  que  ne^ 

comofe  naô  temaó  :  Ita^  nhum  rayo  poderá  fazer 

•mw    ^uealws  docequemadmodú  mal  a  quem  fe  encomen^ 

jiant,  ego  mihtmetum  tUo-  dar  a  S.Barbara.E  porque^ 

rum  excutt  maio  ,  quàm  na^  Porque  allim  o  promereo 

turamindtcart.    E  fe  per-  Deosà  mefma  lianta   An- 

guntarmos  ao  mefmo  Se-  tts  de  ofl^erecer  a  garganta 

neca  como  fe  podem  nam  à  efpada  do  tvrano,fezBar. 

temer  os  rayos?Refponde,  bara  oraçaó  a  Deos ,  que  a 


que  naò  temendo  a  morte. 
Sòquemnaó  teme  a  mor- 
te, naò  teme  o  rayo.  E  naó 
bailara  ,  fallandogentili- 
camcnte  ,  encomendarfe 
hum  homem  aos  Deofcs.? 
Abfolutamente  naó.  Por- 
que os  ray os,  diz  elle,  huns 
faó  fatacs,&neceíí-irios,& 
eftesde  nenhum  modo  fc 


todos  os   que  a  tomaífem 
por  inrerceííòra  concedef- 
fefuadivma  Mageltade  o 
que  pediílcm  :  &  no  mef- 
mo ponto  íè  ouvio  huma 
voz  do  Ceo,que  dizia :  Af- 
iim  ícrà  como  defejas.  Lo- 
go nenhum  rayo  pode  fe- 
rir a  quem  tomar  por  iví^ 
tcrcellòniaS.  Barbara.  A 
con- 


S.  Barba 
confequencia  Ke  evidente. 
Porque  aqueIlaívDZ,que  fe 
ouviodo  Ceo/fòi  voz  de 
Deos  :  &  o  rayo,que  fae  do 
trovaó,  também  he  voz  de 
Deos,  como  diz  Job  :  la- 
^^-  ^7'  nabit  T>eus  invocefua.Lo- 
go  efta  fegunda  voz  de 
Deos  he  força,  que  fe  con- 
forme com  aquella  pri- 
meira também  de  Deos, 
porque  naó  feriáo  vozes 
da  rumma  verdade,  fe  'bua-' 
contrariaíleaoutraj  íii''°*^v 


5.  VI. 

45^^.  A  Tè  aqui  temos 
ZjLviílo  quães  faó 
os  poder  es,  &:  domínio  de 
S.  Barbara  fobreo  fogo  na- 
tural, &  contra  os  mais 
violentos,  &  furiofos  par- 
tos delle  ,  quaes  faò  os 
rayos.  Mas  de  trezentos 
annos  a  eíla  parte  tem  cre- 
cido  muito  mais  a  jurdi- 
çaó,&  império  da  mefma 
Santa  fobre  o  Elemento 
do  fogo.  Ate  o  anno  de 
Chriíl:omir&:  trezentos  & 
quarenta  &:quatro,o  cam- 
po em  que  dominava  S. 


''^'  491 

era ;i Regia 5  doar,  com  os 
ícus  relâmpagos,  &  rayos ,; 
&  com  todos  .  05   o  Litros; 
meteoros   ardentes ,  que 
nelle  acende  o  fogo  ,    env 
que  também  entraó  os  va^^ 
ftiílimos  corpos,  6c  formi^ 
dáveis  incêndios  dos  Ca-r 
metas   Efte  univerfal  do- 
mínio como  governadora, 
&  protectora  exercitou  a 
noílà    Santa  pí^fk-eípaço 
mais  de  mil  annos,que  tan- 
tos fe  contarão  defde  o  feu 
martyrio  atè  o  anno  jà  re- 
ferido de  mil  trezentos  & 
quarenta  &  quatro.    E  fa- 
ço aqui  efba  diílinçãd  de 
tempos  ,  &  de   poderes  j 
porque  nefte  anno  fe  acre- 
centou  à  mefma  Santa  fo- 
bre a  jurdíção  do  fogo  ele-  Sponda- 
mentar ,  &  natural  ,  a  dos  "oaíl 
fogos  artiíicíaes,cujospro-^^i  '344- 
digiofos  exceíí<^s ,  que  ca- 
da dia  vemos  crecer  mais> 
«Sc  mais  com  novos  horro- 
res da  natureza  ,  entaó  ti- 
veraó  feu  principio.  Com- 
razão  clamão  as   Efcritu- 
ras,  que  das  pa  rtes  S  eren-> 
trionaes,&  do  Norte  faí-> 
ria  todo  o  mal.  Aílim  fe  vio 
na  Germânia^  porque  del- 
ia 


i 


i-erem. 
1.13. 


49  J  Strmaode 

la  fahio  naquelle  annopa-     ria,  porque,  atè  entaó  efta 


rapefte  imiv^erfal  do  gé- 
nero humano  a  fatal  invé- 
ção  da  pólvora ,  fendo  feu 
defcobridor  Bertoldo  Ne- 
gro, o  qual  jà  trazia  no  ap- 
pellidoacor,quehavia  de 
ter  o  feu  infernal  invento. 
O  primeiro  Profeta ,  que 
profetizou  os  males  ,  que 
no  Setentriáo  haviaó  de 
terfua  origem  ,  foi  Jerc 


va  cncerradOi ,  &  oculto 
nos  fegredós  da  natureza , 
&  quando  fe  inventou,  en- 
tão fe  àç^Çzohxio^T  andetur . 
Os  primeiros  q  feachaó 
haver  ufado  da  artelharia 
pelo  artificio  da  pólvora 
(^ao  menos  na  Europa]  fo- 
ráoos  Mouros  contra  os 
Chriílãos  na  Batalha  de 
Al2;ezira    em   Hefpanha. 


mias,  quando  em  figura  de     De  maneira,  que  bem  ad- 
húa  caldeira  ardente  ,0/-     vertida  a  Chronologia  dos 


Iam  fuccenfam  ego  video  , 
vio o  incêndio,  com  que 
Nabuzardaó  havia  de 
abrazar  a  Jerufalem.  E 
verdadeiramente  que  as 
fuás  palavras  muito  mais 
naturalmente  fe  podem 
entender  do  incêdio  ,  com 
que  Bertoldo  abrazou  o 
mundo.  Ab  Aquilone  pan- 
detur  malum  fupcr 


tempos,  no  mefmoíeculoj 
&quaíi  pelos  mefmos  an- 
nos  tiveráo  feu  infauílo 
nafcimento  as  maiores 
duas  peíles  do  mundo  ,  a 
pol  vora,&  o  Império  Oto- 
mano. E  parece  que  aílim 
eílava  profetizada  húa,  U 
outra  muitos  feculos  antes 
por  Daniel  no  Capitulo  fe- 
timo.  Fallaallio    Profeta 


»rt*..*,        ,„^^^„*    y,*y^t/         01717168  w  inn  vy .     X    til  ia  a  £  H   W        XlUH.La 

'  '^"^^  habitat  ores  terra.  Aquelle  dos  quatro  mais  famofos 
fogo  abrazou  fomente  os  Impérios  do  mundo  ,  & 
habitadores  de  Jerufalem , 
eítetemabrazado,  &:con- 
fumidoatodas  as  naçoens 
do  mundo.  E  delle  íe  diz 
com  maior  propriedade  , 
^andetur  malum  ,  que  o 
malfc  abriria,  6c  defcobri- 


com  grande  efpecialidade 
das  três  partes  do  Roma- 
no, que  lhe  havia  de  rou- 
bar, &:  dominar  o  Turco 
na  Afia,  na  Europa,  6c  na 
Africa,chaniandoao  mef-  Daniel- 
mo  Turco>  Comu  par\,uLú^  7.8. 
pela 


W 


bid. 


SjBarbara. 
pela  baixeza  de  feus  prin-  Deos 
cipios.  E  na  mefma  or- 
dem da  narração  diz,  que 
vio  a  Deos  aíTentado  no 
trono  de  fua  Mageílade,  & 
queda  boca  lhe  faia  hum 
rio  de  fogo   arrebatado: 

Fluvim  igneusy  rapidus  que    fua  Providencia,  que  fe  fa- 
•'°  egredtebatur  à  facie  ,   hoc     çáo.  Efteriopoisdo  fogo 
efiy  ah  ore  ejus.  E  que  rio  »    -    ^      ^    ^    .   ^     , 

de  fogo  nomeadamente 
arrebatado,  &  furiofo  hc 
eíl:e,fenaó  o  da  pólvora, 
inventado  no  mefmo  tem- 


495 
porque  naó  fó  as 

coufas  naturaes  faó  efFei- 

tos  da  fua  boca ,  &  da  fua 

vozilpfedixityCrfaãafunt'^  ^'^^"^ 

fenaó  também  as  artifi-  ^^' 

ciaes,  quando  querendo, 

ou  permitindo   difpoem 


arrebatado,  &  furiofo  da 
pólvora  fe  dividio  logo 
em  tantos  canaes  ,  huns 
maiores, outros  menores, 
quantos  faó  os  canos  de 


po  do  Império  Turquefco,  ferro,  ou  bronze,por  onde 

como  logo  nota  o  mefmo  o  mefmo  fogo  furiofam^- 

I.  Profeta :  Afpiciebamprop-  te  rebenta  ,  &  por  iííb    fe 

ter  vocem  fermonum  gran-  c  ha  mão  bocas  de  fogo.  Na 

diiim^  quos  cornu  illud  lo-  Cavallaria  as  pifl:olas,&  as 


quebatur  ?  Era  o  author  à^- 
Ite  invento  de  profííTaó 
Religiofo,  ao  qual,  como 
bem  diz  Eípondano  ,  fora 
melhor,  que  notempo,  em 
quefaziaaquelías  experi- 
ências, fe  eftiveíFe  enco- 
mendando a  Deos :  mas 
permite  o  mefmo  Deos 
lemelhantes  invençoens, 
aflim  para  caftigo  dos 
máos,  como  para  gloria,  & 
exaltação  de  feus  Santos. 
Primeiramente  faia  efte 


caravinas,  nos  Infantes  os 
mofquetes,&  os  arcabu- 
zes, nos  exércitos,  &  nos 
muros  das  Cidades  os  ca4 
nhoe^SíÔc  as  culebrinas»^  E 
todos  eHes  infíru mentos, 
&  os  que  os  manejaó,  fica- 
rão defde  entaó  fogeitos 
ao  imperio,&  debaixo  da 
protecção  de  S.  Barbara. 

4f  I  Vede  quanto  íe 
aumentou  o  feu  dominio 
comoinvento  da  pólvora 
na  mulddaó,na  variedade. 


rio  de  fogo  da  boca  de    naforçajnos  eíFeitos  ,  & 


ain- 


Sermão  de 
flicilidade  dos  tanta  mulrídaó  de  rayos, 
quantas  faó  as  pedras  das 
fuás  muralhas.  Os  rayos 
que  caem  do  Ceo  em  mui- 
tos annos/aó  contados,  os 
quefe  fulminaó  da  terra 
na  bataria,  ou  defenfa  de 
húa  praça,  naó  tem  conto. 


ainda  na 

tiros, í^  machinas  de  fogo, 
a  que  prefide.  Para  fe  ge- 
rar hum  rayo  he  neceíla- 
rio,  que  as  terras  naó  fejaó 
extremamente  frias  ,  que 
por  iílb  na  Scithia  faó  ra- 
riíUmos   :   he  neceíTario, 


que  o  tempo  feja  Eftio,  ou     Ainda  quando  os  do  Ceo 
Outono:  que  as  nu  vens  fe-     fenaó  contentaó  com  fe- 


jaó efpeíTas,  &  húmidas 
que  as  exhalaçoens  fejaó 
fecas  &  cálidas :  que  o  mo- 
vimento, ou  anteparifteíis 
as  acenda :  que  a  rotura  por 
onde  fae  feja  pela  parte  in- 
ferior,&  não  pela  de  cima: 
6c  que  a  matéria  feja  craííâ, 
&  pingue,  porque  fenam 
diflipe,  ou  apague  o  fogo, 
antes  que  chegue  a  terra. 
Tudo  iílo  he  necefiario 
para  formar  hum  rayo  na 
Região  do  ar.  Na  terra  po- 
rèm,  quam  pouco  bafta  .? 
Bafta  que  aos  que  tem  o 
fupremo  poder  lhe  fubá  à 
cabeça  hum  vaporíinho, 
ou  de  cobiça,  ou  de  ambi- 
ção, ou  de  inveja,  ou  de 
ódio,  ou  fomente  de  vai- 
dade, &:  gloria  ,  para  que 
contra  hua  fortaleza  ,  ou 
fobrehúa  Cidade  chova 


rir  os  montes  ,  ou  com  fe 
em  pregar  nas  feras,  &  nas 
eníinhas,  ou  fó  com  meter 
medo  aos  homens  5  raro  he 
o  rayo,  que  feja  reomais 
que  de  hum  homicidio. 
Mas  os  que  faem  de  húa 
peça  de  artelhariajfe  o  naó 
viftes,ouvi  o  eílrago,  que 
fazem.  Na  batalha  naval 
entre  os  Ccfarianos  ,  & 
Francezes  na  ribeira  de 
Salerno  matou  húa  bala  de 
artelharia  quarenta  Ceíà- 
rianos:  Na  batalha  cam- 
pal dos  Alemães  contra  os 
Efpanhoes  junto  a  Rave- 
na  matou  outra  peça  com 
hum  íó  tiro  mais  de  cinco- 
enra  Alemães  :  Na  guerra 
de  Alberto  Cefir  contra 
os  Polacos  em  Bohemía, 
não  clizem  as  hiílorias  ác 
qual  das  partes,  mas  afiir- 
maó. 


S.  Barbara.  4Pf 

maó,  que  húa  fó  bala  ma-     ferno  havia  de  fair  apol- 

tou oitenta foldados.  vora,dc   nenhum  modo 

4f2     Que  femelhança     dera  ao   rayo  o  nome  de 

tem  com  a  fombra  difto  as     inimitável,  pois  a  noílà  ar- 


telharia  naô  fó  o  imita,mas 
vence.  Todo  o  apparato, 
&  fabrica  eftrondofa  de 
hum  rayo  a  que  fe  reduz 
no  ar  ?  A  húa  nuvem  5  a  hu 
relâmpago,  a  hum  trovão  > 
&  aomefmorayo.  Etudo 
iílofe  vèj&exprimenta  có 
ventagem  no  tiro  de  húa 
peça.  O  fumo  he  anuvem> 
o  fogo  o  relâmpago  ,  o  ef- 
trondo  o  trovaó ,  a  bala  o 
rayo.  E  digo  com  venta- 
gemi  porquea  nuvem  aca- 
bou no  primeiro  parto ,  & 
em  fe  rompendo  fe  desfez, 
êcdefvaneceo:  &  a  peça 
inteira ,  &  folida  dura  an- 
nos,ôc  fecuIos,defparando> 
&  lançando  de  fy  no  mef- 
mo  dia,  &  na  mefma  hora 
naófohum,  fenáo  muitos 
rayos.  Pouco  ha  diííemos, 
que  o  fogo  natural  era  eíi 
teril,  &  náo  gerava  ;  mas 
depois  que  o  Artificial  fe 
ajuntou  com  a  pólvora  em 
todo  o  género  de  viventes 
tem  filhos  de  fogo.  Ani- 
nhara, que  do  mefmoln-     mães  defogo  nos  camelos, 

íer- 


Balliílas,  as  Tcrebras  ,  os 
Arietes,as  Catapultas,  & 
todos  os  outros  inftrumen- 
tos  bellicosjque  com  tanta 
força  de  engenho  inventa- 
rão primeiro  os  Gregos, 
depoís  os  Romanos  ,  & 
com  canta  força  de  braços 
naó  confeguiaó  em  muito 
tempo^éc trabalho,  o  que 
faz  em  hum  momento  húa 
maó  com  hum  botafogo.^ 
Muitos  ouve  3  que  quize^ 
rao  imitar  os  rayos,  que  a 

Í;entilidade  chamava  de 
upiter  ,  em  que  foi  taó 
famofa  a  arrogância  de 
SulmonReyde  Elide  vi- 
vendo, como  he  fabuíofo 
no  Inferno  o  caíligo  do  feu 
atrevimento.  Virgílio  lhe 
chama  louco,  porque  quiz 
imitar  o  rayo,  que  nam  he 
imitavel. 
*DemenSiqui  nimbo 'i  &  non 

imitabilefulmen 
^^re^ér  comipedum  curfu 

Jtmularat  eqmrum. 
Mas  fe  a  fua  Mufa  adevi- 


49^ 


Sermão  de 


I 


'<- 


ferpentes  de  Fogo  nosba- 
íiliícos,aves  de  fogo  nos 
falcoens  3  &  em  todos  os 
outros  inílrumentosfulfu- 
reos,homcnsdefogo.  Ho- 
mens de  fogo  na  artel lia- 
ria ,  homens  de  fogo  nas 
bombas,  homens  de  fogo 
nas  granadas,  homens  de 
fogo  nos  petardos,homens 
de  fogo  nos  trabucos ,  ho- 
mens de  fogo  nas  minas,6c 
aílímíbbre  a  terra,  como 
debaixo  delia  homens  de 


Averiguada  conclufaõ  hc 
entre  os  Meftres  de  haa,5c 
outra  milicia ,  que  compa- 
rada a  da  terra  có  a  do  mar, 
eftahe  muito  mais  traba- 
Jhofa,&perigofa.  Na  terra 
peleja  contra  vòs  hum  ele- 
mento, no  mar  todos  qua- 
tro :  na  terra  tendes  para 
onde  vos  retirar,  no  navio 
eftais  prefo,  &naó  ttndQg 
outra  retirada,que  lançau" 
dovosao  mefmo  mar.  Na 
terra  ajudão  huns  cfqua- 


fogo,que  nelle,  &  delle  vi-     droens  a  outros  efquadro^ 
vem,  ens,&  huns  terços  a  outros 

terços,  no  mar  eílais  com 
os  companheiros  à  viíla,& 
nem  elles  muitas  yqzqs  vos 
podem  foccorrer  a  vòs, 
nem  vòs  a  elles.  E  quanto 
ao  exercício  da  artelharia, 
na  terra  borneais  a  voíía 
peçacuberto  de  hum  pa- 
rapeito de  pedra  de  cinco 
pès,  ou  de  hua  trincheira 
defcixinade  dezoito,  no 
mar  dctraz  de  húa  taboa 
de  três  dedos.  Na  terra  cor- 
re a  artelharia  íobre  huma 
efplanadaíirme,  ^fegura, 
nomarfobre  hum  convéz 
í l-  m  p  rc  i  n  qu  i c to  ,  &:  ta  m  - 
bem  inquieto  da  parte  có- 
traria 


§.  VIT. 

^^l  np  A5  neceílario 
X  he  ao  intrépi- 
do, &:  temerofoofficio  da 
artelharia  (  que  tudo  iílo 
comprehende)  opatroci- 
nio  deS.Barbaranaterra. 
E  pafíando  da  terra  ao 
mar  ,  bem  fe  deixa  ver 
quanto  mais  importante 
ferà,6c  quanto  mais  admi- 
rável,&  milagrofo ,  defen- 
dendo aos  que  pelejaó  có 
os  mefiiios  inftrumentos 
de  fogo,  metidos  em  hum 
lenho,  ôc  fobre  as;ondas. 


S.  Barbar  a. 


'497 


traria  o  ponto  a  que  íe  ni- 
vella  o  tiro.  Os  Gregos 
chamarão  àpeça  de  arte- 
Iharia  bombarda  pelo  boa- 
to 5  os  Latinos  tormentum^ 
pelo  que  atormenta  o  cor- 
po oppoílo  que  fere :  eu  na 
terra  chamaralhe  tormen- 
to,&:  no  mar  tormenta :  Ig- 
niSi  é^fulphnr ,  érf^iritus 
frocelUrum.  Grande  ci- 
rcncia  Geométrica  he  ne- 
ceílaria  para  entre  dous 
pontos  inconftantes  tirar 
Âúa  linha  certamente  re- 
éba,  qual  ha  de  feguir  a  ba- 
lapara  fe  empregar  com 
cíFeito.  Mastudo  iílo  pò 
de  fazer  o  fabio  artilheiro 
náutico  có  maiores  eílra- 
gos  do  inimigo  ,  dos  que 
acima  referimos  ,  confe- 
^uindo  com  hum  fô  tiro, 
por  fer  no  mar,  o  que  nam 
pôde  foceder  na  terra.  Ex- 
plicarmehei  com  hum  ex- 
emplo famofo  da  fagrada 
Efcritura. 

4jr4,  Por  occafiaó  do 
ieílamento  de  David  faz  a 
Efcritura  hum  Catalogo 
dos  feus  mais  iníignes  Ca- 
pitaens,  que  he  a  melhor, 
&  mais  preciofa  herança , 
Tom./. 


que  Hum  R.ey  pode  deixar 
a  feu  filho,eomo  bem  o  ex- 
primentou  Felippe  Segú- 
do  nos  que  herdou  de  Car- 
los. Começa  poiso  Cata- 2.  ^^^ 
logo  :Hac  nommafortium  ^^^• 
T>avid:  Eftes  faó  os  nomes 
dos  valentes  de  David.  E- 
rão  eftes  valentes  trinta,eA 
colhidos  entre  todo  o  exer- 
cito, os  quaes  fe  chamavaé 
os  trinta  fortes  de  Ifraeí; 
deftes  trinta  eraó  efcolhi- 
dos  três  ,  os  quaes  íècha- 
mavaó  os  três  fortes:  &  de- 
ites três  era  efçolhido  hu,o 
qual  naó  fe  chamava  o  for- 
tiííimo,  fenaóo  fapientif- 
fimo.  As  palavras  notáveis 
do  Texto  faõ  eftas :  Sedens 
in  cathedra  fafientijjimus 
^rinceps  inter  três  :  ipfieft 
quafi  tenerrimm  ligni  ver- 
miculm^  qui  oãingentos  in- 
ter fectt  impetu  uno.  Eftà  af- 
fentado  na  cadeira  o  Prin- 
cipe  fapientiílimo  entre 
três,  o  qual  de  hum  Ímpe- 
to matou  oitocentos,  &he 
como  o  bichinho  fem  for- 
ça vqueroe  as  raizes  da  ar- 
vore. Três  duvidas  nam 
vulgares  tem  eíle  Texeo. 
Se  eíte primeiro  ,  &  mais 
li         afFa- 


4^8  Sermão  ãe 

atFamado  Capitão  de  Da-     tem  acontecido  ,  fcm  dii 


■!;•'■' 


Vià.  matou  oitocentos^  co- 
mo os  podia  matar  de  hú 
fó  Ímpeto,  Interfecit  oãm- 
gentos  impetu  une  ?  E  fenaó 
fó  entre  os  trinta  ,  fenaó 
entre  os  três  fortes  de  If- 
rael,eraelleomais  forte; 
porque  naó  fe  chama  o 
fortiílimojfenaó  fapientif- 
íimo  ,  SapientiJJimm  inter 
fr^^  .<^  Final  mente,  feaquel 


vida  a  deitara  a  pique  com 
hum  fó  tiro,  &  no  tal  cafo 
dehumfó  Ímpeto  matará, 
oitocentos,  &  ainda  mais 
homens :  Occidit oãingen- 
tos  impetu  uno.  E  por  húa 
vitoria  taó  notável ,  que 
nome,ou  fama  alcançara  o 
Artilheiro?  Naó  nome,ou 
famadefortiíllmo,  fenam 
<ie  fapientiílimo  ;  porque 


Ia  fua  grande  façanha  a  de-  aquellaacçaónaó  foi  obra 
clara  a  Efcritura  por  hua  das  forças  do  feu  braço  , 
comparação  ;  porque  fe  fenaó  da  ciência  pratica 
compara  a  hum  bichinho  daGeometria  militar,com 
femforçajque rocas  raízes  que  governou  taó  acerta- 
da arvore  .-7/7^^  í^«^í/^;;í  damenteotíro,&  por  iíTo 
tenerrimus  ligni  vermicw  fapientiíTimo  na  arte:  Sa- 
/ííj  ?  Deixada  a  interpreta-  fientijfimus  inter  três.  Fi- 
ção  literal  defta  hiííoria  ,  nalmente,  para  tirar  a  ad- 
quc  naó  he  fácil  >  eu  que  fó  miraçáo  de  hu  m  taó  gran- 
areferi,&  tomei  porexê-  deeftrago,  executado  por 
pio,  digo,que  nella  eftà  ad-  hum  inltrumento  fem  for- 
miravelmente  retratado  ças,traz  a  h  fcritura  a  com- 
quantopòde  obrarofabio  paraçáo do  bichinho,  que 
artilheiro  com  hum  fó  tiro  fem  ellasroeo  as  raízes  da 
iiaónaterra,fenaónomar.  arvorej  porque  alojados 
Atirando  a  hua  Capitania,  muitos  homens  debaixo 
ou  a  outra  grande  nao  de  de  húa  grande  arvore  ,  fe 
guerra,fe  lhe  penetrar  có  ella  por  Jhe  faltarem  as 
abalaopayolda  pólvora,  raízes  cahio  fubitamente 
ou  lhe  romper  outra  par-  fobreelles,  a  todosoppri- 
tevital^comoalgúasvezes  mio,ac  acabou  de  hum  fô 


SiBariãfâ.  499 

golpe,  T^aõ  fendOi  a  eauía    tccçaó,  que  nos  defenda, & 
principal  de  tamanha  rui-    livre.    Verdadeiramente, 


na  a  grandeza,  &:  pefo  da 
arvore, fenaó o  bichinho, 
que  lhe  roeo  a  raiz :  Ipfe  e(t 
tanquam  tenerrimu^  Ugni 
njermkuliís,  -■' 

45"  f  Por  eíle  íingular 
exemplo  fevé  quãto  mais 
poderofa  he  a  artelharia 
no  mar,  que  na  terra  ^aju-^ 
dandofe,6c  dandofea  maó 
o  Elemento  da  agua  com  o 
do  fogo.  Jà  antigamente 
tinhaó  feito  a  mefma  com- 
panhia entre  fy  eftes  dous 
Elementos  contra  Faraó 
no  Egypto :  Grando^  &  ig- 
nls"  mifia  pariter  fereban- 
tur\  &  a  mefma  fazem  na- 
turalmente em  todas  as 
batalhas,  ou  conflitos  na- 
vaes.  O  fogo  queima  ,  a 
agua  afoga,  o  fogo  mata ,  a 
agua  fepuita.  Mas  fe  tanto 
he  oeftrago  i  que  faz  yi & 
pôde  fazer  hiia  peça  de  ar- 
telharia nas  nãos  inimigas, 
daqui  fc  deve  fazer  refle- 
xão, (  como  a  fazia  Aga- 
menon  no  incêndio  de 
Troya  )  que  o  mefmo  fará 
nas  noífas,  fenão  tivermos 
álgúa  mais  poderofa  pro- 


que  he  tão  pia,  &  chrifl-ãá-^ 
como  bem  entendida  ar- 
chitedura  aqueila,  có  que 
cm  todas  as  nãos  de  guer- 
ra) que  faò  Cidades  nadan<- 
te«,  a  cafa  que  os  Hereges, 
6c  outros  menos  devotos 
chamaó  praça  de  armas, 
nòs  como  templos  peque^ 
nos  a  dedicamos  a  S.  Bar- 
bara, &  a  fundamos  fobre 
osalmazens  mais  fecretos, 
cnl  q  a  pólvora  vai  guarda- 
da.. Como  fe  diíTera  a  noA 
fa  Fè,  ou  a  nofla  confiança 
com  os  olhos  na  vigilância 
de  taó  foberana  Protefto-  yiztth. 
ra:  Non  fínetperfodi  domuni  ^4-43  • 
fuam.  Para  mim  naó  íaô 
necefl^arios  outros  nviía- 
gres  de  S. Barbara,  mais  q 
eíle  taó  univerfal ,  &  taó 
continuo  em  todos  os  va- 
fos  de  guerra  prenhes  de 
mais  aparelhados  incen- 
dios,queo  cavallo  Troya- 
no. 

4f6  Vendo  Moy fes  nos 
defertoà  de  Madian,  que  á 
Çarçaardia,&naó  fequei-  ^^^^ 
mava,  difle :  Vadam^  &  vi-^  ^  3°  ' 
debiivifivnemhcmc  magna  \ 
liij         Q£^ 


w 


■!í>' 


iif 


f^  Sermõde 

Qyero  ir  Ter  efte  grande  E  defta  mefma  ncceílida- 
^ilagre.  O  milagre  confí.  de  de  comer  para  fe  íu- 
ítia,cm  que  eftando  o  fogo  ftetar,  nafce  aofogoaquel- 
tao  vifinno  à  Çarça   ,  ella     Ja  voracidade,com  que  taó 


com  tudo  íem  o  admitir 
em  fyy  eíliveíTe  taó  verde , 
que  como  bem  dífíh  Philo 
Hebreo,  mais  parecia  que 
a  Çarça  queimava  o  fogo, 
que  o  fogo  a  Çarça  ;&  que 
cm  vez  de  o  mefmo  fogo  a 
abra2ar>a  regava,para  que 
mais  reverdeceíTe.  Por  iíTo 


facilmente  fe  atea,&:tan. 
to  mais,  quanto  a  matéria 
he  maisdifpoíla.  Suppofto 
iílo,quem  naó  terá  por  mi- 
lagre, &  continuou  mila« 
grés  de  S. Barbara,  princi- 
palmêtenas  nãos  de  guer- 
ra, em  que  perpetuamen- 
te fc  conferva  o  fogo  ,    & 


Moyfes  não  folhe  chamou  muitosfbgos,  abílerfeelle 

milagre,  mas  grande  :F/^  de  fc  atear  em  matérias 

/wnem  òancmagmm.E  nao  taó  difpoílas^como  as  dos 

leria  grande,nem  milagre,  mefmos    corpos  navaes  ? 

leafome  ,  &  voracidade  Pode  haver  matéria  mais 

do  fogo  naó  foífe  qual  he,  difpofta,&  mais  golofa  pa- 

U  myft eno    com  que  os  ra  o  fogo,  que  taboas  fecas. 

Antigos  fingirão  a  Vulca-  breu,  alcatram,  fevo,  efto- 

no  Ueos  do  fogo  manco,&  pa,&  pólvora,  &  tudo  ííIq 

arrimado  a  hum  bordaÓ,  aíTopradodos  ventos  ,  ôc 

lie  porque  fó  o  fogo  entre  em  perpetuo  moto  ,  que 

todos  os  Elementos  necef-  por  fy  mefmo  he  caufa  do 

lita  demateria,  em  que  fe  calor,  &  o  calor  do  fogo  ? 

luífente.  A  terra,  a  agua,o  Se  as  nuvens  húmidas,  & 


arfuítentaÓfe  ,  &  confer- 
vaófe  em  fy  mefmos,  o  fo- 
go fe  naó  tiver  em  qiiefe 
íuííente,apagare,  &  morr 
re.  Aíli.n  fe  apagou  nas 
alampadas  das    Yirgensi 


frias  naturalmente  produ- 
zem fogo  por  antepariíle* 
íis,  como  naó  obra  os  mef- 
mos cffeitos  em  matérias 
tão  difpoílas  todo  o  Ele- 
mento da  agua ,  que  as  ro- 


nekías  pola  falta  de  óleo.    dea,por  natureza  mais  hu- 

midoj 


S  Barbara.  foi 

mido ,  Sc  mais  frio  ?  Mas     defcartegando  pólvora,  &c 


para  que  faó  argumentos, 
onde  as  mcfmas  maravi- 
lhas fe  demoftraó  melhor 
nas  experiências  da  vifta, 
do  que  as  pode  coníiderar, 
ou  arguir  o  difcurfoíPcn- 
devos  no  Galeaó  S.  Do- 
mingos, Capitania  Real 
de  noíía  Armada  nas  qua- 
tro batalhas  navaes  de 
Pernambuco,  fuftentando 
a  bataria  de  trinta  &  cinco 
iiaos  Olandezas ;  &  que  he 


tendo  nas  mefmas  mãos 
os  murroenscom  duas  me-^ 
chás  acefas,  ou  os  botafo- 
gos  fíncados  junto  aos  car- 
tuchos :  &  que  bailando 
qualquer  íaifca  para  exci- 
tar hum  total  incêndio,  Sc 
voar  em  hum  momento 
toda  aquella  maquina:  que 
entre  tanta  confufaó  ,  Sc 
viíinhança  de  pólvora ,  Sc 
fogo  ,  eíliveíTeo  Galeaó 
tremolando  as  fuás  ban- 


o  que  fe  via  dentrOj^  fora     deiras  táo  feguro,&  fenhoir 
cm  toda  aquella   fermofa,     do  campo,  como  húa  roca 


&  temeroía  fortaleza  nos 
quatro  dias  deíles  confli- 
tos ? Juga va  o  Galeão  fef- 
fenta  meyos  canhoens  de 
bronze  em  duas  cubertas 


batida  fó  das  ondas,  &  naó 
das  balas  j  quem  negará 
que  fupriaalli  a  vigilância} 
&  patrocinio  de  S.  Barba- 
ra,o  que  nenhúa  providen^ 


tinha  guarnecidas  porhú,     cia  humana  podéra  evitar? 
&:  outro  bordo  o  convèz. 


os  caítellos  de  popa  ,  Sc 
proajas  duas  varandas,  Sc 
as  gáveas  com  feiscentos 
mofqueteiros.  E  fendo  hu 
Ethna,  que  lentamente  fe 
movia,  vomitando  labare- 
das, &  rayos  de  ferro  ,  Sc 
chumbo  por  tantas  bocas 
maiores,ác  menores :  dan- 
do todos  ,  Sc  recebendo 
pólvora  ,  carregando  ,  Sc 
'^        Tom. 7. 


457  ÇObre   eft'fe^cOv 

reconhecimento,  -  que  vi** 
vaSjSc  louvores  deve  toda 
a  nlilicia  Catholicâ,  aíílní 
no  mar  ,  como  na  terra,  m 
fua  grande  Prote£bora  ?  Sc 
que  documentos  darei  eu 
aosGíficia^s  maiores,  Sc 
li  iii         me- 


Vil 


1 

.<., 

;, 
li' 

1 

1M 

tj 

1 

1 

1 

< 

a 

ii£. 

^ 

4Reg. 

2.11, 


5^^  SennaÕde 

menores  da  nobiliirima  ar-     os  rayosdoSoI  jde  outros 


tedaartelharia,feus  fub 
ditos,&  devotos  .?  Para  o 
triunfo  de  S.  Barbara  fe  me 
ofFereciaa  Carroça  de  E- 
lias  por  fer  de  fogo :  mas 


lugares  da  mefma  Efcri- 
tura  tiraó  os  Santos  Padres 
a  verdadeira  caufa.  Eftan- 
do  Elias  retirado  em  hum 
monte,  mandou-o  chamar 


pofto  que  tao  fmgular  en-  ElRey  Ochofias  por  hum 
tre  todas  as  que  vio  com  Capkaõ  de  Infantaria, 
admiração  o  mundo,  por-     acompanhado  de   cinco- 

quedenenhú  modo  igua-  enta  foldados ,  o  qual  lhe 

la  apompa,8c  mageílade,  deo  o  recado  do  Rey  com 

quehe  devida  às  vitorias  eílas palavras:  Homo  'Bei, 

da  noíTa  Santa ,  fó  nos  fer-  hac  dicit  Rex :  Feãma^def-  \  ^,'«' 

vira  para  notar  no  mefmo  cende:  Homem  de  Deos,  " 

fogo  a   diíferença  ,  como  diz  ElRey,  que  decais  lo- 

fervemas  fombras  ,  &  os  go,  &:  lhe  vades  fallar.  E 

oppoftos  para   mais  illu-  que refponderia  Elias?  Si 

ftraroscontrarios.Defcre-  homo  T>  d  fim  ,  dtfce.idat 

vendo  a  Efcricura  o  modo,  ignis  de  C^lo,  &  devoret  te , 

com  que  Elias  arrebatado  &qmnqítaginta   tuos  :  Se 

da  terra  fe  apartou  de  Eli-  fou  homem  de  Deos ,  deça 

feo,  diz  que  foi  em  huma  foçro  do  Ceo,  que  te  abra- 

xrarroça,  porque  tira vaó  ze^^a  ti,&:aos  teuscincoen- 

cavallos,&que  a  carroça,  ta.  Allím  odiíTe  j&aíllm 

&oscavallostudo  era  de  fe  comprio  logo   :  deceo 

fogo:^:?  ecce  currm ignetis,  fubitamente  fogo  do  Ceo, 

&  equt   ignei    divifenmt  queabrazou,&confumioo 

íitrumqne.   E  fendo  que  o  CapitaÓ,  &  os  foldados. 

Texto  fagrado  naó  dane-  Sabido  o  cafo  por  ElRey, 

fte  lugar  a  razaó  ,  porque  mandou  outro  Capitão  có 


triunfou  Elias  pelo  ar  em 
carroça  de  fogo ,  podendo 
fer  antes  de  nuvens  mais 
viftoíamcnte  douradas  c6 


outra  companhia  do  mef- 
mo numero:  6ccomoeíle 
déí^Q  o  recado  com  igual 
comedimento;  a  rcpofta 
.    I  .w  ,       de 


tornei. 
1  cap. 
:ccl. 
8.8. 


S.Bar 
de  Elias  foi  como  a  pri- 
mcira,&  o  Capitão  ,  &  os 
foldados  todos  foraó  abra- 
zados  com  fogo  doCeo  cm 
hum  momento.  Tal  era  o 
império,  que  Deos  tinha 
dado  a  Elias  fobre  o  fogo, 
de  que  eile  ufava  taó  def- 
poticamente :  &  efta  foi  a 
razaó  ,  porque  o  mefmo 
fogo,  comofogeito,&fub- 
di to  fcu,  fe  donverteo  cm 
carroça, &  cav:9-Hos  para  o 
levarem  triunfo:  IgnisE' 
liam  quafi  fuum  imperato- 
rem  rever etur  ,  et  que  quafi 
famulus  fuum  ultro  offert 
obfequium^  diz  có  S.  Chry- 
foílomo,  &  os  outros  In- 
terpretes literaes ,  Corne- 
lio. 

4f8  Combinemos  ago- 
ra fogo  com  fogo,  império 
Gom  império,  &  Barbara 
com  Elias.  A  Elias  ,  &  a 
Barbara  deo  Deos  o  impé- 
rio do  fogo  5  mas  com  que 
diíferente  mageílade  exer- 
cita hum  ,  &  outro  o  mef- 
mo império.?  Elias  manda 
ao  fogo  que  queime  ,  & 
Barbara,que  haó  queime : 
Elias  mandalhe,  queabra- 
ze  homens  A  Barbara,que 


bar  a,  5-03 

os  náo  toque  :  obedecci\- 
do  porem  o  fogo  a  Elias, 
queima,&abraza  como  fo- 
go que  he,  mas  obedecen- 
do a  Barbara,  como  feper* 
dera  a  própria   natureza, 
quaíi  deixa  de  fer  o  que  he, 
por  naó  faltar  ao  que  deve. 
Da  parte  de  Elias  parece 
que  he  igual  o  poder  no 
império ,  mas  da  parte  de 
Barbara  moftra  q  he  mui- 
to maior  na  obeuiencia.Sc 
quando  Daniel  foi  lança- 
do no  lago  dos  Leoens  ,  el- 
les  o  coméraó,  naó  era  ma- 
ravilha :  mas  que  famin- 
tos, &  como  paílo  à   viíla 
refreaíTem  a  própria  vora- 
cidade, a  fua  abftinencia 
era  a  que  provava  o  mila- 
gre :  &  aquillo  he  o  que  fa- 
zia Elias  nos  homens,  que 
dava  a  comer  ao  fogo ,  iílo 
o  que  faz  Barbara  nos  que 
livra  dos  incêndios.  Ver- 
dadeiramente era  galante 
a  confequencia,  com  que 
Elias  fazia  decer  o  fogo  áo 
Ceo .'  St  homo  ^eifum^def- 
cendat  ignisde  CaíOy  &  de- 
vorei te :  Se  fou  homem  de 
Deosjdeça  fogo  do  Ceo,  q 
te  abraze.  Bafta  que  o  final 
li  iiij         de 


g, 


50+  Ser 

de  íer  de  Deos  era  abrazar, 
&  confumir  homens  !  Pa- 
ra bem  parece  que   havia 
de  dizer,Se  fou  de  Deosjeu 
rogarei  a  Deos  por  ti,  eu  te 
guardarei,  eu  te  defende- 
reij  &  ifto  he  com  que  pro- 
va a  noíTa  Santa   fer  mais 
propriamente  de  Deos.  fi- 
lias imperando   ao  fogo, 
moftrava  que  era  de  Deosj 
mas  de  Deos  vingador,  de 
Deosrigorofo,  de  Deosfe- 
vero :  &  Barbara  no  mef- 
mo  império  moftra  tam- 
bé  que  he  de  Deos;  mas  de 
Deos  perdoador,  de  Deos 
piedofo ,  de  Deos   benig- 
no, emfím  de  Deos,  no  de 
que  mais  fe  preza  Deos. 

4fp  Naó  ha  duvida, 
que  na  comparação  de  im- 
pério a  império,  o  ufo ,  &: 
exercício  dcMc  foi  muito 
mais  humanOj&  benéfico , 
ScporiíTo  mais  divino  em 
S.Barbarajqueem  Elias.  E 
paífandoa  comparação  de 
togo  a  fogo,aí]im  como  no 
que  domina  S.  Barbara 
defcobriremos  húa  grande 
novidade,  aílim  na  combi- 
nação do  mefmo  dominio 
fuljiiemoscom  a  verdade, 


maÕde 
onde  fó  pôde  chegar  o  en- 
carecimento, &  de  nenhu 
modo  paíTar  a  imaginação. 
JàdiíTemos,  com  a  opi- 
nião comum  dosHiftoria- 
dores,quem,&quãdofoi  o 
primeiro  inventor  da  pol- 
vora.  Mas  febéfe  lerem, & 
entenderem  as  Efcrituras , 
acharemos,que  quatro  mil 
annosantesa  tinha  jà  in- 
ventado Deos  no  fogo  ar- 
tificial, que  cho\^eo  fobre 
Sodôma.  Que  foíTe  artifi- 
cial,&  não  natural  aquelle 
fogo, confiadas  palavras, 
com  que  Moyfes  refere  a 
mefmahiftoria,  dizendo, 
que  o  Senhor  choveo  do 
Ceoenxofre,6c  fogo  feiro 
pelo  mefmo  Senhor  :  'Do- 
mintís phíit  fiiper  Sodomam  ceneC 
fulphur^a  'tgnemàT>om'mo  'i'^^ 
de  Calo.   Onde  he  muito 
novo,&  digno  de  fe  notar 
aquelle  termo,  Tiommiisà 
'Domino,  para  declarar,co- 
moadv^crtcm  todos  os  in- 
terpretes, que  tal  género 
de  fogo  não  foi  eíTeito  das 
caufasnaturaes,  masdaar- 
tcj^Sc  íabedona  divina,  a 
qual  não  cria  nada  de  no- 
vo, mas  das  coufas  jà  cria- 
das, 


S\  Barbara.  ^05- 

áas,compondo-as,  &  unin-     fornalha  de  Babilónia,  re- 
do-as  entre  fy,  produz  ef-     prefentavaa  fegunda  pef- 
feitos  novos,&  maravilho-     foa  da  Trindade,  o  Filho : 
fos,  qual  foi  aquelle  fogo     Etfpeciesquarti  fimilis  Fi-^^'^^'''" 
verdadeiramête  artificial.     lioT)ei.^  E  quando  Deos 


Mas  que  o  artifício  foíTe  o 
mefmo  da  polvorajnaó  ba- 
ila efte  fó  texto  para  o  pro- 
var, porque  fó  faz  mençaó 
do  enxofre,  Ignem^  &  fui- 
phur. Temos  porém  outro, 
em  que  o  mefmo  Moyfes 
no  Deuteronomio  torna  a 
defçrevero  mefmo  fogo, 
&  diz  expreíTa mente,  que 


para  livrar  a  hum  homem, 
qual  era  Loth,  do  primei- 
ro incêndio  da  pol vorajco- 
mete  efta  diligencia  a  dous 
Anjos,&  eífes  reprefenta- 
doresdeduas  peíToas  di- 
vinas j  vede  qual  he  o  im- 
pério, o  dominio ,  &  a  jur- 
diçaó  de  S.  Barbara,  pois  a 
ellafó  encarregou  Deos  o 


eracompoftode  enxofre,  cuidado,&fuperintenden- 

&falitre  jquefaóos  dous  ciauniverfal  de  livrar,  & 

ingredientes  da  pólvora:  defêder  a  todososhomés, 

Sulphure^  &  falis  ar  dor  e  aííim  na  terra  ,  como  no 

comhurens,  in  exempB  Jub-  mar,do  fogo,  ^  incêndios 

verfionts  Sodoma,  Deíle  fo-  da  mefma  pólvora  I 

gopois,&do  primeiro  in-  ^60      Fabriquem  pois 

cendio  ,   que  caufou   no  os  Serafins,  que  faó  eípiri- 


mundo  a  pólvora,  livrou 
Deos  a  Loth.  Mas  por 
meyo  de  quem  ^  Nam  fó 
de  dous  Anjos ,  mas  eífes 
reprefentadores  de  duas 
peíToas  divinas  ,  porque 
craódous  dos  três  ,  que 
aparecerão  a  AlDraham  no 
valle  de  Mambrè  Q  bem 
aíTim  como  o  Anjo,  que  li- 
vrou aos  três  mininos  da 


tos  também  de  fogo,novo 
carro  triunfal  a  S.  Barba- 
ra, melhor,  &  mais  gíorio- 
fo  que  o  de  Elias  :  di^ntQ 
do  qual  naó  fejaó  levadas 
em  urnas  triftes,&  funeílas 
ascinzaáde  homens  abra- 
zadcSj^f morros,  mas  vi- 
vo», &  dando  vivas  à  ío^ 
berana  Froteéiora  todos 
arquelks [ numerofem  nu- 
mero j 


S*^^  .  Sermão  de 

mero] que liyroiido fogo,     vosaproveitar  de  hua  fó 


&  dos  incêndios.  E  o  noíTo 
mÇxgnç^  Capitão  do  mar,& 
da  guerra,  que  hoje  có  tan- 
to apparato  ,  &  grandeza 
celebra  a  mefma  triunfa- 
dora, leve  como  nobiliíll 


coufa  boa,  que  trouxe  ao 
mundo  o  uro,8c  invento  da 
pólvora.  DasBiborasnaó 
fó  fe  tira  veneno  ,  fenam 
tambê  triaga.  E  que  coufa 
boa  trouxe  ao  mudo  a  pol- 


1  n  ----""-  -^^  •^ivyuA^.cn^aiuuoapoi- 
ma  partedosfeus  triunfos,  vora.^Hum  defengano  uni- 
rodando  em  carretas  dou-     verfal,de  que  nenhnm  ho- 


radasos  canhoens  ganha- 
dos em  tantas,&  taô  famo- 
fas  vitorias  ,  com  os  quaes 
melhor,  que  com  colunas 
de  bronze,  fc  honraó  as 
portadas  defua  illuftriíTi- 
ma  Cafa  :  digno  fucceflbr 


mem  fe  devejà  fiar  das 
fuás  próprias  forças.  An- 
tiga mente  havia  Achilles, 
haviaHercuIes,havia  San- 
foens :  depois  que  a  pólvo- 
ra veyo  ao  mundo,  aca- 
boufe  a  valentia  dos  bra- 


daquelle  immortal  Heroe,  ços.  Hum  Pigmeo  cÓ  duas 

quecomoMartedapatria,  onças  de    pólvora   pôde 

adefendeonaguerra  ,  &  derrubar  o  maior  Gigante 

comoPay,cerradasaspor-  Que  fundamento  cuidais 

ínt-^r.  í"*^'  ^     ^^^°"  ^^'     ^^^^  ^  Filofofia  Symboli- 

"         ^  ca  das  fabulas,para  fingir, 

que  os  Gigantes  fizeram 

guerra  ao  Cco,&quÍ2era6 


toriofa  em  paz 
§.  IX. 
4^1    17  AvôsCanimo 


ílfos  Miniílros 
de  Vulcano,que  continua- 
mente exercitais  o  perigo- 


apear  do  feu  trono  a  Júpi- 
ter j  fenaó  porque   enten- 
derão ,  &  quizeraó  decla- 
rar aquelles  Sábios,  que  os 
homens  ,  que  fe  íiaó  cm 


lo  manejo  do  fogo  nos  ma-  fuás  grandes  forças,naó  te- 
lores,  &:  mais  arrifcados  mem  a  Dco^,  nem  o  vene- 
mílrumentos  da  voíTa  ar-  raó,como  fenaó  depende- 
te;  o  que  fó  vos  digo  por  raòdelle.  Ouviaarroean- 
fim  ke,que  nam  deixeis  de     cia  facrilega,  6c  blasfema  , 

cora 


S.  Barbara. 
cóqfallavahú  deíles  cha- 
mado Mefencio.  Dextra 
mthi  T>eus ,  &  telum  ,  quod 
mijjile  libro :  O  meu  Deos 
he  o  meu  braço,&  a  minha 
lança.  Por  certo  foberbif- 


4,62  Sirva  pois  a  pól- 
vora, que  fempre  trazeis 
nas  máos^de  vos  lembrar  o 
perigo,  em  que  igualmen- 
te trazeis  a  vida  ,  vivendo 
de  maneira  jqueíejaagra- 


íimo  Capitão,  que  naó  ha-    davel  a  Deos,  de  quem  por 
vieis  fallar  táo  confiada-     taó  ordinários    accidentes 


mente,  fe  fora  em  tempo, 
que  o  menor  foldadinho 
do  exercito  contrario,  vos 
podéra  refponder  com  húa 
boca  de  fogo.  Eíle  he  pois 
o  derengano,que  trouxe  ao 
mundoapolvora,para  que 
todo  o  homem,  Sc  muito 
mais  os  que  vive  na  guer- 
ra, &  da  guerra ,  fe  perfua- 
daó,quefó  Deos  lhe  pôde 
confervaravida,  &  naó  o 
feu  braço,  nemafua  efpa- 
da.  Aííim  o  dizia  David, 
aquellefoldado  tãoesfor- 
çado,&  tão  forçofo ,  que 
com  as  mãos  defarmadas 
efcalava  Uííbs,'&;  aífogava 
Leoens:  Glaâius  meusnon 
Jalvabit  me. 


eftà  mais  dependente,  que 
a  dos  outros  homens.  E  va- 
lendovos  da  poderofa  in- 
terceííaó  da  voíla  vigilan- 
tiíllma  Protectora  a  glo- 
rioía  S.  Barbara  :  de  cuja 
devaçaò,&  invocação  vos 
prometo  por  fim,  o  que  a 
mefmaSanta  tem  provado 
ao  mundo  com  vários  ex- 
emplos. Ainda  os  que  ef- 
taó  ardendo  no  meyo  das 
labaredas,  invocando  feu 
nome,feelle  lhes  naó  íal- 
va  totalmente  a  vida  tem- 
poral ,  ao  menos  lha  íu- 
ítenta  quanto  bafte,  para 
que,  recebidos  os  Sacra- 
mentos, alcancem  a  eter- 
na. 


SER 


4(^3 


SERMAM 


DO 


t 


S  A  B  B  A   DO 

ANTES   DA  DOMINGA   DE  RAMOS, 

r.  na  Igreja  de  N.Senhora  do  Defterro. 
Bahiajanno  de  1(^34, 


CogitavermtTrincipes  Saccrdotumut  ò  Lazarum  in- 

terfaerent^qtiia  multipropter  illum  abíbant  ex  Judais^  & 

credebantinlefum.  In  craftinum  autem  turba  multa  ^ 

qua  venerat  addiemfejiumycum  audijfent  quia  ve- 

nit  lefiis  Jerofolymam^acceperunt  ramos  palma- 

rum^ò'  procejjerunt  obviam  ei,  Joann  .12. 


§.  1. 

Thcmahe  gran- 
de ,  mas  o  Ser- 
mão fera  peque- 
no. Saó  as  pala- 
vras do  EvangcliílaS.Joaó 
aos  doze  Capítulos  de  fua 


hiftoria  fagrada  ;  querem 
dizer:  Fizeraó  confulta  os 
Irincipes  dos  Sacerdotes. 
Quando  logo  encontrei  có 
cíleprincipíojfiz  eftacon- 
fidcraçaó.  Confulta,  os 
Principcsdos  Sacerdotes! 
Sem  duvida  ,  que  fairáó 


Sermão  do  Sabbado  antes 
delia  grandes  bens  à  Re- 
publica:he  gente  Ecclefia- 
llica,  Re  pelo  confeguinte 
dou  ta,  &  fanta-,  que  fe  pô- 
de eíperar  de  h  Cia  confulta 
fua,  fenaó  coufas  de  gran- 
de gloria  de  Deos5&  gran- 
des bens  dos  homens?  A  f- 
lim  o  imaginava  eu,  mas 
enganeime.  Contra  Deos, 
&  contra  os  homens  íim, 
O  que  fahio  da  confulta, 
foi,  que  em  todo  o  cafo 
inorreíTe  Chriílo,Gomo  no 
dia  dantes  fe  tinha  decre- 
tado) iíTo  quer  dizer  aquel- 
le  Et^ut  &Lazarum,como 
interpretaó  os  Doutores: 
^  naó  fô  q  dêíTem  a  morte 
a  Chrifto,  fenaó  que  tam- 
bém tiraíTem  a  vida  a  La- 
zaro ,  a  quem  o  Senhor 
pouco  antes  tinha  refufci- 
tado;  Uf  ò*  Lazarum  in- 
ter jicerent.  Hajuizosmais 
apaixonados  ?  Ha  fcntença 
mais  enorme  ?  Ora  ouça- 
mos as  cauíàs,que  allegaô , 
êc  admirarnoshemos  mui- 
to mais.  Morra,  dizem, 
Chrifto,  porque  faz  mila- 
gres ,  porque  dá  faude  a 
enfermos,  êc  vida  a  mor- 
íosjporque  he  amado,por-; 


âa  dominga  de  Ramos,  f  o5> 
que  heeftimado,  porque 
he  feguido :  &  morra  La- 
zarOjporque  fendo  refuf" 
citado  por  virtude  de 
Chriftojhe  caufa  de  o  ama- 
rem, de  o  eftimarem,  de  o 
feguirem :  ^lia  multiprop-  r^^j^^. 
terillumablbant  exludaisy  »i- 
Ò"  credebãt  in  lefum .  (^Hon- 
ra do  crime  í  3  Tudo  ifto  mÍIÍ 
paíFoucomQhoje:  Ju  era-  ibidu. 
jtinum  amem  :  porém  ao 
outro  dia,  diz  o  E  vangeli- 
íla,  que  entrou  o  Principe 
da  gloria  a  cavallo  por Je- 
rufalem  triunfando  (^den- 
tro porém  dos  limites  de 
fuamodeília,  6c  humilda- 
de )  fervindolhe  de  pom^ 
pofo  acompanhamento  a 
multidão  infinita  do'  po- 
vo, que  com  palmas ,  &  ac- 
clamaçoens  devoto  o  fe» 
guia ;  Turba  mttltay  qu£  ve- 
ntratad  diemfeftum^  acce" 
perunt  ramos  palmarum^  ò* 
procejferunt  obviam  eL  Atè 
aqui  a  letra  do  noílb  The- 
ma.  O  que  temos  que  ver, 
hehúa  caufa  cri mejfenten^ 
ciada,  apellada,  revogada. 
Do  primeiro  tribunal  fai» 
ráó  culpados  os  innocen- 
tes:  do  íegundg  fairáò  con- 
denados 


fio  Sermão 

denados  osjuizes.  Pouco 
difto  parece  que  eftà  no 
Tliema,  mas  tudo  tirare- 
mos deli  e.  Naoo  moftro 
logo,  por  naó  gaílar  dous 
tempos.Peçamos  a  Graça. 


í.  11. 

'    4<>4   r^IziaPlatam, 
JLyque  os    que 
julgaô,  ou  governaó,era 
bem  que  dormiíTem  fobrc 
as  refoluçoensjquetomaf- 
fem.  Parecialheao  grande 
Filofofo,  queojuizo  con- 
fulcado  com  os  traveíTei- 
ros,  era  força  que  faíííe 
mais    repoufado.     AíHm 
acontcceo  aos  noíTos  Jui- 
zes do  Evangelho  os  Prin- 
cipes  dos  Sacerdotes^  dor- 
mirão fobre  a  refoluçam, 
que  hontem  tomáraó^de 
tirar  a  vida  a  Chrifto,  po- 
rém  hoje  acordarão  em 
Confelhocom  hum  confe- 
lho  taó  deíacordado,conio 
foi  confirmarem  hiia  Ç^n 
tença  a  mais  injufl:a,a  mais 
barbara,  amais  facrilega^ 
que  nunca  íedeo,  nem  ha 
de  dar  no  mundo.  Pergun- 
tara eu   a  fuás  Senhorias 


do  Sabbado 
dos  Principes  '  dos  Sacer- 
dotes ;E  bem,  Senhores, 
fazer  milagres  ,  refufcitar 
mortos,  fer  cftimado,  fer 
querido,  que  culpa  he,  ou 
contra  que  Ley?  NoExo^ 
do,  no  Levitico  ,  no  Deu- 
teronomio,  que  íàó  os  Câ- 
nones por  onde  vos  gover- 
nais,naó  ha  Texto,  que  tal 
prohiba :  pois  ignorância  ? 
Seria  afronta  de  hum  Tri- 
bunal   taó    authorizado, 
querer    prefumila    nelle. 
Deoarazaóde  tudoEuti- 
mio  em  duas  palavras;//^* 
que  t Ota  res  eft  invidia.  O 
cafo  he,  que  tudo  nefte  ca- 
fo  he  inveja.    Pois  já  me 
naó  efpantOjqueachaíTcm 
os  Principes  dos  Sacerdo» 
tes   na  mefma    bondade 
crimes,  na  mefma  innocê- 
cia  culpas,no  mcfmoChri- 
fto  peccados  ,  porque  -  nos 
TribunacSjOu  pubiicosjou 
particularesjonde  a  inveja 
preííde  ,  as  virtudes  faó 
peccados,  os  merecimen- 
tos faó  culpas,  as  obras,  ou 
boas  calidades  faó  crimes. 
40)''     Filava  Saul  hum 
dia  muito  maicncolizado, 
&íriíi:e,  dcícjou  quclhe 
b«f- 


'mtes  âa  T)omngã  de  Ramos]  j  i  i 

bufcaílem  algum  bom  mu-  zê  os  Doutores  Hebreos  j 

fico,  naófeife  para  fe  ale-  como  refere  Nicolao  de 

grarjfeparafe  cntriftecer  Lyra,  queefte  Cortefaó  , 

mais.   Acudio  logo  hum  que  aqui  falloujCra  Doeg, 

dos  Cortefaós ,  que  o  alli-  capital  inimigo  de  David. 

ftiaó,  dizendojque  naó  po-  Capital  inimigo  de  David, 

dia  SuaMagcftade  achar  &  gafta  tanta  retho rica  em 

outro  como  David  j  por-  feus  louvores?  Capital  ini- 

-  que  além  de  grande  muíi-  migo  de  David,  &  de  hum 

cojcra  mancebo  muito  va-  fundamento  taó  leve,  co- 

lente,de  grande  intelligen-  mo  fer  mullco,  toma  occa- 

cia  nas  matérias  de  guer-  íiaó  para  fazer  hum   aran- 

ra,  cortefaó,  avifado ,  gen-  zel  taó  largo  de  fuás  gran- 

til-homem,  &  fobre  tudo  dezasPSim.  Defcobriolhe 


muito  virtuofo,&  temente 
a  Deos :  Vuíifilium  Ifaifci- 
entempfallere  ,  &  fortijjl- 
mum  roborey  &  virum  helíi^ 
cofum^& prudentem  in  ver- 
bis^&  vir  um  pulchrum ,  & 
^ominus  ejl  cum  eo  :  Ha 


a  tenção  delicadamente 
hum  Expoíitor  grave  Por- 
tuguez ,  &  de  nofla  Com- 
panhia :  Sctebat  Saulem  ejje 
mvidum^&  alienis  laudtbus 
incredibiliter  cruciar t :  lau- 
dat  igitiir  T>avidem  apud 


mais  panegy rico  que  efte  ?    Saulem^ ut  Saul  invidiafti 

Pareceme  que  eftaó  dizê      mulis  agitatus   interficiat 

do  todos  os  que  o  ouvirão,    T>avidem.  Sabia  Doeg,que 

que  he  grande  coufa  ter     era  Saul  grande  emulo  de 

hum  amigo  em  Palácio,  &     - 

que  efte  o  devia  fer  mui 

verdadeiro  de  David,  pois 

fabía  fazer  taó  bons  oííi- 

ciospara  com  elle  diante 

del-Rey.  Tal  heo  múdo,q 

muitas  vezes  parece  fíne- 


David  5  que  o  invejava 
muito  ,  &  como  no  juizo 
dos  invejofos  os  mereci- 
mentos faó  culpas,  &  as 
excellentes  calidades  deli- 
tos, louvou,  6c  engrande- 
ceoaDaviddiãtede  Saul> 


zas  de  amifadejO  que  faó     para  que  Saul,  como  fez, 
ódios  reíinadiííimos,  Di-    défle  fentenca  de  morte 


con- 


}v3^ 


fii  Sc^rmaÕ  do  Saíhadõ 

contra  Da '/id.  DiíTe,  que     como  levava  par  cõmpa^^ 


era  prudente ,  guerreiro, 
esforçado,  gentil-homem, 
vírtuofo,  &  dotado  de  tan- 
tas outras  boas  partes  :  & 
quem  bem  entendeíTe  to- 
da efta  ladainha  de  enco- 
mios,&  louvores,  bem  po- 
dia dizer  por  D2Lvid)0rate 
proeo.  Eraò  capitulos,que 
contra  elle  fe  prefentavaó 
ao  Rey,  não  menos  que  de 
lefaMageftade.  Pareciam 
louvores  ,  &  eraó  acufa- 
çoens :  pareciaó  abonos,  & 
eraò  calumnias.  Calum- 
niadooinnocente  na  fua 
virtude,  &:  acufado o  be- 
nemérito nas  fuás  boas 
obras,  fem  que  à  innocen- 
cia  fe  lhe  déíTe  defefa,  nem 
ao  merecimento  lhe  valef- 
fem  embargos,  porque  era 
ojuiz  a  inveja. 

466     Que  bem  o  entê- 
deoaílimo  mefmo  David! 


nheiraafuafama  ,&  efta 
nunca  fabe  guardar  filen- 
cioi  começou  a  correr  lo- 
go pela  Corte,que  era  che- 
gado o  valente  de  Ifrael,  o 
matador  do  Golias,  aquel- 
leaquemas  damas  de  íe- 
rufalemcompuzeraó  a*le- 
tra,que  então  andava  mui-  ,  j^. 
to  valida  :  Tercuffit  Sanhi.i\ 
mi  lie,  T>avid  decem  miUia, 
Coufa  maravilhofa  a  que 
íefegue!  Tanto  que  che- 
gou aos  ouvidos  de  David 
o  que  paíTava,  diz  a  Efcri- 
tura,que  começou  a  recear 
muito  aparecer  diante  de 
A  chis :  'Fojíiit  T)a\:;d  Ser- 
mones  ijios  in  cor  de  fiio^  cJ-  ^^^  '• ' 
extimiát  valde  a  facie  A- 
chis  Regi s\  &:  a  ultima  re- 
foluçaó  que  tomou,  foi  fu- 
gir dalli ,  &  irfe  meter  em 
húa  cova :  Fugit  antem  inde 
infpeluncam  Odollam,  Pois  áfi? 


Denos  a  confirmação,  quê     David,  que  rcfoluçam  he 
nosdeoaprova.PaíToufeo     eílavoífa  ?  Que  quer  di- 


Uf 


perfeguido  mancebo  para 
aCortede  Achís  Rey,  & 
Reyno  contrario  ao  de 
Saul,&:  que  por  iíTo  pare- 
cia fcguro.  Hia  fó,  defco- 
nhecido,&:  disfarça  doimas 


zerirdefv^os  fazer  Ermitão 
de  hum  deferto  ,  quando 
vos  YtdQs  taõ  acreditado 
em  húa  Corte  ?  Qiiando 
vos  vedes  com  tanta  fima 
duntcdoRcy  ,  para  que 
fií- 


antes  dã  ^omln^ 
fugis  de  Tua  prcfença  ?  En- 
jCendia-o  como  prudente, 
obrava  como  experimen- 
tado. Saó  os  louvores  no 
pribunalda  inveja  accufa- 
çoens:  &  porque  David  íe 
viotaó  louvado,   homizi- 
oufe.  O  verfe  louvado  era 
yeríc  aççufado,  o  ver  fuás 
grandezas  referidas  ,  era 
•veras  fuás  culpas  prova» 
das,  teve  logo  muita  razão 
de  fe homiziar,  &  fugir  tã- 
to  de  fy,como  de  feus  emu- 
los.  Os  Satrapa9,&  primei- 
ros Miniílros  de    Achís 
^raó  mui  picados  de  inve- 
ja contra  os  Hebréps   :  & 
<:omo  havia  de    efcapar 
4elles  5  &  viver  na  mefma 
Corte  David    criíiiinofo 
das  fuás  vitorias, &  Keo  da 
fuafama?  Se  fe  diíTera  de 
David,  queera  hum  falfa- 
rioj  hum  perjuro, hú  adul- 
íero>  hum  homicida ,  hum 
roubadordpalheoj&r  ou- 
tras baixezas,  fe  as  ha  ain- 
da maiores  5  paíTeára  Da- 
vid na  Corte  ,  &  entrara 
muito  confiado  no  Palácio 
do  Rey ,  porque  ai  li  tem 
(eílesferviços  premio  ,  ou 
quando  menos,  paífaófem 
Tom.  7. 


\adeRdms^.  yr^ 

caíligo:  porem  dizendofe 
delle  tantas  virtudes,  tan- 
tas grandezas,  tantas  faça- 
nhas, tantas  excellenciasi 
andou  como  prudente  em 
fe  homiziar,em  fugir  j^por- 
que  todas  eífas   excellen- 
cias,&:  grandezas  eraõ  cri- 
mes contra  a  peíToaj&pri- 
vad!os  de  Achís,  &  delito» 
fem  perdaà  contra  as  leys 
da  inveja.   Coníidero  eu , 
que  ha  mandamentos    da 
ley  da  inveja,  allim  como 
haMandamentos  da  Ley 
deDeos.  Os  Mandamen- 
tos da  Ley  de  Deos  dizem. 
Não  matarás,  Naò  furta- 
rás,Naó  alevantarás  falfo 
teftemunho ;  os  manda mé- 
tos  da  ley  da  inveja  dizem, 
naó  feras  honrado, não  fe- 
ras rico,  não  feras  valente, 
não  feras  fabio  ,  não  fer᧠
bemdifpofto  ,&:  também 
dizem  ,   não  feras    bom 
Prègador:&fcacafo  Deos 
vos  Vez  mercê,  que  foubef- 
feis  por  os  pès  por  húa  rua, 
que  foubeífeis  apertar  na 
mão  húa  efpada,  quefof- 
féis  difcreto,  generofo ,  ou 
rico,ou honrado  i  no  mef- 
mopòto  tiveíles  culpas  no 
•      ^  Kk        ■  tri'^ 


f  1 4*  Sermão  do  Sabhado 

tribunal  da  inveja,porque    o  refufcitou  Chrifto  •  que 
peccaftes  contra  os  feus    culpa  he  fer  hum  homem 
mandamentos.  Por  eftas    refufcitado  >  Taò  longe 
culpas  efteve  taó  arrifcado    eft^ve  de  culpa  nefte  cafo , 
David,  por  eftas  foi  hoje    quenem  a  teve  em  ado. 
condenado  feu  filho  Chri-    nem  em  potencia  ,  nem  a 
lio,  que  alllm  lhe  chama-     teve,  nem  a  pode  ter  Cu- 
raó  as  Turbas  no  Evange-    rou  Chrifto  hum  moço  ce- 
\ho'.  Hofanna  fihopavid.     godé  feu  nafcimento,  & 
Era  grande  Pregador,  fa-    perguntarão  os  Difcipu^ 
2ia  muitos  milagres,  dava     los,  cuidando  que  excita- 
faudea enfermos,  refufci-     vaóhúaqueílaódeRrande 
tava mortos,&  comoeftas     habilidade;  T^omme,  quis  joa 
excellencias,  ou  eftas  cul-    pccavit,  htc,  aut  Parêntesis- 
pas  eftavaó  provadas  com     ejus,  tit  ca  cus  nafieretur  > 
osapplaufos,comasaccla-     Senhor,  por  cujos  pecca- 
maçoens,  com  o  amor,  &     dosnafceo  efte  moço  ce- 
feguimétodospovos,«^«///    go,  pelos  feus,ou  pelos  de 
Mantexlua^ts,  &  crede^    ftus  pays  ?  Rimfe  muito 
imntmlefum.  Confirmou-     defta pergunta  os  Expofi- 
le  o  primeiro  decreto  ,  &     tores  ,  6c  em  particular 
fahio  a  fegunda  fentença ,     Theophilado,porqu€  fe  o 
que  morra  Chrifto,  ut  &     moço  nafcéra    cego    por 
Lazarum,tdeft,  ut  Chriftn,     feus peccados , feguirfehia 


à'  Lazarum  interfciant. 

S'  III. 

4^7  lI)Emeftâ,cumal 
LJeftà  :  porem  a 
Lazaro  porque  o  códenaó? 
Não  lhe  neguemos  fua  de- 
fenfá  natural.  Sc  o  conde- 
não ,  como  dizem,  porque 


quepeccára  antes  de  naf- 
cer :  &  que  maior  difpai  a- 
te  pode  dizerfe,  ou  imagi- 
nar, que  ter  hum  homem 
peccados,  antes  de  ter  fer: 
ier  peccador  antes  de  fer 
homem  ?  Naó  menos  ia^ 
nocente  que  il lo  eftava 
Lazaro.  Eftava  morto, 
quando  Chnfto  o  refurci- 

tClí, 


antes  daT^omlnga  de  ^antof,  fif 

toMy  &C  por  beneficio  do  como  os  demais ,  fizeralhe 
naò  fer  eílava  impeccavel.  o  pay  húa  túnica,  ou  pello- 
Aílim  que  podemos  dizer     te,  naó  fei  dé  que  eftofaíi- 


delle  neíle  cafo,  o  que  de 
Eurialo  diííe  feu  grande 
amigo  Niío ;  Nihilifte^  nec 
aufus^necpotmt^  Nem  teve 


nh2.mdhoryt uni cam  foly- 
mitamy  com  que  aparecia 
os  dias  de  fefra  na  Aldeã 
menos  paftor  que  os  ou- 


^ulpajnemapodeter:  in-  tros.Ahquantos  Jo^ésdc- 
^nocenteemad:o5&empo-  ftes  ha  hoje  no  mundo! 
tencia.  Mascomferaílím,  invejados,  murmurados, 
faó  taó  linces  os  olhos  da  perfeguidos,  porqueíPor- 
inveja,que  neíles  impof-  que  Ihesdeoa  fortuna  c6 
liveis  de  peccado  defco-  que  trazer  húa  capa  me- 
briraó,&:  acháraó  culpas  liior  que  a  voíTa.  AíTimef- 
d  i  gnas  de  morte,  ut  &  La-  ta va  condenado  o  innocê- 
s^aruminterficerent.E^OT'  te  moço,  quando  trouxe 
que?^//^[  eisaquiacul-  íua  ventura  por  alli  hum 
p:i  )qu!a  fmlti  propter  //-  mercador  Ifmaelita  ,  que 


fcnef. 
7.t8. 


bim  credebant  inlefum\^or 
que  muitos  por  caufa,  ou 
por  õccafiaó  delle  criaó 
cmjefu. 

4,^  Fizeraó  coníèlho 
fobrejofeph  feus  irmãos : 
fahio  delle  que  morreíre,& 
quafi  com  as  mefmas  pala- 
vras, que  temo^  no  Evan- 
gelho, o  refere  a  Efcritura: 
Cegitavertmt  eum  occidere. 
Sabida  a  caufa,  era  porque 
o  amara  Jacob  particular- 
mente, &  além  da  famafrra, 


prometeo  por  elle  vinte 
rcales,  &os  cobiçofos  ir* 
mãos,  que  eraó  dez,  por 
quatro  vinteins ,  que  ca- 
biaó  a  cada  hum,  venderão 
a  feu  irmão, &  as  fuás  cbn- 
ciências. 

^69  Tinhaólhejà  des- 
pido a  túnica  caufa  das  in- 
vejas5&  naó  tinha  bem  vi- 
rado as  coftasjofeph,  quã- 
do  os  vendedores  arre- 
metem a  ella,&  a  começaõ 
a  fazer,ou  desfazer  em  pe^ 


ou  pellote  do  campo  com     daços.   Parai  ahi  ingratos 
que  hia  guardar  as  ovelhas    i;rmãos,parai,&refpondei. 

Kkíj        me^ 


5 1 6  SermaÕ 

me,  que  quero  arguirvos. 
Não  eftà  jà  vendido  Jo- 
feph?  VoíTa  cólera  naõ  eílá 
jà  vingada  ?  VoíTa  fereza 
não  eílà  jà  ÍUísíqíxí-Sí  ?  EíTa 
túnica  que  culpa  tem,  ou 
que  culpa  pode  ter  ?  Por- 
que a  fazeis  em  pedaços  ? 
Bem  Çtiy  que  naó  haveis  de 
ter  boca  para  me  refpon- 
der,  mas  refponderà  por 
vòs  Ruperto  Abbadeiir^- 
tern£  glorÍ£  monumentum 
impeccabile  Ç  notai  muito 
a.que\lG  rfnj)eccai?ik  ^  Fra- 
teriííe  gloria  monumentum 
impeccabile  laceratur :  adeo 
nec  morte^nec  venditionefa- 
tiattir  invidia.  Nenhuma 
culpa  tinha  a  túnica  dejo- 
feph,  que  mal  a  podia  terá 
feda,  oulãainfeníiveljfem 
vida  3  fem  alma  ,  Tem  von- 
tade. Com  tudo  nefta  in- 
capacidade natural,  &  ne- 
fte  impoíUvel  de  culpa, 
acharão  híía  os  invejofos 
irmáos,&:  foi,fer  inílrumê- 
to  da  gloria  de  Jofeph : 
Fraterna  gloria  monurnsn^ 
tum.  Era  prenda  da  parti- 
cular afleição  dcjacobjcra 
gala  com  quejoíbph  fe  au- 
thonzava,  com  que  luzia 


doSabbado 
mais  que  os  irmãos  ,  com 
que    grangeava    refpeito 
noseílranhos  ,  &  ifto  lhe 
bailou  por  culpa,  para  fem  ' 
culpa  a  defpedacarem:A/<?-' 
numentum  impeccabile  la-, 
ceratur. 1^2.0  fei  fe  fe  pode-  ■ 
ra  achar  em  toda  a  Efcri- 
tura  paíTo  que  mais  aovi-- 
vodeclaraíTe  o  queremos- 
entre  mãos.  Nenhúa  culpa- 
tinha   cometido  Lazaro, 
antes  nem  a  podia  ter  quã-: 
do  o   refufcitou  Chrifto> 
como  vimos5&  neíla  gran- 
de innocencia,  antes  nefta. 
impeccabilidade  foube  a 
inveja  defcobrir  culpas,  & 
culpas  dignas  de  morte,, 
que  foraójferinfrrumento 
das  glorias  de  Qhníko.quia 
multi  propter  illum  crede- 
bantinlefum.  Fora  famo- 
faj&:  mais  que  todas,  a  re- 
furreição  de  Lazarojadmi- 
randofe  ,  &  pafmando  a 
gente  de  ver  paíTar  pelas 
ruas  de  Jerufalem  o  que  ti- 
nhaó  viflo  de  quatro  dias 
morto  na  fepultura,  &  co- 
mo toda  eíla    admiraram 
redundava  em   fama  ,  & 
gloria  do  refu  feita  dor,  por 
íerinílrumcnto  da   gloiia, 
dcíla 


antes daT>õínmga de  Ramos.  fi/ 

defta"  fama  ,  condenaó  â    dia  por  JetUfalem   triuii- 


Lazaro  a  perder  a  vida:  UP 
éf  Lazarum  inter  fie  erent\ 
Bem  aíTim  como  a  inveja 
dos  irmãos  dejofeph,  nam 
contente  com  fe  vingar 
nelle,  paíTou  a  executar  a 
vingança  na  tunicá  inno- 
cente :  Adeo  nec  morte ,  nee 


farido,  recebido  com  pal- 
mas, &  acclamadodo  po- 
vo :  Acceperimt  ramos  pai- 
marum ,  é'  procejferunt  ob- 
viam ei.  AíTim  o  diz  o  The- 
ma.  Mas  vejo  que  me  aí- 
guem.Naó  tinha  eu  pro- 
metido ao  principio,  que 


venditionefatiatnrinvidia,     na  revogação  das  fenten 

ças,  fícariaõ  os  Juizes  con 


^WW'l 


i^un^j^'.  oui 


ror  .ií:x?"up 


470 


I  Ronúciada  çô- 
trà  Chrifto,  & 
contra  Lazaro  eíla  taó  in- 
jufta  fen tença,  como  a  in- 
iioc^ncia  quanto  mais  cal- 
la,então  allega  melhor  por 
ly  diante  de  DeóS ,  fervio 


ãénados  ?  Onde  eftáo  èftas 
condénaçoens  ?  Onde  ef- 
taó  eftas  penas  ?  EíTa  he  a 
graçajferem-no,  &nam  o 
parecerem.  Não  íè  execu- 
tar a  morte  de  Lazaro  foi  a 
primeira  pena  :  entrar 
Ghriílo  por Jeruíàlem  tri- 
unfando foiafegunda.Ve- 


efte  íilencio  de  appellaçaó  jamosa  primeira,logo  paf- 

ante  feu  divino  tribunal,  faremos à outra. 

Não  tardou  muito  o  def--  471  Eftavajob  cuber- 

pacho  Q  que  no  juizo  do  to  de  lepra  com  as  doreSj^c 

Geo  não  ha  dilaçoens3&  ò  trabalhos^  que  tantas  ve- 


que  fahio  nelle  foraó  dous 
decretos  contra  os  dous 
dos  Pontifices  nefta  ma- 
neira. O  primeiro ,  quê  a 
fêntença  dada  contra  La- 
zaro fenaòexecutaíle:que 
ficaíTefócm  intentos,  Co- 
gitaverunt.O  fegundo,que 
Chrifto  entraíTe  ao  outro 
Tom.  7. 


zes  fe  tem  repetido  nos 
Púlpitos  ,  &  nunca  aíTáz 
exageradojcomeçaa  quei- 
xarfe,  &  dizer  aíli m :  T>ies 
mei  tranfierunt^cogitationes 
tHeadiJipataJunt^  tor  quen- 
tes cor  meum.  Paíráraófe 
meus  dias  5  &  os  contenta- 
mentos que  neiles  tinha 
Kk  iij     tam- 


Job.  ,7: 
II. 


■^^PIP 


Éd^ 


fiS  Serrnao 

também  fe  paUaraõ  ,  que 
para  naó  durarem  muito , 
bailava  ferem  meus,  T>ies 
mel:  alguns  intentos  que  ú- 
ve,  cogitat  tones  me£ ,  abor- 
toumos  a  fortuna^não  che- 
garão a  ter  execução,  dijjl' 
patíefunty  6c  ifto,  diz  Job, 
hea  maior  pena  que  pade- 
ço ,  porque  quantos  foraó 
cntaó  ^íTqs  intentosjtantos 
verdugos  tenho  agora,que 
me  atormentaó  a  alma, 
tor quentes  cor  meum.  Naó 
acabo  de  meadmirar,  que 
hum  homemjque  tanta  ra- 
zão tinhade  faber  avaUar 
tormentos,  fahiíTe  com  íe- 
melhante  queixa,  t  bem, 
exemplo  da  paciência,  taó 
mimofo  andais  vós  da  for- 
tuna, que  de  coufas  taó 
poucas  vos  queixais  tanto? 
Naó  tendes  perdas  de  fa- 
zenda, mortes  dos  filhos, 
mina  da  cafa,&  do  eftado, 
doresjtriíiezas,  defempa- 
ros,  miferias,  o  corpo  feito 
hCia  chaga  viva  •,  que  tem 
que  ver  com  tudo  ilto  os 
intentos  naó  executados, 
para,  fo  yos  queixardes 
dellcs  3  Cogitãtio?ies  mea 
Jlpatafaut?  Fallou  co- 


do  Sahhado  '-.>% 
mo  grande  Meftre  de  par- 
ciencia.  Tinhatomadoos 
pulfos  Job  a  tudo,  o  que  he 
dor,  a  tudo  o  que  hepena,. 
a  tudo  o  que  he  tormento , 
&  porque  achou,  quenam 
ha  dor  taó  exceíltva  ,  pena 
taó  cruel,  tormento  tão  in- 
fofrivel  como  hum  penfa- 
mento  fruftrado ,  hum  in- 
tento fem  execução;  por 
iíFo  tendo  tanto  de  que  fe 
queixar,  fó  fe  queixa  de  fe 
fruílrarem  feus  penfamen- 
tos,&de  feus  intentos  fe- 
não  executarem ,  Cogita^ 
tioncs  me£  dij/ifata  funt. 
Como  era  taó  difficultofo 
o  credito  defte  encareci- 
mento, não  o  quiz  fiar  Job 
dos  Expofitores,  ellefe  fez 
comentador  de  fy  mefmo 
no  verfo  feguinte :  Sifujii' 
nueroy  infemus  dontus  me  a  J'^^  '7' 
eft.  Tutredini  dixi\Tater  '^  ''*' 
meus  es-,  mater  mea^  é^foror 
mea^  vermtbus.  Naó  cuide 
alguém,  diz  ,  que  faó  hy- 
perboles,  ou  exageraçoens 
fantafticas  o  que  digo,por- 
que  de  verdade  he  o  tor- 
mento que  padeço  taóin- 
fofrivel ,  &  taó  dcfefpera- 
do,quefc durar  mais  hum 

.-.;,.  pOU- 


UO.: 


antes  da  T>ominga  de  Rémss.  f  i  ^ 

pouco,  Sifíipyii^erú  v  bem  verdugos;  que  lhe  aperta^ 
me  podem  abrir  a  cova.  O  raóo  garrote  à;  alma,fí?r^ 
que  os  mortos  fem  padc*  quentes  cor  meum  ,  cxecu- 
cerexprimencaò  nafepul-  tandonelles  a  fentençade 
tura,iílbhe  o  que  execu-  Deos,fentençanaó  menos 
taó  em  mim  os  meus  pen-  que  de  morte, ScfeDultura: 
famentos: porque  nam-ha-  Sífuftinuero/epídcMrumdo' 
corrupção  ^  o  que  tanto  pe-'  musmeaefi, 
netre,&  desfaçajnáó  ha  bi- 
chos, que  tanto  comáo,  & 
carcomáo  hum  cadáver, 
como  os  mcímos  penía- 
mentos  me  eftão  morden- 
do o  coração,  &  roendo  a 
alma:&  o  peor  he  ,  qué 
nãoacabáode  matar,  mas 
matandomeme  eftáo  ge- 
rando outra  vez,  como  fe 
foraõ  meu  pay  ,  &  minha- 
mãy,para  maispenar  vTíí- 
tredini  dixi\  ^ater  meus  es 
tu;mater  mea^  &  foror  mea^ 
'uermibus.  Comparemos 
agora  o  cogitdtiones  mea  de 
Job  ,  com  o  cogitaverunt 
dos  noíTos Juizes :  &  vere- 
mos fe  ficáraó  códenados. 
Tiverão  intentos  de  ma- 
tar a  lj7íZ2iVO^Cogita'verunt 
ut  Lazarum  interfaerent^ 
ficarão  eíTes  intentos  no 
ar,  nam  chegarão    a  ter 


472  Satisfa^amôls  ago- 
ra aos  curiofos.  Suppofto 
que  foi  fentença  de  morte 
efta,&  as  de  morte faó  taô 
varias,  perguntar  me  ha  6, 
que  género  de  morte  foi? 
Gnome  nãolhefabéreieu 
dar,  mas  digo ,  que  he  húa 
morte  da  cafta  daquellas , 
que  por  mais  penar  não 
matãojhu  a  mortein  terior, 
que  fe  fabe  fcntir,  mas  não 
fefabe  explicar  ,táo  rigo- 
rofa,  tão  cruel,  que  feDcos 
mandara  pendurar  de  hum 
pào  todos  eftes  Principes 
dos  Sacerdotes  contra  os 
foros  de  fua  dignidade, 
muito  mais  benigna  ,  êc 
piadofa  fora  a  fentença. 
DeoAchitofel  hum  con- 
felhoa  Abfalam,com  que 
fem  duvida  ficaria  desba- 
ratado feu  pay  David,  con- 


exccu(^2ió)Coptatíones  me^e  tra  quem  o  ingrato  filho  fc 
dijjipatte  jiint  ,  &  aílim  levantara,  não  o  aceitou 
não  executados  fôramos     Abfalamporpermiflaôdo 

Kk  iiij         Ceo, 


T20  Sermão 

Ceoj&tonloú  outro  htm 
diífercnt&qJhe  àto  Cufai. ; 
Tanto  que 'Achitofel  vio 
ifl:oCou\rihum  caforaro, 
&  efpantofo  ^  poemfe  a 
cavallo',  partefe  para  fua 
cafa,  faz  feu   te fta mento, 
deita  hum  laço  ahúa  tra^ 
íf  if .  ^^'  enforcafe:  y^%V  in  do- 
mumfuam ,  d^  dtfpofita  do- 
mo fua  ,  fufpendio  interijt. 
Muitas  queíloens  fe  pòdê 
levantar  fobre  efte  cafo. 
A  dos  Canoniftas  bem  à 
raãoeftà,&  he,fe  fe  havia 
de  enterrar  efte  homem 
cmfagradojounaó?  AEf- 
critura  diz ,  que  o  enterra- 
rão na  fepultura   de   feu 
pay  :  Sepelierunt  eum  cum 
patribus [uis ',  masiftonam 
faz  argumento, porque  na- 
quelies  tempos  nem  as  fe- 
pulturaseftavão  nas  Igre- 
jas» nem  ha  via  ainda  o  Ca- 
pitulo Tlacuit  i   &  dado 
que  hua,&  outra  coufa  fo- 
ra,entre  todos  os   Santos 
&  Doutores,  que  efcrcvé- 
rão fobre  o  paílb,  fó  hum 
Rabino  diz,que  náo  efta- 
va  Achitofeíem  feu  juizo. 
Se aíTim  he  (  agora  entra  a 
minha  queílaó  )   fe  eftava 
cru  feu  juízo  Achitofcl,co- 


i^o  Sabbado 
mo  fez  húa  acção  tão  defa- 
íizada,como  he  enforcar- 
íehum  homem  com  fuás 
próprias  mãos  ?    Diífe  -o  a 
fagrada  Efcritura  ,  &  he 
prova  maravilhofa  do  nof- 
io  intento :  Vtdens  qíiodnon 
fuiffetfaõiwn  eonfiliúfuumy 
abijtin  domuni fuam^ò' fuf' 
pendio  interijt.  A  única,  & 
total  razão,  porque  fe  en- 
forcou Achitofel  ,  diz  o 
Texto,  ^oi^Fidens  qiiodnon 
fuiffetfaãum  confiimmfuúy 
Porque  vio,  que  naó  fora 
executado  feu    confelho. 
Quem  dera   credito  a  tal 
caufa,  por  mais  Doutores 
queodiíreráo>feo  mefmo 
Efpiriro  Santo  o  náo  affir- 
mára !  Tão  cruel  executor 
he  hum  confelho  não  exe- 
cutado, taes  dores,  taes  pe- 
nas, taes  tormentos  cau ia 
n-a  alma  de  quem  o   coníi- 
dera,q  eftãdo  hum. homem 
em  feu  inteiro  juizo,  efco- 
Ihendo  fegundo  as  regras 
da  prudência  do  mal  o  me- 
nos, teve  por  melhor  mor- 
rer a  fuás  próprias  mãos 
agonizando  em  húa  forca, 
que  viver   padecendo  os 
rigores  de  hum  tormento 
taó  defcfperado.  Allim  o 


GX- 


antes  da  dominga  de  Ramos.  5-2 1 

exprimentou  AchitofeljSc     deílapena  em húa,  vilania 


paraqueaílitno  expritné- 
taíTem  os  invejofos  Pon- 
tífices, ordenou  Deos^que 
naó  chegaíTe  a  ter  execu- 
ção o  confelho,  que  entre 
fy  tomáraójde  tirar  a  vida 
a  Lazaro  ,  ficando  ntrlles 
eíTe  mefriio  confelho  nam 


da  condição  natural  dos 
invejofos,  com  que  mais 
fencemosbens  aiheos,  & 
fuás  glorias,  que  os  males , 
&  tormentos  próprios.  En- 
trou Chriílo  Senhor  noílò 
hum  dia  no  Templo  àt^t- 
rufalem  ,  &  vendo  que  fe 


executado,  por  executor     eftaváoalli  vendendo  pó 
da  mefma  morte ,  ou  por     bas,  cabritos,  cordeiros  & 


ventura  ,de  outra  mais 
cruel,  que  a  que  lhe  deter- 
mina vão  dar:  Cogita  verunt 
Trincipes  Saceraotum  ut& 
Lazarmn  interficerent. 

473  /^Ondcnados  te- 
Vw^mos  os  Juizes 
pela  primeira  fentençain- 
juílamente  dada  contra 
Lazaro.  Ainjuíliça  da  fe- 
gunda  dada  contra  Chri« 
fto  era  muito  mais  atrõ3:& 
para  que  o  foíFe  ta m  bem 
em  a  pena  ,  &  o  caftigo  , 
mandou  Deos  ,  como  di- 
zia mos,  que  entraííe  o  Se- 
nhor por  Jerufalem  triun- 
fando :  Acceperunt  ramos 
palmar  um ,   é-  procefferunt 


ainda  novilhos,  indignado 
de  tamanho  defacato  ,  to- 
ma as  cordas,com  que  vie- 
raó  atados  aquelles  ani- 
maes  ,  faz  delias  huns  co- 
mo azorragues,  começa  a 
açoutar  os  que  compra^ 
vão,6c  vendiáo.  Compras, 
&  vendas  feitas  na  Igreja 
caíliga-as  Deos  por  fua 
própria  mão;  &  não  come- 
te a  outrem  a  execução  de 
femelhantes  delitos  :  fetíi 
repararem  fua  authorida' 
de.  Mas  cuidava  eu,  que  fe 
aggravarião  muito  eíles 
homens  úq  (c  verem  tão 
afpera,  &  tão  baixamente 
tratados  por  Chriílo  ,  ôè 
que  quando  não  chegai- 
ítímalhepòras  mãos ,  ao 
menos  o  blasFemaíIem. 
obviam  ei.  Fundafe  o  rigor     Fui  porem- ver  o  Texto,5c 

achei. 


1 


52  2  Sermão 

achei,  que  nenhila  mà  pa- 
lavra diíTeráo  contra  o  Se- 
nhor, não  o  reconhecendo 
portal.  Comparando  pois 
eíle  paíTo  com  outros  de 
fua  vida  mui  difFerentes, 
fazeftapóderação  S.Joaó 
Chryfoilomo.  Se  quando 
Chriílofarou  o  mudo  ,  o 
accufáráo  por  endemoni- 
nhado :  Se  quando  Chrifto 
deoviftaa  hum  cego,  o 
querião  apedrejar;  Se  quá- 
do  refu feita  a  Lazaro ,  dão 
contra  elle  fentença  de 
morte :  como  agora  que  os 
açouta  ,  6c  os  trata  como 
e  fera  vos,  nem  fe  quer  húa 
mà  palavra  dizem  contra 
ChriíloPComo  o  não  ac- 
cufaôjcomoo  não  apedre- 
jaó,  como  o  naó  mataó  ? 
Divinamente  o  Santo  Pa- 
dre :  Animadvertis  invidia 
incredjhílem^  &  quonampa- 
Bo  in  alios  coUata  beneficia 
tnagis  eosirritahúnt  ?  Naó 
vedes,  diz  Chryfoílomo,  a 
vilania  deftcs  invejofos, 
que  mais  fe  doíâo  dos  bens 
alheos,quc  dos  males  pró- 
prios r  Sarar  Chriílo  en- 
fermos, dar  vida  a  mortos, 
erão  bens  ,alhcos>  por  iílò 


do  Sahhado 
ofentião  tanto,  que  q«c* 
rião  apedrejar  a  Chrifto, &c 
tirarlhe  a  vida  :  açoutallos 
Chrifto  a  elles,  &  tratallos 
como  efcravos,  erão  males 
próprios,  por  iftb  o  fentiaò 
taó  pouco,  que  nem  huma 
fó  mà  palavra  diftèrão  có- 
trao  mefmoChrifto.Mais. 
Os  milagres,  que  Chrifto 
obrava,erão  fama,&  gloria 
para  Chrifto  ,  os  açoutes 
com  que  os  caftigava,  eraó 
p en a, &  afronta  para  elles, 
mas  como  era  gente  inve- 
jo fa,  mais  fentião  a  fama, 
&  gloria  de  Chrifto, que  as 
penas,&  afrontas  fuás  :ex* 
ceftb  verdadeiramente  da 
inveja, não  fó  admirável, 
masincrivel  ,  invidíam  in- 
credihilem.FciTCccri  enca- 
recimento a  confirmação 
que  hei  de  dar  a  efte  paííb , 
mas  tem  bom  fiador. 

474  Ardia  no  Inferno 
o  Rico  Avarcnto,&  vendo 
dalli  o  pobre  I;azaro  no 
Seyo  de  Abraham,difte  af- 
íim  :  Tater  Abraham-.mife-  , 
reremet^  &  mitte  Lazaru ,  i^  23. 
HT  tyitingat  extremum  digtti 
in  aqua?fi,  nt  refrigerei  lin^ 
guam  ;//í'^^//.PayAbraham, 

tCtt- 


antes  da  dominga  de  Ramos.  p  ^ 

tende  compaixão  de  mim,     de,  nem  amor,  que  fe  là  o 


mandai  a  Lazaro,  que  mo  - 
lhe  a  ponta  do  dedo  na 
agua,  &:  me  venha  refrige- 
rar a  lingua.  Náo  lhe  de- 
ferio  Abraham  a  gofto-, 
mas  como  da  avareza  he 
tão  próprio  o  pedir,  como 
o  náo  dar ,  tornou  o  Ava- 
rento a  fazer  fegunda  pe- 
tição :  Rogo  te  pater  ^ut  mit' 


ouvera,  não  fora  Inferno , 
fora  Paraifo:  como  he  pòf- 
íivel,  que  tiveíTe  efte  con- 
denado tanto  amor  para 
com  feus  irmãos,  que  lhe 
queira  mandarPrègadores 
da  outra  vida,  para  que  fe 
convertão  ?  Quanto  mais , 
que  para  o  refrigerar  do 
incêndio,  qualquer  outro 


tas  eum  in  domum  pdtris    o  podia  fazer  tao  bem  co^ 
mei^habee  enim  quinquefra^     mo  Lazaro :  &  para  pregar 


tresyutteftetur  illis  ^ne  ò" 
ipfivenlant  in  himc  locum. 
Rogovos  muito  ,  Pay  A- 
braham,queao  menos  mã- 
deis  a  Lazaro  a  cafa  de 
meus  irmãos,  que  lhe  diga 
p  que  porca  paíTa  ,  para 
que  não  fe  condenem.  Ou 
eu  meenganoj  ou  cftas  pe- 
tiçoens  dizem  hua  coufa , 
&pertendem  outra.  Se  as 
labaredas  do  Inferno  fam 
tão  grandes  como  fabe- 
mos,&  o  Avarento  o  fabía 
por  experiência,  como  he 
poílivel ,  que  tiveíTe  para 
fy,  que  as  podia  refrigerar 
tão  pouca  agua, quanta  pô- 
de levar  aponta  de  hum 
dedo  ?  Mais.  Se  no  Infer- 
no náo  pode  haver  carida* 


a  feus  irmãos ,  muitos  ou- 
tros o  podião  fazer  melhor 
que  elle.  Qual  he  logo  a  ra- 
zão, porque  em  húa  ,  & 
outra  propofta  fempre  in- 
íiíle  unicamente  em  que 
và  Lazaro  j  em  hila ,  Mttte 
La^arumyçm  outra,  Rogo 
ut  mit  tas  ettm  ?  O  cafo  he, 
que  nenhúa  deftas  coufas 
pertendia  o  Avarento  ^  & 
todo  o  feu  intento,  &  tei- 
ma, era  tirai  lo  do  Seyo  de 
Abraham, &  fazer,  que  ao 
menos  por  algum  tempo 
náo  gozaíTe  o  dcfcanfo  em 
que  o  via.  He  futileza  de 
S.Pedro  Chryfologo,  &  a 
razão  não  fó  tão  delicada  j 
mas taó natural  comofua: 
^odagit  dives^non  efi  no^ 
vciii 


I 


7':' 


5^4^  Sermão  do 

velli  doloris^fed  livoris  an- 
tiqui  :  zelo  magis  incendi- 
tuTy  quàm  gehenna.  Sabeis , 
diz  Chiyfologo  ,  porque 
bufca  o  Avarento  tantas 
traças,&  invençoens,  para 
quefaya  Lazaro,  íe  quer 
por  hum  breve  efpaço,  do 
Seyo  de  Abrahaò?He  por- 
que fe  eftà  comendo  de  in- 
veja, porque  vè  agora  em 
tanta  felicidade  o  que 
noutro  tempo  vio  em  tan- 
ta miferia  :  Zelo  magis  in- 
cenditur^qttam  gehenna.  A- 
qui  vai  o  fútil  do  penía- 
mento.  O  Avarento  eftà 
no  Inferno,  mas  o  Inferno 
do  Avarento  mais  eftà  no 
Seyo  de  Abraham ,  que  no 
mefmo  Inferno.  Porque 
mais  o  atormenta  no  Seyo 
de  Abraham  o  defcanfo,& 
felicidade,  que  alli  eftà  go- 
zando Lazaro,  que  no  fo- 
go do  Inferno  as  mefmas 
chamas,  em  que  elle  eftà 
ardendo.  Pedia  que  fahifie 
Lazaro  do  feu  defcanfo,& 
que  trouxe ftc  agua  para  o 
refrigerar  ,  &  o  refrigério 
eftava  naõ  na  agua,  que 
havia  de  trazer,  fenam  no 
defcanfo,de  que  havia  de 


Sabbado  v-u 
fahir.  Como  era  invejofo, 
maisoabrazavaó  as  glo- 
rias alheas,  que  via,  que  os 
Infernos  próprios, em  que 
penava :  Zelo  magis  incen- 
dituTy  quam  gehenna.  Efte 
foi  o  género  de  caftigo  a 
que  a  divina  Juftiça  con- 
denou os  injuftos  Princi- 
pes  dos  Sacerdotes  mui 
conforme  a  quem  elles 
eraó.  Eraó  invejofos ,  co- 
mo vimos  5&  porque  ne- 
nhúa  pena  os  havia  de 
atormentar  tanto  como  as 
glorias  de  Chrifto,  entra  o 
Senhor  diante  de  feus 
olhos  em  Jerufalem  triun- 
fando com  húa  univeríàl 
acclamaçaó  de  filho  de 
David  ,  &  Rey  de  Ifrael, 
com  hum  perpetuo  vidor 
nas  bocas,  &  nas  mãos  de 
todos  :  AccepeTunt  ramos 
palmarum^  &  proceffernnt 
obviam  ei. 

475"  Bem  pudera  eu 
dizer,  que  foi  efte  maior 
caftigo,  que  fe  Deos  lhe 
mandara  dar  cem  açoutes, 
como  pelas  ruas  publicas 
os  negociantes  do  Tem- 
plo: bem  pudera  dizenquc 
foi  maior  caftigo,  que  fe  os 
lan- 


antes da^omlngn  de  Ramos.  ^i^f 

lançalfe  logo  nas  chamas  :  as  cruzes, em q  invifivel- 


do  Inferno,  como  o  Rico 
Avarento  -,  mas  em  parte 
quero  ir  menos  rigorofo, 
por  ir  mais  próprio.  Sabi- 
da coufa  he,  que  a  pena  a 
que  os  Juriftas  chamaó 
ÍT^Z/Wj,  he  entre  todas  a 

maisproporcionada.Digo     Mardocheo,fó  porque  hua 
pois,  que  foi  eíla  pena  dos     vez  fenaó  levantou  paííàn- 


mente  hiaó  crucificados 
na  alma ,  cruce  mentis 3cvci 
lembrados  eftareis  da  hi- 
íloria  de  Aman  privada 
delRey AíTuero.  Mandou- 
Aman  levantar  húa  Cruz^ 
para    crucificar    nella   a  ^ 


Pontífices,  pena  ,  &  tor- 
mento de  Cruz.  Elles  qui- 
zeraò  crucificar  a  Chriílo, 
&  Chriílo  crucificou-os  a 
elles.  Naó  he  meu  o  penía- 
mento,ou  a  fentença,  fe- 
naó do  grande  Padre  da 
Igreja  S.  A^o^'m\\o  •Quam 
cTucem .  mentis  invideiitiai 
Jud£orum  perpeti  poterat , 
quando  Regem fuum  Chri- 
ftmn  tanta_  multitudo  cia- 
mabat.  Que  vos  parece 
que  foi  para  os  invejofos 
Pontífices  entrar  Chriíto 
porjerufalem  triunfante? 
Que  vos  parece  q  foi  ,diz 
Agoftinho,  fenaó  crucifi- 
calos?  Aquellasacclama- 
çoens  do  povo  eraó  os  pre- 
goens,  que  hiaó  diante  pu- 
blicando o  delito  dè  fua 
injuftiça :  aquellas  palmas, 
que  levavaó  nas  mãos, eraó 


doelle.  Ataesfoberbas,8c. 
infolencias  chegaóos  pri- 
vados de  quem  nam  fabe 
fer  Rey .  Porém  trocou  a . 
fortuna  as  mãos,  revogou-, 
fç  afentençaem  outro  tri- 
bunal fuperior ,  &  o  cruci- 
ficado foi  o  Aman.  Aílim 
aconteceo  aos  Principes: 
dos  Sacerdotes.  Elles  no 
feu  tribunal  quizerão  cru- 
cificara Chriílo,  porém  o 
tribunal  divino  em  pena 
defua  injuítiça  ,  ordenou 
quenelles  fe  executaíTe  a 
fuafentença)&que  foílem 
elles  os  crucificados,  nam 
em  húa  fó  cruz  ,  porque 
eraó  muitoSjfenáo  em  tan- 
tas cruzes  V quantas  foram; 
as  palmas  do  triunfo  de 
Chriílo:  ccceperunt  ramos 
palmanim ,  à^  exkrunt  ob^^ 
viam  et, 

§.ví. 


< 

i 

1. 

■■(,■:' 

p6 


S'  VI. 


47^ 


vangelho,  &  fatisfeito  ao 
que  prometi.  Reílame  dar 
íatisfação  ao  lugar  em  que 


Sermão  do  Sahhaãõ 

unum  adverftu  T)ommm^ 
&adverftu  Cbrijlumejm. 
Ajuntáraófe  os  Reys  da 
terra, &  uniraófe  era  votos 
os  Príncipes  contra  Chri- 
ílo,  diz  David :  &  nam  hc 
pequena  a  diíficuldade  de- 
lia Profecia.  Seaentendc- 


'Enho  cóclui 
do  com  o  E 


eftou,  q  he  o  do  Defterro ,  mos  da  morte,que  Chrifto 

cuja  dcvação  nefte  fabba-  com  eíFeito  padeceo ,  nam 

do  feriai  convocou  a  elle  ouve  entáó  mais  que  hum 

tão  grande  Auditório. Co-  Rey,que  foi  Herodes .  fe  a 

íiderei  devagar,  que  parte  entendemos  da  morte,quc 


deftedifcurfo  lhe  acomo 
daria.  E  porque  nenhuma 
achava,  que  lhe  ferviíTe, 
determinei  fazerme  hum 
aílintea  mim  mefmo  ,  3c 
acomodarlhotodo.  Tudo 
quanto  atèqui  tenho  dito, 
foihúa  reprefentação  do 
quepaíTou  no  defterro  de 
Chriílo.  Para  intelligen- 
cia  deita  conllderaçáo  ha- 
vemos de  fuppor  ,  que  os 
Juizes,  que  condenarão  a 
Chrifto  à  morte,  quando  o 
Eterno  Padre  lha  comu- 
tou em  defterro  ,  nam  foi 
fó  Herodes,  como  parece, 
fenão  Herodes  ,  &  junta- 
mente o  Demónio.  Provo. 
v^AvA.í.  Aftítenmt  Reges  terr^^  ^ 
^'        Trincipes   conveneruut  in 


lhe  quizerão  dar  quando 
nafcido,da  mefma  manei- 
ra náo  ouve  mais  que  hum 
Reyjquefoi  também  He- 
rodes (náo  jà  o  mefmo,  fe- 
não outro  do  mefmo  no- 
me: que  hum  tyrano,  que 
perfeguio  innocenteSjuam 
havia  de  viver  trinta  & 
tresannos.  3Diz  agora  S. 
Joaó  Chryfoftomo  :  Nun- 
quid Herodes  Reges  ?  Por 
ventura  Herodes  he  mui- 
tos Reys:Herodes  he  mui* 
tos  Principes  .í>  Claro  eftà, 
que  não:  pois  fe  he  hum  fó 
Rey,&humfó  Príncipe, 
como  diz  David,  que  fc 
ajuntarão  ,  &:  fe  uniram 
Reys,  &■  Príncipes  contra 
Chrifto :  AHtterunt  Reges 
tcrra^ 


'  '         M  Ml 


antes  da  Dominga  de  Ramof,  '^ty 

terr^y  é* 'Prinàpes  come-    acclamado  por  Rey  de  If- 
neruntinunum  ?  A  reporta     rael,  &que  muitos  criaó 
do  mefmo  Santo  Padre  he    nelle :  Multi abtbant  ex  lu-  J^^;'; 
o  que  eu  dizia:  In  Rege  He-    d£is,&  credebantin  lefum-^ 
rodepeccatt  quoque  Regem     ScHerodes,  &com  elle  p 
oftendit.    Olhava    David     Demónio, porque jà o  co- ^ 
com  olhos  proféticos ,  que     meçavaó  a  ver  em  feu  naf- 
vcm  o  vifivel,  &  invifivel,     cimento  bufcado,  &  vene- 
rado dos  Reys  do  Orien- 
te, &  dentro  da  Corte  do 
mefmo  Herodes  acclama- 
do por  Meílias,  &  Rey  dos  ,   , 
Judeos  :  Um  ejt  qut  natus  2.2 
eíiRexJudaorum.  K^*.. 

/^jj     Viíiaafemeíhan- 


&  por  iíTo  diz,  que  fe  ajun- 
tarão Reys  ,  &  Principes 
contra  Chriílo  5  porque  os 
que  o  condenarão  à  mor- 
te, não  foi  fô  Herodes ,  fe- 
naó  Herodes ,  &  mais  o 
Demónio.   Herodes  Rey 


de  Judea,  o  Demónio  Rey  ça  da  condenação  de  Chri- 

dopeccado:HerodesPrin-  ftono  tribunal  dos  hom es, 

cipe  da  terra,  o  Demónio  feguefe  ver  a  condenaçani 

Principe  do  Inferno  :  In  dos  Juizes  no  tribunal  de 

Herodepeccati  quoque  Rc'  Deos  com  a  mefma  pro- 

gem  ojlendit,  E  fe  bem  con-  priedade.  A  primeira  pena 

íiderarmos  o  motivo  que  a  que  Deos  condenou  os 


Herodes,  &  o  Demónio 
tiveraó  para  querer  tirar  a 
vida  a  Chrifto5&:  aos  inno- 
centes  na  occaíiaó  de  feu 
deílerroj  acharemos,  que 
he  amefma,eom  que  a  in- 
veja moveo  os  Principes 
dos  Sacerdotes  a  querer 
matar  naò  fó  ao  refufcita- 
dor,fenáo  também  ao  re- 
fufcitado,  Eílesjporq  viaó 
a  Chrifto  reconhecido,  & 


Princip  es  dos  Sacerdotes 
foi ,  como  vimos ,  que  íi- 
caííem  fruílrados  os  feus 
intentos:  &  tal  foi  também 
a  de  Herodes.  DiíTe  Hero- 
des aos  Magos :  Ite^interra^ 
gate  diligêter  deptiero :  Ide> 
informaivos  donde  eílà 
eíTe  miniíio  que  dizeis:  Et 
cum  inveneritisy  renuntiate 
mihèy  E  como  o  achares 
avifaimc ,  ut&ego  ^erãem 
údê" 


P8 


Sermão 


aaore?neiwi  ,  para  que  eu 
também  o  và  adorar.  lílo 
pronunciava  Herodes  c6  a 
boca,&:como  coraçáo  di- 
'ziarldejinformaime,  que 
■cu  lhe  tirarei  a  vida,  &  mil 
•vidas  (^como  tirou  a  tantos 
mil  innocentes.  }  Mas  que 
fez  Deos  .^  Ou  por  hú  An- 
JO5OU  por  fy  mefmo  aviíòu 
aos  MagosjquevoltaíTem 
por  outro  caminho  :  & 
quando  o  Tyrano  vio  feus 
intentos  fruftrados^F/Ví^wx 
qtioniam  ilhif/ís effet  a  Ma- 
gis^  diganos  o  mefmo  S. 
Joaó  Chryfoftomo,  qual 
ficou.  Saõ  palavras,  que  fe 
as  mandáramos  fazer  de 
encomenda  ,  ^^o  vieraó 
mais  medidas  com  o-in- 
tento  :  Conjidera  quaiiam 
Herodempatiprobabilefue- 
rít^  qui  certèfuffocari  etiam 
pra  indignationis  magnitu- 
dinepotuitj  cumfs  ita  illu- 
fumatque  irrifum  viderM, 
-A  pena  que  Herodes  fen- 
tio  vendo  fuás  traças  át^^- 
vanecidas,  &:  feus  intentos 
fruftradosjconfidere-o  que 
fabc  que  coufa  hc  a  inveja, 
que  explicarfe  com  pala- 
vras naò  he  poíilvel.  Mil 


do  Sahhadõ 
vezes  quizeratomarhum 
laço,&enforcarfe  (^  digno 
caíligo  daquella  cabeça 
tão  indignamente  coroa- 
da,3  &:  he  maravilha  como 
a  mefma  dor  colérica,  que 
o  fazia  raivar,  lhe  naó  áéí- 
fe  hum  nò  na  garganta,  ôc 
o  afogaíFe.  Là  diíTe  a  Efcri- 
tura  de  Achitofel  :  Vtdens 
quodnofifuijfetfaãum  con- 
JdhmfimmyMjt^  &  fufpen- 
diointerijt.  È  da  mcfma 
maneiradiz  Chryfoílomo 
de  Herodes :  Vtdens  qiionm 
illufus  efet  à  M agis, fujf o  ca- 
ri etiam  pr£  indignationis 
magnitíidinepotuit.  E  nòs 
vejamos  agora  fe  he  igual 
a  condenação  de  Herodes 
com  a  dos  Principes  dos 
Sacerdotes.  Elles  conde- 
nados a  ficarem  os  feus  in- 
tentos fó  em  mt^Vítos :  Co- 
gitaverunt  Trincipes  Sacer^ 
dotum  ut  CT  Lãz^ariiyyi  /;/- 
terficcrent:  &  ellc  condena- 
do a  ficarem  fruílradcs  os 
feus ,  .&  zom  barem  delle 
•os  Magos :  Videns  qnoniam 
■iUuJks  ejfct  à  Magis. 

478     A  ícganda  pena 

coube  ao  fcgundojuiz  o 

Dcmomo:  5c  íbi^ver  entrar 

a  Chri- 


antes  da  Dominga  de  Ramos.  ^29 

a  Chriílo   triunfante   no     efcapado  das  mãos  de  He- 

rodeSjhia  entrando  vivo,& 
triunfante  nos  braços  da 
Máypelasruas  do  Egyp- 
tOj  ao  mefmo  paíTo  dentro 
dos  Templos,  &  derruba* 
dos  dos  Altares  hiaó  cain- 
do as  imagens  dos  falfos 
Deofesjcm  que  o  Demó- 
nio era  adorado,  desfeitas 
empÒ5&  emcinza. 

479  He  Theologia  cer- 
ta, que  quando  Deos  lan- 
çou do  Ceo  os  Anjos  máos, 
huns  foraó  parar  no  Infer- 
no,&  outros  fícáraó  nefta 
Região  do  ar  ,  aos  quaes 
por  iíTo  chama  S.  Paulo 
Aéreas poteftates.  De  forte, 
que  nefte  mefmo  lugar  nos 
eftão  ouvindo  muitos  De- 
mónios, Sequeira  Deos,  que 
fejaófóosque  fenaó  vem. 
Dà  a  razaó  deite  confelho 
divino  ,  divinamente  S. 
Bernardo:  Diabolusinpde' 
namjuam  loctim  inaereme^ 
dium  inter  Calum^  ò*  ter^ 
ramfortitus  eft^  ut  videaty 
é^invideaf^  ipfaqueinvidia 
torqueafur.  Quer  áizcrJ^H' 
ra  maior  tormento  do  De- 
mónio lhe  deo  Deos  eíle 
cárcere  livre  do  ar,elemen- 
Li  to 


Egypto,  como  os  Princi- 
pes  dos  Sacerdotes  verem 
o  feu  triunfo  por  meyo  de 
Jerufalem.  Pintanos  iílo 
maravilhofamente  o  Pro- 
feta Ifaias:^í  afcendet  Do- 
mimis fuper  nubem  levem^ò* 
[^'  ^^'  ingredieturç^^yptum.SO' 
birà o  Senhor,  &  entrará 
pelo  Egypto,  levado  como 
em  carro  triunfal  em  hua 
nuvem  leve.  Eíla  nuvem 
leve  (diz  S.  Ambroíio^he 
a  Virgem  Santiífima,  Mãy 
do  mefmo  Senhor  mini  no, 
que  o  levou  em  fcus  bra- 
ços ao  Egypto  :  nuvem, 
porque  ella  he  a  que  nos 
defende  dos  rayos  do  Sol 
.  dejuftiça,&  leve,  porque 
nella  fó  entre  todas  as  cria- 
turas nunca  ouve  pefo  de 
peccado.  E  que  fuccedeo 
ao  Demónio  á  vifta  deíle 
triunfo  ?  O  mefmo  Profeta 
o  áiz\Et  commo^vebuntur  à 
fade  ejus  fimulacra  c/^- 
gypti.  E  à  vifta  defta  entra- 
da triunfante  cahiráó  der- 
rubados por  terra  todos  os 
ídolos  do  Egypto.  Aílim 
foi,  porque  aífim  como  o 
defterrado  minino,  tendo 
Tom.  7. 


!^> 


BI 


I; 


530  Sermão  do  Sabbado 

to  meyo  entre  o  Ceo  ,  &  a 
terra,  porque  vendo  fubir 
os  homésdaterraaoCeo, 
&  deita  Igreja  Militante, 
onde  osperícguejirgozar 
da  gloria  na  Triunfante  i  a 
vifta,&  inveja  defte  triun- 
fo lhe  íirva  de  maior  Infer- 
no aos  que  ficáraó,  que  aos 
que  là  eítão  penando.  Jà 
ouvimos  a  S.  Pedro  Chry- 
fologo  ,  que  menos  pena 
davão  ao  Rico  Avarento 
as  labaredas  do  Inferno  em 
q  padecia,  que  as  glorias , 
que  Lazaro  gozava  no 
Seyode  Abraham:  &  eftc 
foiocafl:igo,mais  que  do 
próprio  Inferno,  a  q  Deos 
condenou  o  Demónio,  no 
mefmo  defterro  com  que 
livrou  de  fuás  mãos  a  feu 
filho  ;  para  que  vendo  o 
entrar  triunfante  pelo  E- 
gyptOjpenaífemais,  &  fe 
desfizcífe  de  inveja,  allim 
como  fe  desfizeraó  os  mar- 
mores,6c  bronzes  das  ima- 
gens, &  íimulacros  em  que 
era  adorado ;  Et  commove- 
buntur  à  facie  ejusfimula» 
€ra  (i^gypti. 


§.  Vil 


ACabei.  Efup- 
1     ' 


480    _ 

pofto  que  te- 
nho fatisfeito  ao  Evange- 
lho,&  ao  lugar  ;  algúa  ju- 
ftiça  parece  que  me  fica 
para  pedir  ao  Auditório  a 
mefmafatisfação.  No  E- 
vangelho  temos  a  Chrifto 
triunfante  em  Jerufalem  : 
naquelle  Altar  temos  a 
Chrifto  triunfante  no  E- 
gypto  :  jufto  he,  Senhores, 
que  entre  também  Chri- 
fto triunfando,  ou  pelo  E- 
gypto  ,  ou  pelajeru falem 
de  noíTas  almas.  Que  outra 
coufahehúa  alma  ,  onde 
eftà levantado  altar  a  Ve- 
nusjidolo  da  torpeza  :  on- 
de fe  fazem  facrificios  a 
Marte,  idolo  da  vingança : 
ondehe  adorado  Júpiter > 
idolo  da  vaidade;  que  cou« 
fahe,  digo,  húa  alma  de- 
ftas  ,  fenão  hum  Egypto 
idolatra .?  Entre  pois  Chri- 
fto triunfando  pelo  Egyp- 
to defta  ai  ma :  Et  comove* 
antur  à facie  eJHS  fímulacra 
ç_y£gypti^^  cayáo  ,  èí  ren- 
daófcafeuspès  todos  eíTes 
ídolos. 


antes  da  T^ominga  de  Ramos.  5  3  ^ 

Cava  a   torpeza,     mana  Santa,  em  que  ne- 
nhum Chriftão  ha  de  taó 


ídolos. 

caya  a  vingança ,  caya  a 


vaidade,  &acabemfe ido- 
latrias tão  pouco  Chri- 
ftãas.  Que  coufa  he  por  ou- 
tro modo  húa  alma,  onde 
rey  na  a  ambição :  onde  dà 
leys  a  inveja :  onde  manda 
tudo  o  ódio  t  que  coufa  he, 
torno  a  dizer,húa  alma  de- 
itas, fenaó  húa  Jerufalem 
depravada,  8c  perdida ,  & 
onde  por  ódio ,  por  ambi- 
çaó,&  por  inveja  fe  dà  fen- 
tença  de  morte  contra  o 
mefmo  Chrifto  ?  Ora,pois, 
Jerufalem,  Jerufalem,  con- 
'verteread  T>ominum  T))eu 
tuum  ,  acabemfe  ódios, 
acabemfe  invejas,  acabéfe 
ambiçoens  :  cayão  todos 
eíTes  vicios  aos  pès  de 
C  hriílo,  &:levantemfe  pai- 
ra as  nas  mãos  em  final  da 
vitoria :  Acceferunt  ramos 
palmar um^  &  exierunt  oh* 
'viam  et. 

4,8 1     Não  duvido  que 


fraca  Fè,&  de  tão  fria  pie- 
dade, que  fenão  lance  ren- 
dido aos  pès  de  Chriílo. 
O  que  porém  quizçra  eu 
encomendar,  &  faberper- 
fuadir  a  todos  he,  que  nos 
nãoaconteçajO  que  acon- 
t€ceoaos  que  acompanha- 
rão a  Chriílo  no  feu  triun- 
fo. He  advertência  de  S. 
Bernardo.  Quando  o  Se- 
nhor hia  paíTando  pela$ 
ruas  de  Jerufalem,  tiravaó 
muitos  as  capas  dos  hom- 
bros,  para  que  o  Senhor 
paífaíFe  por  cima  delias  \ 
porém  tanto  que  o  mefmo 
Senhor  tinha  paífádo,  tor- 
nava cada  hum  a  levantar 
a fua capa,  &:  polia  outra 
vez  aos  hombros  como 
dantes.  O  mefmo  nos  acó- 
tecea  nos  neíla  Somana. 
Dcfpimos,  ou  parece  que 
defpimososmáos  hábitos 
de noíTos vicios,  lançamo- 


o  facão  aílim  todos  os  que     los  aos  pès  de  Chrifto ,  pa- 
temnome  de  Chriftáos,     raquepaífe  por  cima  del- 


não  movidos  da  eíficacia 
de  minhas  razoens  ,  mas 
obrigados  da  fantidade  do 
tempo.  Entramos  na  So- 


les com  a  Cruz  às  coftas  j 
porém  tanto  que  paífou , 
tanto  que  fe  acabou  a  So- 
mana Santa  , &  chegou  a 
LI  ij         Paf- 


v^^ 


53-  Sermão  do 

Pafchoa  ,  torna  cada  hum 
aos  mefmos  vícios ,  &  a  re- 
veftirfe  delles,  comofejà 
não  foraó  peccados.Oh  fe- 
pultemolos  para  fempre 
com  Chrifto  morto  ,  & 
deixemos  eíTes  máos  habi- 
ros,como  Chriílo  deixou 
as  mortalhas  na  fua  fepul- 
tura.  Façamos  diante  da- 
quella  Senhora  huns  pro- 
poíitos  ,  &  reíoluçoens 
muito  firmes  de  fer  perpé- 
tuos efcravos  feus  ,  &  de 
feu  béditiílimo  Filho :  fe- 
guindo-o,ôc  fervindo-o  sê- 


Sabbado 

pre5&  em  qualquèi  parte: 
ou  no  Egypto,como  de- 
ílcrradosdefte  mundo,  ou 
em Jerufalem,  como  mor- 
tos ao  mefmo  mundo ;  naó 
havendo  trabalho  ,  ou  fe- 
licidade, nem  fortuna  taò 
profpera,ou  adverfa,  que 
nos  aparte  de  feu  ferviço, 
de  fua  obediência  ,  de  feu 
amor,&  de  fua  graça,  para 
que  vivendo ,  &  morrendo 
com  elle,&  por  elle,  o  acó^ 
panhemos  na  vida,  onde 
naó  ha  morte,  por  toda  a. 
eternidade.  Amen. 


vi 


SEIti' 


m 


SERMAM 

S.JOAMBAUTISTA, 

NA  PROFISSAM  DA  SENHORA  MADRE 
Soror  Maria  da  Cruz,  filha  do  Excellentiífirno  Du- 
que de  Medina  SydoniajReligiofa  de  S.FrancifcOs 
no  Mofteiro  de  N.Senhora  da  Quietação,  das 
Framengas,  em  Alcântara. 

ESTEVE  O  santíssimo    SACRAMENTO 

cxpoíto.  An  no  de  1644. 


EUfabeth  impletum  eft  tempmpariendi^érpeperitfilmm.  Et 
audierunt  vicinh&  cognaú  ejus,  quia  magnificavit  T)o- 
minusmifericerdiamfuamcumiUa ,  &  congratulaban- 
tur  ei.Et  venerunt  circúciderepuerum^&  vocabant  eunt 
no?nmepatrisfiii  Zachariam.  Et  refpondens  mater  ejuft 
dixif-Nequaquam/edvocabiturloannes:  Luc.c.í. 

vozes  dos  homens.  Admi* 


§.  I. 

Senhor. 

O  dia  em  que 
nafce  a  Voz  de 
Deos  5  juftamê- 
t©  emudece  as 
STorn./, 


raçoens  emudecidas  faó  a 
retórica  defte  dia  \Mirati 
funtunivepft  y  pafmos,  & 
aílbmbrosfaõ  as  eloquen*' 
cias  deíla  acção :  Faõíus  eft 
timor  fuper  omnes  vkinos 
Lliij  f#- 


554^  Sermão  de 

eonim.  Hedia  hoje  defal-     vai  muito  de  lugar  alugar 


laremoscoraçoens,  6c  de 
callaretn  as  linguas :  por  if- 
íb  a  língua  de  Zacharias 
emudeceo,por  iíTo  os  cora- 
çoens  dos  Montanhezes 
fallavaó :  Tofuerunt  in  cor- 
de  fuo  dicentes,  E  fe  em 
qualquer  dia  do  grande 
Bauciíla  he  perigofo  o  fal- 
lar,&  os  difcurfos  mais  dif- 
cretos  faó  os  que  fe  remete 
aoíilencio  5  que  fera  hoje 
no  cócurfo  de  tantas  obri- 
gaçoens,  emqueascaufas 
dotemorj&os  motivos  da 
admiração  fe  vem  taó  cre- 
cxàos^  Setodaarazaódos 
aílbmbrosno  nafcimento 
do  Bautifta  era  verem  que 
dava  Deos  a  hua  alma  a 
maó  de  amigo  ;  Etenim 
mamis  Domini  erat  cum  ti- 
lo -,  quanto  mais  deve  af- 
fombrar  hoje  noíla  admi- 
ração, ver  que  dà  Deos  a 
outra  alma  a  mão  de  Efpo- 
fo :  Etenim  manus  'Domini 
erat  aim  illa  >  Bem  fei  que 
©rigen.  diíTe  Origeucs  ,  que  dar 
Deos  a  máo  ao  Bautiíla  foi 


Defpofarfe  Deos  nos  de- 
fertosjhe  coufa  ordinária; 
mas  defpofarfe  Deos  nos 
Palácios :  Deos  defpofado 
no  Paço.'  Maravilha  gran- 
de. Hecafo  efte,  em  que 
acho  contra  mim  todas  as 
Efcrituras. 

483  Se  lermos  o  Pro- 
feta Ofeas,  acharemos,que 
querendo  Deos  defpofarfe 
com  húa  alma,  diíTe,  que  a 
levaria  primeiro  a  húde- 
ferto:  ^ucam  eam  infolitu^  ^^^*  '^'■ 
dmemy&  loquar  adcor  ejtis. 
Se  lermos  o  Profeta  Jere- 
mias, acharemos,que  lem- 
brando Deos  a  JerufaJem  o 
tempo,que  com  ella  fe  àzí- 
pofára,  advertio,  que  fora 
noutro  áç,Çç:no:Charitattm  Jcíid; 
defponfationis  tu£j  quando 
fecuta  es  me  in  deferto.  Se 
lermos  os  Cantares  de  Sa- 
lamaó,  acharemos,  que  os 
defpoforios  daquella  al- 
ma,fobre  todas  querida  de 
Deos, num  deferto  íe  tra- 
táraójnoutro  dcfcrto  Çc  có- 


feguiraó :  i^?/^  ejhjlu,  qu£  Canr.3, 
defpofarfe  com  fuaalma;     afcmdit  per  dijirtinn  ,diz 
mas  muito  vai  de  dcfpofo-     no  çap.g .  ^/^  efi  tjía ,  qu^e  cw.s, 
rio  a  defpoforiò  ,  porque     afcendit  de  áejerto  inn:xà 


miÊmm 


6encí. 


Jhper  ãHcãnmfuum ,  diz  no 
cap.  8.  Mas  para   que  hc 
multiplicar  EfcrituraSjfeo 
mefmo  Efpofo  ,  que  eílâ 
prefente,  nos  pode  efcufar 
aprova?   O  myfterio  cm 
que  Deos  mais  propriamê- 
tefedeípofacomas  almas 
he  o  Sacramento  foberano 
da  Euchariftia.  Porqnclle 
C  como  gravemente  notou 
S.  Agoftinho)  por  meio  da 
'^«gafl^.  yniao  do  corpo  de  Chrifto 
fe  verifica  entre  Deos,  &  o 
homem ,  Emnt  duo  in  car- 
melina. E  fe  bufcarmos  os 
lugares emque  Deos  fígu- 
racivamcntc  celebrou  ef- 
tes  deípoforios  ,  achare- 
ihos,queosprincipaes,  af- 
fim  noVelhojComo  no  No- 
vo Teílamento  ,  foraó  de- 
fertos.  A  principal  figura 
do  Sacramento  no  Teíla- 
ínentoVelho  foi  o  Mannà, 
durou  quarenta  annos,  & 
todos  foraõ    de  deferto; 
Tàtres  nofiri  manducave- 
í?^''"'  funt  Mannâ  in  deferto.  K 
principal  figura  do  Sacra- 
mento no  Teílamêto  No- 
vo, foi  o  milagre  dos  cinco 
paens,&:o  milagre  dos  fe- 
se,6í  ambos  fucedéraò  no 


Bautijta,  f.rf 

deferto :  7)ejertus  locm  ejh  ^^^^"^  ^'' 
é"  nanhabent  quod mandu'  j^^^^j. 
cent.  Vnde  eos  quis  potefl 
hkfaturarepanibus  infoli- 
tudine  ?  Pois  qual  he  a  ra- 
zão [  para  que  mais  funda- 
damente nos  admiremos] 
qual  he  a  razãos  porque  fe 
defpofaDeos  nos  defertos 
fempre  ?  Náo  heo  Monar- 
ca wniverfal  do  mundo, 
não  hc  o  Príncipe  eterno 
da  gloria?  Pois  jà  que  ha  de 
defpofarfe  defigualmentc 
na  terra,porque  naó  bufca 
efpofa  com   menos    defi- 
gualdade  nas  CorteSj&nos 
Paços  dos  Reys ,  fenáo  nos 
defertQS5&  nas  folcdades?^ 
484    A  razaô  he  •,  porq 
efpofa  com  as  qualidades 
de  que  Deos  fe  agrada,nã o 
feacha  nos  Palácios,  acha- 
fe^os  defertos.   O  Sacra- 
mento nos  fundou  a  du  vi- 
da iSJoão  nos  fundara  a 
repoíta.Fez  Chrifto  hum 
Panegyrico    do  Bautifta 
(quedetaó  grande  fogei- 
to  fó  Deos  pode  fer  baftan- 
te  Orador)  as  palavras  fo- 
rão poucas,  a  fuftãcia  mui- 
ta, &  começou  o  Senhor 
^íTím-.^idexiJiisindefertu  1^,^.7. 
Lliiij         ^'^: 


Í3<>  Sermão  de 

videre  ?  Hommem  moUihtis    homem,  que  feguia  todo  ò 


'vejlitum  ?  Ecce  mã  molUhus 
'vejiiuntur^in  ãomibus  Re- 
gumfunt.  Sabeis  quem  he 
JoaójeíFe  a  quem  todos  fa- 


bem,  &  que  fugia  de  rodo 
o  mal.  E  para  dizer  que 
feguia  todo  o  bem,  diíTe, 
que  vivia  no  deferto ,  para 


•i  .     '  A. '^  *"■  M"'"  ♦^ ivjLct iiu ucicrLu,  para 

lusaver?[dizChriíto3He  dizer  que  fugia  de  todo  o 

hum  homem,que  vive  no  mal,diíre,que  não  vivia  no 

deferto  :  não  he  dos  ho-  Paço.ExphcoulhcChrifto 

niens,que  vivem  no  Paço.  a  vida  pelo  lugar,  &  para 

Notavd  dizer  !  Pois  Se-  dizer  quem  era,  diíTeonde 

nhor,  eíte  he  o  thema,  que  morava.  Ainda  nam  digo 

vos  tomais  para  pregar  do  bem.  Para  dizer  quem  era, 

Bautiíta  ?  Quando  quereis  diíTe  onde  morava,&  onde 

concluir  ,  queheo  maior  não  morava.    Para  dizer 

dosnafcidosjfundaisoSer-  que  era  homem  do  Cco, 

mão  em  que  vive  no  de-  diífcque  morava  no  defer- 

ferto,8j:  não  vive  no  Paço .?  to :  para  dizer  que  naó  era 

bim.  rodaa  perfeição  re-  home  da  terra,  diíre,qnaÓ 

lumidaconfiftccomodi-  morava    no  Paço.    Eque 

zem  os  Theologos  ,  inpro"  eftando  os  Paços  dos  Reys 

Jecuttone  ,  &fiiga,  emfe-  da  terra  tão  mal    reputa- 

guir,&:  em  fugir;  em  feguir  dos  com  Deos,que  aauelle 

a  virtude  ,  &  em  fugirão  Senhor,  que  fófe  dcípofa- 

vicio.PojiíTo  os  preceitos  va  nosdefertos,hojeo  ve- 


Ecclefiafticos,  &  divinos, 
hunsfaópoíitivos,  outros 
negativos  j  os  pofitivos, 
que  nos  mandão  feguir  o 


jamosdefpofadoem  Palá- 
cio .'  Maravilha  grande. 

485-     Mas   qual  fera  a 
razaó    deíla   maravilha  ? 


bem,osnegativos,quenos  Qual  fera  a  razão ,  porque 

mandão  fugir  ao  mal.  Pois  Deos,  que  fó  fe  delpolava 

para   Chrifto    refumir   a  nos  dcfcrtos,  hoje  fede  fpo- 

poucos  fundamentos  toda  fano  Paço    .^  A  ra7no  he^ 

a  pcn-eição    do  Bautiíla,  porqueiPaçoda^Rainhas 

que  itz>  DiíTcquc  era  hum  dePort.u-al,  he  P^ço  com 

pro- 


S.loaS  Bautífta.  ^37 

propriedades  de  deferto.     Reys  (diz  S.  Gregório  Pa-  ^^«& 
Deos  comummente  def-    pa}  em  cujos  Paços  Reaes  ^^' 

de  tal  maneira  fe  contem- 


pofafe  no  deferto ,  porque 
naó  acha  no  deferto  as  co- 
diçoens  do  Paço :  hoj  c  def- 
pofafe  no  Paço  5  porque 
achou  no  Paço  as  condi- 
çoens  do  deíèrto.  Quando 
a  Job  no  meio  de  feus  tra 


porizà  com  a  vaidade  da 
terra,  que  fe  trata  princi« 
palmente  da  verdade  do 
Ceo  5  &  Paços  onde  fe  fer- 
ve a  Deos  como  nos  er- 
mos,naó  faó  Paços,  faó  de«* 


balhos  lhe  parecia  melhor  fertos:  ^i  adificantfibifo' 

a  morte, que  a  vida ,  entre  Utudines,   Bem  dito ,  que 

as  queixas  que  fazia  delia,  edifícão-,  porque  ha  duas 

diíFe  defta  maneira  :  Et  maneiras  de  edificar  :edi- 

nunc  reqíiiefcerem  cum  Re-  ficar  por  edifício,  &edifi- 

giòm^é'  Confulibus^qui  adi-  car  por  edificação.  O  e'difí- 

ficantjibifelítudines.  Se  eu  gío  faz  dos  defer tos  Pala- 


fora  morto,  eftivera  agora 
defcáçado  entre  os  outros 
Reys ,  &  Príncipes  ,  que 
edificaó  defertos.  Notável 


cios,  a  edificação  faz  dos 
Palácios  defertos.  Hu  Pa- 
ço onde  fe  ferve  a  Deos,  he 
hum  deferto  edificado. Pa- 


mododefallarlCí/»^  Regi-    çoonde  fó  Deos  fe  ferve> 
bm^  qui  adificant  JoUtudi-^   6c  o  mundo  fó  fe  contem- 


nes  \  Reys  que  edificaó  de 
fertos í  Se  diíTera  Reys  que 
edificaó  Palácios  j  bem  ef- 
tava.-masReysque  edifi- 
caó defertos  i  Os  defertos 
edificaófe  ?  Antes  desfa- 
zendo edifícios,  he  que  fe 
fazem  deíertos.  Pois  que 


poriza :  onde  a  claufura  có- 
petecomádas  Religiões: 
onde  as  gafas  faó  difíimu- 
laçaó  do  cilicio :  onde  a  li- 
cença do  galanteo,  a  liber- 
dade dos  faráos,  &  outras 
mal  GntçnâidsLS  grandezas 
faoexerciciosde  efpirito 


Reysfaóefl:es,que  trocaó  ondefair  do  Paço  para  o 

os  termos  a  Architedura?  noviciadomaíshe  mudar 

Que  Reys  faó  eíles5qedifí-  decafa,quie   devida;  eíle 

cão  defertos  ?  Saó  aquelles  ermo   corteíaó  nam  lhe 


ena- 


ii\ 


538  SermaSdé 

chatttein?aço,cliamemlhe     pois  nos  dà  licénçâ  ò  paA 
de  ler  to :  ^i  adificant  fibi     mo :  Et  apertum  ejt  iUico  9S 
Socrat.  foktudines.  Là  diíTe  Sócra-    ejm. 
tts  do  Emperador  Theo- 
doíio  Segundo  ,  que  fora 
táo  religiofo  Príncipe ,  & 
taó  reformador  da   Cafa 
Real,que  convertera  o  Pa- 
ço em  Moíleiro :  Talathim 


§■  II. 


Erdadeiramê- 

te,  que  me  vi 

embaraçado  no  concurfo 


jic difpofuit^ut haud alienum  das  obrigaçoens  de  hoje  ^ 

éffet  a  Monafierio.  Efta  có-  porque  faó  todas  taó  gran- 

to  eu  entre  as  grandes  fel i-  des,quecada  hua  pedia  o 

cidades   do  noílb  Princi-  Sermão  todo.  Para  naóer- 


pe,que  Deos  guarde,  &  a 
tenho  ainda  por  maior,qa 
do  outro  Theodoíio. O  ou- 
tro Theodofio  fella,  o  nof- 
foachou-a:  o  outro  criou, 
efta  reformação  ,  o  noílb 


rar,  aconfelheime  com  o 
mefmoSJoaòBautiíla,  & 
fcguireifua doutrina:  èlui 
habetfponfamyfponfus  efi^  ^^^ 
amtcmautem  fponjl gáudio 
gaudet.  Eu  fou   amigo  de 


criafe  nella.  Oh  que  gran-  Chrifto  ("  diz  S.JoaóJ)  a  ef- 

des     fundamentos    para  pofahedo  efpofo  ,  a  feíla 

taó    grandes  efpcranças ! .  hedoamigo.  Aííim  feja.  A 

E  como  no  Paço  de  Por-  feftaferàdeS.Joaó,  o  dia 

fugal  tem   o  Ceo  tantas  feràdaEfpofa,  &  oEvan- 

prerogativas  de   deferto,  gelho  fe  acomodara  tanto 

que  muito,  que  Deos  co-  a  hum, &  a  outro  ,  que  pa- 

ftumado  a  fe  defpofar  nos  reçajque  he  de  ambos.  Va- 

defertos,o   vejamos  hoje  moscóelle,  femnos  apaiw 

defpofado  no  Paço  !   Cef-  tar  hum  ponto.                 '"^ 

fem  pois  as  admiraçoens  487  Elijabeth  impletum 

com  as  dos  Montanhczes,  eft  temptis pariendi^  &pepe- 


rompafe  ofilencio  com  o 
deZacharias,  &:  comece- 
mos a  fallar  íicíta  acçaó, 


Tttfilinm.  Ifabel  depois  de 
com prido  o  tempo  dos  no- 
ve mcfeS;foimãy  de  hum 
filho. 


SJoaÕ 
filho.  Aquella  palavra,?;»- 
pletum  eft  temj?us^ácpois  de 
comprido  o  tempo,  pare- 
cco  fuperflua  a  algíãs  Dou- 
tores antigos,  Naó  eílava 
claro,que  S.  Joaó  havia  de 
nafcer  como  os  outros  ho- 
menSjpaíTado  o  tempojqtie 
a  natureza  limitou  para  o 
nafcimento  ?  Pois  porque 
dizhua  coufa  fuperflua  o 
Evangeliíla,  que  nafceo  S. 
Joaó  depois  de  comprido 
o  tempo:  Elifaheth  imple- 
tum  eft  tempm  ?  O  Cardeal 
^^^'^  Toledo,  &  todos  os  Lite- 
raes  dizem,  que  naó  foi  fu- 
perflua efl:a  advertência, 
fenaó  muito  necefl^ariaj 
fuppofl:oqueem  SJoaófe 
anticipáraó  tanto  as  Icys 
da  natureza,  que  aos  Ígís 
mtÇc$  de  concebido  jà  ti- 
jjhaufo  de  razão.  Equem 
anticipou  o  ufo  da  razaó 
tantos  annos,  podiafe  cui- 
dar,que  também  anticipa- 
ria  o  nafcimento  alguns 
mefes.  Pois  paTa  quç  íe 
foubefl^e,que  naó  foi  aífim, 
digaoEvangelifl-a,  q  naf- 
ceo S  Joaó  depois  de  cheo, 
&  comprido  o  tempo;  Eli- 
fabeth  impktum  eji  tem^us» 


Bautifta.  f59 

Efl:a  he  a  verdadeira  intel- 
ligencia  deíle  Texto  -,  mas 
quanto  mais  verdadeira , 
tanto  mais  funda  a  minha 
duvida.  Que  fe  diga,que  S, 
Joaó  nafceo  comprido  o 
tempo,  porque  naó  antici^ 
pou  o  nafcimento  i  bem 
dito  efl:à:mas  porque  o  naó 
anticipou  ?  Porque  náo  an- 
ticipou o  tempo  do  nafci-» 
mento,  aílim  como  antici^ 
pou  o  tempo  do  ufo  da  ra- 
zaó .í*  O  uíb  da  razão,  fegu« 
do  as  leys  da  natureza,  ha- 
via de  íer  aos  C^tQ  annos 
do  nafcimento,  o  nafcimê- 
to  aos  nove  mefes  da  con- 
ceição. Pois  fe  anticipou 
o  ufo  da  razão  tantos  an- 
nos, porque  naó  anticipou: 
o  nafcimento  alguns  me- 
fes ?  Porque  o  nafcimento 
pertence  ávida  da  nature- 
za, o  ufo  da  razaó  pertence 
à  vida  da  graça  j  &  nas  ma* 
terias  temporaes,o  que  co-^ 
fl:uma  fazer  o  tempo,  bera 
he  que  o  faça  o  tempo  :  nas 
matérias  efpirituaeSjO  que 
eofl:uma  fazer  o  tempo, 
melhor  he  que  o  faça  a  rat 
Zaó.  Para  nafcer  ao  mudo, 
faça  o  tempo,o  que  ha  de 
fa* 


m 


í 


Mai-c. 

22. 


Hl 


Chí-y- 


540  Serina  O  de 
fazer  o  tempo :  para  nafcer  mudo,  faça  o  tempo,  o  que 
a  Deos,  o  que  ha  de  fazer  o  ha  de  fazer  o  tempo:  Elifa- 
tempo,faça-oarazaó.  Ca-  hth  impletum  eft  tempusj, 
minha va  Chrifto  de  Be-  mas  para  dar  frutos  a Deos> 
thania  para  lerufalem,  vio  o  que  ha  de  fazer  o  tempo, 
no  capo  húa  figueira  mui-  faça-oarazaó  :  Exultavit 
to  copada,  chegou,  &  co-  infansinutero.  "Eí^^h^hÚ^SL 
mo  naó  achaíTc  mais  que  das  excellencias  ,  que  eu 
folhas  5  amaldiçoou-a.  E  venero  muito  entre  as  grã- 
notaoEvangeliftaS.Mar-  des  do  Bautiíla  ;  fer  hum 
cos  (coufa  muito  digna  de  homem,em  quem  fez  a  ra- 
fe notar)  que  naó  era  tem-  zaó,o  que  faz  nos  outros  a 
podaquella  arvore  ter  fru-  tempo.  Efperarem  os  an- 
to :  Non  erat  tempusficorú.  nos  pela  razão,iíIb  aconte- 
Poisvalhame  Deos  ^  paA  ce  a  todos,  mas  adiantarfc 
maó  aqui  todos  os  Douto-  a  razão  aos  annos  ,  fazer  a 
res  ;  fenaó  era  tempo  de  razaó  o  que  havia  de  fazer 
fruto,  para  q  o  foi  Chrifto  o  tempo  j  ifto  fó  fe  acha  no 


bufcarPEfeo  naó  achou, 
quando  o  não  havia  ,  por- 
que caftigou  a  arvore?  Se  a 
caftigou,  tinha  ella  obri- 
gação de  ter  fruto.  E  fenaó 
era  tempo,como  tinha  efta 
obrigação    ?    Tinha   efta 


Bautifta :  fe  bem  gloriofa- 
mente  imitado  hoje. 

488  Oh  que  gloriofa me- 
te equivocado  temos  hoje 
oanno  ;  o  Abril  mudado 
em  Setembro,  &  os  frutos, 

1>"3— '    '     '- que  havia  de  amadurecer 

obrigação  [ diz  S.  Chryfo-  o  tempo,  fazonados  na  ra- 
ílomo ]  porque  ainda  que  záo  !  Quem  podia  fazer 
porferPrimavera  naó  de-  outono  dos  frutos,  apri- 
via  frutos  ao  tempo,  por  ma  vera  daí>  flores ,  fenaó  a 
Deosfequererfervir  delia,  efpofaqueriaade  Chrifto? 
devia-osá  razaó.  Eas  di-  Flores app ar uerint  in  terra 
vidas  da  razão  na  m  haó  de  7ioJira^ternpuspn  f-.átioiíts  aã*  ^^"''^ 
efperar  pelos  vagares  do  i^êw/Y.^Alíim  obedecemos 
tempo.  Para  dar  frutos  ao    tempos^ondeaílim  domina 

ara- 


'  S.  loaÕ  Bautifta.  f4i 

a  razão.  QLiejào  mundo,    pois  de  pentear  defenga" 


&  a  vida  não  faibaó  enga- 
nar !  Que  vejamos  tantos 
defenganos  da  vida  em  tão 
poucos  annos  de  vida!  Que 
he  ifl:o?He  que  fez  a  razaó, 
o  que  havia  de  fazer  o  tê- 
po.  Seguiremfeaos  annos 
os  defenganos,  he  fazer  o 


nos  j  &  que  os  cabellos  de 
Abfalaó  na  idade  de  ouro 
íintaó  os  rigores  do  ferro  í 
Que  enxugue  a  Magdale- 
na  as  lagrimas  dos  pès  de  "^  ^' 
Chrifto  com  os  cabellos, 
mas  que  os  naó  corte  5  & 
que  haja  outra  Maria,  que 


tempo,o  que  faz  o  tempo:     ponha  aos  pés  de  Chrifto 
masanticiparemfe  os   de-     os  cabellos  cortados,  com 


fenganos  aos  annos,  he  fa- 
zer a  razaòjO  que  o  tempo 
havia  de  fazer.  Queixa  vaie 
.  Marco  Tullio,q  fendo  os 
homens  racionaeSjpudeíTe 
mais  com  elles  o  difcurfo 
do  tempo  ,  que  o  diícurfo 
da  razaó.  Mas  hoje  vemos 
o  difcurfo  da  razaó  mais 
poderofo,  que  o  difcurfo 
do  tempo.  Que  não  baftaf- 
fem  noventa  annos  para 
'•^cg-  dar  íizo  a  Helí ,  &  que  ba- 
^'  ílem  dezoito  annos  para 
fazer  fezudo  a  SamuelPOh 
que  grande  viftoria  da  ra- 
zaó, contra  a  fem-razaó  do 
tempo !  Hua  velhice  enga- 
nada,he  a  maior  fem-razaó 
do  tempo:  hua  mocidade 
defenganada,  he  a  maior 
vitoria  da  razaó.  Que  nam 
1^^^    <;orte  os  cabellos  Sara  de- 


os  olhos  enxutos  !  Qúela^  Gen.48. 
cobna  primavera  dos  an- 
nos enterre  a  fua  Rachel  i 
he  inconftancia  da  vida : 
mas  que  Rachel  na  prima- 
vera  da  vida  fe  fepulte  a  fy 
mefma !  Grande  valor  da 
razaó.  Dar  a  vida  a  Deos 
quando  elle  a  tira,  he  diíll- 
mular  a  violência  ,  entre- 
garlha  quando  elle  a  dà,he 
facriíicar  a  vontade.  Quem 
dedica  a  Deos  os  últimos 
annos,  faz  Chriftão  o  te- 
morda  morte  :  quem  lhe 
eonfagrà  os  primeiros,  faz 
religiofo  o  amor  da  vida. 

489  As  batalhas  da  ra- 
zaó com  os  annos  he  hua 
guerra,em  que  reíiftê  mais 
os  poucos,  que  os  muitos. 
Deixaremfe  vencer  da  ra- 
zão os  muitos,  annos,  nam 
hc 


Luc.i 


2,Reg. 
^9- 


f42  Sermão  ^e 

he  muito :  mas  deixaremfe     Defenganárao  a  Bercellai 


vencer  ,  &  convencer  os 
poucos  5  grande  poder  da 
razaó  í  E  maisfe  confide- 
rarmos  a  refiílencia  favo- 
recida do  lítio.  Poucos  an- 
nos5&nas  montanhas  (^co- 
mo eraó  os  do  Bautifta} 
naó  he  tanto,  que  fenaó  de- 
fendaó  à  força  da  razaó  ; 
maspoucosannos,  &  em 
Palácio,  convencidos ,  & 
defenganados !  Graó  vito- 
ria. OiFereceo  ElRey  Da- 
vid a  Bercellai  hum  gran- 
de lugar  no  Paço,  &   elle, 
que  era  jà   de  oitenta  an- 
nos,que  refponderiaPOí^í?- 
genarim fum  hodie :  non  iri' 
digeo  hac  viciffltudinei^tÇ- 
pondeo  ,  que  aíTáz  tinha 
aprendido   em  tantos  an- 
nos  a    defenganarfe    das 
Cortes ,  que  o  deixaíTe  o 
Rey  viver  retirado  coníl- 
go,&:  tratar  da  fepultura ; 
porém  que  aceitava   o  lu- 


os  muitos  annos  próprios, 
para  naó  querer  o  Paço  pa- 
ra fy,  &  enganáraó-no  os 
poucos  annos  aiheos,para 
querer  o  Paço  para  o  filho. 
Naó fei  que  tem  o  Paço,& 
os  poucos  annos  ,que  ain- 
da quando  o  conhecem  os 
muitos, naó fe  atrevem  ao 
deixar  os  poucos.  Teve 
conhecimento  para  o  dei- 
xar hum  velho  ,  naó  teve 
animo  parao  aconfelhar  a 
hum  moço.  Sendo  mais  fá- 
cil de  dar  o  co  nfelho,que  o 
exemplo,  deo  o  exemplo 
Bercellai,  mas  naó  fe  atre- 
veo  a  dar  o  confelho .  An- 
tes parece  que  fe  fuflituio 
a  pay  nos  annos  do  filho, 
para  lograr  na  mocidade 
alhea,  o  que  na  própria  ve- 
1  hice  naó  podia.  E  que  naó 
havendo  valor  na  velhice 
para  deixarem  totalmente 
o  mundo5ainda  aquelies,  a 


gar  para  hum  feufilho,que  quem  o  mundo  deixa;  que 

tinha  de  pouca  idade:  EJi  hajarefoluçaóna  mocida4 

firvus  tms  Chamaam ,  ipje  de,para  meter  o  mudo  de- 

'vadat  tecum.  Parece  que  baixodospès^quemomú- 

fe  implica  nefta  acçam  o  do  trazia  na  cabeça  !  Oh 

amor  de  Pay,  mas  explica-  que  bem  fc  dcfafronta  ho- 

fe  bem  o  engano  do  mudo.  jc  a  natureza  humana.  Là 

dl. 


S.loa^ 
dizia  S.Paulo:  Mihi  mun- 
^^^^'^' dus  crucifixus  eft  ,  ò'  ego 
mundo:  O  mundo  cftà  cru- 
cificado em  mim,  &  eu  eA 
tou  crucificado  no  mundo. 
Sc  o  mundo  ellava  crucifi- 
cado em  Paulo  ,  tinha  o 
mundo  viradas  as  coftas 
para  Paulo:  fe  Paulo  cita- 
va crucificado  no  mundo, 
tinha  Paulo  viradas  as  co- 
ftas para  o  mundo.  Eque 
dèeu  as  coftas  ao  mundo, 
quando  o  ni\;indo  me  vira 
as  coftas  -,  n^ô  he  muito: 
mas  quequahdoo  mundo 
me  moftra  bom  rofto  ,  dè 
cu  de  rofto  ao  mundo;  efta 
hea  valentia  maior.  Que 
quando  o  mundo  fe  ri  de 
vòs,  vòs  choreis  por  elle>  ô 
fraqueza  í  Mas  que  quan- 
do o  mundo  fe  ri  para  vòs , 
vòs  vos  riais  delle  >  a  va^ 
lentia  í 

490  He  taó  grande  va- 
lentia efta ,  que  fendo  pró- 
pria das  forças  da  razaó, 
naõ  fiou  S.  Paulo  o  credito 
delia  ,  fenaó  dos  poderes 
do  tempo.  Falia  S.  Paulo 
dcMoyfes,  &  diz  aífim; 
Adueb.  ^^yf^^g^fàisfaãusne^^^ 
,1.      VitJeeJfefilítmfJía  Tha- 


BmtUía.  f43 

raonisy  magis  eligens  ãffligi 
cum  popuío  'Dei^érc .  M oy- 
ÍQS  depois  que  foi  de  maior 
idade,  deixou  o  Paço  del- 
Rey  Faraòj  deixou  a  Prin- 
cefa  ,  deixou  quanto  alli 
pofiliíaj&efperava  5  efco- 
ihendo  o  viver  pobre  ,  & 
fem  liberdade,com  o  povo 
de  Deos  no  cativeiro  do 
Egypto.  O  em  que  reparo 
aqui  he  no  grandisfaõfus: 
que  fez  ifto  Moy  fes  depois 
de  fer  de  maior  idade.  E  a 
que  vem  agora  aqui  a  ida- 
de ,?  S.  Paulo  tratava  da  re- 
íòluçaô,  &  naó  dos  aniios 
deMoyfes,  Poisíea  refo- 
luçaó  eftava  no  animo ,  & 
naó  nos  annos ,  porque  diz 
que  era  de  maior  idade 
Moyfes,  quando  deixou  o 
Paço  ,  &  fe  cativou  por 
Deos.?  Direi  Moyfes  cria- 
rafe  no  Paço  delRey  Fara^ 
defde  minino  ,  era  todo  a 
mimojSc  favor  da  Prince- 
íà  do  Egypto,  que  o  adop- 
tara por  filho,  &  como  tal 
era  fervido, &  venerado  c5 
authoridade,&:  magnifieê- 
ciareal.  E  deixar  Moyfes^ 
a  grandeza ,  &  regalo  da 
Paço,deixar  aamor  de  húa 
Fria- 


1 


'54'4<  Sermão  de 

Princefajdcixar  a  cercania     foou  logo  pelo  lugar ,  que 


de  húa  Coroa ,  pareceolhe 
a  S.Paulo,  quenaó  era  fa- 
çanha crivei  em  poucos 
annos  j  por  iíTo  ajuntou  a 
refoluçaó  com  a  idade,  pa- 
ra que  a  idade  délTe  credi- 
to à  refoluçaó :  Moyfesgra- 


engrãdecéra  Deos  íua  mi- 
fericordia  com  Santa  Ifa- 
bel  :  ^ia  magnificavit 
T^eus  mtfericoràiam  fuam. 
Notável  dizer  !  Parece  q 
naó  eftà  boa  a  confequen- 
cia  do  texto.  O  que  foou 


disfaõtus.  Como  fe  difíera:     pelo  lugar,  havia  de  fer  o  q 
Ninguém  duvide  efta  ga-     íliccdeo  em  cafa  de  Zacha- 


lliarda  acçaó  de  Moyfes , 
porque  quando  a  fez,era  jà 
de  maior  idade,  bem  cabia 
nos  feus  annos.  Ora  feja 
embora    a   refoluçaó   de 


rias.  Suceder  húa  coufa, 
&  foar  outra,  iílb  acontece 
nas  Cortes  lifongeiras ,  & 
maliciofas,&naó  nas  mon- 
tanhas íimples.  OnoíToE- 


Moyfes  vitoria  do  tempo ,  vangelho  o  diz  :  Divulga 

que  a  grande  acçaó ,  q  nòs  bantur  omnia  'verba  hac : 

celebramos  hoje,  com  fer  que  o  que  fe  divulgava,  era 

taó  parecida   em  tudo  o  o  mefmo  que  fuccdia.  Pois 

mais ,  não  fe  pôde  gloriar  fe  o  que  fucedeo,foi  nafcer 

delia  o  tempo,  fenão  a  ra-  oBautiíla;  Elifahethpepe- 

zaó.  Obrou  aqui  a  forçada  ritfilium  -,  como  diz  o  E- 

razaó,  o  que  là  fez  o  poder  vangeliftajque  o  que  foou. 


do  tempo  :  Eltfaheth  im- 
fletumèfttempus. 


§.  in. 


491 


E: 


Tauàterunt  'vi- 
]cini,  ò"  cognati 
^jns  ,  quia  magnificavtt 
Í)ens  mifericordiam  fuam 
cumiUa.  Tanto  que  nafceo 


foi,que  engrandecéraDcos 
fua  mifericordia:  Et  andie^ 
runt  ,  quia  magnificavit 
Deus  mifericordiamjuayn  7 
Grande  louvor  do  Bauti- 
íla !  Quando  as  vozes  di- 
ziaó  em  cafa  de  Zacharias, 
que  nafcéra  Joaõ,  repctiaó 
os  cecos  nas  montanhas,  q 
Deos  cngrádecéra  fua  mi- 


$Joa6(diz  Q  EvangcliltaJ     fericordia>  porque  quando 
1     :  Joaà 


S.  loa  o 
Joaõ  fae  ao  mundo,  aunié- 
taófe  os  attributos  a  Deos : 
quando  loão  nafce,  Deos 
crece.  Não  he  arrojamen- 
to,  fcnão  verdade  muito 
cháa.Diííe-o  o  mefmo  S. 
loão  5  6c  mais  faltava  em 
íeus  louvores  com  grande 
modeftia :  Illu  oportet  cref- 
cere^me  autem  minui  :  Im- 
porta queellecreça^&que 
eu  diminua.  Aquelle(^eile3 
naóTe  refere  menos  ,  que 
ao  Verbo  humanado.  Pois 
comoaíllm  ?  Deos  ainda 
em  quanto  humanado  naó 
pòdecrecer.  Como  logo 
diz  S.  loaó :  ll/um  o^portet 
creftere:  Importa  que  elle 
creça  ?  E  dado  que  podeíTe 
crecer  ,  que  dependência 
tinhaóos  crecinientos  de 
Deos  5  das  diminuiçoens 
do  Bautifta?  Deos  lie  gran- 
de fem  depender  de  nin- 
guém. Como  diz  logo  :  11- 
lum  oportet  crefcere^  me  au- 
tem mlnui :  Importa  crecer 
elle,  &  diminuir  eu  ?  He 
poílivel  crecer  Deos  ?  E  he 
poííivel  que  o  feu  crecer 
dependa  do  Bautiíla?  Sim. 
Porque  ainda  que  Deos> 
porfer  infinito,  nam  pòdc 
Tom./. 


Bautifia.  5-4.5- 

crecer  em  fy  mefmo  ,  por 
fer  limitado  o  conhecime- 
to  humano,pòde  crecer  na 
noíTaeftimaçaó.  E  naefti- 
mação  dos  homens,  nem 
Deos  podia  crecer  fem  di- 
minuir o  Bautiíla ,  nem  o 
Bautifta  podia  diminuir 
fem  Deos  crecer.  Ora  ve- 
de como.  O  conceito  que 
os  homens  fazião  de  Deos 
antiguamentejcra  tal,  que 
quando  o  Bautiíla  apare- 
ceo  no  mundo,  aífentáraõ  ^^ 
que  elle  era  Deos.  Confor- n. 
me  efta  refolução,lhe  foraó 
oíferecer  adoraçoens  ao 
dèferto,  onde  o  mefmo  S. 
loão  os  defenganou.  E  co- 
mo o  Bautiíla,  &  Deos,  na 
opinião  dos  homens ,  erão 
iguaes  >  tanto  que  por  feu 
teílemunhofe  desfez  eíla 
opinião  5  neceífariaihente 
creceo  Deos ,  &  o  Bautiíla 
diminuio.  Diminuio  oBau- 
tiíla,  porque  ficou  menor 
que  Deos  :  creceo  Deos, 
porque  ficou  maior  que  o 
Bautiíla.  De  forte,  que  de- 
pois que  o  Bautiíla  veio  ao 
mundo, ficou Deos,para  c6 
os  homens,  maior  do  que 
dantes  era :  porque  dantes 
Mm        era 


•M'' 


54'^  fiz- 

era como  o  Bíuitifta,  de- 
pois começou  a  fer  maior 
queclle.  Donde  fe  infere, 
em  grande  louvor  deftc 
grande  Santo,  que  a  medi- 
da do  Bautiftahe  fer  me- 
nor que  Deos,& a  medida 
deDeos  he  fer  maior  que 
o  Bautifta.  Naó  tenho  me- 
nos abonado  fiador,  que  S. 
Agoílinho :  G^úfquis  loan- 
j.Aug.  neplm  eft^non  tantum  homoy 
fedT>etíseJt.  Sabeis  quem 
he  Joaó  ?  He  menor  que 
Deos.  Sabeis  quê  he  Deos? 
He  maior  que  loaó.  Com 
eíla  difFerença  porém-,  que 
em  quanto  S.  loáo  o  nam 
diíFe,  eraó  iguaes  •,  depois 
que  o  tefbem  unhou,  come- 
çou Deos  a  ler  maior.  Que 
muito  logo,  q  creça  Deos 
nos  feus  attributos,  quan- 
do S  Joaó  nafce no  mudo ! 
Et  audiertmtj  quia  magntfi" 
cavtt  ^etis  mifericorúiam 
Jnam. 

4*92  Deíla  maneira  crc- 
cco  Deos  naquelle  tempo, 
&:  tambcm  eu  hoje,íc  a  c6- 
fidcraçaó  me  naó  engana, 
o  vejo  muito  crecido.  En- 
tão creceo  nas  minguantes 
de  Joaó  ,  hoje.  crece  nas 


maode 

minguantes  do  mundo.  A- 
pareceolhe  a  Nabucodo- 
nofor  aquella  taó  repeti- 
da, 6c  taó  prodigiofa  efta- 
tua  i  &  vio  o  Rcy,  que  to- 
candolhe  hua  pedra  nos 
pèsde  barro,  a  eílatua  fe 
diminuioa  poucas  cinzas, 
&  a  pedra  creceo  a  grande- 
za de  hum  monte  :  t^aãnsDin.!. 
eft  mons  magnm^  &  replevii 
terram.  Para  entender  eíla 
figura,  que  he  enigmática, 
falhamos,  quem  era  a  pe- 
dra,&  quem  a  eílatua.  Em 
fentido  de  S.  A  mbrofio,  &  Ami^r. 
S.  Agoftinho,  aeíhtuaera  "^^^ê^^- 
omúdo,apedra  era  Dcof. 
Pois  fe  a  pedra  he  Deos, 
como  crecea  pedra  >  Deos 
pòde.crecer  .^  E  fe  a  eílatua 
hc  o  mundo,  como  dimi- 
nuea  eílatua  ^  O  mundo 
diminuefe.?  Tudo  faõ  ef- 
í-eitos  da  eílimação  dos 
homens.  Segundo  a  cíli- 
maçaó  q  fazemos  de  Deos, 
&  do  mundo  ,  ou  crece  a 
eílatua,  &  diminuç  ape^ 
dra,ou  crecea  pedra,  &  ái^ 
mmue  a  eílatua.  Se  pomos 
a  Deos  aos  pcs  do  mundo, 
crece  o  mundo, 3c  diminue 
Deos,  fc  pomos  o  mundo 
aos 


SJoaoBautífta.  1^7 

aos  pès  de  Deos  ,  crece     derrubar  com  húa  pedra 


Deos,6cdiminue  o  mCrdo. 
Deixara  Deos  por  amor 
dos  nadas  do  mundo  ,  he 
fazer  a  Deos  menor  que 
nada:  mas  deixar  o  tudo  do 
mundo  por  amor  de  Deos, 
he  fazer  a  Deos  maior  que 
tudo  ;  Accedet  homo  ad  cor 
aM ,  &  exaltabitur  Deus. 


ao  Golias,  bailou  a  funda  ^^'^•?' 
de  David  ,  para  derrubar 
comoutrapedra  a  eílatua 
de  Nabuco,  foraò  neceíTa- 
riosimpulíbs  (  poílo  que 
inviíiveis  }  do  braço  de 
Deos.  O  Gobas  tinha  de 
altura  féis  covados,  a  efta/* 
tua  tinha  féiTenta  j  que  nas 


Bcmditofeja  elle,  que  de     grandezas  mais  pompofas 
quantas    vezes  vemos   a     domundo,femprefaó  ma 


Deos  táo  pequeno  ,  &  taô 
apoucado  nas  Cortes  dos 
Reys,  o  vemos  hoje  tam 
grande,^  taó  crecido!Taó 
•crecido ,  &  tão  acrecenta- 
doeílà  hoje  Deos  em  fua 


ioresos  Gigantes,  que  as 
eílatuas.  Nunca  asmachi- 
nas  vivas  igualaó  a  medi* 
dadas  fonhadas.  Sonha  a 
fantaíia,  promete  a  efpe- 
rança,profeciza  o  defejo  , 


grandeza  ,  quantas  faó  as     reprefentaa  imaginaçam: 
grandezas  do  mundo,  que     &  ainda  que  a  foltura  de 


vemos  a  feus  pés  arroja- 
das, ii  eftatuadeNabuco, 
na  eftatúra  reprefentava 
•grandezas,  na  matéria  ri- 


fles fonhos,  o  comprimen- 
to deílaspromeífas,  o  pra^ 
zodeílas  profecias,  a  ver- 
dade deílas  reprefentaçoês 


quezas,  na  íignificação  ef-     nunca  chegaó  j  mais  triun- 
tados, &tudo  ifto  abrazado     fa  o  amordivino  ,  quando 


T.  Rcg, 
i7- 


em  fogo  do  coração  fe  re- 
de hoje  em  cinzas  aos  pès 
deChriíto  Ninguém  me- 
lhor façrifíca  a  Deos  o  mú- 
do,que  quem  lho  offerece 
em  eftatua. Porque  o  mun- 
do em  eílatua  he  muito 
maioi'quefymermo.  Para 


piza  o  fantaílico ,  que  o 
verdadeiro  :  o  eíperado^ 
que  o  poíTuido.  Deixar  an- 
tes de  poíTu  ir,  he  ufura  de 
-merecer  ;  porque  quem 
maisdá,mais  merece  ,  & 
quem  dà  os  bens  na  efpe- 
rança,dá  osonde  faó  maio- 
Mm  ij         rè$. 


54  S  '  Sermão  de 

Tcs.  A  melhor  parte  dos  deo.  Não  ha  duvida,  que 
bensdeílavidahe  o  efpe-  dos  bens  temporaes  mais 
rar  por  elles :  logo  mais  faz  liberal  he o  mundo  em  fuás 
quem  feinhabil ira  para  os  promeífas,  que  Deos  cm 
efperar,  que  quem  fe  priva     fuás  liberalidades.Náo  co- 


Mat.h. 
4- 


dc  os  poíTuir.Por  iíToChri 
Ho  chamou  os  Principes 
dos  Apoftolos,  quando  lã- 
çavaó  as  redes,  &  não  quá- 
do  as  recolhião :  Mittentes 
retetnmare.  Porque  mais 
faz  quem  deixa  as  redes 
lançadas,  que  que^n  deixa 
os  lanços  recolhidos.  As 
redes  quando  fe  lançaó,le- 
vão  em  rada  malha  húaef- 
perança  •,  os  lanços  quando 
ferecõlhemjtrazem  muita 
rede  vazia. 
493  Oh  quantaSíSc  quam 


íluma  Deos  dar  tãto,quan- 
to  o  mundo  coítuma  pro- 
meter. Bem  fe  fegue  logo, 
que  mais  dà  a  Deos  quem 
lhe  dà  as  promeífas  do  mú- 
do,quc  quem  lhe  torna  as 
dadivas  fuás.  Se  dais  a 
Deos  o  que  Deos  vos  dà, 
dareis  muito  y  mas  fe  dais  a 
Deos  o  que  o  mundo  vos 
promete,  dais  muito  mais. 
Oh  quão  liberal  eftà  com 
Deos,  quem  dandolhe  as 
maiores  grandezas,  ainda 
bufca  artifícios  de  lhas  dar 


bem  fundadas  efperanças,     acrecentadas  !  t  que  artifi- 
ôquantas,&:quam  bé  en-     cio  pode  haver  para  acre- 


tendidas  grandezas  hon 
raóhojeem  piadofo  facri- 
^cio  os  Altares  de  Chriílo! 
niQiv  T.  Dizia  S.Paulo  aos  Roma- 
nos, que  ninguê  pôde  dar 
a  Deos  fenáo  o  que  Deos 
lhe  der  primeiro.  Mas  eu 
vejo  hoje  hum  efpirito  tão 
engcnhofamente  liberal, 
que  havendo  recebido  de 
Deos  tanto,  ainda  lhe  oíFe- 
rccc  mais  do  que  Deos  lhe 


centarosbens,  &  grande- 
zas do  mundo?  Eu  o  direi : 
que  nos  exemplos  delia 
acção  não  fe  pôde  deixar 
de  aprender  muito.  Os 
bens, &:  grandezas  do  mu- 
do falíamentc  fe  chamaó 
bcns,porquefaó  males,  & 
fem  razaó  fe  chamaó  gran- 
dezasjporquefaó  pouqui- 
dades.  Pois  que  remédio 
para  fazer  das  pouquida- 
de5 


dcsgrãndezías,  &  dos  ma- 
les bens  ?  O  remédio  he 
deixalos,&  deixalos  em  ef- 
perançasiporque  eíles,que 
o  mundo  chama  grandes 
bcnsjfó  faó  bens,qiiando  fe 
deixaójfó  faó  grandes,quã- 
doíeefperaó.  Aeíperança 
Ihedàa  grandeza  ,  o  dcf- 
prczo  lhe  dà  a  bondade; 
deíprezadosíàó  bens,  ef- 
perados  faó  grandes.  E  af- 
íim :  mais  dà  quem  deíp re- 
za o  que  efpera,  que  quem 
dà  o  que  poíTue.    Dehúas, 
&  outras:  depoíTuidas,  & 
de  cfperadas   grandezas, 
faó  defpojos  as  cinzas,que 
hoje  íè  rendem  aos  fobera^ 
nosimptílfos  daquella  pe- 
dra divina.  Oh  como  defà- 
parece  a  efliatua!  Oh  como 
creceomonte  !  Denoííàs 
diminuições  aumcta  Deos 
fuás  grandezas,  de  noílbs 
defprezos  fua  Mageíladc. 
494     Là  vio  S .  loaó  no 
Apocalypfc  aquelles  vinte 
&  quatro  Anciãos,  que  ti- 
rando as  coroas  dascabe- 
ças,as  lançavão  aos  pèsdo 
trono  de  Deos  :  Mitt entes 
coronas  fuás  ante  thronum. 
Tornou  a  olhar  o  Evange- 
Tom.r, 


lu 


BítUtljid.  ^4^ 

lifta,&  vio,qiie  Deos  tinha 
muitas  coroas  na  cabeça : 
Et  in  capite  ejus  diadema» 
ta  multa.  Pois  fe  as  coroas  .'^®^'^ 
fe  lançavaó    aos    pès  de 
DcoSjComo  tinha  Deos  as 
coroas  fobre  a  cabeça.^Por* 
uc  tanto  crecc  Deos  cm 
ua  grandeza ,  quanto  dcP* 
prezão  os  homens  por  feu 
amor.  As  coroas  na  cabe- 
ça de  Deos  era  ò  aumentos 
de  ftia  grandeza :  as  coroas 
aos  pès  de  Deos  eraó  def- 
prezos do  amor  dos  ho" 
mens;  &   com  as  mefmas 
coroas,que  arrojava  o  def* 
prezo  humanoj  fe  authori* 
zavaaMageftade  divina: 
porque  tanto  crece  Deos 
nos  au mentos  de  fua  gran- 
deza, quantas  faó  as  gran- 
dezas, que  põem  aos  pès 
de  Deos  noííb  amor.  Diga»» 
felõgo,  que  creceo ,  &  íc 
engrandecco    Deos   hoje 
duplicadamence:  húa  vez: 
medido  co  m  S .  Ioaó>outra 
vezmedidocom  o  mudo. 
Ser  antepoílo ao  mundo, 
&fer  preferido  a  loaó,  he 
crecer  muito  Deos  em  fua  • 
eftimaçaõ,6c«ngrandecer- > 
fe  muito  em  feus  attribu- 
Mm  iij        tos: 


ff^ 


Sermão  de 
'£luia  magntficavit    m aior graça,  liâô  IZC^ÇCeni 


^etis  mijericordiam  fuam, 
/^9^  Et  njenerunt  circú- 
Cíderepuerum,  Vieraó  cir 
cuncidarominino.  Supo- 
11o  que  o  minino  era  S. 
Joaó^parecequeo  naóha- 
viaó  de  circuncidar.  A  cir- 


deinnocéte  aos  remédios 
de  culpado  !  Grande  ac- 
ção:  grande  facrificio.Fal- 
la  Zacharias  à  letra  do  ma-  Zichau; 
ior  facriíicio  da  Ley  da 
Graça,  o  San  ti íH  mo  Sacra- 
mento da  Euchariília  ,  & 


cúncifaó  naquelle  tempo  diz  aíTim  \§luod  bonuejuSy 
era  o  remédio  do  peccado  &qiiGdpulchrum  ejus^  nifi 
original5ComohojeoBau-    frumentum  eleãorum  >y   ò* 


tifmo.  Pois  fe  S.  loaó  efta- 
ra  jà  livre  do  peccado  ori- 
ginal, feeftava  em  graça 
de  Deos,  Sc  fantifícado  nas 
entranhas  de  Tua  mãy,por- 
que  fe  fogeita  ao  rigor  da 
circuncilaó  ?■  Porque  ain- 
da que  a  circuncifaó  nam 
lhe  tirava  o  peccado  ori- 


vtnum  germimns^  Virgines? 
Quecoufa  fez  Deos  boa, 
que  coufa  íqt.  Deos  fermo- 
faneíle  mundo  ,  íenaó  o 
paó  dos  eícolhidos  ,  &  o 
vinho  dos  ca ílos*^  Quefe- 
jabom,&  boniíllmo  o  fa- 
criíicio do  corpo,&fanguc 
de  Chrifto  facramentado , 


ginal>dequc  eílava  livre,     naó  haverá  quem  o  negue, 
acrecentavalhe  a  graça  da     Mas  que  diga  o  Profeta, 


juftiíicaçaó  com  que  naf- 
céra  fantifícado.  E  eíla  he 
nos  fervos  de  Deos  a  maior 
fineza  da  virtude ,  fogeita- 
remfeatomar  para  aumê- 
ro  da  graça,  os  rigores  que 
Deos  deixou  para  remédio 
da  culpa,  A  circuncifaó 
nos  outros  homens  era  re- 
médio da  culpajem  S.Ioaó 
era  fó  aumento  da  graçajÃ: 
fogeitarfe  S.    loáo   par;^ 


que  naó  ha  outro  taóbom 
como  elle :  Sluodbonu  ejiis^ 
&  quodpulcbrujnejiístí^Tiò 
íci  como  o  havemos  nos  de 
conceder.  E  para  que  nam 
vamos  mais  longe :  o  facri- 
ficio  do  corpo,  &:  fanguc 
de  Chrifi-o  na  Cruz,nao  he 
taò  bom  como  o  íacrifício 
do  corpo  ,  &  fangue  de 
Chriílo  no  Sacramento? 
Heo  mefmo  fu.ílancial  me- 
te. 


da  mcfma 


SJcdÕBautifídl 
te.  Pois  porque  diz  Zacha-  ferénças  >  & 
riasr  queo  facrificio  do  igualdade yêcagens:^<?i 
corpo,  ^  Tangue  de  Chri-  honumejus^&  quodfulchru. 
ílo  no  Sacra  mento  he  me-    W»x  ?  Tal  foi  o  a£to  da  cir 


Ihor  que  todos  ?  A  razão 
da  ventagem  eu  a  darei.O 
facrificio  do  corpo,  &fan- 
gue  de  Ghriílona  Cruz, 


cuncifaò  do  Bautiíla  com- 
parada com  a  dos  outro» 
alhos  de  Adam.  O  corpo  ^ 
&  farigue  que  os  óucrog 


foi  facrificio  para  remédio  deraó  ao  golpe  da  circua- 

de  peccado :  o  facrificio  do  cifaó  para  remédio  da  cui- 

corpo,  & fanguede  Chri-  pa,deo-o S. loa ó [que anão 

fto  no  Sacramento ,  he  fa-  tiiíha  )  fó  para  aumentos 

crificio  para  aumento  de  da  graça  5  &  que  fe  facrifi- 

graça.  Ainda  que  em  Chri-  quehuminnocente,  para 

ílo  naò    havia  peccados  crecer  na  graça,ao  que  eílà 


proprios,nê  merecia  graça 
para  fy$  tinha  com  tudo  to- 
mado porfua  conta  a  fa- 
tisfaçaó  de  noífos  pecca- 
dos, 6c  os  meyosdeneíTa 
juftificação.  Equefacrifi- 
quetantoChriílo  na  Eu- 
chariília  para  au  m ento  da 
graça,quanto  facrificoH  na 
Cruz  para  remédio  da  cul- 


fogeito  o  peccador  para 
remediara  culpa !  Grande 
acçáo  doBautifta.Mas  nao 
foi  íua  fó  cila  vez>  nem  fua 
fomente. 

49(>  Duas  innoccncias 
temos  hoje  fogeitas  aos  re- 
médios da  culpa  -ambas 
condenadas  ao  rigor ,  ^ 
ambas  ao  habito  da  peni- 


pa !  Qiie  empenhe  corpo ,  tencia  5  que  taes  injuíliças 

&  fangue  para  aumentar  como   eílas  fabe  fazer  o 

merecimentos  iinnocen-  amor  divino.  Condenain-^ 

cia, como  empenhoucor^  aocencias  como   culpas, 

|po,&:  íangue  para  alcançar  caftiga  merecimentos  co- 

perdão  ao  peccado  í  He  mo  delitos.  Que  facão  grã- 

circunílancia  de  facrificio  de  penitencia  os  grandes 

taò  relevante  íefta,  ^ue  da  peccadores,  he  muito  ju- 

Mefmaidoãtidade  tira  dif-  âo;  que  aipenitencia  he  re^; 

Mmiiij       m^à^i^^ 


mk 


ff2  .  SermaUe 

medió  do  peccado.  Mas  uniaóao  Verbo  fua  alma 

queoBautifta  fe  defterrt  não  era  impeccavel  >  As 

ao  deferto,  fe  condene  ao  mefmas  palavras  o  dizem: 

cilicio,  fe  caftigue  com  o  ^ipeccatumnon  noverat, 

jejumiminino,emqucpec-  Pois  como  pode  caber  de- 

cou  voíTa  innocencia?  Hu  litona  innocencia  :  como 

corpo  delicado  condena-  pòdefer,  que  o  impecca- 

do  a  tanta  afpereza  I  Húa  vel  fe  fízeíTe  peccadorrPrí? 

almainnocente  caftigada  nobispeccatumfecit  >  K^Ç- 

com  tanto  rigor!  Se  o  Bau-  pondo.  O  impeccavel  não 

íiftaforao  maior  pccca-  fe  pôde  fazer  peccador  de 

Gor,que  havia  de  fazer  fc-  culpas,  mas  pódefe  fazer 

namifto?Masifl:ofez,por-  peccador  de  penas.  Nani 

quehavia  de  íer  omaior  pôde    cometer    peçcado 

Santo.  Não  pôde  chegar  a  quanto  à  culpa^  mas  pôde- 

mais  o  mais  fervorofede-  fe  fogeitar  à  pena  do  pec- 

fcjodafantidade,  que  fo-  cado,comofe  o  cometera, 

geitarfc  aosremedios  do  Jílohe  o  que  hz  Chriílo 

peccado  ,  quem  goza  os  poramordenòs.&ifí-ohc 


o  que  muito  encarece  S. 
Paulo  em  feu  amor  :  ^/ 
pi cc atum  non  noverat  ^pr o 
nobispeccatumfecit.  Nam 
pôde  o  amor  chegar  a  ma- 
ior extremo,  não  íe  pode 


f  '  ..     f  M 


privilégios  da  innocencia. 
Encarece  S.Paulo  o  amor 
deChriílo  para  có  os  ho- 
niens5&  diz  defta  maneira 
aos  Corinthios;  ^ipecca- 

tum  non  noverat  ipro  nobis    , ^^     ^^.^ 

€o^rtt.  P^ccatumfectt.  Amou  o  Fi-  adelgaçar  a  maior  fín^eza , 

lho  de  Deos  tanto  aos  ho-  que  a  fazerfe  peccador  nas 

mens,  que  naó  tendo  co-  penas,quemhe  innocente 

nhecimento  de  peccado^  nas  culpas.   Que  o  pecca- 

fe  fez  peccador  por.  amor  dor  de  culpas  fe  faça  pec- 

delles.  Eftranha fen tença í  cador  depenas,  bufca  na 

Chrifto  naó  era  innocen-  penitencia  o  remédio  de 

tiffimo,  antes  a  mcfma  in-  feu  peccado :    mas  f  zcrfe 

jwoceaeu  ?  Por  ra^aó  da  peccador  de  penas  o  inno- 

cento 


S.loao 
<cnte  de  culpas ,  íie  bufcar 
na  penitencia  o  defafogo 
de  feu  amor.  A  penitencia 
no  peccador  paga ,  no  in- 
nocente  obriga:  naquelle, 
pelo  que  oíFendeo ,  nefte, 
pelo  que  ama  :  vede  quaes 
agradarão  mais  a  Deos,  fe 
as  fatisfaçoerts  de  oíFendi- 
do  ,  fe  as  obrigaçoens  de 
amado  ? 

49/  O  igualmête  ama- 
do ,  que  amante  Senhor ! 
cófenti  os  termos  da  igual- 
dadejquantoentre  o  áivi- 
no5&  humano  fe  permite, 
pois  vemos  hoje  as  finezas 
devoílb  amor  competi- 
das, como  as  dividas  de 
noííà  obrigação  defempe- 
nhadas.  Hua  alma  inno- 
cente  de  culpas,  maspec- 
cadora  de  penas,hua  inno- 
cencia  em  habito  peniten- 
te vos  oíFerece  hoje  a  ter- 
ra,Eípofodo  Ceoj  qucef- 
Casfaó  as  cores  de  voíTb 
pcnfamento,eftas  as  galas 
de  voílb  amor,eftas  as  pur- 
puras do  voíToReyno.  F/- 
ha  Babylonis  induutur  pur^ 
i^"«/«rd!,é' ^//í?>C  dizia  S.Ber- 
nardo em  femelhante  ac- 
jaõ  à  Virgem  Sophia ) 


Bautifta.  y^j 

^fubinde  confcientia  pan" 
nofajacepfulgentmonilibusy . 
moribusfordent.  E  contra 
tu^forispannofa^  intusfpe- 
ciofarefplendes  yfeddivinis 
afpeãibiis  non  humants :  /'«- 
tuseftquod  deleõfat ,  quia 
intuseftquem  dekãat.  Ne 
a  romancear  me  atrevo  ef- 
tas  palavras  ,  porque  em 
tanta  differença  de  elei- 
çoens,  ou  fe  ha  de  topar  co 
o  aggravo,ou  com  a  lifon- 
ja .  E  contra  tu  (^ò  ifto  que- 
ro repetir  }  foris  pannofd , 
intus  fpeciofa  refplendes  : 
Pelo  contrario  vòs,ô  efpo- 
fadeChrifto(  diz  S.  Ber- 
nardo }  como  dentro  ten- 
des a  quem  quereis  agra- 
dar, por  dentro  trazeis  as 
galas :  por  fora  Yç:íziàz  de 
íayal ,  por  dentro  de  ref- 
plandores :  Foris  pannofa  y 
intus  fpeciofa  rtfplendes, 
Verdadeiram.ente,q  quan-' 
do  reparo  neftas  palavras> 
me  parece  que  vejo  já  íi- 
naes  do  dia  do  íuizo.  Hum 
dos  finaes  do  dia  do  luizo 
fera  (^  como  diz S,  loaô  nó 
Apocalypfe^  Ntíúií^  o  Sol  A^qs^;. 
de  cilicio :  Solfaãusefni- 
^er  tãquamfacfus  cíUfinus» 


Efejà  veniós 
cilicio  o  Sol,  fe  mortifica- 
das fuás  luzes  ,  fe  peniten- 
tes feus  refplandoresj  de- 
baixo da  afpereza  de  taó 
groíTeiros  ecclyples  >  que 
havemos  de  dizer  ?  Que  fe 
acaba  o  mundo  ?  Que  he 
chegado  o  dia  do  Juizo? 
Com  muita  propriedade 
fe  pôde  dizer  aíllm  j  por- 
que melhor  merece  o  no- 
me de  dia  do  Juizo  aquelle 


Serfnaode 
veftido   de     penitencia  o  Sói,  fendo  in? 


nocente,  porque  naó  ha  fa- 
criíicio  mais  fermofo  aos 
olhos  de  Deos  ,  que  huma 
innocenciailluftreem  ha- 
bito de  penitencia. 

498  Aquellas  pélles  de 
que  Deos  veftio  aos  pri- 
meiros fenhores  do  mun- 
do, eftavaólhe  muito  mal  a 
Adaó,mas  eílavaólhe  mui*» 
to  bem  a  Abel.  A  Adam 
eílavaólhe    muito     mal , 


em  que  o  mundo  fe  deixa ,     porq  erào  habito  de  pec- 
que  aquelle  em  que  o  mú-     cado  com  penitencia,  a  A- 


dofeacaba.  Quanto  mais, 
que  também  fe  acaba  o 
mundo  para  quem  acaba 
comelie.  Como  cada  hum 
de  nòs  tem  o  feu  mundo,  o 
univerfal  acaba  com  to- 
dos, o  particular  acaba  có 
cada  hum.  E  que  muito, 
que  fe  vejaó  finaes  do  dia 
do  Juízo  em  húa  alma  pa- 
ra quem  hoje  fe  acaba  o 
mundo  !  Mas  perguntara 
eu  ao  Sol,porque  fe  veíle 
de  penitencia?  Por  culpas.^ 
Náo  i  que  o  fez  innocentc 
a  natureza.  Pois  porque.^ 
Para  os  olhos  do  mundo 
por  luto,  para  os  olhos  de 


hú  eftavaôlhe  muito  bem,  f  °*^ 
porque eraô  habito  depe- 
nitencia  fem  peccado :  em 
Adáo  eráo  habito  de peni- 
tenciado,em  Abel  eraó  ha- 
bito de  penitente.  Eíia 
grande  ditíerença  ha  entre 
a  penitencia  dos  peccado- 
res,  &  a  penitencia  dos  in* 
nocentesi  que  a  penitencia 
dos  peccadores  he  reme*- 
dioja  penitencia  dos  inno- 
centcshe  virtude.  Nam 
quero  dizer, que  os  ados 
depenitécia  nopeccador, 
&  no  innocente  naó  fejáo 
virtuofos  fempre.  Sò  digo, 
que  os  peccadores  tomáo 


Deos  por  gala.  Veítefe  de    a  virtude  da  penitaicia  pe 

Í9 


-^^ 


S.loaÕBautífta.  SfS 

lo  que  tem  de  remédio,  os    naó  merecidos ,  'quaes  faó 


innocentestomaóo  remé- 
dio da  penitencia  pelo  que 
tem  de  virtude.  Donde  fe 
fcgue.que  a  penitencia  ho- 
ra os  peccadores,  os  inno- 
centes  honraò  a  peniten- 
cia. A  penitencia  honra  os 
peccadores,  porque  lhe  ti- 
ra a  afronta  do  peccado,os 
innocentes  honraò  a  peni- 
tencia, porque  íhetiraó  a 
itiiftura  de  remédio.  Oh 
ditofòBautiíla^ô  ditofa  al- 
ma imitadora  voílà  ;  am- 


os dos  innocentes.  O  me- 
recimento  oífendido  fó  o 
pôde  fatisfazer  a  innocen- 
ciacaftigada.Ohquegran- 
de  facrificio  para  DeósíOh 
que  grande  lifonja  para  o 
Geo !  Là  diíTe  Chrifto^que  Uc.íf, 
faz  maior  fefta  o  Ceo  ao 
peccador  penitente,que  ac^ 
juílofem  penitencia.  Pois 
fea  innocencia  do  jufta 
agrada  muito,  &  a  penitê- 
cia  do  peccador  agrada 
mais  i  quanto    agradará 


bos  em  habito  de  peniten-  aquelle  excellen te  eftado  , 

tèsj  bambos  honradores  que  abraça  a  perfeição  de 

da  penitencia.Ditofos  vòs,  ambos,  &  ajunta  a  p^nité- 

que  fazeis  trofeos  de  vito-  cia  de  peccador  com  a 


m- 


ria  os  inílru mentos  do  def- 
agravo,  &  gozais  a  prero- 
gâtiva  de  peniten tes,fem  o 
defar  de  arrependidos.  E  m 
vòs  he  virtude ,  o  que  nos 
outros  he  remedío^em  vòs 
eleição,  o  que  nos  outros 
neceííidade.Sò  em  vòs  na6 
he  remédio  do  peccado  a 
penitencia,  fendo  que  fó  a 
Voílapenitêcia  poderá  fer 
remédio  do  peccado.  Por- 
que oífenfas  não  mereci- 
das, quaes  faò  as  deDeos,  ,  fe  de  dar  nome  aro  mininoj» 
fé  fe  pagaò  com  caítigos    &  queriãoos  circunftan- 


nocencia  dejufto.^Iílo  he 
o  que  fez  o  Bautifta  hoje 
na  circunciíaó ,  fojeitando 
izençoens  de  innocencia  a 
remédios  de  j>eccado :  Et 
venerunt  eircuncidere  fue^ 
rum, 

s.y- 

4PP  TI?  Tvocaõa^i  eum 

gJàmmme     patris 

fui  Zachariam.     Feito  o 

aâ^o  da  circúcifaõ>  tratou- 


o 


j^S^  Semaodâ  "^""     " 

tes  ,  que  fe  lhe  puzcíTc  o    vaíTea  memoria  dos  pays 


nome  de  feu  pay,  &  que  fe 
chamaíTe  Zacharias.  Gu- 
vioiftoS.  Ifabel,  ^ài^ç^: 


no  nome,  quem  profeílava 
o  efquecimento  dos  pays 
na  vida.   Quereis  que  fc 


Nequaquam,  Por  nenhum     chame  Zacharias,  porque 
cafotnáofeha  de  chamar     he  nome  de  feu  pay?  Alie- 


allim.  E    porque  razão  ? 
Porque  não  fe  ha  de   cha- 
mar Zacharias  o  filho  de 
Zacharias  ?  Não  era  nome 
fanto  ?  Não  era  nome  illu- 
ftre?  Não  era  nome  autho- 
rizado?  Não  era  nome  glo- 
riofo  ?  Sim  era,  mas  era  no- 
me de  pay  ;  l^ocahant  eum 
nominepatrisfui,  E  o  nome 
dos  pays,  quanto  mais  il- 
luftre,quanto  mais  glorio- 
fo,  tanto  menos  o  ha  de  to- 
mar quem  profcíTa  íèrvira 
Deos  ,  como  profeílava  o 
Bautiíla.  Nonomeperpc- 
tuafe  a  memoria  dos  pays : 
na   Religião   profeíTafe  o 
prai.4^.  efquecimento  delles :  Obli- 
"vifcere  poptilum  tuum  ,  ^ 
domumpatristui.^  como  o 
Bautifta  havia  de  fer(^  co- 
mo foi  }  primeiro  funda- 
dor,&:  exemplar  de  Reli- 
giofos  j  não  quiz  prudente 
S.líabeijquetomaíreo  no- 
me de  Zacharias  >   porque 
não  era  juíto ,  que  confcr- 


gais  contra  vòs.  Antes  por- 
que he  nome  de  feu  pay, 
fenão  ha  de  chamar  aíllm ; 
Vocabant  eum  nomine  pa* 
tris  fui  Zachariam ,  é'  ait 
mater  ejus:  Nequaqua.Quc 
grandemente  imitado,  fe 
bem  em  parte  excedido 
vemos  hoje  efte  exemplo 
do  grande  Bautifta.  S.  Lu- 
cas,porque  cfcrevia  para  a 
memoria  dos  futuros,  de- 
tevefeneíle  lugar  em  con- 
tar a  genealogia  dos  pays 
de SJoaó ;  eu  que  fallo aos 
olhos  dos  prefentes  ,  nam 
mehe  neceíTario  determc 
em  tãofabído,  como  tam- 
bém me  não  fora  poílível 
em  tão  grandiofo  aílump- 
to.  Muito  fez  quem  deixou 
o  nome  de  Zacharias,  au- 
thorizado  aiíim  com  húa 
teara  -,  mas  muito  mais  hz 
quem  deixa  o  glonoíiíli- 
mo  nome  de  Gufmáo(^glo- 
riolbnoCeo,  &  na  terra  ^ 
cujo  Real ,  U  efclarecido 
faji' 


S.loao  Bautifla.  f^7 

fangue  fe  teceo  fempre  nas    de  S.Marcos  perguntou/e 


purpuras  de  toda  Europa; 
&hoje  com  mais  gloria, 
que  em  nenhíi  outro  Rey- 
no(  pofto  que  com  igual 
mageílade  em  tantos  )  o 
vemos  felizmente  coroa- 
do,&:  veremos  em  immor- 
tal  defcendencia ,  no  noílb 
de  Portugal.  Eílehe  o  fa- 
moíiílimo  eni  todas  as  ida- 
des: o  eminentiílimo  em 
todas  aspeíToas :  o  aííinala- 
diííimo  em  todas  as  em- 
prefas  :  o  celebradiíllmo 
cm  todas  as  hiftorias  ,  no- 
.inede  GufmáOj&  eftehe 
íó  que  hoje  vemos  deixado 
pelo  humilde  da  Cruz. 
Não  íei  fe  admire  nefta 
eleição  o  virtuofo,  feo  diC-  pellat,  He  do  Texto.  Por 
creto.  Emfim  a  virtude,8f     que  S.  MatheOs  diz  aíTim : 


bufcavãoajefu  Nazareno  ^^^ 
cmcí^<:3.do:  lefum  quaritis  J'^' 
Nazaranu  crucifixU.  Pois 
fe  oAnjo  de  S.  Marcos  cha- 
mou a  Chriílo  Jefu  Naza- 
reno crucificado  •,  porque 
razão  o  Anjo  de  S.  Ma- 
theos  lhe  chamou  Jefu  cru- 
cificado fomente,  &  nam 
fallou  no  Nazareno  ?  O 
melhor  comentador  dos 
E  vangeliílaSi  o  dputifllma 
Maldonado,  notou  adver- 
tidamente, que  o  Anjo  de 
S.  Matheos  apareceo  co- 
mo Anjo,  &o  Anjo  de  S. 
Marcos  apareceo  como 
homem  :  Matthms  Ang^e- 
lumy  Marcus  hominem  af- 


Matth. 


O  entendimento  tudo  me 
parece  Angélico. 

500  Quando  os  Anjos 
mo  íèpulchro  de  Chrifto 
perguntarão  às  Marias  o 
quebufcavaò  ,  ufáráo  de 
differentes  termos  (^  fegú- 
do  diverfos  Evangeliílas.) 
O  Anjode  S. Matheos  per- 
guntou,fe  bufcavâo  a  J eíii 


Angelus  i^úmmi  defcendit 
de  Caío^qui  dixit  mulieri' 
bus:  Hum  Anjo  do  Senhor 
deceodoCeo,  quefallon 
às  mulheres.  ES.  Marcos 
diz  aíllm :  Intr antes  monu- 
mentum^  vid^runt  juvenem 
jedentem:  Entrando  no  fe- 
pulehro,  viráohú mance- 
bo aíTentado.    E    como  o 


crucificado :  lefum^qat  cru-     que  fallou  às  Marias  em  S. 
cifixus  efti  qu/trms.O  Anjo   .  Majccos^era  homens  ^, em 


55*8  Sermão  de 

S.  Matíieos  eraAnjojpor    mòuonomcda  Cruz,  & 


iííb  o  de  S.  Marcos  chamou 
a  Chriílo  Jcfu  Nazareno 
crucifícadoj&odeS.  Ma- 
theos  chamoulhejefu  cru- 
cificado fomente  5  &  nam 
fallouno  Nazareno.  Ora 
notai.  Entre  o  Nazareno, 
&o  crucificado  havia  efta 
differençaem  Chriílo5que 
o  Nazareno  era  nome  dos 
pays  ,  o  crucificado  era 
nome  da  Cruz :  &  antepor 
o  nome  de  Nazareno  ao 
de  crucificado,  antepor  o 
nome  dos  pays  ao  nome  da 
Cruz,  iíío  fazem  os  An- 
jos, que  faó  como  homés  -, 
mas  tomar  o  nome  decru- 
cifícado,  ôccallar  o  de  Na- 
zareno, tomar  o  nome  da 
Cruz,&  deixar  o  nome  dos 
pays,  iíTo fazem  ús  Anjos, 

'que  faó  como  Anjos.  O 
Anjodc  S.  Marcos,  que 

•fallou  como  homem  da 
terra :  Piderunt  jwvenemfe- 
de?item:  antepoz  o  nome 
dos  pays  ao  nome  da  Cruz: 
leftnn  quarítisNazaranum 
cYucifixíim.  O  Anjo  de  S. 
Matheos,  que  faJlou  como 
Anjo  do  Ceo:  Angelm  ^o- 
mini  defcendit  de  Calo :  to- 


deixouo  nome  dos  pays: 
lejum  ^qui  crucifxas  eft  , 
qu^eritls .(ò\i  difcriçaó  mais 
que  humana!  Oh  eleiçam 
verdadeiramente  Angéli- 
ca !  Sei  eu,  que  as  Marias 
ouvirão  os  Anjos,  mas  nc- 
nhúa  delias  aprendeo  a 
mudar  o  nome.  Maria 
Magdalena  naó  fe  chamou 
da  Cruz  ,  fenaó  Magdale- 
na: Maria  Cleofc  nam  fe 
chamou  da  Cruz,  íenam 
Cleofé.  Naó  foubéraó  dei- 
xar o  nome  dos  pays,&  to- 
mar o  da  Cruz  aqucllas 
MariaSjporqueeftava  cftc 
religioío  primor  guarda- 
do para  outra,  quenade- 
vaçaó  havia  de  vencer  as 
Marias  ,  &  na  difcriçam 
igualar  OS  Anjos. 

50 1  Mas  aííimcomo 
em  cafa  de  Zacharias  fe  le- 
vantou queílaó  fobre  o 
nome  do  Bautiíla  ;  allim 
hc  bem  que  a  tenhamos 
hoje  aqui  fobre  eíle  nome 
da  Cruz.  Quem  là  contra- 
diílc  o  nome  deJoaõ,foraó 
as  peífoas  mais  authoriza- 
das,queafiiiHaó  à  celebri- 
dade da  fclla:  y^  vaierant  t^ic^; 
cde^ 


ímt 


S.JoaõBautlJla,  ffp 

celebritath grafia :  comen-     zçr  ,  que  naíp  quer  que  ^ 


ta  o  Cardeal  Toledo.  Quõ 
aqui  impugnará  o  nome  da 
Cruz  ,  fera  cambe  a  peíToa 
mais  authorizada,qalIifte 
à  celebridade  da  feíla,  que 
he,quem  ?  Chriílb  facra- 
jnentado.EalIim  como  là 


nomefejada  Gruz,  fenam 
do  Sacramento  ?  A  razaó 
he  muito  forçofa.  Porque 
profeíTar  Keiigia6>mais  he 
façram  enÇârfe,  que  ç  rucifi- 
carfe.  Todos  os  Samtos  co- 
mummente chMmaÔ  cruz 


diziaó,que  nao  fe  havia  dç    ao  eilado  Religioíb  : ;  mas 


chamar  Joaó  ,  fenaó  Za 
charias :  aíHm  cà  diz  Chri- 
ílo,  que  nao  fe,  .hayia  de 
chamar  da:Giiuz>  femaó  dp 
Sacramento.  ,Naó  he  imst;- 
ginaçaó  fem  fundamento 
minha  ,  he  acomodaçam 
verdadeira,  tiradaa  CO  m: '  to- 
xia  a  propriedadejdô  Te56- 
toi  O  nome  que  la  querisp 
dar  ao  Bautiíta,  era  Zacha- 
rias.  E  Zaeharias  que  quer 
dizer  ?    Quer  dizer ;  Me- 
moTÍ<tT>ominh  A  memoria 
<io  Senhor.  I0b  mefmohe 
o  Santiílimo  Sacramento 
daEuchariília.  Hea   me- 
moria do  Senhor,  que  elle 
nos   deixou  .por  prendais 
em  fuaaufeneia :  H^c  qm>- 
.tiefiunque  feçeritis  yin  mú 
memoriam  facktis.    Eftá 
fundado.  Agora  pergunto 
eu.  E  querazaó  tem  Chri- 
ôo  ^cra,inçníado  para  úi- 


com  licença  fua,  eu  digo, 
que  o  eftado  Religiofo 
tem  mais  do  Sacramento , 
que  da  Cruz.  A  razaò  em 
que  me  fundo, tieeíla.  For- 
que na  Cruz  morreo  Chri- 
ftohúa  fp  vez  -,  no  Sacra- 
mêto  morre  todos  os  ô^:3i^. 
Oxfacriíicio  da  Cruz  foi 
.cniento^nias  foi  único  j  o 
facriíicio  do  Altar  he  in- 
cruento, mas  he  quotidia- 
no. 

592  'A  maipr  fineza  do 
amor  he  morrer  \Maiorem  If^'^ 
charitatemnemo  hahet',m^s 
tem  hum  grande  defarefta 
fineza,que  quem  a  faz,nap 
pode  fazer  outra. He  a  jn^- 
iorfineza,mas  he  a  ultima. 
E  como  Chdfto  amam 
taó  extremamente  aos  ho- 
mens ,  &  via  que  morren- 
do na  Cruz  íe  acabava  a 
íiugferig  A  fua^  fínezas  -,  que 
fez? 


«íf- 


^mm 


m 


5<>o  Sermão  de 

fez  ?  Inventou  milagrofa-    amor  grande  fe  compara  à 

mente  no  Sacramento  hú     morte,&o  maiorao  Infer- 


modo  de  morrer  fem  aca- 
bar,para  morrendo  poder 
dar  a  vidajôc  não  acabando 
poder  repetir  a  morte.  Efta 
-hea  ventagem^que  leva 
em  Chriílo  o  amorjq  nos 
moftrou  no  Sacramento, 
ao  amor  que  nos  moílrou 
.  na  Cruz.  Na  Cruz  morreo 
húavez  i  no  Sacramento 
moríecada  dia  :  na  Cruz 
deoaviday  no  Sacramen- 
to perpetuou  a  morte.  A 
Efpofa  5  como  quem  me- 
lhoras fabeavaliar,nos  di- 
rá a  verdade  deíla  fineza: 
Fort  is  eft  ut  mors  dikãio^ 
c^mxdurajicut  infernus  a  mula- 
tio,  O  amor  fe  he  grande 
[que  iíTo  quer  dizer  dí/e- 
ãio  }  he  como  a  morte  i  & 
fe  he  maior  Q  que  iíTo  quer 
áiztTamulatio^hccomoo 
Inferno.  Notável  dizer! 
Porque  razaõ  compara  Sa- 
lamaó  o  amor  grande  à 
morte,  Sc  o  amor  maior  ao 
Inferno  ^  Eu  o  direi. Entre 
a  morte,6c  o  Inferno  ha  ef- 
ta  diíferença,  que  a  morte 
tira  a  vida,  o  Inferno  per- 
petua a  morte.  Por  iílb  o 


noj  porque  mais  he  per- 
petuar a  morte,  que  tirar  a 
vida:  tirar  a  vida,he  mor- 
rer húavez  j  perpetuar  a 
morte,  he  eftar  morrendo 
fempre.  Eis  aqui  a  deíi- 
gualdade  do  amor  deChri- 
ftonaCruz  ,  &  no  Sacra- 
mento. Competio  o  [amor 
de  Chriílo  no  Sacram  éto , 
^&o  amor  de, Chriílo  na 
Cruz  •,  o  da  Cruz  foi  como 
o  da  morte,  porq  chegou  a 
tirar  a  vida  :  Fortis  eíí  ut 
mors  dileãio  j  o  do  Sacra- 
mento foi  como  olnferno, 
porque  paíTou  a  perpetuar 
a  morte :  ^Duraficut  Infer- 
nus íemulatio^  muito  mais 
foi  perpetuar  a  morte,  que 
tirar  a  vida  j  porque  tirar  a 
vidajhe  morrer  num  inílá- 
te,  perpetuar  a  morte, he 
morrer  toda  a  vida. 

5-03  Eis  aqui  a  razaõ 
porqueoeílado  Religiofo 
fe  parece  mais  com  o  Sa- 
cramento, que  có  a  Cruz. 
Na  Cruz  morrefe  húa  fó 
vez,  no  Sacramento  mor- 
refe cada  dia.  Sei  que  diíTc 
S.  Agoílinho  ,  que  fó  os 
Mv 


S.loaoBautijia.  5^i 

Martyrespagaôa  Chrifto  todos,  S.  Paulo  :  §luoUdie 

a  fineza  que  fez  em  fe  dei-  monor:Q'3.à'3L  dia  morro. De 

xar  no  Sacramento  ,  por-  maneira  ,  que  aílim  como 

que  morrem    por   quem  Chrifto  no  Sacramêto  in- 

morre  por  d\es:^íacceííis  ventou  hum  modo  de  mor- 

ad  menfamTrincipis  debes  rer fem acabar ,  para  mor- 

Jimiliapr^parare^  hoc  beati  rendo  poder  dar  a  vida ,  & 

Martyresfecerunt.  Mas  ef-  nam.  acabado  poder  repe- 

1^  ^^^^  ta  razão  de  S.  Agoftinho  tir  a  morte  ^  aílim  os  Patri- 

"^'("dènos  licença  o  lume  da  arcas  das  Religioens(  & 

Igreja  3  impugnafe  fácil-  melhor  que  todos  o  Sera- 

mente.Porq  muitas  mor-  fico  em  feu  divino  Inftitu- 

tesnão  fe  pagaó  com  húa  to  }  parecendolhe  pouco 

fó  morte  :  Chrifto  no  Sa-  amor  não  morrerjêc  pouca 
cramento  morre  todos  os 
di^asj  os  Martyres  morrem 
húa  fó  vez:  logo  naó  pagaó 
os  Martyres  a  Chrifto  no 
Sacramento.  Pois  que  di- 
remos a  ifto  ?  Digo  que  os 
Martyres  pagaó  a  Chrifto 
na  Cruz,  os  Religiofos  pa- 
gão a  Chrifto  no  Sacramê- 


mortejmorrer  húa  fó  vezj 
acháraó  efte  modo  mila- 
grofamente  natural  de  vi- 
ver morrêdo,  para  na  mor- 
te multiplicarem  as  entre- 
gas da  vidaj&  na  vida  per-, 
petuarem  os  facrificios  da 
morte. 

504,     Grande  lugar  do 


to.  Gs  Martyres  pagaó  a  Protopatriarca  das  Reli 

Chrifto  na  Cruz  5  porque  gioensS.  Bafilio.    Falia  o 

morrem  húa  vez,  por  quê  grande  Bafilio  das  ccllas 

húa  vez  morreo  por  elles :  dasReligioens  maiseftrei- 

os    Religiofos     pagão    a  tas,&:  diz,  que  a  cella  de 

Chrifto  no  Sacramento,  huma  Alma  Religiofa  he 

porque  morrem  cada  dia,  emula,  he  competidora  da 

por  quem  morre  por  elles  fcpultura  de  Chrifto:0  cel- 

todos  os  dias.  Ha  quem  o  UDominicafepulturaamU" 

diga  ?  Náo  he  menos  Re-  la !  Pois  faibamos  j  que  ca- 

ligiofo,queo  exemplar  de  lidades  tem  húa  cella  para 
Tom./.  Nn  tão 


5^2  Sermão  de 

taó  nobre  competência  ?     te.  Es  húa  fufpenfaó  glo- 


Em  que  prefumpçoens  fe 
funda  efta  emulação  ?  Que 
fe  compare  a  cella  a  qual- 


riofa  de  morte, &  vida  (^fc 
bem  gloriofa  com  pena} 
onde    pofta   a    alma  nas 


querfepulturaj  juftafeme-     rayas  do  viver,  &  morrer, 
Ihança  •  porque  onde  o  ha-     participa  indecifamente  o 


bito  hehúa  mortalha,  o 
leito  hum  ataúde ,  as  pare- 
des taó  eftreitas,  ^  có  taó 
pouca  luz,  como  eílas  que 
vemos,  muito  ha  de  fepul- 
tura.  Sepultura  fim:  mas 
fepulturanaó  outra,  fenão 
a  de  Chriílo  5  porque  ra- 
zão? Porque  nas  outras  fe- 
pulturasmorafó  a  morte 5 
na  fepultura  de  Chrilto 
morou  a  morte ,  &  mais  a 
vida  juntas.  Na  fepultura 
de  Chrifto  eftevc  a  vida 
morta,  &  a  morte  refufci- 
tada :  &  taes  faó  as  voíTas 
cellas,  ò  Religiofos  efpiri- 
tos :  O  celía  dominicitfefful' 
tur£  amula  ,  qua  mortuos 


mais  rigorofo  de  ambas; 
infenfivel  ,  como  morta , 
para  o  goftofo  da  vida : 
fenfitiva,como  viva,  para 
o  penofo  da  morte.  Em  ti 
fevè  multiplicado  o  mila- 
gre natural  da  Feniz  ,  fen- 
do pátria  ,  &  fepulchro 
quotidiano,  onde  fe  morre 
àvida,&fenarce  à morte, 
faltando  cinzas,  mas  nani 
faltando  incêndios.  Em  ti, 
C&  com  maior  proprieda- 
de hoje]  fe  vè  verdadeira  a 
metáfora  dos  orizontcs, 
fendo  oriente  ,  &  occafo 
juntamente,  onde  o  Sol  no 
mefmoinrtante morto,  & 
nafcido  refufcita   a    hum 


fufcipis^Ò'  revivifierefacis.  emisferio,quando  fe  fepul 

Ò  cella  verdadeiramente  ta  a  outro    Emtifinalmé 

imitadora  da  fepultura  de  te  (^  com  feres  a    melhor 

Chrido  ,  pois  eítà  em  ti  a  parte  do  Piraifo^fe  vè  fem 


vida  morta,  &  a  morte  re- 
fufcitada  :  a  vida  morta, 
porque  naó  tem  ufos  a  vi- 
da ',  a  morte  refufcitada , 
porque  tem  alentos  a  mor- 


fingimento  a  fabula  do  In- 
ferno, fendo  cada  Religio- 
fo  efpirito  hum  Ticio  em 
bemavéturan.^a  depenas, 
que  náo  podendo  morrer, 
para 


S.loa^ 
para  morrer  mais  vQzç;Sy 
tem  morta  a  vida  ,  6c  im- 
mortal  a  morte :  Semperque 
renafcens  nonperit^utpoffít 
fapeperire.  Naó  he  muito, 
que  achee;?.  comparações 
no  Inferno  ao  maior  facri- 
ficio,  quando  no  Inferno 
as  bufcou  a  Alma  Santa  ao 
maior  Sacramento.  Dehú, 
&  outro  fe  pôde  dizer  com 
grande  femeihança :  IDura 
ficut  bifernus  amulatio,  E 
comooíacrifício  da  Reli- 
gião,por  fer  morte  perpe- 
tuada, fe  parece  mais  com 
o  Sacrainento,  quecom  a 
Cruz  •,  fendo  o  oíficio  dos 
nomes  declarar  a  eíTencia 
das  coufas  •,  parece  q  quem 
profeíTa  Religião,  nam  fe 
deve  chamar  da  Cruz,  fe- 
naó  do  Sacra  mento:^ri;<?- 
cahant  eum  nomine  patris 
fui  Zachariam^hoc  ejiy  me^ 
mor  iam  ^omini. 

ff.  VI. 

50^  /^Om  tudoref- 
V^  ponde  S.  Ifa- 
hú :  Nequaquam:  Por  ne- 
nhum cafo.  E  com  muita 
razáo.  Porque  ?  Peia  mef- 


Baufiftã,  í^3 

ma,que  o  perfuadc.  Porq 
feonomc  do  Sacramento 
diz  tudo  o  que  ha  no  eíla- 
do  Religiofo,&  o  nome  da 
Cruz  diz  menos,  pelo  mef- 
mo  cafo  fe  deve  tomar  o 
nome  da  Cruz,  Sc  não  o  do 
Sacramento.  Na  eleiçam 
dos  nomes  ha  húa  grande 
diíFerença  tomada  dos  fins 
porque  fe  elegem:  os  no- 
mes que  fetomão  por  ver- 
dade dizem  tudo,os  que  fe 
tomão  por  vaidade  dizem 
mais,  os  que  fe  tomão  por 
humildade  dizem  menos. 
Ecomo  a  mefma  humil- 
dade,que  defprezou  a  grá- 
deza  dos  nomes  paternos , 
foi  a  que  fez  a  eleiçam  do 
nomeReligiofoj  por  iííò 
com  difcreta  improprie- 
dade efcolheo  o  nome  di" 
minutivocja  Cruz,emquc 
he  mais  o  que  fe  calla^  que 
o  que  fe  diz. Como  refpon- 
do  a  Chriílo  facramenta- 
do,  com  o  mefmo  nome  do 
Sacramento  quero  confir- 
mar a  rcpofta.  O  Sacramê- 
todo  Altar  chamafe  cor- 
po, &  fangue  de  Chriílo. 
Eííenome  lhe  deo  o  mef- 
mo Senhor :  Hoc  eji  corpus 
Nn  ij        meum: 


■m 

n 


I 


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5^4  ■  Sermão  de 

meum  :  Hlc  eft  Cálix  fan-     mo  paíía  no  noíTo   cafo: 


guinis  mei.  Pergunto :  E  ha 
no  Sacramento  mais  algCia 
coufa  PHaalma,  &  ha  di- 
vindade. Pois  fe  no  Sacra 
mento  naó  fó  eílà  corpOj& 
langue  ,  fenão  também  al- 
ma, &  divindade  ,  porque 
fenão  chama  corpo,  &  al- 
ma5rangue  ,  ^  divindade 
de  Chriílo, fenão  corpo,  & 
fangue fomente  ?  Porque 
eíle  nome  deo-o  Chriílo 
ao  Sacramento  na  hora  em 
que  fe  quiz  moílrar  mais 
humilde.  A  hora  em  que 
Chriíto  fe  mofírou  mais 
humilde,  foi  a  mefma  em 
que  inftituío  o  Sacramen- 
to de  feu  corpo, &  íangue , 
difpondo  aos  Apoílolos  cô 
a  pureza  do  lavatório :  &  a 
fy  com  a  humildade  de  lhe 
lavar  os  pès.  E  coUio  Chri- 
fto  poz  o  nome  a  efte  my- 
ílerio  com  advertências  de 
humilde,  por iíTo  declarou 


que  ainda  q  fenão  tomou  o 
nome  ao  Sacramento ,  fc- 
guiofelhe  o  exemplo.  Dei- 
xaie  o  nome  do  Sacramen- 
to,porquediz  mais,toma- 
fe  o  nome  da  Cruz,porquc 
diz  menos ;  que  fe  preza  o 
verdadeiroamor ,  do  que 
he,&nãodoque  fignifíca. 
Baftelhe  à  Religião  fcr 
Cruz  ex  vi  verhorum^Tiuiá^ 
que  feja  muito  mais  per 
concomitantiam.  Tão  jufto 
foi  logo  deixarfe  o  nome 
de  Zacharias  quanto  à  íig- 
niíicaçáo,  como  quanto  à 
realidade  :  Et  fat  mater 
ejus :  Neqíiaquam. 

§.     VIL 

505     A  Caboufenosa 
/\Thcma5&    fe 
me  naó  engano  tenho  pon- 
derado todas  as  clauíulas 
delle,com  alsua  femelhan- 


fómenteomenosque  nel-     ça  às  obrigações  deíle  dia. 
le  haviaj  que  os  nomes,que     Mas  também  vejo,  que  re- 


compõem a  humildadcjsê- 
precallãomais  do  que  di- 
zem. O  que  diz,  he  corpo, 
&  fangue  i  o  que  calla,he 
alma;^divindade.O  mef- 


parariaó  os  maiscuriofos, 
em  que  paíTei  em  filencio 
aqucllas  palavras  :  Audíe* 
runt  viciíú^  ò'  cognati  ,  ò* 
congratídabantur  ci.  Con- 
fcífo, 


riiíiimi 


msà 


S:loaS 
fisíTo",  íjueiiâo  fallei  neftas 
.palavras  j  &  também  con- 
feíTojqueas  deixeijporque 
não  achei  nellas  femelhan- 
ça/enáo  muita  difFerença 
do  noíTo  intento.  Cognati^ 
(^  v/dm  congraíulabafituT 
ei.  Là  no  nafcimento  do 
Bautiítadizo  Evangelho, 
que  os  parentes,  &  os  viíi- 
nhos  eftavaó  muito  conte- 
res, &  agradecidos  [j  porem 
cànaóheafílm.  Tão  fórà 
eftáo  de  poderem  eftar  c5- 
tentcs  os  viíinhosjôc  os  pa- 
rentes; que  antes  o  pa- 
renterco,&:  a  vifinhança  tê 
razaõ  de  eftar  queixofos. 
Tem  razão  o  parentefco 
de  eftar  queixofo,  porque 
fe  vè  a  fy  deixado :  tem  ra- 
zão a  vifmhança  de  eftar 
queixofa,  porque  vè  osef^ 
tranhos  preferidos.  Quan*- 
do  o  Tangue  fe  vè  deixado, 
porque  naó  ha  de  eftar 
queixofo  o  parentefco  t  E 
quando  as  Eftrangeiras  fe 
vem  preferidas  ás  natu- 
raes,  porque  não  ha  de  ef- 
tar queixofa  a  vifinhança.? 
Não  fe  diga  logo  aqui  ; 
Cognati^é'  vícini  congratu- 
hbanturei.  Acudoaeftas 
^     Tom./. 


Bautijfa.  f^f 

duas  queixas,  &  acabo. 

5-07  Primeiramête  di- 
go, que  não  tem  razão  o 
parentefco  de  eftar  quei- 
xofo 5  porque  quand©  ás 
obrigaçoens  do  fangue  fe 
deixaóporamorde  Deos, 
não  he  fazer  off^enfa,  he  fa- 
zer lifonja  ao  parentefco. 
Da  parte  de  quem  he  dei- 
xado he  facriíiciojinasda 
parte  de  quem  deixa  he  li- 
fonja. Tudo  provo.  Hof- 
pcdou  Martha  a  Chriftô 
em  fua  cafa,  &  tinha  cfta 
fenhora  húa  irmãa,a  querii 
o  Texto  chama  Soror  Ma-  lhc; 
x\^\Ethuk  erat  Soror  no- 
mine  Maria :  a  qual  fe  reti- 
rou com  Chrifto  -,  &  aíTen- 
tada  humilde  a  feuspès,  o 
eftava  ouvindo,&contem- 
plando.  Chegou  Marthà 
aoSenhor,&:  diíTelhei^^?- 
mtne^nonefttibi  cura^  quod 
Soror  mea  reliquit  mefoiam 
minijirare?  E  bem  Senhor, 
tanto  vos  defcuidais  de 
mim,  que  naó  vcd^s^  que 
minha  irmâa  me  deixou 
fó .?  Efta  foi  a  hiftoria;  duas 
fáó  as  minhas  pondera- 
çoens.  Digo  que  Martha 
na  queixa  que  fez  de  Ma- 
Nniij  ria 


'"^"mmm 


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31 

í 

a 

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1 

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1 

^  Bb 

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5"/^^  Sermão  de 

ria  oíFereceo  hum  grande     porque  a  deixara 

facrifícioaChriftoj&Ma-     "'      '  " 

rianaoccaíiaójque  deo  à 

queixa,  deo  hua  grande  ík- 

tisfaçaó  a  Martha. 

508  Difficulto  aíTim. 
Chriílo  naó  foi  o  que  cha- 
mou a  Maria  3  Maria  foi  a 


—  -  Maria? 
Mas  deites  dous  facrifícios 
qual  he  maiorj  o  de  Maria, 
ou  o  de  Martha  >  Eunam 
me  atrevo  a  dar  fentença 
neftacaufa.  Sòdigo,  que 
fe  nefte  lugar  pregara  S.  chrri 
^-  „,.._.  _  Pedro  Chryfologo,havia 
que  íe  allentou  a  feuspès  de  dizer,  que  o  facriíicio 
íagrados.Poisfeaoccaíiaó  de  Martha  era  maior  que 
jufta.ouinjuíla  da  queixa     ode  Maria.   Pergunta  S.  Gen 

Pedro Chryfologo,  quem        * 
fez  mais,  fe  Abraham  em 


a  deo  Maria  ,  &  não  Chri 
floi  porque  propõe  Mar- 
tha a  fua  queixa  a  Chrifto, 
&  naó  a  Maria  ?  Porque 
Martha  nefta  acçaó  nam 
pertendeo  tanto  dar  quei- 
xas de  Maria,  quanto  oíFe- 
recer  facrifícios  aChrifto. 
Como  fe  diíTera  Martha  r 
Não  cuideis,  Senhor,  que 
fó  Maria  he  a  que  faz  as  fí- 
nezas,que  eu  também  vos 
ofíereço  as  minhas.  Maria 
facrifíca  fua  devaçaó,eu  fa- 
crifíco  minha   foledade  : 


facrificaralfaac  j  fe  Ifaac 
em  fe  oíferecer  ao  facriíi- 
cio ?ílefolveq  Abraham; 
&  verdadeiramente  tem  a 
Efcritura  por  fua  parte. 
Pois  fe  Ifaac  era  a  vidbima, 
que  havia  de  ficar  niorto: 
fe  Abraham  era  o  Sacerdo- 
te,que  havia  de  fícar  vivo; 
como  era,  ou  como  podia 
fer,  queofacrifício  foíTe 
maior  em  Abraham  ,  que 
em  Ifaac  ?  A  razão  he  eíta. 


Rehjuit  mefolam  miniftra^     Porque  Ifaac  facrificava  a 
re.  Ella  ofFerecevos  o  eftar     fua  peífoa,  Abraham  facri- 


com  vofco,  eu  ofFereçovos 
oeftarfemeila.  De  forte 
que  em  húa  acçaó  havia  al- 
3i  dous  facrifícios :  hum  de 
Maria,porquefc  fora  para 
Chriílo,  outro  de  Marcha, 


ficava  a  fua  íòledade:  Ifaac 
ofFereciafe  a  fícar  fem  vi- 
da, Abraham  offereciafe  a 
ficar  fem  Ifaac.  E  fegundo 
o  muito  q  Abraham  ama- 
va aqucllcfíJho,  maior  fa*. 
crifício 


S.Joa^ 
crifício  fazia  em  o  dar  a  el- 
lc,queelleeinre  dará  fy. 
Bem  digo  eu  logo,  que  foi 
grande  íacrificio^o  q  Mar- 
tha  offereceo  a  Chrifto  en- 
tre fuás  queixas,  pois  lhe 
facriíicou  não  menos  que 
a  foledade  de  Maria:  Reli- 
quit  me  filam  minijir  are. 

cop  E  que  Maria  na 
mefma  occafião,  que  deo  à 
queixa,deo  húa  grande  fa- 
tisfaçáo  a  Martha ,  não  ha 
duvida.  Porque  ?  Porque 
deixar  Maria  a  Martha 
náo  por  amor  de  outre,  fe- 
náo  por  eílar  com  Chrifto, 
foi  dizerlhe  claramente: 
que  fazia  tão  grande  efti- 
maçãodeíiaa  companhia, 
que  fó  por  Deos  a  podéra 
deixar,  &  fócom  Deos  a 
podia  fuprir.  Vendo  os  fi- 
lhos de  Ifrael,  que  havia 
quarenta  dias,  que  faltava 
Moyfes,por  cftar  fechado 
com  Deos,  determinarão 
abalar  dope  do  monte,  & 
irfe.Foraófeter  c5  Araó, 
&  diíTeraó  allim :  Fac  nohis 
Exod.  ^eos  ^  qui  nos  fracedann 
gi.  *  Moyfienimhmc  vira  nefi'i-- 
mus  quid  acciderit  \  Araó, 
fa^einQS  hum  Deos,  q  nos 


Bautíjfa.  s^7 

acompanhei  porque  na m 
íabemos  que  feito  he  deftc 
homem  Moyfes. Linda  çó- 
fequenciapor  certo!  Daí 
cà  hum  Deos,  porque  falta 
Moyfes.  Moyfes  nam  era 
homem  .<*  Elles  mefmos  o 
dizião :  Moyfienim  httic  vi-- 
ro.  Poisfe  Moyfes  era  ho- 
mem,porque  pediam  hum 
Deos  em  falta  de  Moyfes  ? 
Porque  haprefenças,  que 
fó  por  Deos  fe  podem  dei- 
xar i  &c  ha  aufencias>quefó 
có  Deos  fe  podem  fuprir. 
Gomo  os  Hebreos  amavão 
tanto  ao feu  Moyfes,  &  fe 
vião  forçados  ao  deixar, 
faziaó  efte  difcurfo.  Jà  que 
fe  ha  de  deixar  Moyfes,  fó 
por  hum  Deos  fe  ha  de  dei- 
xar j&jà  que  fe  ha  de  fuprir 
com  outrem  o  feu  lugar,  fó 
com  hum  Deos  fe  ha  de  fu- 
prir. Por  iílb  pedião  a  A- 
raó  hum  Deos,  6c  não  ou- 
tro fubftituto  daquellaau- 
fencia:  Fac  nobis  T>eos^qui\ 
nospr£cedant.  Efta  fatisfa- 
çaóderap  os  Ifraelitas  a 
Moyfes,  quando  o  queriaó 
deixaria  efta  foi  a  fatisfa- 
çaó,que  deo  Maria  a  fua  ir- 
mãa 5  quando  a  deixou,, 
Nniiii     Dei- 


I 


f68 


Sermão  de 


Deixou  de  cftar  comella, 
mas  por  eftar  com  Deos : 
^iuaetiam  fedefis  fecus  fe- 
(íes  T>07nini.  Naó  tem  logo 
razão  o  parentefco  hoje  de 
fe  moílrar  fentido,ou  quei- 
xofo,  fenáo  contente  ,  & 
agradecido  :  Cognati  con- 
gratiilabanturei. 

fio  Et  audierunt  vici'- 
ni.  Também  fenam  deve 
queixar  a  viíinhança  de 
ver  as  Eílrangeiras  prefe- 
ridas às  naturaes.  Eporq? 
Porque  húaaima,  que  por 
mais  fervir  a  Deos  quiz 
ajuntar  a  claufura  com  a 
peregrinação  ,  neceíTaria- 
mente  ouve  de  deixar  os 
naturaes5&:  bufcar  os  Ef- 
trangeiros.  Húa  das  couías 
que  muito  agradou  fempre 
a  Deos  em  feus  fervos,  foi  a 
Gen?T2.  peregrinação.  Por  iíTomá- 
l'^l]l  doua  Abraham,  quefahif- 
fe  peregrino  de  fua  pátria: 
poriílo  quiz  que  peregri- 
naffe  Jacob  em  Mefopota- 
miaJofephnoEgypto;  & 
a©  mefmo  povo  querido 
de  Ifrael  ,  porque  o  efco- 
Iheo  para  fyjO  fez  peregri- 
nar inteiro  tantas  vczes,6c 
por  tantos  annos.  E  como 


Deosfe  agrada  tanto  dos 
peregrinos  C^^e  também  ^^^^th, 
o  quiz  fer  nefte  mundo  3  ^ 
que  faria  húa  alma  defejo- 
fa  de  agradar  muito  a 
Deos,vendofe  obrigada  à 
claufura  pelo  feu  eftado,8c 
inclinada  à  peregrinaçam 
pelo  gofto  divino  ?  Pere- 
grinação, &  claufura  nain 
podem  eílar  juntas  ;  pois 
que  remédio  ?  O  remédio 
foijcntrandoem  Religião, 
efcoiherhumMofteiro  de 
Eftrangeiras ;  para  q  vieíTe 
deíla  maneira  a  achar  jun- 
tas a  claufura,  &  a  peregri- 
nação :  a  claufura  no  lugar, 
aperegrmaçaó  na  compa^ 
nhia.  Quem  cuidaria ,  que 
era  poílivel  eílar  juntamê- 
te  em  Portugal,  &:  peregri- 
nareniFlandes?  Pois  iíIq 
hc  o  que  vemos  hoje  cora 
noífos  olhos. 

fii  Falia  David  da, 
peregrinação  dos  lilhos  de 
Ifrael  para  Paleílina,^  diz 
aílim:  Cum  exiret  de  terra^?íL\.^^ 
ç^yE^yptiy  lingnam  qna  non 
noverat  audi^it'.  Quando  o 
Povo  fahio  do  Egypto,ou- 
vioalingua,qucna6  ente» 
dia. Particular  moao  de  re-; 
parar  \ 


««M 


S.loao 
parar!  Se  David  pondera- 
va a  peregrinaçáo  dos  IC- 
raelitas,  parece  que  havia 
de  dizer,  que  paftaraó  cli- 
mas incognicos,  que  cami- 
nharão terras  desconheci- 
das. Pois  porque  naó  repa- 
ra nas  terras,  fenaó  nas  lin- 
guas  ?  Porque  naó  diz,  que 
andáraó  por  terras  eílra- 
nhas,  fenáo  que  ouviram 
Jinguas  eílrangciras  ?  Por- 
que julgou  difcretamente 
o  Profeta, que  a  formalida- 
de da  peregrinação  nao  çó-» 
fiftia  tanto  na  mudança 
dos  kigares,  quanto  na  dif- 
ferençadas  linguas.  Nam 
efl:à  o  fer  peregrino  na  ef* 
tranhcza  das  terras  que  fe 
caminhão,  fenam  na  eílra- 
nheza  da  gente  com  que  fe 
trata :  Cum  extret  de  terra 
t^ígyptiilifiguam  qua  non 
noverataudivit.  Sahir  do 
Egypto  para  onde  fe  ouve 
outralinguajiíTo  he pere- 
grinar.  K  fe  he  verdadeiro 
peregrinar  o  viver  entre 
gente  de  lingua  eftranha , 
bem  digo  eu,  que  fe  viraó 
aqui  juntas  milagrofamê- 
te  a  claufura ,  &  a  peregri- 
nação ;  a  claufura  no  lugar, 


Buutifla.  ^6c^ 

a  peregrinação  na  compa- 
nhia. Naó  deve  logo  de  ef? 
tar  queixofa  a  viíinhança  j 
pofl-o  que  a  queixa  parecia 
juftiíicada  j  antes  tê  obri- 
gação as  Religiofas  Portu*- 
guezas  de  fe  èdiíicaremj  & 
alegrarem  muito  de  verem 
(^  fobre  hum  táo  grande 
exemplo  3  hum  tão  novo, 
&  particular  efpirito  na 
proíiífaó  de  feu  eftadojtro-. 
cando  as  apparencias  do 
fentimenío  em  motivos  de 
parabensi  Vicini  congéatu^ 
labantur  ei. 

fij  Temos  acabado  a 
Sermaó,&  com  eile  as  Vi- 
(florias  do  Impoííivel ,  quo 
aílim  fe  chama.  Doulheef-í 
te  nomejnão  fô  por  fer  Ser<^ 
mão  do  Nafcimento  do 
Bautifta,  com  o  qual  pro- 
vou o  Anjo,  que  nada  era 
impoííivel  a  Deos  :  ^i/a ^"c»^^ 
non  erit  impoffibile  apud 
T^eum  omne  ver  bum  s  íenão 
por  fer  Sermão  defta  pro- 
fiíTaó  foi emniííí ma, que  ce- 
lebramos, na  qualíem  ha- 
ver reparado ,  deixo  pro- 
vados fcis  impoííiveis.  No 
nafcimento  do  Bautifta 
venceofehum  impoííivel, 
^ue 


570 


Sermão  Je 


que  foi  ajuntarfe  eílerili- 
dade  com  parto :  Elifabeth 
feperitfilium.  No  aáo  de- 
fta  profifTaó  vencéraófe 
féis  impoíliveis ,  que  foraó 
os  que  ordenadamente  vi- 
mos em  Ç^^s  difcurfos.  No 
primeiro,ajuntarfe  a  Cor- 
te com  o  deferto.  No  fe- 
gundoa  mocidade  com  o 
defengano.  No  terceiro  a 
grandeza  com  o  defprezo. 
No  quarto  a  innocencia 
comocaftigo.  No  quinto 
a  vida  com  a  morte.  No 
fextoaclaufura  coma  pe- 
regrinação. Efeisimpoíli- 
veis  vencidos  na  terra,que 
devem  efperar,  fenaô  lú.s 
coroas  ganhadas  no  Ceo? 
Darvos-hano  CeOjErpofa 
fereniíTimade  Chrifto  ,  a 
Corte  com  o  deferto  hua 
coroa  de  folitaria  entre  o 
Coro  dos  Eremitas.  A  mo- 


cidade  com  o  dcíengano 
húa  coroa  de  prudente  en- 
tre o  Coro  dos  Doutores. 
A  grandeza  com  o  defpre- 
zo hua  coroa  de  humilde 
entre  o  Coro  dos  Apofto» 
los.  A  innocencia  com  o 
caíligo  hua  coroa  de  peni- 
tente entre  o  Coro  dos 
ConfeíTores.  A  vida  com 
a  morte  húa  coroa  de  mor- 
tificada entre  o  Coro  dos 
Martyres.  Aclaufuracom 
a  peregrinação  húa  coroa 
de  peregrina  entre  o  Coro 
das  Virgens.  Aílim  triun* 
fa^quem  aílim  vence:  aífim 
alcança,  quem  aílim  mere- 
ce :  aílim  goza ,  quem  aííim 
trabalha:aílim  reynajquem 
aílim  ferve  :  neíía  vida  a 
Deos  por  graça  ;  na  outra 
vida  com  Deos  por  gloria: 
§iuam  mihh  &  vobisy  &c» 


EINIS. 


I  N- 


ââiiâi  ààààààààààààà'  àààààààà 

ffffffffffff:fffffffffifffff 

I  ND  EX 

Dos  Lugares  da  Sagrada  Eícíkura. 

OsNumeroSyfígrííficãoasTagmasy&asC&/ums. 


ExLib.GeneC 
Cap.  I . V. I.  T  A*  principio  creavit  Deus 
J  C^lãj  (S  t erram,  pag.  5  x  y, 
col.i. 
v.l.Terra  autem  erat  inanis,^  vacuAy 
pag.rLiG.col.i.^Sp.âpf^.coLi. 
,    Voiá.  Et fpiritm  Domini  ferebatítr  fn» 
per  aquas^pag.á^li^xol,!. 
v.^i^.  Fiat  Ihx,  E.faãa  efi  lux,  pag.  62. 
col.i. 

■  «'.4.  E:  vidit  Deus  Incem  qmd  ejfèt  bo" 
\^       }ia,pag.6z.ço/.  I. 

'Verf.i^l .Benedíxitífue  ei<;p  Ç}C).coL l. 
,■  Ibiá.Crejate^O' mfíltipiieammi,p.  ^. 
coli. 

V.  24.  Sccmdumfp^ciesfHas ,  fag.  59, 
col.i. 

^  f .  i6.  Faciamus  hominem  ad  imagi- 
nem ,  Ç^  ftmilitPídmem  noflram  :  & 

,  praJttpifcibHs  maris.ZSc.pag.xz/^.c.í. 
injin.&fic^i^.p,^  g  I  .Í-.2.  ífi  fin.^feqq. 
^p'^7y.  coLx.  'infin.^feqq, 

C>2.^.x.Y .z.  R-qiiievit  diefiptimo  ah  uni- 

■  verfi  opere  quodpatrarat^p.'^  i  ç.e.  i . 
s-',^.  Ab  omm  opere  [m  qmd  crcfívit 


Deus,utfa€eret,pag,  ^19 xol.  i ." 
V.  ij.rt  operaretnr^^  cufiodiretillum^^ 

pag.â^iyO.col.iànjin. 
•  V. x^.Erpim  dm  in  carne  f^naypagx^f, 

coli.. 
Gúp.'^,v.^.Nequaquam  morte  mor  temi» 

m,pag.'z6^col.x.&  fiqq. 
v.^.Et  eritisficHt  Dij^p.  194.  cal.  x.  ift 

finp.z6^.c.%.^p.'^^o.c.2.inprinc, 
Í/.9.  Adam,  ubi  es  ?  pagxi.eol.i.. 
V.Z  I .  Fecit  quoque  Dominas  Deus  A- 

díe,&  uxori  ejus  túnicas  pelUceasy  ^ 

induit  eos,pag.f^/\..col.t. 
v.xz.Nefortefumatetiam  de  ligno  vi» 

ta, ^  vivai  in  aiernum^pag.  xf^.çoi^ 


v.ij!^.Coílocavit  ante  Tara^fumChs» 

rHbim,& flammeumgladium  ad  ett^ 

'    fiodiendi^é,  m  vii^m  ligm  vit<s;,pag.  x^Q» 

Col.X. 

Gap.6.  V.4.  Gigantes  autem  eram  fuper 

terram^p.^.col.x. 
V.14,  Fac  tibt  Arcam  de-  lignis  kviga» 

tis,pag.'í^i'i.col.x. 
l^i^úMatiffíncHlaiin  Ana  fácies  ,  (§ 


51^ 


Index  cios 


bituminc  fivics  intrinfe^Hs  j  O  extrin- 
fecffs,  pa^.^  1  i.çol.tr^    '  ■"     "   ^  '"' 
v.i^.  Et Jic  fácies  eam,  pag.  g  iz.col.z. 
■  -  ^.ZO..ytpo]fint  vivere,p.'^i'2^.c9l.i. 
Cap. 1 1 .  v.í^.CelebremPis  nomen  noflrum , 
^    antequíim àividamur^ p.'^i'^.coí.i. 
Cap.ii.v.  I.   Dixit  antem  JDominus  ad 
Abram :  Egreàere  de  terra  tua^  i3c.  p. 
5^68  cqI.  I . 
Cap.  14.V.  I  ^.MelchiÇedech  proferem  pd' 
nem  (  era,t  enim  Sacerdos  Dei  altijfi- 
mi,  ) pag.z^i.col.z. 
C^p.i^.v.z.C^  g.  Ego  vadam  abfcjue  li- 
beris :  ^  ,  Eliex^er  vernaculus  meus ,, 
haresmeHserit,p.'^'j^.col.z. 
Cap.  i^.Y..'L.4pparnerftnt  eitres  viri^a^. 
.  ,  91.C-0/.I.  -    , 

"V.io.Revcrtensveniamad  te  tempore 
ifloy  vila  comité ^&  habeb.tt  filtfim  Sa- 
'  'ra  Hxoriua^pag.^i .col.z.Ç5 feq. 
.  \V,  14.  Juxta  condigam  reverter  ad  te 
hoc  eodem  tempore^vita  comité,  p.  91. 
L.   col.z.mfin.CSfi<l. 
Cap.  i^.v.râp.DommHSpluitffiper  Soda- 
mamfiílphur,&  igriem  à  Dommo  de 
Calo,púg.^O:\..col.z. 
Cap.  i  I  .V.  10.  Ejíce  ancilkm ,  :^  fUifir» 
cJHs:  non  emmerit  haresfilim.analla 
CHmfiliomeo/faaCyp.O^yy.c.Z-tnf». 
C^\-).zz.v.Z.(^fe^^ToUefltfim  tuum  fim- 
gcnitum,  ^uem  dtligts,  Ifaac,  de.  pag, 
^GG.coL.T.. 
•   i-.iS.  Benedicemur  in  fentine  tuo  om-^ 
■     nesMg.^6.coL%.p.ç)J .col.x.  (Sp.ioi, 
col.z. 
Cap. 2  •'. V. í^4.  Parvipcndem  ^uodprimO' 

íTrnita'vnidídíJ[et,p.^97 -col.z. 
Cap- 2.9. V.  I  •  Profcãuscrgo  lacob  vcnn  m 

taram  oncntaUm.p  .'^G^.coLi. 
C^^.7;7.v.iXiinmmpoljmu^,p.3i.$^ 


,  V.  1 8.  Cogltaveríifít  iUum  eç^id^re^pag. 

^i^.ccl.i.  ';      '      '"^  : 

v.i^.Ecce fomniator  venit :  venite,  oc 

cidamtis  epim,pag.%zxol.  1 .  infin. 

Cap.g8.v.27. .  KnHsprõtHlU  mannm ,  itk 

qua  obfietrix  Ugavit  coccinam ,  pag. 

-•  -■ :  -ijj.eol.z. 

Ibid  Ifie egredietur prioTy  pag.zi^.c. li 
Cap.59.v.i.  Igitur  lofiph  dftãus  efi  in 

zj£gypt!'í7njdc.pag.^G^.col.  i . 

C^p.^i.y.^.Exp/oraíoresefiiSip.jT^.c.z. 

Cap. 48. V. 7.  Aííhi  enim  cjuàndo  venie^ 

bam  de  Afefipotamia^  ^c.p.f^  1  .c-Z. 

Cap.49.  V.  ^.  6c  4.  Rnben  prtmogtnttus 

mem^c.  non  crefcas,p.  101.C.1.&  2# 

V.^.Catfilfis Leonis /f(da,pag.  ^^.col.i, 

infin, 
Ihiá.  Re<jMÍi^fi-ens  acmbffifii  nt  Leo,p\ 
98.6-0/.  I. 
«í^W.  I  àf-Ifachar  Aftnftsfortis,  pagi/^^.i.z. 

inprinc.&  p.çS.coLi. 
■   v.i  y.Fíat  Dan  Coluber  in  via,  p^^-4.^. 
col.  I  .infin .^ p.^ ^'Col.  i . 
v.z  I  .Ncphthalí  CervHs  ^mij[fií,p.^^.c, 

I  .infin.&  pag.^S.col.  1 . 
V.ZZ' Filius  accrefccns  lofeph  ,filÍHS  «í-- 
crefcens,pag.  i  o  i  .col.  i  .tnprtnc.&  c.  z. 
C^  pag./^i6.col.z. 
V.zi  .Benjamin  Lúpus rapax,p.'\^.^.l» 
infin.(S  p.g^.col.i. 

ExL.ibr.Exodi. 
Cap.^.v.:^.   Fad.im,  &  vidcbd  vi/micnt 
hanc  magnam.p.ii^Oi.col.  i  Mfin.d  p, 
á^ç)<).col.i.tnfin.^fc!j. 
'y.^.Cemens  íjkod  pager  et  ad  vidctídu^ 

vocavU  enm.p.-xp  1  xol.z  .m  pnnc. 
<u.i^.Loci4S  entfn  tn  que  fias,  terrafanFlA 

eft, p. 1^0  \. col.z, 
1.^.  Deficndt  u(  Hbsrem  mm^pag.^o  i , 

Ca|?, 


Lugares  da  Sagra 

Ç3p,4.V.24.  Cum<^ue  ejfetin  itinere.in  di~ 
verforío^occurnt  ei  DominHSy  ^  vole- 
kit  occidere  eum^p.  1 6 1  .c.l.infin. 
V.  t^.SponJfí  ifanguintim  tu  mihi  es,p  ^g. 

i6'^.col.iJnpnnc. 
vx6.  Et àimijit  eHm,pag. 1 6'2^.co!.i. 

Qà^.^y .z\.Grandoy  &  ignis  mifia  pari' 
terferebantHr,p.í^(^^.col.\. 

Cap.  1 2.V.29.  Faiium  ejl ^amem  in  noBis 
médio, per  CHJfit  Dominus  omneprinta^- 
genitnmin  terra  t/^gypti,p.  190.C.1. 

Cap.  9  .V.  I  G.Et  ecce  caperum  audiri  to- 
nitrua,^  micare fulgura^  pag.^jS.c. 

V.  1 8.  Totm  amem  mons  Sinai  fuma- 
hat :  60  qmd  dejcendijfet  Dominu-s fi- 
per  eum  in  igne^p.^jG.col.  1 . 

Cíip.23. V.  1 5:.  Non  apparebisin  conJpeBtt 
meo  vacHHs^pag.ijG.coLz. 

Cap.  5 1 . V.  I .  Fac  nobis  Deos,  qtii  nospr^' 
cedam  :  Aíoyftenim  hmc  viro  ignora- 
mmcjíiid  accídentjp.^Sy.col.  i.infin. 

'V.  1  t.Ns  <^Hdífo  dicant  zy£gyptijp.  i  ai. 

col.i.        * 
V.  5 r.  C?  g i.  Am  dimitte  eis  hanc  no- 
xam\aHtf%nonfacis^deUms  deli. 
bro  tm^cjíiemfcnpfiiii^p.^fj,  c.i. 
Gap.3g.v.  i^.  luvemfii  grattam   coram 
me^^ag.^ycoL.í. 
í/.  I  g.  Si  ergo  ínveni gratiam  in  confie^ 
ãu  tuo,  ojíende  mihifaciem  tuam^  ut 
[ciam  te  ,  ^  inveniam  gtatiam  ante 
óculos tms\,pag.'^%'^.col.z.  ^  fiqq.  (3 
pag.^xG.col.i. 

Ex  LibnLevíticí. 
Cap.6,v.i2.  Tgnis  in  altarifemper  arde- 

bit^pag,'!.'^  r..  col.  i  jn  fin.&  coL  2. 
Cap.  16.  V,  t,  Ne  ingredtaiur  SatiBua- 
rÍHm,qmdcfl  mira  vdum^  mfi  hu 


daEfcritura.  57^ 

amgfecerity  pagl^^^.eol.  lànf.a.  Úp, 
XJi^.col.  I . 
V.  7.  P^itulmn  pro  peccato  ojferct,  &  arie- 

temin  holocauflum^p  .i^^ii^.c .  i  .mfin. 
v.i\.&  I^.  Hisrite  celebratis^  &c.  ul- 
tra, vdmninirabitit;  Sanãa,p,  25'g.í'. 
i.mfin. 
£x  Libr.Deuteronornij. 
Cap.^.v.i^,.  Deus   tuus  ignis  conjumens 
efl,pag.^'j6.coL2.. 
v.'^6.AHdijliverba  illin$  de  medío  ig- 
gnis,pag.  4.7  6. col.  2. 
Cap,  1 7.  V.  ( f.  Nonpoteris  akerius  gen  tis 
homine  Regem facere^qut  nonjjtfrater 
tuHS\pag.'x^!^%.col.\. 
Cap.  18.  V .it.Hochabebisjigntim  :  Quoi 
Prophetapradixerit,  &'  non  evenertt : 
hoc  Dominus  noncfi  locutus^pag.  1 1^, 
coL\. 
Cap.29.v.Z3.    SHÍphure,  &  SoUs  ardor e 
comburens ,  in  exemplam  fubverjionis 
Sodoma^pag.^o^.col.i. 
Cap.^2.  v.^4.iVô««^  hjíc  coditafint  apt-íd 
me,(3fignatain  íbejoaris   meisf  pag, 
iy.col.i.in  me  d. 
v.'^^.Mea  ejl  ultio,  &  ego  retribuam  eis 
in  tempore  ,pag.  1 7  .col.  i .  in  med. 
Cap.33.v.i9.  Inundaíionem  marisqMoJi 
lacfugent ,  ^   thefauros  abfcondttos 
arenarum  ,pag.  4  74.  eol.z  in  princ. 
Ex  I..ibr.Iofue. 
Cap.  7.  V, 9.  Quid  fácies  magno    nomim 
tuQ?pag.  i^i.col.j. 

ExLibr.  lucltcum. 
Cap.^.v.^.Niinfuid  pojj/tm  deferere  pin- 
guedinem  meam,  (3  venire ,  Pit  inter 
ítgnapromovear}  pag.'^^'j.c.^. 
v.iz^Veni^& VíKpcra  nobis,p.'^â^J.e.7. 
v.iâ^.Feni^^  impera fiiper  nos,p-.  548. 
çcl.j, 

"^r  15*, 


fJ 


574 


Index  dos 


v.í^.  Sivere  me  Regem  vobis  confli^ 
tnitis^  venite ,  &fih  umbra  mea  re- 
tjuiefcite  :Jiautem  non  vultis^egredia- 
wr  ignis  de  rloamno^\í  devoret  Cedros 
Lihaniyfag,  548.CÍ?/.  i . 

Gap.  14.  V.  1 2.  Proponam  vobis  problema, 
pag.  1  y^.col.z. 

Cap.ió.v.iy.  Qmmodo  dicis  ejuod amas 
me  ?  Per  três  vices  menWfis  es  mihi,p. 

Ex  Libr.i.Regum. 
Cap.i.v.  lg.  zy£fiimavit eam  temí^len- 

tam^dixitqm  ei :  VfqHequo  ébria  eris? 

pag.ji.vol.i. 
Cap.2.v.  I  o.  Dominam  formidabum  ad- 

verjàrij  ejí4s,fuperipfos  in  CahstonA' 

bít^pag.^HS.col.  I. 
Cap.g  V.12.  (^fiqq.  In  dte  ilUJufcitabo 

adverpAm  HeU,^c.p.  5*4  1  .c.  i . 
■C^^.^.Confiitue  nobis  Regem.pcm  Ç3  uni- 

verjk  habent  nationes,p .  7^  ip  coL  i , 
Q'A^.\ ^ .V .^p.Peccavi  :fed honora  me co- 

ramfmiortbpu  populi  mei  ,  ^  coram 

Ipael^pag.  1  '^^.col.z.&feq. 
Cap.  16.V.7.  Homo  videt  ea,  qudeparent , 

Dominus  autem  inmeíur  cor,  pag.6^. 

CO  Li. 
V. i^.Fídifiliíim Ifii  fcientempfallere , 

k3  fortijjimum  robore,  (3  virum  belli- 

cofíimJS  prudemem  m  verbis,  &  vi- 

rumptilcbrum ;  ^  Dominus  efi  cum 

eo,p.^  11. col.i. 
Cap.  1 7.  v.4.^.^  fe<^:j.  Et  egrejfíís  efi  vir 
fpurii^s  de  caft-rísPhilifihinornm,nomi' 

ne  Coita  h,  de  Geth,  altitadtmsfix  cft' 

biíor;im,^  p^lmi ,  ^cpag.^/^y.col.z. 

inprmc. 
Cap.  i8.v,4.  Expoliavitfe  Ionath.ts  tú- 
nica ejua  erat  mdfítus,  ^  dedtt  eam 

DAV:d,p.i^'íí^.col.z.tfjfih 


V.  7.  PercuJJit  Saulmille,  ^  David  de 

cem  millia,pag.6j .col.i, 
Cap.2i .  V.  1 1 .  PercHJjit  Sanlmille^íS  Da- 

vid  decem  mtllia,p .  5- 1  ixol.i. 
V.  12.    Poptít  David  [ermones  tfios  in 

cordefro ,  ÇS  extimmt  valde  a  fac  e 

Achis  Regis,p.^  i  t.col.x. 
Cap.2i  .z/.  i  .Abtjt  ergo  Davtd  inde,Ç^ffi' 

gtt  ínfpelnncam  Odollam^p.^ il.c.z. 
Cap.  28.  V.  1 5-.  J  i  i  xta  Tex  c.  Hcbr.  jQtta- 

re  tncfuietafti  me,  m  afcendenm  ?  pag. 

ZlS.col.l. 

Ex  Libr.2.Regum. 
Cap.  12.V.  I  ^.Peccaviypag.  1 55".  col.  i.  #'» 

princ.&fetjíjl. 
Ibid.  Dominus  quoque  tranfiulit  pecca- 

tum  tH(4m,p.  I  "^^.col.  I . 
Cap.  1 4. V.  14.  Omnesmorimur  ,  (3  cjHaJi 

aijHa  dílabimur,p.z^.col.  i . 
v.zó.Et  quando  tondebat  capillum, ^c. 

p^.$^i.  col.i.in  prmc. 
Cap,  1 7.v.2:^.  Vtdens  cjHodnonfuijfet fa- 

ãnm  conJilÍHmffium,pag.^zo.  col.  2. 

&feqq. 
Ibid.  Ãbijt  in  domum  fuam:^  dijpo/tta 

domo fiia^fiffpendio  interijt,pag. ^zoc. 

I  .^fecjq. 
Ibid.  Et  fepHhusefi  infepulchro  patris 

Jfíi^p.^xo.col.  I. 
Cap.ip.v,  gf.  ^56.  Oãogenarius  fum 

hodie :  ÇSc.  non  indigeo  hac  viciJJitHdi- 

n\pag.tç^Z.col.i. 
V  ;  j.Efifervus  tuHs  Chamaam.ipfe  va- 

dat  tecum^pag.^i^r.col.  i . 
Cap.22.v.8.9.io.;:^.  <S  feqq.  CommotA 

#/?,0í  contremuit  terra  :  fmdamenta 

monti.m  conctfjfa  f:nt^  Õ  concjuajja- 

ta,c]íioniam  mitus  efi  eis.  Afcenditfft» 

mas  de  naubfis  ejui  ,  ^c.f^ig.  488.<-. 

i.infin.^fcqq. 


EM 


Lugares  da  Sagrada  Efcritura. 


v.^i.  Cribrans  aquas  de  nubibus  Ca^ 
lorHm^pag.^ ;  .col.ian princ. 
Cap.i^.v.S.  Hac  nominafortium  Da-, 
z'iJ,pa^.^^  j.col.z. 
Ibid.Davídfidem  in  c athedra  fapien^ 
úljimm  Princeps  inter  tres,ipfe  efi  qua- 
ji  tenerrimm  Itgni  vermtculus  ,  qni 
oãingemos  inter fecit  impetn  uno^pag. 
^0)^X01.2..^ feqq. 

ExLib.g.Regum, 
Cap.  1 1.  V.50.  PalliuntfuHnt  novHm,pag. 
103.C0/.1. 
í/.ç^i.   Ecce  ego  fcindanj-  Regnum  de 
mann  Salomonis,  ^  dabo  tibi  decem 
Tribns^pag.  i  o^.col.^anprinc. 
Cap,  1 7.  V.  I .  P^tvit  Dominíís,in  cujus  conf- 
peã!*[h),Jí  erit  ros, ^plfívia.  p.   i  o jr. 
coL  I . 
Cap.i8.v.24..  Deffs,  qffi  exmdierit  per 

ígngm,pag.^y6.col%. 
Cap.  29. V.  14.  Zelo  z.elatusptmpro  Do' 
mino  Deo  exerciiuumy  k3c.  &  dereli- 
UusÇnm  ego  folus^pag.ioi.c.^. 
V.  1 8.  Derelinquam  mihi  in  Tfraelfip' 
tem  millia  virorum  ,  quorum  genua 
nonJuntincHrvataanteBaaly  p.  102. 
€ol.z. 
Câp.zi.v.z  Hortumolerum,p.^^o.c.i. 
í/.if.  Fenundatus  efi,  ut  faceret  ma- 
lum,pag  I  'ip^.col  I . 
Q'^'^.xi.y ."S^.  Anignoratis  quod  noflrafit 
Ramoth  Galaad,  &  negligimus  tollere 
eam  de  m^nu  Regts  Sp  ^e?  p.\  09.^.2. 
«z/.ó.  Congregavit  Rex  Ifrael  Prophe^ 
tas,  cjuad  ingentos  cirúter  viros  ,pag. 
109.C0/.2. 
Ibii  Iredebeo  in  Ramoth   GaUad  ad 

belUndum^an  cjuisfcere?  p .  1 09.  í-.  2 . 
Vdià.Afcende^  ^  dabit  eam  Dominus 
mmanHtua,pag.iio.c.i. 


v.S,  Remanjtt  vif  Hnus:  fed  ego  odi  eum^ 

quianon  prophetat  mthi  bonum  yfeâ 

inalum,pag.  1 1  o  col. 
V.  1 3 .  Stt  [ermo  tuus  fimilis  eorUm ,  (3 

loquere  bcna, pag.  1 1  o.col.z-in princ. 
1'.  14.  Vivit  Domm^Siquía  quodcuncjue 

dixerit  mihi  Domm^Sy  hocloquar^  p. 

IlO.Col.2. 

Ex  Libr.4.Regum. 
Cap.i.v.  11. Homo  Dei,  hac dicit Rex  1 
Feftina,  defiende,  pag.^01  .cz. 
v.lt.  SihomoDei  egofum^  dejcetidaí 
ignis  de  Calo,Ç3  devorei  te^  &  quin* 
quaginta  tuosypag.joi.c.í.&fejq. 
Cap.2. V.  1 1  .Et  ecce  currus  igneus^&  equi 
ignei diviferunt  utrnmque.p.  joi .cl* 
Cap.4.v.  yVafa  vácua  non  pauca,p.i'j6. 

col.i. 
Cap. 5'.v.  7.  ánimadvertite^  ^videte^ quod 
occaftones  quarat  advetfum  me,  pag, 
yi.coLidnfin. 
Cap.20.  V.9.  Kis  ut  afiendat  umbra  decem 
lineisy  an  ut  revertatur  totidem  gradi- 
bus  ?  pag.zo/^.coi.  I 
V.  i  o.Factle  efi  umbram  cr  encere  decem 
lineis:  nec  hoc  volo  ut  fiat  ,fèd  ut  re  - 
vertamr  reirorjum    decem  gradibus^ 
pag.  to^.col.x. 

Ex  Libr.  I .   Paralipomenon. 
Cap.xo.v.  I .  Eo  tempore.^  quofolent  Reges 
ad  bella  proceder  e  ,p.izy  .çol.  1 . 
ExLibr.Tobiç. 
Q^>.^ .v.i6.Rogo  te,  indica  mihiyde  qua 
domaram  de  qua  tribu  es  tu?  p.^o.c.  i. 
V.  I  H.Ego  fum  Azoarias  Anania  magni 
filÍHs.ipãg.i:)C  .c.  1  .&  pag.^z.e.l. 
Ex  Libr.Eíther. 
Cap. 7. V. 8.    Etidm  Reginamvuh  oppri>- 
inere,weprafent€yin  àomomea^  pag, 
yi.coLi.. 

Ex 


.  — ::'-^»»*i«pi 


•^16 

ExLibr.Tob. 

Çap.^.V.l^.C^  lâf.EtriHnc  requiefcerem 
ctim  Regibtis,^  Confulibus ,  qui  aãt- 
ficmtJlbifolítíidmeSip .^-^J.col.  i.(S 

V.  I  o.  Si  bonafHfcepimus  de  manu  Deiy 
mala  quare  nen  frfcipiamus  ?  fog.^^ 
col.z. 
dap.'r.v.'2.  5/'í'<!5'  egohabm  n7enfes  va- 


Index  do9 


CfíOS.p. 


''d.X 


y^.coi.i. 


v.S.  Nec  afpiaet  me  vipis  hominis,  pag. 

ij^.col.i. 
Cap.  IO.  V.6.FÍ  qtíízras  iniquit  atem. meã  ^ 

^  peccatum  meum  firmeris  ? p .  z^.c. 

l.inprinc. 
v.j.  Et  feias  cjuia  nthil  impiumfecerim^ 

pag.i^.c.\.^  1. 
Cap,  ig.v.xj.  Contra  folium,  qmàvento 

rapittiyjftendispotmtiam  tnam  ,pag. 

5  i^.col.t,in  fin.CSfiq. 
V.Z7.  Obfervafli  omnes [emitas meãs, ^ 
:        vc-flio^apedirnimeorum  corfiderafii, 

pag.zf.coLi.infin. 
Ibia.  Secundúm  Septiiaginta.  Et 

r adices  peànm  meortim  conjiderafii  ^ 

pag.iú.col.i. 
Cap.i4.v.2.  EtnnnqHtmin  eodemflatu 

permanet,pag.ix.coLi.in  med. 
Cap.:^8.v.22.0'  xi.Ny^nqmd ingrejp^s es 

thefiifiros  nivis,  ant  thefauros  grandi  • 

nisvidifti\  ciua;pr^paravi  in  tempfis 

hofiís^  in  dicmpHgn&^^  belU  ?  /'.47  5. 
1;,;^  íol.i.infin.Z^y  feqq. 
■  >J».:^f  ISJHncjíiidmittes fulgura^Ç^ ibíit : 

Ô'  revertentia  aicent  ttbt  :  Adfamus  ? 

pag.\%c.col.i.^  X. 
Cap,  I  7.V.  1 1 . Dtes  mei  tranfierimt ,  cogi^ 

,  tationes  meee  dijfipatxfiwt,  torquentes 

cor  meum^  p.^;J  .col.x.in  fm.^feqq. 
.  '    -^.15.  SífitjlmHçro^tnferpHs  dçmus  mca 


jeqq. 
V.  I  ,\..PHtrediyn  dixi :    Pater  meus  es : 
Marermea,  Z^firormea  vermíbus^ 
pag.^   S.col.Z.  Ú  feqq. 
Cap.^7.v.5'.  Tonabit  Deus  in  vocefua^p. 

í\.C)l.C0l.l. 

Ex  Libr.Pfalmorum. 
Pfalm.  I  .V.  I  .Beatus  vir,pag.<^66.col.i.Ç^ 
jeqq. 

V.  5.  Et  erit  tanquam  lignum^  quodplx' 

tatum  ejijecus  dectirjns  aquarn :  ^uod 

fruUumf. um  dabtt  in  temporefuo  ,p. 

l^x.col.i.inpytnc.^p.l^-i.c.r.^feqq. 

Ibid.  Folmm  ej^.s  non  defluet,  pag.zc)%. 

col.  I . 

Pfahn.a.v.2.  Afliterunt  Reges  terra  ,  CS 

Príncipes  convenernnt  m  tínum  ad- 

verfus  Dowtnum  ,  ©'  adverfus  Chn- 

flum ejHs, p.')X6.c.i.mfin.  ^fiqq. 

Pfalm.4.v.  ^.r?  qmddtUgitis  vatntatew , 

(3  qutcrttis  mendacium  ^ pag.ic}-'.c.v. 

infin.CSfeq. 

V.6.  Mtílti  dicHnt :  Quiis  ofle 

bona'?pag.i^'^^.çol.i. 
V .y .  Signatnm  efl fiifer  nos  Ifimenv/ih 
tas  tui  Domine.pag.ò^':í^áf.c.  i . 
Plillm.  1 7.V.9.  Jgnis  afacie  ejus    exarjity 
pag.úf']  6x01.2..  \- 

V .lòf.Inlonmt  de  Cdo  Dominas  ,.  CS 
AlijJimHs  dedii  voçcm [nam: granào , 
C3  carbones  igms^pag.^jy.ci. 
v.zrj .  Cum  eleito  eleitas  cris  j   CS    ( tim 
perverjò  pervertem, p.ic)"/  .Cl. 
Pjabn.  1  S.v.z.C£li  enarrant gloriam  Dei, 
CS  opera  manHum  ejns  annHntiat  fir^ 
mamcntiím.pag.ii^<^.col.  1 . 
v."^.  Dies  diei  crnílat  vcrbum :  CS  nox 

tio  clí  indicat  fcientiam^p.Zâff^.c.  i . 
«/.  c.  /;;  omnem  terram  cxtvit  fonas  ^fl- 
r?í,CS  infncs  orbts  terra  verba  eorfim^ 
/;.249.f.i.  ^^!f^y 


idy 


cnait  nct>!s 


Lugares  da  Sagrada  Efcritura^  57/ 

V.  1 3.  Jl^  occultis  meis  mmda  me,  (3  ab     Pfal.6 :^.v.8.  Accedet  homo  ad  cor  almm : 


aliemsparceferv9  tuo,p.'^^.col.i> 
'Pãlm.zz.v.^.  Farafii  m  confpeãu  meo 
menfam,  adverfrs  cos,  qui  tnMant  me, 
pag.í6y.col.  I  .infin, 
Tiàím.-^z.v.y.Ponens  in  thefaaris  abyjfos, 
p.í^y^.coi.i.mfin. 

V.S^/pfedíXíf,  Ó  faãafint , p4g.  495. 
coi.z. 
VÍ2Xm.'i^^.^.^.Nolmtintellig€re  ,«í  benc 

a^eret^pag.^^xol.i. 
Pfalm.3  6.V.  lo.Çí^res  locnm  ejm,^  non 

mvenies^fag.í^y.c.  i. 

"  v.'7^f.P^idt  impiHmfrperexaitatum  ,  ^ 

eUvíimmficm  cedros  Ltbaniyp.  i  ç6.c.  1 . 

%>.l^6.Et  tranjiviy&  ecce  non  erat:^  quéL- 

jivi  exm,(3  non  eíí  inventus  locns  ejust 

pagi^6.c.i.&  x.^p.igj.c.i. 

Pfalm,3  7.V.  i4.£^o  autem  tanquamfitr- 

dusncnafídí-ebamyp.i^^^.c.^. 
Pfalm.^S.v.  ';.Thefiúr(z^t:&  ignorat  cui 

congregahit  ea,p.^f^.c.z. 
l^íúm.^z.v.fjadíca  me DeHs,& difcer- 
tie  caufam  meam  de  gente  nonfinãíH^ab 
homine  iniqm  eripe  me,p.^^.€.  1  .in  pn^ 
^Jeq. 
IJ^falm 4:^.v.  7.  Gladm  meus  nonfdvabit 

me^p.^oj.c^i.infin. 
Píàlm,44.v.  1 1 .  OblivifcerepopulH  tuum^ 
&  domumpatris  tHÍ,p.^^6.c.i. 
•Í/.15',    Adducenmr  Regi    virgines  poíi 
eam,p  zi à^.c.zjnfin. 
Pfahn.49.v.2 1  .Stamam  te  contra  faciem 

tuam,,p.iz^.c.i. 
Píalm.  fo,  V.  f.  Peccatummeum  contra 

me  efijèmper,p.  izS.c.l. 
Pfaliii^jy.  v.8.yí<5Í  mhtlum  devenient  tark- 
quam  aqua  decurrens,p  .ij.c.i.in  princ. 
IPíalm  6i.v.^.  Preíium  meum  cogitme- 
írmtrepsllere:,p:'i(^^x,Zy 
Xom.7, 


^  exaltabitnr  Deus^ag.  ^/í^j.col. 
Plàlm.óS.v.  10.  Zdmdomm  tua  come* 

ditmeyp.io^-c.i.m  fin. 
V.  zz.  Dederunt  in  efcam  meam  fel :  Cf 

infiti  meapotaverHntme  aceío,p.^^^, 

col.z. 
Pfalm.yi.v.  7.  Eritindiebus  ejus  jufii^ 
^   tia  y  Ç3  abmdantia  pacis  y.pag.  ^^ 

colz. 
Pfalm.yi.  v.zo.  Velm  f@mnÍHmfmgen^ 

tinm  Domine,  imaginem  ip fórum  adni-» 

htlumrediges,pag.\y.col.t. 
VÇúm.j/^^w .^.  Çalix  inmanu  Domini 

vinimèriplenfís  miflo,  pag.^7,6.  coLz^ 
P falm .  yó.Y.zo.Et  vefiigia  tua  non  cog- 

HofcentHr,p./!fi$.c.  i  ,m  fin. 
Vfalm.y/.v.zf. Panem  ãngelorum  mm^ 

ducavithomo,pag.z^y.c..i, 
Pfalm.  78.  V.  10. Ne  forte  dicant  in  Genti- 

bus,pag.i^i.C'i' 
Pfalm.8o.v.6.  Cumexiret  de  terra  t/£-' 

gjpi :  linguam^quarr^non  neverat ,  aíf' 

divit,p.^6^.Col.Z.&feqq. 
v.ii. Dilata  os  tuum,  &  impkbo  illud^ 

pag.Z^^.C,Z.&feqq. 
V.  17.  Cííavit  eos  ex  adipefrumentiypag, 
.     z^-^.coLz, 
]?Mm,B^.y4.Etenim  pajfer  invenitfbi 

domum :  Õ  turtur  nidumftbi.ubipmat 

fHllosfuos,p.zzi.c.i.infin. 
v.6.C^  jMeatm  vir  ,  cujus  efi  auxilium 

abs  te :  afien/iones  in  cordefuo  difpofuit, 

in  valle  lacrymínrum  ,  in  loco  quemp  o  • 

fuit^ag,zzi.e.z.^feqq.(3p-â^ll.s.l. 
v.iz. ^damtfericordtam,  ^  ver-tmum 

diligit  Dem:gratíam^  é'-g^^'^^'^*^''"^^^^^ 

DominHs,p-i6<^.c.'i'^  ■' 

Píalm.96.-z^.  :^./gnis  ante  ipfimpraceder^ 


^■Mi 


178 


Index  dos 


Píàlm. loi.Y.ii.Tn omniloco  dominatto- 

nis  ejpís  benedic  anima  mea  Domino, f. 

ifi.coLi. 
Pfalm.  I  og.v.  f.   Fnndafii  terram  fitper 

ftabilit-atemfíiam^p.zi  J.coí.  z. 
•  ^'  5  ^  •  -^^  refpick  terram ,  Ç3  facit  eam 

tremer e,  pag.  iz^^xol.  i  .infin. 
Piàlm.  I09.v^4-./»r^■^;í■i  Dominm,^  non 
■   fanií  ehit  eum  :  tu  es-  Sacerdos  in  ^í«e- 

numfecundum  ordinem  Melchifedech, 

p.zji.c.i  .infin,  (S'fèfq.& p.  zf^.c. i. 
plàlm.iio.  V.4.  G?  j.  Memoriam  fecit 
^    mirabUÍHmfHorHm,ÇSc.efcam  deditti-^ 

memibusfe.pag.i^y.c.t. 
Pfalm.  1 1 T^.v.i&.Calum  Cali  Domino  \ 

/>rf^.^5'8.í•.^.^  ;>.-558  c.  I. 
Jbid.  Teritam  amem  dediffidjs  hominíi , 

Píàlm.  1 1 8.  V.  I  'è.Revela  óculos  meos.pag. 

iz^.col.i. 
V.S^.  In  éSternum,   Domine  ,  ver  hum 
^   tHfim  permanet  in  Ca/o,  p. x^j.c,  i . 
^y.  I  ;5 1.  Os  menm  aperni,  &  attraxi  Jpi- 

ritfimjp.x/^. 
jp.ig7.  I^ifius  es  Domine :  Ç3  reBnm  ju- 

dicifím  tufim, pag.'^^.c0Í.z.& pag.  79. 

col.i^ 
pfalm.  12 7. V.  a.  Labores  manHum  tua- 

rum  cfuia  manducabis :  beatutet^^  be^ 

netibierit^p.  ^^^6  c.i, 
Pfalm.  1 34. V. 7.  Fulgura  in  pluviam  fe- 

€it,pag.jfi^.e.z. 
-!/.  8.  ^iproducit  ventoí  de  thefauris 

fiis.pag./^y^c.i. 
pfalm.  i:^6.v.9.  Beatus  í^ui  occiditpar' 

vulosfiio^  ad  patrem,  p,  i  ^/^.col.  i . 
Pfalm.  142. V.  2.  Ncn  intres  in  judicium 

€umfiivo  tuo,pag.^S.c.i. 
Pfalm.  148. v.4.£r  a^ua  omnes ,  cjUd; fn. 

feruiosfiunt ,  IdHdentmmen  Domint, 


pag.zz^.col.i. 

Ex  Libr.  Proverbiorum.' 
Cap;  I .  V.24.  rocavt,  &  renuiflis,  p.  i  j  jC 
col.  I  .inprinc. 
Ibid.  Extendi  manum  meam,ÇS  nonf.-iit 

qui  afptceret,  pag.  1 5-5-  .g.  i  .in  pnnc. 
•v.-L^.  Defpextfiís  omne  conjiltum,  />.  15'5'J 

col.i. 
V.z6.  Ego  (^uoque  in  interitu  veflro  ri» 
debo,&  fubfannabo^.i^^.coLi. 
v.zS.Tunc  invocabunt  me^fS"  non  exau- 
diam,  pag.  1 5*5'.  c-o /.  i . 
Cap.2. V.  lAf.Latantur  cum  fnalefecerin^ 

pag.-^^j.c.t. infin. 
Cíip.S.v.ij.  Ego  diligentes  me  ^di/igo^p. 
'i^yi.col.i. 
v.^o.&Qji.  DeleSiabarperfmgules diesy 
ludensin  orbe  terrarum:  c5  aeltcia  mea 
ejfe  úim  filijs  hominp!m,pag.  'XpG.c.i. 
Cap.  14.V.  1 5.  Rtfiis  dolore  mvfccbitur^f^, 
extrema gaudij  luUus  occupat,  P-  AZ7 
çol  I, 
Cap.2g.v.2  6.7'r^^í//i  mi  cor  tuummi^ 

hi,pag.  1 5rf  .£•<?/.  2 .  infin. 
Cap.^o.v.  16.  Ignisnunquam  dicit^Sf^ffi- 
cit.pag.'L'j2..c.\.infúi.t3feqcj. 
Ex  Libr.  Ecckíiaítcs. 
Cap.  I  .V.4.  Generatiopréítent ,  & grftéra- 
tio  advenit :   terra  amtm  in  <íte>  num 
ftat,pafí^.  ly.c.i  .infin.&  c.i. 
Ibià. Terra  amem  tn  xiernum  Jlat, pag^i 

Zl6.C0l.2.ÇSfi(^. 

v.f.  Ontur SeU&  occídit,p.ii6c.r. 
V.6.  Gjrai  per  Aíeridie?n,  ÇSfieHitnr  ad 

A^ailonem ,  Inflrans  nniveyfa  tn  ctr-^ 

cuitu^pag.-  i6,c.2. 
V.  I  o.  NihilJ .  b  Sole  novum  ,p.  i  t^C).c  2 .' 
Cap.2.V.  I.  Dixi  cgoin  cor  de  meo  :  Va- 

díim^  é'  ajjhiam  deltcijs^^  fruar  bcnis^ 

p^g,^7,J-col,i. 

V.  IG" 


riiiifirTii 


Lugares  da  Sagrada  Eferiturá^ 

V.io.  OmnU^ua  áefidemveytmt  ocfiU         fiiorfám.p.iSj.C.lAnfin.Ó' Cl- 
màyHonmgavíeí-s  :  nec  prohihi.  cor 
mcHm  quin  emni  volHpxatcfrmretHr^p, 

V. II.  Cftm  me  convertijfem  aã  univerfa 
.     omra^qmfecíratít  mantis  taça  ,  Ç3  ad 

labores^in  pinhas  frufir a  fadaveram  , 
•  vidi  in  omnibm  vamt atempe'  M^Uãio- 
.     f^ew attimi.píig ^'^'à.c.%.  uW;  ^i.:.  v- 

Ex  Lib.Cantic.Çantkor. 
,Cai5. 1  .V.7.  indica  mthi^  quem  diUgit  anL 

mameayubipafcas^ubi cabes  in  meri- 
- .  ^die^ne^-vagariinctpiampofigregesfoda^ 
.    êtim.tíidrHm,pAg.y:>7-^col.z.^'pq^.^^ 

■  .  p.'^'è'js.r.fnprmc. 
v.^.  Slígn0yaste,p.'7^oi.c.z. 
Ibid.  Egredere,  C5  abipofi  vefifgia  gre- 

gttm^O  pafie  hados tmsjuxta taberna- 
'  €Hta pajiemm,p. :^Qx.c.i.^feqq.  0" p. 
gS/.cz.  -      ' 

Gap.2.v  9.  En  iffefiatpofl  parietem  no- 
ftrum^p.x']'}^,col.'L'^íeqq. 

■  Jí>.  ia.  Flores ^pparuermt  m  terra  nofird , 

tempus putatíonis  advemt,pag.  540.  c. 
■i.infin. 
V.16.  Dileãrn  nfeusmihi^  ^ego  ilU,p, 
.  373  c.i. 

Cap.^.v 6QuaeP:  ifta,  í^m  afcendit  per 

,    defertum  r^ag.fQ^^.c.rdnfin. 

Cap.4.v.6  Vadam  admontem myrrha , 

ér^d  coUâmthuris,pag.i6^.coL  2.  & 

feq^.&pag.ijg.col.i. 

^.  7  Tota  pffkhra  es  arnica  mea ,  £?  ma^ 

çtãa  non  ejitn  te^p.ió^.c-^.  ^fiW-  : 

.^.H.Kem,Jponfa  mea,  veni  de  Líbano  ^ 

%iem  cor@naberis,pag.i^^.ç.i- 
'V.<^.  Vvilneraf^i  çor  meum^foror  meajpo' 
Jdj  vídneraflt  cor  weum,  p.i6^<C.i' 
Cap  f^v.i.  i^entat  dileãm  meus  in  hov 
mmfm^mi^^-^omdmfruãHmpQmoríi 


579 


Ibid.  J^eni  in  hortum  meun^ ,  foror  me  a 
fponfa^  mejfm  myrrham  meam,p^i6.J4» 
i.Ópag.iyS.çoI.z. 
-z/.!  I.  Coma  eJHsJjçíft  elàca  palm^ranf  » 
,  nigrdi  qptafi  çorvHs,p,zgz^ç.z. 
V.  1 2.  Lábia  ejus    dtfitlUntia  mjrrham 
primam^,  i  j^.cz.infin.  &feqq. 
Cap.7.v.7.. StÉúratua  ajfimilata efipd->^ 

m<e,p4g.^i6-c.i. 
Cap.S.v.)-  QMi!sèliifia,qua  afiendit  dé 
deferto,  delíá/saffiffens,  tnni;cafuper  du 
leãur^fnnm  '^.p.l^)^'C.  x.  ^ [eqq.  &p. 
^'^^xoWL.infin.d  (eq. 
v.ó.Fortís  efi  m  mors  dileBiê^pag.  560^. 

Ibid . DuraficMinfernus  (ímuUuo,  pagí 
loó.c.i.infin  & p.^6o.ç  i.&  ^. 
ExLibr.SapieiKiae. 
Cap.4.v.8:c^9.  C^Kí  mtemfmt  fmfu 
,hominis\^  (Htasfmeãmis  vita  immpi' 
çulatayp.x^2..c.i.infin. 
C^p.^.y.íEgo  dprmio,  é'Cormmmví' 
.gilat.fag.'2^^oxol.x. 
-&.  :^.  Fíenitentiam  agentes,  fí?  .pr£  angu^ 
fiiafpiritmgementesypag.^^.  coL  i.  íí» 

princ. 
Ibid.  Vicentei  intra fe,p.$^.c.  i. 
Ihid. Hifin/qfíos  habmmm  aiiquando 

inderifpim,&in  fimUmdinem  impro^ 

perij,p.ff.càf.i. 
Í/.4.  Nosinfitipui  ojitam   lUorum  (^sít" 

mabamus  infaniam^Õ finem  UlorHmf" 

ne  honor.c.Mce  qHomodo  çompmatifí^nt. 

inter  Ftlioiêei,  Í3tnter  Smttosfirs  ti- 
.  lorum eBjpag.f^. çoLiàn princ. 
í/. : X  Ergo  erravimus  k  viíi  vent.aiis  ,  p 

SolinteíligenÚAmn  eft  ortusnobis.pãg, 

^T^.colt.mjin. 
V.2.  ^iã  néis\pr.ofmt  fupcrbia  }pag. 
Oo  ij  53. c< 


,8, 

Vonò.Diviúamnjjahantia quid  contulit 

fiobis  ^pa^.f^.col.i.tn  prwc. 
V.  9.  Iranfierunt  omnia    tila  tanquam 

Hmbra,fag.^^.c.i. 
Ibid.  Tanqaam  n^intim  percurrens^pa^. 

v.io.Ettanquamnavis^^Ha  pmranjit 
jitU Plantem  aquim  :  cnjvii^  cumprate- 
rierit^non  efi  vefiigm  mvemre,p.f^.c.  i . 
i>.  I  i.Aut  tan^Ham  avis^qua  transvolat 
in  aere^  verberam  levem  ventum  :  ^ 
nHUumfignUrmtnvenmr  uineriiillm^ 
pag.^/!^.c.i.infin. 

V.  I  l.Aut  tantjriam fagitta  emijfa  in  loctt 

^efiinatií,  divtfus  aer  cotinuo  in  feredu- 

jks  efi,m  ignoreturtrãfttus  illÍHs^p.^\.c,z. 

V.  I  g.iS/c  <í3  nos natí  continuo  defivimus 

effè,  Z3  virtHtis  e^uidem  nullHmftgnum 

valftintHs  oflendere :  in  malignitate  ííh- 

temnoflra  confHmptifHmHs,p.^í:^.c,x. 

I  v.ijí^.Talia  díxerunttn  Inferno  hi  qui 
feccAvernnt^p.i^í^.c.i.. 

Cap.  7.  V.26.  Specnlnjine  macuU  Dei  ma- 

iefiatis,  Ç^imago  bonitatis  illius^p.'^  BJ-^-^-. 

ExLibr.Eccleíjaíticj. 

Cap. y.Y.y.Noltfie/-íJHdex,  nifivaleas  ir- 
YHmperc  intqmtates :  ne  forte  exttmef- 
çasfaciem  potentis^.i^-^.c.x.infin. 

Cap.  10.V.8.  Regnum  a  gente  in  gentem 
transferturpropi  cr  tnjuftmas^p.  1 8  .£■.  i . 

Cap.20.v.  29.  Sapiens  in  verbisproducet 


feipfHm^p.:i^^\x.\, 
Cap.24.z/,  I  -j.QuaftCedrm  exaltatajitm 

tn  Ltbano,p.  ^6o.c.  i . 
«'.  1 8.  Et  q.'^aJiCypre[Jiís  in  monte  Sion  : 
quaji  Palma  exaltatafum  in  Cades,pag. 

V.z^^ei  ed;:m  mc^adhuc  efurient :  (^ 
q'ub,  junt  ms^adhHcJinmt^  p.iji.c.i. 


Index  dos 

Cap. 48.  y.^.Qhí  rcceptfis  es  in  turbine  ig- 

nis m  currH  equo, h igneorn^  p.yCi.c. I . 
ExProphet.llaiae. 
Cap.2.v.4.  Conflabunt gládios  fuosin  VO' 

meres^^  lanceasfnas  tnf alces, p.^^.c.  I . 
v.ii^.Quid  efl  quod  debm  ultra  f acere  vi- 

ne£  mea,&  non  fect  ei  ?  p.^í^.c.z. 
C^p. 6. V. 1. Du.rbus  velabant  faciem  ejuSy 

(3  duabusvolabant,p.yji.c.z.  C3 p^g, 

^ty.col.x.CSfeq. 

Cap.7.v.i4.juxtaTcxt.  Hebr.  Eccey 

abfcondita  concipietyp.zj±x.x. 
Cap.8.v.3./^í?í:^  nomen  ejus  Accelera.fpo' 
lia  detrahere,F.ftmapradan,  p.  94.^.2. 
Cap.9.v.6.  Cujíís    imperiumfuper  hume- 
rum  ejus,p.<^^x.  I . 
Ibid.  Vocabitur  nomcn  ejus  Deusfortis^ 
?.94.c.i. 
Cap.  1 1  .v.G.Habitabit  lúpus  cum  agno,p, 
^6.col.i. 
V.  j.Et  leo  quaftbos  comcdet paleas^  pag, 
^d.col.i. 
Cap.  i^.v.  1 2.  Quomodo  cecidifii  de  Ca- 
lo^Luctfcr  "í p.i.zoxol.i. 
V.  I  g.  Qhí  dtccb,:s  in  carde  tuo  :    In  C<e- 

lHmconfcendam,p.2.'2.cx.  i. 
Ibid.  Super  afim   Dei  cxaltaho  foliunt 

meum,p.\<^j^x.i.tS  p.ix^.  c.  i . 
V.  i^.Simdis  ero  AlttJJimo,  p.  ^.  1 94 . c.  1. 

ÇS  pag.iz^xol.i, 
v^if.rcruntamen  ad  infirnum  deíra^ 
hêris  in profundum  laci,p.zz(^  c.i, 
Cap .  1 9 . V.  1 .  Ónus  iy£gypti,p.  1 1 2 .c.  r .  < 
Ibit].  Ecce  Domin^.s  ajccnd:tfupe  nu  bê 
levem,^ ingrediaw tyE^píu p .i^zc^x .  i. 
Ibid.^í  comov.  buntur  Jim::Uichra  ^/E-» 
gypti àfacie cjus, p.^z^  c.\.ÍS  fc.-jq. 
Cap.  g5'.v.4.  Ipfe  veniet,  (S falvabft  ncs^ 
pag.^i\xol.  I. 

v.b.7 mf  faltei Jlçin  çervus çlaudus ,  ^ 

aperta 


JMlMCjugjkiii 


Lugares  da  Sagrada  Efcritura^  581 

aperta  erit  lingua  mutoríí,  Õc.p.^^.c.  1 .        Cap.ó^. v.20.  Pueri  çentum  annorum^p. 


Cap.^S.v.ii,  De  mane  ufque  ad  vefpe 

ramfimes  me,^p.i\.c.  i . 
Cap.40.  v.4.0w«?.f  vdLis implebitur ,  (^ 

omnis  motis^\3  collishumiliabitur^fag. 

Cap.45'.v.i5'.  VeretHcs  Deus  ahfiondt- 

tHs,Deus  IJrael  Sahator,p.zy^.c.t. 
Cap.yg.v.ç^.  Novijfimtim  virorum^pag. 

izj.col.z. 
C^p.^H.v.^.  ínvocabís ,  &  Dominus  ex- 
audtet :  clamabis,  &  dicet:  Ecce  adjum^ 
pag.Q^zx.c.u  jnfin.^ c.x. 
Cap.f  9.V. i6.>Er  vjdit  quia  non  efi  vír\(3 
aportatm  eji^  qma  non  efi  qui  occmrat, 
pag.ií^^j.c.l.in  princ. 
V.  1 7.  IndmHs  efljufiitia^  ut  loricay&  ga- 
leaj^lutís  tn  capite  ejus :  indpitus  efi  ve- 
fiimentis  nhionis  ,  &  opertm  efi  quafi 
pdlioz^eh^p.é^Q.c.x. 
t/.  1 8.  Sicm  ad  vindicam  quafiad  retri^ 
buúonem  hofiibusfiis^^  viçijjitudinem 
inimicis  Çms  .p  ag.â^6  .c  .1. 
Cap.6o.v.  lg.  Etlocumpedummeomm 

glorificabo^p  .'ipj  .ç.  i  ànfin. 
Çap.óg.v.  I .  Quis  efi  ifie^qui  venk  de  E- 
-  kom^tinãis  vefiibus  de  Bofraf p .  iS^.r. 

1.&  feqq.^  p.l^y.C.Z.Ç^ fiqq. 
Ibid.  IfieformoÇus  infiolafua^  gradiens 
in  mnltitudine fortittidinisjtiâi^p.  iSy. 
c.z.infin.^  fiqq, 
Ibid.  Ego  qmloqmrjufiittam^Ç3  prO" 
pi^gnatorfím  adfalvanaum^p.  j  ^J.c.i. 
lf.2..Qi-are  ergo  nérum  efi  indumentum 
tuum ,  ^  'vefiimenta  tuaficut  calcan- 
num  m  torcúlari  ?p.i^j.c.i, 
v.':t^XorcHlãr  cãlcavifolm,  (3  de  Gentu 

bus  non  efi  vir  mecum^  p.  1 87.C.2. 
Ibi  d .  Afpeijus  efifanguis  eorumpiper  ví' 
fitmenta  mea,p.  1 88  .c.  i .  "^ 


TLt^o.coLz. 

Ex  Prophet.Icrcmiae. 
Cap.  í .  V.  1 3.  Ollamfuccenfiím  ego  video^ 
pag.^C)Z.c.i. 

v.i^.Ãb  Aquilone  pandetHrmakm  p- 
per  omnes  hahitatores  terríe,p.^^2.c.i. 
Cap.2.  V.2.  Charitatem  defponfationis tua, 
quando  ficma  es  me  tn  ^efirto,  p,  ^24. 
çol.z. 
Cap.  I  i.w.i^.Cogitfivertintfuper me con* 
jtlia^  dicentes :  Aítttarnus  lignum  in  pa- 
nem ejus,<3  eradamus  eum  de  terra  vi' 
ventium,p.z6'i^.c.  i  jnfin.^feq. 
Q2cç.i.':^M.iyEntafiieDem  e  vicino  egQ 
fiim,&  fion  Deus  de  longe}  p.':}7%.c,i. 
v.i^.  Cíeluw,&  terram  ego  tmpleo,  pagj 
7,'^S.c.i. 
Threnor.  Câp.  f  ,v.  19.  Torcular  calcavit 
Dominus  virgini filias  Itida^  />.  i SS.c.  i .' 
Threnor.Cap.g.v.  i.^<?  virvidensp^pt- 
pevtatem  meam^f.  1 6o.c,  i .  » 

í/.go.  SAturabkHr  opprobrijs,  pag.   141.' 
coLz, 
Threnor.  Cap.4.v.22.  Filia  Sion,  notp 
addet  ultra ,  ut  tranfinigret  tc^  p .  2 14. 
col.i. 

Ex  Prophet.Baruch. 
Cap.  3.V.38.  Pofihdícin  terrisvifiisefi^ÇS 
cnm  hominihus converjatus  efi^p ,  272» 
c.í.tnprinc. 

Ex  Prophet.  Ezechielis. 
Cap.S.v  .5'.  Et  ecce  idolum  zjsli  in  ipfo  m2. 
íroítu^p.  i  oj.c.  1  .inprinc. 
V.  1 1.  Etfeptuaginta  viri  de  fenioribus 
domus  ífael,  (Sc.fianttum  ame  ptãw 
ras :  ^  unusqmfque  habebat  thnnbpt" 
hmin  manu jua^p.ioj .Cl. 
V.  14.  Et  ecce  muUeresfidebant  pUngen* 
tes  Adomdem^p,  1 07  .c.  i . 


^mmmm 


582 

v.  i6.Etecce£jíiaJi  vigintl^mntjue  viri 
dorfa  habmtes  contra  templi^m  Domini, 
fag.ioj.c.i.inprinc, 

Jbiá.Eí fácies ad  Orientem:^    adora- 

bantadortum  S^lisyp.ioy.c.z. 
Cap.  I o. V.  1 8.  Egyefa  eft gloria  Domini  k 

lminetenfpã,p.  i  i^.c.z.injin.^fe^. 
Cap.i'^.v.f.N'&nafiendiflis  ex  adverfi 
(  aut  juxta  Text.Hebr.«<?»  afcendi- 
ftisinfraãuras^^  interruptiones  )  ne- 
£^fie  oppofHtflis  murumpro  domo  Ifrael: 
mftaretis  m  pralio  in  die  Domini^  pag. 
^^y.col.i.tnfin.&feqíj. 

ExPropher.  Daniclis. 
Càp.2.v. 2 T .  fpfi  mtitat  têmpora;  ^  Sta- 
tes :  transferi  Rcgna,atque  cShflilHit^p. 

,   i%.coLi. 

-z/, 2 1  .Ti'(3  fq^.  Th  Rex  videbas^  &  eC' 
ce  quafi ji  atua  una  granais^  (Sc.p.^/\'J, 
col\.infin::3  fqcf. 

Í/.34.  Abfcijfíis  lápis ftne  mmibm.p.ZoÇi, 
col.i.^  p.^\']  .c-t.inprmc. 

v.l^^.NnllHsque  locas  mventm  eftcis,p. 
2.06.C0I.1. 

Ib  id .  Faãus  eftmons  magnm,  &  imple- 


Index  dòs 

v.cf.Thrcfius  ejfUfflamma  ignís^pay. 

^yó.col.i. 
Ihid.Rot^  eJHs,  ignis accenfks^p.â^jG  c .  il 
v.io.  FIhvíhs  igneus f  rapidusque  erre» 


vitt  erram  ^p.íif^\. 


Gjol.z. 


C.ip.^^.-z/.  I.  Nabuchodonofor  Rcx  fecit 
fiatuamaurcam  alitudine  crd-hitorum 
fxagintay  dc.pag.:2^^^.cõl:  i.  C^ p^g- 
,  ^^J.col.t. 
v.gz.  Et fpecies  quartiJlr/tUts  FtUo  Dei, 
pag.'^0).col.z.inprinc.        '""^  ' 
Qà^.6N.i\.Porro  Rcxcogitahat  conJUtHe- 
re  eumjupcr  omne  Regni'.m\'p.^ i  J.c.  I . 
Ibid.  Fnde  Príncipes, é  Sair apa  quare^ 
bant  occafoncm,  vA  tnvemrcnt  Damcli 
ex  latere  Regis,  p^g.4.  ly.ci. 
Cap-7-V.2.  Etccse  quaí.'íor  venti   Cali 
pugnabaiít  m  m ar i  magno. p.yx.  i. 
fy  .8,  Cornu  parvHl4im,p.\<^)z.c.z.ffjfiK 


diebatur a  facie ejus, (Sc.p.íy^  i.c. I . 
'  v.li.  Afpiciebam propter  vJcem  fermo~ 
nnmgrúndiHm^  qms  cornn  illftd  loque* 
batiír,p.^c^7^.c.i. 
Cap.i4.v.:^4.  Babylonem  mnvidijÇS  U* 
cnm  nefcto  p.'2^^6.c.  1  .i»fin. 
Ex  Prophet.Ofee. 
Cap.2.v.i4.  Ducam  eamin  folitudinemi 
k3  loquar  ad  cor  ejMs.p.  5"  :^4.6'.  i . 
Ex  Prophct.Iotlis. 
Cap.i.v.4.  Reftàuura  cruca  comeàitlo' 
enfia :  refid'APim  locufia  comedit  bru» 
chus  rrcílduum  bruchi   comcdit  rubtao, 
pag.^f^.col.z. 
Cap.a  V.  1  o.  A  facie  ejus  contremuit  ter' 
ra^motifunt  Cdi :  Sol  i5  Luna  obtene- 
bratifum,(^  Stelk  retr>ixcrfíntfp lendo» 
rem  fuum.pag .  1 4^].  col  i . 
^'.  1 1 .  Dominns  dedit  voccmfuant  ante 
f a  ciem  excrcitusfeii  :  quia  mnlia  fimt 
tiimis  c afira  ejus^quiafortia,  \S  facie n» 
tia  veibnm eJHs^pag.\^.col.\. 
v.ix.  Magnus emm  dies Domini,Ç^ ter» 

ribilis  valde^pag.  144.C.  i  jnfin. 
Ibid.  Et  qfiisjufiímbit  cpim  ?  pag.  144. 

col.i.tnfin. 
VDU^.Nnnc  ergo,  dicit  Doininns^  conver^ 
timim  ad  me  ni  totó  corde  vefiro  ,  pag. 
Í^.C0l.Z.^fq. 

Ex  Propher.Tonas. 
Cap.:>.  V.4.  Adh;ic  qHodragiMA  dies  ,  CS 
Ninivefnbvertet:ir,pag.  145-.^.  i . 
Ex  Prophcr.Nahum. 
Cap.  I  ,V.  I   Onsís  Níni'yc,p.  i  1 2,c.  I. 

Ex  Prophct.Habacuc. 
Cap.:^.v.6.  Afpcxit,  5*  dijfolwt gentes, p. 
iLi^.ci.inprtnç,  Ex 


Lugares  dá  Sagrada  Efcriturar  58^ 

Ex  Propber.Zacharia:.  ^uavit  enim  Regnum  Ca{orum,p.  149. 

col.i. 
Cap.4.  V.  I.  BhHpís  efl:  in  defertum^ut  ten- 

taretíirkDiabolo.f.ii  i.c.i. 
v.íÇ.AJfpinip^i:  eum  Diabolíís  infdnElam 
Civitatem,  ^ftatmt  eumfmperpinna- 
cnlum TempU,pag.i  ii.c.z.  inprinc.  (^ 


Cap.6.v.i2.  Ecce  viroriens  nomenejpís, 
pag.^Sf.c.z. 

Cap.9  V.17.  ^md  bonumcjfis  ,  ^  quid 
pHkhrHme]Hs:  niftfr^mentíím  ekão- 
rfim,&  vintim  germinam  virgines,pag. 

Cap.  I  i.v.  17.  o  Pafior^^ Idôlfim  !  pag. 
^^xol.zàn  med. 

Ex  Propher.Malachiae. 
Cap. i.v.^.ii/í^í  amem  ódio habmyp.'y)'j. 
CO  Li.. 
V.  1  o.  Non  efi  mihi  voluntas  in  vobis :  & 
mnnHs  nonfufcipiam  dé  manu  vejha,p. 
1^6x01.1. 
V.M.  Ab  ortH  enim  Solis  ufcjue  ad  occa- 
fiim,  magnum  efi  nomen  meyi.m  in  Gen- 
tibíis,  ^  m  omni  loco  facrificawr,  ^  of- 
fertHr  nomini  meo  oblatio  munda,  pag- 
:   1/!^6.Col.i.<^  fetjq. 

Cap.4.v.2,  Etfmitasinpennis  ejus,p.^^ 
col.i.infin. 

Ex  D.Matth^eo. 
Cap.  i.v.  I  G.Maria,  de  qua  natus  efi;  fe- 

C^p.z.v.i.P^bí  eft,qm  natus  efi  Rex  Tn» 
dieorum  fp.fTLj.c.^. 
v!^.Iteí3  interroffãte  diliqenter  de  tuC" 

ro^p.^xf.col.ianftn. 
Ibid  .El  cum  invenerins ,  renuntiate  mi- 

hiypag.  ^1'jc.  l.in  fin. 
Ibid./^  ^  ego  vemens adorem  eum^pag, 

^1'j.col.i.tnfin. 
v,i'^.^fiqq.  S/rge^  ^  accipe  puerum^ 
■    O  marrem  ejus,  ^fi'!ge  in  fL/£gyptum , 
,    Ç5cpag.^  6S.C0Í.2.  m  pr-inc, 
V.  1 6.  ndens  quoniam  illfijhs  ejfet  k  Ma- 

gisp.^^S.CA.&feqq. 
Ibid.^  bimam^&  infra^p  Si.eol.  i . 
Cinp.'^.Y:Z.Pmfmfíim agite :  appropin-* 


pag..^' 


[^.c.^. 


1/.6.  Aíitte  te deor[tim,p.i i  i.c.i. 
v.%.Iterum  ajfnmpfit  eum  in  montem  ex- 

celfiim'úalde^t.l\\.c.'h. 
Ibid.  Ofiendit  ei omnia Regna mundi^ ^ 

gloriam  eorum,p.^'2,^.c.  1 . 
V.  g.Si  cadens  adoravéris  me^p.  2 1  \\c.  2  j 
V.  I  %.Mittentes  rete  in  ?nare,p.  f/^Sx.  i . 
Cap.^.v.  /^ly .  Qhí  Solem  [num  oriri  facit 

Cuper  bonos^S  maios. p.'i06x.  i. 
Ibid  .Etpluitfiiperjufios^^  injnfios^pag^ 

loGxol.i. 
Cap.6.v.  10.  Adiwniat  Regnum  tuum,p2 

I49.Í".  I. 
V.  19.  Nolite  thefíuriz.are  vobis  in  terra*. 

ubicerugo.^^  tineade?nolitur,&  ubifif» 

res  ejfodmnt,&  furamur^p.  45*^  .í-,2. 
v.roThefauriz.aieautemvobtsin  Calo: 

ubi  nequé terugo^^neque  tinea  demolitur^ 
■    Ç3  ubi  fures  non  efiodium.necfurantur^ 

pag4S^x.z. 
Câp.y. v.i.N'oíitejudicare,  ut  nonjudice^ 

mim,pag,Syc.i.inprinc, 
V.lJn  quo  enim  juÀicio  judicaveritis  Jh^ 

dicabimini,p.Sjx.i. inprinc. 
Cap.9.v.  8.  J^/  dedtt  poteflateni  talent 

hominibus.p.ià^jx.i.infin. 
Cap.  lo.v.y./»  viímgentiHm  neàbieritís^ 

p.'^QOxol.x.infin. 
v.x^-Si  Ratremfamilias  Beelz^ebub  VO" 

caverum:  quanto  magii  domefiicos  ejnst 

pag^ox.%.in  princ. 
VãèiMs  ergotimmrins  m.  Nihil  efitm^ 


í 


11 


efi  opertum^cjHodnon  revelabitur  j  <^ 
occiiltam,  cjf/õdnonfiiemr,  p.So.col.  z. 
inpmic.&fèc^. 
v.i^ .Nolite  ttmere  eos^qm occidunt cor- 
.    pus,  animam  autem  nonpojfint  occi-de- 
re  :fed  potius  timste  eum,  t^mpotefi  Í3 
animam ,  (3  corp%s perdere  in  gehen. 
nam,pag.'j%.c.  i .  tnfin. 
Cap. I  i.v.i.  loannesin  vincHlis,pag.  5*6. 
col.  I  .^[eqq. 
'v.yTu  es^cjuiventuruses^an  dium cx- 
peElamus}  p.6%.c.i.z5  p.^i<^x.i>infin. 
v.í^.Eantes  renunttate  loanm  ejHíeaudi' 
fiis,i3  vidifiiSypag.^%.col.  1  anfin.  & p. 

g20.í:.I. 

■z/.j.  Caci  vidcnt^clmdi  amhulant^  mor- 

tui  re/krgfint,p.6S.c.i.infin. 
V.  6.  Et  beatHs  efl,  cjui  nonfaeritfcanda' 

lÍK.atus  inme^p.G^.c.z.inprmc. 
V.  7.  ^id  exiflis  in  deferi  um  videre  ?  p. 

èg.çol.i.pag.f^^.col.l.tnfin.  ^feqq.^^ 

Ibid.  irnudinem  vento  agitatam  ?  pag. 

6g.c.z. 
-zf.S.  Hominem  moilibin  vefiitam  •''/'. 69. 

C.1..C5  p.'y'>^6.col.  I  .in  princ. 
'  Võià.Eccc  qni  molhbm  veíiíyrntptrjn  do' 

77nbHs Regnm  funt^p .^i^G.  cl .inp. inc. 
'v.<^  Prophâtam^p.i 08 .c.  i  .infin. 
Võ\á.'Plmqr:am  Prophetam.p.  Gc).col.z. 

^p.io^.e.i.infin. 
'v.iQ.  Ecc!^  ego  mino  Angelum  meum^p. 

6(^.c.zànfin. 
v.i  l\  .íoannes  Baptifla  ipfe  efl  Elias,  pag. 

I  íé.í-.i. 
Cap.  I  g.v.  28.  Vis  im(is^&  colUgimtts  ea} 
.  p.jiy.c.i.infin. 
v.i^o.  Sinitc  mraque  crefcere  ufque  ad 

mejpm^p.y  ^.c.zjn  prmc. 
v.í^^,SimíÍe  efi  Regnnm  Cdornm  thc^ 


Index  do? 

janro  abfcondito  in  agre  :  quem  qui  íh^ 
vêntt  homo,ahfcondity  & pree gáudio  tU 
Ims  vadit,íi  vendit  univerfa  ,  q^a  ha- 
bet^&  emit  agrptm  tllHmfpag.^ji  .c.  I . 
(Sfeqq. 
'«'.47.  S.igenâ.  mijfain  mare^pag.i^x.z. 

in  med. 
v.^i.  Ideo  omnis  Scriba  do^HsJtmilis  eji 
Patri-familias^  qmprofert  de  thefanra 
fm  nova,(3  vetera^p.  1 6o.c.  I . 

Cííp.i  y.v.z^.NonJiimmiJJíisni/íadoveSf 
quAperierunt  domjis  Ijrael,  pag.  200. 
co/.x. 

Cap.  1 6. V.  2 7 .  T/mc  reddet  unicniquefç. 
cnndkm  opera  ejus^p.i^G  i.c.i. 

Cap.  1 7.V.  I .  Ajfumpfit  lefus  Petrum  ,  Ç5 


lacobt4m,^  loannem^  ^  dnxit  tllos  in 
montem  exccljHmfeorfnm,  pag.  42 1 .  r. 
I.  (Sfeq. 

v.z.  Et  íransfiguratus  efianteeos^p.^'^!, 

C.l.&fiqq. 
IbiJ.  Refplendnit  fácies  ejus  p.cut  Sol,p. 

434.^.1. 
v.^'  Bonum  efl  nos  hic  cjfe^p.^'^^c.  i. 
Voiá.Factamfii  hic  triatabernacftia,  tibi 

finum,  Aloyfi  unum,  ^  Elia  unum^p, 

ófio.c.i.^z. 
Cap.  18. V.  10.  Semper  videntfaciem  Pâ' 

tris^qm  m  CccUs  eji.p.'^  t  i  x.z. 
v.zyQjfi  voUit  ratton-m  ponere    cnm 

fervislHis^p.áfi.c.  i. 
v.x^.Dccem  mdlia talenta^p./^%,c.  i. 
C-àp.lç).y .ij.X^id  ergo erií Kobií  ?  p.rg, 

ZOO.C.Z. 
v.zH.  Sedebitisf:pcr fedes  duodecim,  jf*" 

dícames  dttodecim  tribns  ífrad^ p.  200. 

c:Lz, 
Cap.20  V.  zi.Eicf!tfid.a»t  hi  dno  (ilij 

mei^unus  ad  dexierum,  (S  unas  adfm- 

firam  in  Regnç  tHo,p  .4 1  S.f.  2 .  tnfin.  Cjí 

fiqq.  Cap. 


Lugares  da  Sagrada  Eícritiira. 


Cap.  1  r,V.  19!  Nanejuam  ex  te  fruãns 
rtajcatur  ínfempiternum,  ^g^i^i  .co/.i^ 
iSp.-i^z.c.i. 
Cap.ix.v.  19.  Ofienditemihi  nffmijma 
cenjuí,p.  '^'^i.c.i.tnfin. 
v.io.  Cujfís  efi  imago  hac  ,  ^  [uptr- 
firiptiú  P^j.gxp.c.  1  .^fi(jiq. 
v.iiDicmtH  :  Cafrris.pag.  519.^.1. 

Ihiá.Reddite  ergo  quaÇmt  Cafarts^C^- 

fan:(^  quafmt  Dei,Deo,p.^6z.c.z. 
Cap.2g.v.2,5»/>ffr  cathedmm  M^jftfide^ 

rum  ScribA^^  Pharifsi.p .  1 98.C-.  i . 
v.S-Amant  antem  primos  recubitus  in 

CAnis, oprimas  cathedras   injjnagogiíf 

f.ago.c.i. 
'v.zj  .S:pHlchra  dealbata^p.  292.^.  l . 
Cap.24.v.29.  SolobfcHrabitur,  Ç3  Lufia 

non  dahit  lí^men  fuum^  (S  Sielk  cadent 

deCalõ^p.i\ox.i.  ' 

.  «^.30.  TuncparebitJignMmFilijhominií 
i   inCalo,p.z^^.i.i. 
Ihià.Tmc  videbunt  Filium  hominis  ve- 

nisntemin  nubibus  Cdi,p.^^.e.i.  fi?  2. 
^.43.  Nonjineretperfodí  domumfuAmy 

Cap.Xj-.v.  1 5*.  vnicmqtie fecHndum  pro- 

priam  virmtemjp.^'^.c.z. 
nj'\<^.Pofi mfiUíim  vero  temporis  venit 

Dominas feívorurn  iUoru^  & popiit  rá- 
-   tion em  cum  eis,p./^i  .ci.in  fin.^feq. 
<v.'\^.Venttebet}fdíãi,p.%7^.c.l.    , 
'O.\o.  Ouofidiyifecflis  tini  ex  his  frd' 

tribtis  méis  minimis^  mihi  ficiflts^  pag. 

q25'.r.i. 
1^.41.  Difceditekme  nidediãi  in  ignem 

4£trrnum,pctg,^z.col.t.  in prittc.  ^p. 

Gap.26. V.8.  V^í  ^Hidperdim  hxc  ?  />•  1 59^ 
Tom.7, 


o.  Opusemm  hnum  operata  efi  m 

me.pag.  ^y^.cal.z: 
v.zi.  dmendico  vohls  ^(^hía  mm   pe* 
flrâm  me  tr^dimrns  efí  f  ^ox.  i.[."/^ 
v.zz,  Nmqmd  egofum  Dominstp.Tpl 

co/.i. 
t/.i6.  Hocefi  corpus  meum,  p.  565.  c.x. 

infin.^  feíjq. 
v.-^i. Percutiampaftorem,  &  difpergeU'*^ 

tur  ovesgr€gis,p.z<^g.c,  I . 
•^.jS.  rt  videret finem^p .jG.c.z. 
V.  óc.  Blasphemavit,p.  14 1  .col.  x. 
V.  68.  Prophetiza  nobis  Chrtfie  :  Qnk 

efi  quite percuffií  ?  />.  1 1 ^X.  l . 
Cap.27.v.i3.^<'w  audis quanta  adver- 

Jumte  dicunt  tefitimnia  f  pag,   134. 

col.i. 
v.z\.Accepta  aqua,  lavit  manus  coram 

põpulo,dicens :  Innocens  ego  Jkm   àfan^ 

gUnejufli  hujuSyp.  6^x.z.(5fiq. 
V.  25-.  Sanguis  ejusjuper  nos  ,  pag^  66, 

cd.i. 
'Z/.34.  Dederunteivinuw  cumfelkfm^ 

fiHm,p.óf\lxol.z. 
Ibid.  Cíimgufiajfet,noluit  bihere.p.^^T^, 

col.z.infin. 
v.XJ.Et  tmpofuerunt  fuper  caput  ejufi 

caujamipjiusfiriptam,p.6i.e,  i.inftn, 

&  c.z. 
^.^z.SeipJun»  nonpotefi  falvMm  facere^ 

pag.i^ix.z. 
V  ôl^.Seduãorille^p.iàfix.z. 
Cap.iS.í/.  2.  Angelus  Domim  defcendk 

de  Calo^p.^^y  x.z.&feqq. 
VS'  Dixit  mulieribm,pag.^^j,  c.i.  ^_ 

Ibiá.lefum,  quicructfixuseft,  qumtis^, 
^fj.c,i.injin.&fiqq, 

Ex  XX  Marcoi 
Cap.2.V.i7.  fycobu Zebedxi,^  loannem 


Wê 


J» 


5^^  Index  dos 

fratrem  Taçohi:  ^  impofuit  eh  nomina. 
Bomerges^  qHodefi,  FdijtonitrHiypag, 

Cap.4..v.24.  In  qna  menfura  menJífíierU 

tis,  remetietnr  vobis,p  .46 1  .c.i. 
Cap.  6. V.  g  5-.  DefertHS:  efi  íocuSy  (Jc.  pag. 

f^f.c.z.íMprífíc.         - 
Cap.8.v.2.  Nechabem  qnad  wandHcent, 
p-f7,^.£.z.tnprmc\ 

'Z'.i\..  F'ndeillos.  quis  poterit  hrcfaturare 
fanibHs  infihtudim  f  p.  ^25-.  co.l.  2.  m 
princ. 
t/.8.  SMHraúliint.p.zj^.e.'l\.       .v 
«'.2.4.  Fidea  homines,v€ht  arbwes^am-^ 
hHJmtes,p.\-ii^.c.\.tnfin. 
Cap.  1 1 .  V ,  1 2. Èfíír/jt^p.^  I  ,çol,  I ,  mprtac. 
»'.  I  g . Síqiiidfone  mvmiret  m  ea^,  p.  21.. 

cot.  i, 
Ibid.  Non  enimerat  tempní  ficorum,  jO>^ 

3  i  .eol,  I  .p.ag.'ip..c.  I . ^;>.  5'4o.í-.  i . 
a/.  14,  £/  refpondens.dtxit  et  :  Iam  non 
Amplms  in  íeternum  ex  tefrPíãum  qmf 


quam  mAnducet^p.-^ 


.e.z. 


Cap.  í  '^.y,'^z.D'e  die  autem  tilo  nemo  fcit^. 
nsque  Angelí,  neqne  FUiHs,pag,  4x0.^:. 
lànfin.t^  feqq. 
Cap.  1 4.V.  g .  Simonis  Leprojl^p .  77  .c.  2. 
'Z'- g 3 .  C<^pit  pavere,  i5  tadere,pag.  183. 

col.i.infin, 
"V.i^/í^.Dederat  antem  tr aditar  ejus  ftg- 
num.  eis,  dicens :  Qy.emcumque  ofcnla.- 
tusftiero.  ipfe  efi. :  t.€ne:e eum^pag^^i.c. 
l.tnfm.^  feqq. 
Cap.  1 6.  v.^-.  Et  introeuntesin:  M,m^men' 
tum  viderunt jHvenem  fedentem  ,pag. 
S^^J.c.i.^feqq. 
*V.  6.  lefum  quA.  itis  NAZ.cirentHm  ^  cniçi'- 
fixjim^p .  5"  5: 7 .  c.  2  .in  pYinc.  Í5  fcqq.. 
'V.  10.  Pradicaverfim  íibiqtic,  pag.z^^, 
(o/.i.. 


Ex  D.Lnca. 

Cap,  I  .V.28.  Avegratia  plena,p.^oi.c.%', 
v.zç.  Turbata  cji  mjcrmone  ejusp.  1 84. 

col.z. 
v.  "^o.  ISTe  timeas  Maria,  p,  1 84.^.2. 
Ibid.  Invenifii, gratiam  apHU  Denin^  to 

403.^.1. 
'u.\x.  Dabitilli  Dominus  Dens  feder» 

Davidpatris  cjm :  ^  regnabit  in  domo. 

lacob  in  aternam^  pag, 96.  col.i.injin. 

&feq. 
v.T^f.Spiritus  S4nãffsjMpervenie:in  te^ 

pag.^oi.c.1.. 
'£'.37.    Qnianon  erit  impoffibile  apnd. 

Diumomne  verbftm,p.^6^.c.%. 
•z;.  3  o  .Fiai:  mihifecfindum  verb^m  tnam^, 

pag.  i84.<r.2. 
v.à^i.  ExHltavitinfansinfiterOy  p.  5*40- 

col.i. 
v.^j.jS.&fêqq.  Elifabethimplcfím  ejh 

tempmpartendí :  ^  peperit filiam.    Et 

ÁHÁierunt  vicini^  ÍS  iognati  ejas ,  quid 

magnificavit  Dominas   mifericordiam 

finam  cum  illa,  &  congratulabAnitir  ei^ 

Et  veneram  circuncidere pHeram^  ^c, 

v.ò-j^.  Miratifimit  uníverfi.pag.  5'33-  fv 

1..<^.  fe-cjq:. 
v.6f.  FattHsej}  timorfnper  omnes   vici* 

noseorfim,p.^'2^-:i^.c.x.  tnfim. 
Ibid.  Divulgabantur  amríta.  verba  hac^ 

pagj^.c.z.. 
^.66.  Fofiuertmt  in  cordejucy  dicentcs,  /. 

534.^.1. 
\h\á.  Etenim  manus  Domini  trat  cnf» 

illo,p.s^:i^à^.cA, 
t/.So.  Pner  antem  creficíbat^^c.  pi  542^ 

col  1. 
Cap.2.v,7.  Peprrit  Ftliíím  fiuum  Primo- 

genit.:?7J.^p.lb6'C.i.. 


Lugares  da  Sagrada  Efcritura 


^S; 


Olp.'!'.  V.  2,  Faílum  efl  verbnm  Domini 

Juper  loannem^CSc.p.  iii.c.i  .^  [e^^. 

'tv.\  Et  venit  in  omnem  regtonem  lorda* 

'  H/s,  prádicam  baptifmum  p^nit^nti^ 

in  remijJiawmpeccatõrHmy  pag.  iz  i .  c. 

•«/.4.  J^ox  cUmantisin  deferto,  pag.ivz. 

celi.infiK. 

Cap.6.v.  19.  Omnis  turba  í^aar&hat mm 

■   tanger e^  quiá  virtus  de  Uh  èxihat  ,  ^ 

ftnabat  omaesyp  .o^zi  .e.7..infin: 

•v.'Xp  .Nolitejudicare^  &  Konjffdicabi' 

•  mini:noUtecondemnare ,  &  non  con- 
âemnabimini,p,%G.c.i. 

Cap./.v.  "^.Líicrymis  c<£pxt  rigare pedes 
ejus^\3  capilUs  capkisfiutergebat,p.f^  i . 

COI.Z: 

^^-  39  •  Qi^fdpeccátnx  efi,  pag.^  5  .coi.  2 .  ^ 

p.iy^.coí.i. 
v.^j.  RemktPímur  eipeccata  mnlta^pág, 

Cap.S.v,  5*.  Exijt  quifeminát,  fiminare^ 

p^g.iiz.c.z. 
vil.  Sémen  efi  verbum  Dei,  pag.  1 22. 

€al.z, 
Cap,9,v.!^  I  .hieebant  cxcefum  ejus^quem 

<:ompletwruserMin  Jernfdsm  ,j!'.44i. 

'     €01.2,. 

«/,  5g.  Nefciens  qnid  Âiceret,  f.^^o.c.  i . 

*  ^.5*4.  Dómine,vis  dicimus^  ut  ignis  def. 

■cendat  de  Cds^  &  eenfumat  iltos  ^p^g. 
^j^.c.iinprwi:. 

Cap.io.v.  27.  Diiíges  Dcminum  Deum 
íuHm  extoto  cor  de  tuo  ,  ^  ex  tota  mi- 
ma tHa,&  ex  omnibm  •viribfís  tnis ,  (3 
■^x  omni  mente  ttfa^.z^^.c.'!.^  fiqq- 

'  ^. 59.  Et  h-uic^rM  firornomine  J\ãari^^ 

J>.S6S.C.2. 

ibid.  Qndí  etiam fedem feçns  pedes  2?^- 
'^ni,p.^6^,<;,idnpnn€y 


Ibiâ.  Atídtebat  veybumi/ãus,p.'^Sj.c.i. 
v.±o.  Domine,  non  efi  tihi  curdi ,  qmdfi- 

YOY  mea  reliqmt  ms  falam  miníjirare?  f^ 

iy).c.i.(^  p.S^^^.C.Z.^S  feqq. 
v./^i.Martha,Manha,(olicita  es  ,  ^ 

tmbaris  ergaplurima,pag.'^  lo.col.  i .  & 

c.x.infin. 
v.^\,Manaoptmam  partem  etegit^pag, 

'^io.c.i.(^p.'^6:^.c.i.&feqq.  -> 

Gap.  1 1  .v,2.  Advemat  Regnn/n  tuíim^^pl 

àf.if.lnBeehebfíb  Príncipe  Damonio^ 

rum  ejicit  tí^monia^p.  1 4 1  .c.i. 
Cap .  1 1 .  V.  1 9 .  Anima  mea  habes  mui  f/t 

bónainannosplfirimos,  pag.^fj^.c.x.íf& 

fin. 
vôjo.  Quáí  aniâmparaflí,  tujus  ermt}  p, 

45'6.ír.i.  .    ^ 

t/,^8.  SI  vmerit  in  fecunda  vrgilm^  &  jC 

in  UríídTJígiiia  venerit ,  &  tta  inveíie.^ 

rit :  beatifunt fervi  iUi,pag.  x8 1  .coL  i,; 

&feqci.         . 
i/.'ic^.  Quontamft  fçiret  Pater-familias l 

quá  horaffir  veniret ,  vigdaret  utiqke^ 

pag.'^i6.c.x. 
Cap.  14.  V.  i.Sabbathê  mandncare  panem  ^ 

ièiffi  obfirvabant  eum,p .  1 92.^^/.  i .  m 

fn. 
^.y\I)i<:ehatáHtem  &^d  invitatos  pa^ 

rabolam,p.  I94.C-.  1 . 
Ibid»  íntenãms  qmmedo  primos  accubi- 

tm eUgertnt.pag.i^T^.cd.i .  \3  p.  201. 

ç.l.infn.0'feq. 
■  i/.^.CHmpocaíHsfierisad  nu^tias,^€, 

pag.i^f.ç.i. 

Ibid.jEf  tm<:  inçipias  mm  rubore  novif 
.fimum  loçHmtenere,pag.\<)'yc.  i.xnfn. 
p.iz6.c.r.^.p.zz^.c.i. 

V. 10, Recumbein  nòviffmol^co^  p.i^i. 


" 


■«■m 


> 


58 S  Index  dos 

Ibid.  Amke^  afiendefnperÍHs,fag.  126,      C^p.zi.v.i^.  Eruntjígna  in  Sele^  ^  Lh' 


col.x.ÇSp.iz^.c.i. 

y.l!^.^  29.  Quis  ex  vobís  volens  turrim 

^dificare ,  non  prius  fedms   compmat 

frmptHs,  cjHt  neceffkrij  funt :  ne  ,  pofiea- 

,  ^Ham  pofuent  ffindantentumy^  non  po  - 
tHeritperjicere^omnes  qni  vident  ,  ma- 
piant illudere  ei ? p.^ii^.ç.i'     ■ . . / 

pap.  i5'.v.7.  Dic9  vohts^  cjuod  itagaudití 
,  tritin  Cdlofiíper  uno peccatore paniten' 

\     tiam  agente^  qukmfuper  nonagintano' 

\    vcmjuflís.qm  non  indigent  panitcntia^ 

'p.i%.Pater,damihi  por t tonem  pibftan» 
tia^qua  me  contmgit,p./^^y.c.  i .  í»jí». 

í/.  I  iJn  regione  longinqtíam^p.  45*7.^.  i . 
V.  1 8.  Pater^peccavi  in  CalHm,&  coram 

te,p.^^y.c.i.&  feqq. 
V.  ^  I  .FfUytufemper  memm  es,  Ç3  omnia 
,   mea  tnafunt^p^â^^-j .c.x.infin.  &fiqq. 
Çjãp.i6.v.z.Redde  rationem  vilUcationis 
jtHa  \jam  enim  non  poteris  vilUcare^p. 
'^f.c.i.mfin. 
k^.i^.Pater  Akraham,  miÇercre  Tsm,  Í$ 
mim  Lazjirumy  ut  intingat  extremum 
Àigiú  in  aquam ,  nt  refrigerei  linguam 
m€am,p.^i.l.c.'2..infin.^fe<jiq, 
.  v,irj.Í5  28.  Rogo  te  pater  ^t  mittas  enm 
in  domum  patris  mei:habeo  enim  cjmn- 
(^ue  fratres^Ht  teftetur  ilhs^ne  &  tpjtve- 
niant  in hfinc  locHm,p.^X'i.c. i .Ò/èqq. 
Cap.  ij  .Y  .T^j.ybicunquf fnerit  corpus  ^tU 
Ihc  congregabutur  Ú  aquiU,p.Zy0.c,z. 
Cap.  i^.v  .f  .DeJccnde,p.io^.c.l. 
•vAZ.Abijt  in  Regionem  longincjuam  ac» 

€iperejibi  Regnií,^  reverít.p.-^-m.c.  i . 
í;. lg.  Negotiamini  dnm  vcmojpag^i, 
€ol.z. 
v.ii.Serve  neqfíam,p./^z.C'Zf 


na,pag.Si.c^z. 
v.'^7,.CaIf*m,  0  terra  tranjibunt :  verba 
atitem  mea  non  tranjibum^  p.  i.c.  \,Ç3 

Cap.22.  V.  1  •j.Dividitc  inter  vos  yp.  248. 

col.i. 
V.  i^.Hoc  eft  corpus  meumtp.^o^.c.  i.  ^ 

pag.^$  3  '^'  ^  .tftjin.&feqq. 
v.lo.HtceftCaitx  novum  tefiamemum 

inJàngHÍnemeo,pag.j!^p^.  c.  i.p.  4.10. 

coÍA.t^p.  j6^.c.  I  .tn  prtnc.  (S  feqq.     , 
v.Zíí^.Quis  eorum  videretur  ejfe  maior ^p, 

i^f.c.i.^p-^iJ.ci.C^fiqq. 
v-Tfi.  Satanás  expetivit  vosjut  ribraretf~ 

eut  triticum,p.zf. Cl. 
v.^'i^.Prolixius  orabat,p.  i  y^.c.  i , 
v./S^.EtfaíiusefiJiidoreJHs/tcHt  gutta 

fanguims.p.  1 7 1  .c  i  .ÍS?  i.p.  1 71.  c.z.p, 

\  j^.ç.  I .  G^  z.íSp.  I  %^.c.z.infin. 
v.i^^.  Domine  .^fipercutimus  in  gladio  l 

p.^79  cz  infin. 
V.6 1  .Refpexit,pag.  1 25.C.  I. 
Cap.2g.v.2.  Subvertentem  gemem  «#7 

Jtram^p.\\\.c.z. 
V.  14.  Ego  nullam  caufam  invenie  in  ha* 

mineiflo,p.6\c.Z' 
v.z^Jefumvíro  tradidit   voluntati  eo^ 

rum,p.6^.c.z. 
v.g4.  Pater,  dimitte  illis  :  non  tnimfci^ 

nn  t  qutdfi  cÍHnt,p .  g  5  .«"•  I . 
v.^T^.Hodtemeçumerii  inParadrJo.pa^ 

^lo.c.z.infin, 
Cap.i4.v.  I  iJpfa  die,pag.  299.^.1. 
Ibid.   Staaiorumfexaginta^  P''£- '^9^ 

col.z. 
V.  1 5.  ípfe  lefus  appropinquans  ibat  CHta 

iUís,p.z99  Cl . 

Ex  D.Joannc, 
Cap.  I .  V.  I  g.  Qui  non  ex  fanguinibusjèd 

ex 


^í^ 


Lugares  da  Sagra 

(ol.iJnfin-.pag.x^^.colA.^leqq.'^?. 
Ihió.Et  habitavit  in  nobts,pag.^^z.c.u 


Ihiá.EtvidímHsglor^íim  ejus,  gloriam 
qt4aJiFmgemti.à  PMre^  píemmgram, 
^veritatis.p.TL-}  '2^.c.  i  .pag.  585".  col.  i. 
in  princÔ  pag4'i.6.c.i . 

^.16.  De  plenimãine  ejusomnes  accrpi- 
\     WHs^  ^  gr  a- Um  progfMta.p.  585".  c.  i . 

v.i^.  Sacerdotes  j&  Levitas^ p.%<^.c.l. 

Ibid.  Tfí  quis  es  ?  />.88.(r.  i  .^  feqq.  pag. 
izy.c.z-in  pritjc.^  p.f^^.c.z, 

V.  20.  Et  confejfus  efi^^  non  negavit:  & 
confejffis  efi  :    Qtiia  nonfum  ego  Chri- 

flHS,p.97,.G.l.^Z.^p-lOl.C.X.(^fi^q. 

v.^i.Elus estti  } pag.ioi.col-zanfin.d 
fiq.&p.ioS.c.i. 
Ibid.  Nonfim,pag,  iox*coii.  ^pag, 

Ibid. Propheta  es  ttt  ? pag.io^.  c.  l-pag. 

\OQ.C.\.(Sp.ll$.C.l. 

\h'\à.Noi9,pag.  10^  xA. 
v.iX.Qíiiddtcis  deteipfo ?p.SS.col.i.& 
feqq. 

v.i^.Ego  vox clamantis in  deferto  ,  pag, 
ii^.Ç'i'mfin.p.ii6.c.z.^  f.iiy.c.z, 

f    »»/». 
i/.z6.Medm  veftrumfietit,  quem  vos 

nefiitís,p.ici.c.z. 
v.i8.  Híecfi5lajHtJttram/ordanem,p. 

lOl.C.l. 

Cap.-^.  V.  19.  Lux  venit  in  mundum ,  ^ 
dilexerum  hominesmAgis  tencbras^quã 
lucem,p.6t.€.i.<^z. 

v,Z^.§í^habetJponfimi^onfas  efi:  ami^ 
cus  ante jponji gáudio gaudet^p.^l  S.f.i. 

v.^a.  Illnm  oportet  crefc^re ,  m  ±^t^_ 


da  ECmtun,  fSp 

minuiipag.j^f.c.í. 
Cap.4.  V.  30.  vi//;  labor averHnt,  (3  vos  in 

labores  eorít  introifiis,p.i\.6j .c.  lànfin. 
Cap.c.  V.  1 7.  Pater  meus  ufque  modo  ope-^ 

ratttr:^ ego  operoryp.'2^\^.c.i.      ■         - 
V. zz. Pater  omne  jHdiei'^m  dedit  Filio,  p. 

60.C.Z.&  p.6 1 .  c.  i.inprinc. 
Cap.6.v.2.  Seqtfebatur  eum  mnltitudo 

magna^quia  videbantfigna^  qudLfaáe- 

batjuper  his^qui  infirmabantur,  /-^^-o. 

col.z.infin. 
V.')-  CfimJkblevaffH  óculos  lefus  ,  ^  vi- 

dijpt  qtiia  mnltitudo  máxima  venit  açl 

efim,p.'^zi.e.i. 
«z/.io.  Dijcubuerunt  ergo'  viri  ,  numera 

quafi  quinque  millia,p .  52 1  .c.  i . 
v.  iz.SHperaveruntfragmèta^p.zyi  .f .  r.^ 
v.zj.  Operamini  non  cibum^quiperit^feã 

qtiipermanet  in  vitam  aternam  ,  quem 

Ftlkis  hominis  dabit  vobis^p.z'2j  x-z,^ 

feqq. 
Ibid. Huncenim  Pater fignavit  Demypl 

Z'ipx.zA3feqq. 
v."!  I  .Patres  noftri  maducaverunt  Man^ 

nàindefirto,p.^^fX.i.^ 
v.^Q'Hic  efipanis  de  Cdo  defcendens :  ui 

Jiquis  exipfo  manducavertt ,  non  ma*. 

riaturp.x6f.c.i, 
v.f^.  NtJimandHcaveritis  camem  Filij 

hominiSy(S  biberitis  ejusfanguinem,  non 

habebitis  vitam  in  vobis^p .  1^9. É^2, 
V, ff. Caro  mea^vere  efi  cibus,p.z^7^x.JÍ 

ínfin. 
v.f^.Qffi  manducai  me^  (^  ipfi  vivet^ 

propter me,p, ^T^^x  2 . infin. 
v.f^.Hic  efi panis,qHÍ  deCdo  defiendit^ 

p.l'^lX.i.^feq^.^p.ií^S9-^'^' 
Ibid .  ^í"  manducat  hunc panem,  vivet 
.  inaternum,p.zf^x.j.&fiqq. 
vJSi,Hoc  i)osfiandaHz^tf  P'  ^^o.€.^. 

v,6y 


i) 


'     ■      Index  dos 

cvno  vUcrith  Fílium hominis  af-         fwnem  <.mdmmfâeiemHS, ;>.5 8"i xol.  i 


■  590 
^'.6^.  Si 

^  céadentcmuhí  eratpyim^  p.ZiSp.c.z. 
■V  .6^^SpíritHsj(i^qm  vivificai :  caro  non 
■  prodeftqHidqHamyp.ià^o  c.X.é^feejaf. 
Cap.7.v.54  Quibreúsm^^ér  ^^^  invcniâ' 

'  íís,p.i^6.c.i. 
CiLpM.v.ii.Etin peccati>  vefiro  moris' 

7?tÍHÍ,p.l^6.C.l. 

w  /\.S. Samaritanas  estUy<3  Damonium 
hahes,p.i^i.c.2. 
Cíip.9.V.i.   Rabbi^quispeccavit  ,hic,aut 
parentes  cjus^ut  caçus  nafçeretur?  p.Si, 

Cap.io.  V.  ij^.  Ego  fum  Pafior  bmus:  é^ 
cogn'ofi:o  oves  meãs  y  ^  cognofcfim  mi 

Gap. I  i.v. I  i.Laz,n-ru:amícm  mfierdoT' 

mit^p.\o^<c.\jnfi}i.&  eol.i, 
f.14.  LAz^cirtts  mortuuseft.pag.Llo^x.l, 
infin.^  col.z. 
^47.  Qjiia  hic  domo  multa  fignafacit^ 
'  'P^^  6^-c.l.infiíí, 

'  ■©'.  48.  Vement  Romani^  ^  toUent  noftr» 
'  iocHm.p.íipx.i. 

Cíip,  12. V. IO.  1  i.'^/cqíj>  Cogitaverunt 
Príncipes  Sacet-datí-i^f^  tit  Í3  Laz.arum 
imcrficeyent^&c.p.foS.c.  I  .&fi^^q. 
ij.l2.Hofiííinafiiío  David,  p.^i^.c,i. 
^'.1^.  Eccemundus  tatus  ^ofleum  abtjtj 
p.09  c.l.inprinc. 
Cap.  I  ^.V.iS.  Hoc^utem  ncmofcivit  dif- 
•  €HmhentíHm,p.^^o^^.iJnprtnG.  & coL 
l.l^feqq. 
C:\v^i ^.Y.z. Fado parare  vobis  hçnm^  p. 

I99.C.2. 
■'í/.  1 2.  Opera  qna  ego  facio^faciet,  ^  ma- 
iorafaciet :  qnia  ad  Eatrew  vado,  pag, 

'V.i'!.  Si  quis  diligit  me.fiermonem  mcum 


ihfin.<iy  fcq. 
Cap.ij.v.  lg.  Maioremhac  dileãionem 

nemo  haht,p.^^^.c.x. 
Cap.  16.VM4.  PetiieÇ^ accipietii,p.'^iz, 

col.i. 

Cap. 1 9. V.  12.  Si  huKçdimittis ,  non  et 

a-micus  Cifaris.p.'^i  9  r.i.  infin. 
v.i6.  Mulícr,  eçcefilmstuHs.p  409.^.1. 
'Z/.g4.  LatusejHs  aperuit.p^^^Of^.col  i. 
lhió,Exivitp.nguis,&  aqua^pag.Gô.c.Z, 

p'lji .cqL I .tnprinc. ^ col.z.  ^^.409. 

col.z. 
Gap.zi.v.r^.Etfiimus  quia  verum  efi 

teftimoniu  ejus.p.^i  i  .c.x.mfin.  ^  fiq. 
V.  i^.  Simon  loannis,  diligis  me  pias  htsf 

Ibid.Tufiis  qpiia  amo  tep.  ?og.f.i, 
Ibid  Pafce  agnos  meos,p.::^o^c.  i, 
'^'.  I  y.Dícit  cí  tertí0,p.  ^04  í".  i. 
Ibid. Pafce  eves  meas,pag. '^c^.cffl.  i  m 

fin-é-fiq- 

■V.ZO.  Converpís  Petrus,  vidit  ãlum  diÇ- 

€ipulum,  quem  diltgebat  lefus  ,feqMn^ 

■tcm^p.^C^.C.l.&  feqq. 
Vo\ò.  Qui  & recubutt  in  c£fiAfuperpe- 

ãus  ejusyp.^oó.-coLz.^  p^g,^z  1  c^2.  i* 

fin. 
\h\á.  Et  dixit  :  Domine^qaisefi^quitra' 

Àct te fp.c^i^  col.%.^  pag.iigZic,x:in. 

fin.&fcqq. 
v.Z  I .  Domiíie,  híc  amem  qmd  ?  p .  405*, 

C.\.^  l.^p.^l.^.c.Z.afeqq. 
v.zz.  Siccumvolo  mancre  d9nevveni%^ 

quidadte} p.j^0yc.i.& Z-  ^  p.  414," 

4:.Z.  ^  fcqq. 

Ex  Libr.A6luam  Apoílolor. 
Cap-l  .v-^  Et  nubes  fvfccp:t  eum  nh  e:u- 
Jis  eorum,pag.7.j  j^.coL  i. 
/crví^bit,^  ad  enm  venismHs^p  mm-       ^.z^.Vt  abirft  in  lGCMmfuffm,pag.  a  o  r , 

ç^i^  "^  .Ca?. 


Lugares  da  Sagrada  Efcríttira?  fp  í 

Cap.^.v.i y.SciO'<jtíiai>er  ignorantiamfe-  detn accipiet  fecmdHmfmm  laborem^, 


cifiís^Jicut  ^  Príncipes  vefiri,p.'^'i^.c.i. 
Cap.i^.v.ii.  f^ocabant  Burnibam  ,  fo- 
V27n :  Paulmn  vero-,  Aiercurmmypag. 

Ihid.^oma??^  ipfe  erat  dtix  verbi,  pag. 

Cap.i.7.v.28.-^  ipfaenim  vivimuSy.  ^ 

movemury&fHmm^p.x/^i.c.x. 

Ex  Epiír;D.PaLil,ad  Romanos. 
Cap.i.v.  1  .In  ciuojMdicas  aherum  ,  teip- 

fitm  eondemnas.p .  8  6.  col.  i ,  iujín . 
v.í^  An  divitias  bonitâth  ejm ,  é^  pati- 

entí£,&  lo-nganimitatis  contemnis^ pag. 

lô.c.t.mfim. 
v.^.  Secundam  amem  duriíiam  tuam^^ 

impanitens  cor,  thefa,Hriz.as  tibi  iram ,. 

in  dte  ira,,^  revelationis  jufli  judiei} 
'   Det,p.z6.c.z  infin.&fe(j^. 
Cap.8.  v^i6.  rppenim Spmtustefiimonm 

redditfpiritíii  noflra  ,  ^mdfíímus  Fdlj 

Dei,p.:2,'/6.c.i.. 
V.  1 7.  Si  OHtemfiUj,  &  h^rcd^s ;  hteredes 

qnidem  DW,  coh^eredes  autem   Chrifii : 
,  Ji  tamen  compatimur ,  m  &  eonglonfi- 

cemur.pag.-^jGx.i. 
"^•^f-  Qji^^^i^go  nos feparabit  k  charitate 

ChriJíí?p^'^'j6:c'-2. 
Cap.p.v.^.    Optabam  eggipfe  anÀ.hsma- 

ejfe  à  Chrífioprofratabus  meis^quiftint 

cognati  meifecundumcarnem,  p.  278. 

col  A. 
Cap.i  i.v.g^.  Quam  incomprehenjihilian 

funt judiem cjus  \p.Tl.c.  1  .infin. 
í/.ç^f.  Aut  quis  prior  d^dit  illi^  &  retri- 

buetíir  ei}  pag.c^^^.c.i . 
Cap. 1 5'.v»i9.. EvAngelium  Chrifli,pag. 

257X.1. 

Ex  Epiít.  I  ad  Corintlr. 
Cap.g^.V.8.  FhusqxifqHe propy.iam  merae- 


p<íg.^6i.e.i,infii. 
C^p.^.v.^-Nihil  mihi  confcius  fum  ,  pag, 

i^c.i.&  2. 
\hià.Sednon  inhocjufiijica^uspim :  qui 

autemjudkatme^  Dominus  eíí,pag.i'^, 

col,x. 
v.^.Notitemte  tempHsjudicaref  p  JJ^c» 

1  .inprinc. 
Ibi d  .QHpadufque  veniat  I>ominus> ,  q^ã 

Ç3  illHminabit  abjcondita  tenebrdmmg 

pag.'^^x.iànfin. 
Cap;7.v.29.  Fi  &  quihabent  ftxores,  ta* 

quam  mithabentesjtm.,p.'^x^t-^feqq:.; 
'U.'2pEt quiflent^tanquam  nonfienies  t 

&  qui  gaudent,  tanquam  nongauden" 

tes  :  &  quiemunt  ytanq^ammn  pojji'^ 

dem-es.pag.;^  c.z.&fiqf. 
•y.^i.  Et  qMUtuntur  hoc  mundo'  ,  tan^ 

q>tam  non  utantur^p.'^.c.x.&fiqq. 
Ihiã.Pr^terit  emm figura  hujus  mmtdi^ 

p.â^c,i. 
Cap.p.v.  14.  Gmnes  inftadiocurripmifeã 

unus  accipit  bravmm-p .  2  o  ^.í".  i . 
Cap.io.v.ii.  O mniain figura,  conúnge^ 

bantitliSyp,iS'^.€.i. 
v.iz.  Quifieexifitmatfiare  ^  v.ideat  n& 

cadat,p.zi^.c.z. 
Cap.  1 1  .v.2g. /«  qua noUe  tradebamry/p^ 

a45'.c.2..,..r, 
^^.24.  Hoc  ejt  corpus  meum,  qftoâprom^. 

bistradetur^p.^Gi.c.z.itiprinc 
Cap.i 5.V.7 .  OmniafifjJrert^p^2.6S'^,%^ 
Ibid.  Omnia  credit,  ommaJpsrat.yOmnm 

fiíjfinet^p.-^ix.cz. 
^'.  1 1.  Cumejfemparvulks',  kqúeBm!  hU 

parv--4lm,fapiebam  m  parvulus.,cogiía^ 

i>am Mparvulus-.  ^iuando-auiemfaãu^ 

fiim  vir^  ev-ãcuavi  quiS  crantpaxv-HB^ 


\ 


í 


^92 


rrnjn'/     indexdos 


Cap.i5'.v.io.  ex  addir.  KcchC  Gratía 

ejm  in  me  vdctia  non  fnu  ,  fed  gratia 

eJHsfemper  in  me man etjp.zy^.c.  2.  in 

fin.à  feqq.^  />4X4.c-.l.  tHpnnc.^ 

*:/.  2 1  .jQjfottdie  morior^pag. 2^ 3 •^•'i .  ^ p- 

^ói.c.z.in  princ. 
•z/. 4 1 .  Alia  c Untas  SoUs.alia  çUritas  Ln- 
n^^&  alia  claritas  Stellam.  Stella  enim 
àftella  dijfen  in  clarita^e,p./\.6i.c.l. 
V.  \6.Non  prius  qmà  [pintuale  efi ,  fed 
qmd  animakydeinde  qnod  (piritmle,p. 
289.^.2. 

Ex  Eoift.i.ad  Corinth. 
Cap.2.v.  M.Evartgelium  Chrijii^  P-'^S7' 

col.l. 
Cap.g.v.iS.  J claritatein daritatemj p^ 

0^16. Ci-in  princ. 
Cap.f.  V.  15".  Pro  omnibHs  mortnus  efi 
Chrifipis,p.\6\,c.\. 
v.z I .  ^i  y^on  noverat peccatHm,pro  no- 

hispeccam?nfecit,p.^^z.c.  i  .^  feq^ 
Cap.6.^^  i .  Ne  in  vacuum  graiiam  Dei 

recipiatis,p.zj2.c.i.^fip. 
Cap.9.v.  6.  O/iiparcefimtKat ,  parcè  ^ 
■    meíct:^  qmje?7}inat  m  benediãioni- 
bus,  de  benediãionihus  (3  metet,p.^6l, 
col.  i  .infin. 
'V.  I  "i^.Evangelium  Chrifii,p.Z^j.c.í. 
Cap.i  i.v.'l.^-Qj4Ísir,firmatHr,& cgomn 
infirmar"^.  Qiiisfcan dalizjttnr ,  (5"  ego 
non  HYor  ?  p.^ó^.c  i  .in  ^nnc.  &  c.z. 
Cap.i2.v.4.  Audivit  arcanaverba,qu<e 
non  licet  homini  loj!íi,p.í\.zz.c.z, 
Ex  Epift.ad  Gaiatas. 
Q-xv).i^.v.Z'^ .  Spiritu  vivimns  ,fpiritu  ^ 

amb'Mem'^Sy  p.1âf'yC.  i . 
Cap.6.v.  14.  Mihi  mundus  crucifixus  efi, 
^  eoo  mundo.p.f^i^T^.c.iin  p,inc. 
Ex  Epilt.ad  Philíppcnf. 
Gap.i.Y.ó.C^  -j.Cnm  informa  Dei  efièt  ^ 


non  rapinam  arbitratus  efi  ejfefi  épejua^ 
lem  Dco,t:^c.pa7.X'^\,.c9l.x.(S  feqq.  (^ 
pag.ZT^^.col.z. 
Cap.4. V,  1 2.  Seio  abfíudare ,  (Sfciv  efifri- 
rejp./^d^.c.z. 
V'i\  Ommapojfum  ineo ,  qui  me  con* 
fortat.pag.xi^.c.i. 

Ex  Epiíl.ad  Colofleníès. 
Cap.  I .  Y.xo.Pacificansperfanguine  Cru* 
eis  eJHS,  five  qH4L  in  terris  ffive  ^ha  in 
Cáílís,p.i6^.c.z. 
Cap  g.v.^.Afí^rm  efiis:  C3  vita  vefira 
efi  abfcondita  cum  Chhfio,  in  De9,pag, 
27f.c.  1.CÍ2. 
1/.^,  Cfim  Chriflus  apparuertt,  vita  ve^ 
ííra :  tunc  C^  vos  apparebitis  cum  ipjh 
ingloria.p.zy^.c.i.^  fiq. 
ExEpiít.adTitum. 
C^ip-Z.v.  I  '^.Expeãantes  b:atam  fpem,  & 
aâventHmgloriA magni  Deiy  pag.yjo, 
CdLz.&feq. 

Ex  Epiíl.ad  Hebrícos. 
Cap  I .v.i .Novijfime locutus efi  nobis  in 
Fílio,p.z^6.c.i. 
v."^.  Qui  cumfi:  fplendor glori<t  ,  ^  fgt^ 

raffíbfiantia  ejus,p.'^fo.c.l. 
V.  1 4.  Omnesfunt  admimfiratorij  fpiri* 
tus  in  mmificrium  mijfi,p.  3 1 1  .í"  I- 
Cap.4.v.  1 6.  Adeamus  ergo  cumfiducia 
adthromímgratiâi  :  Ht  mi(eríC9rdia?n 
confequamur,  ^  gnniam  -nv^niam^s 
in  auxilio  opportHno,p./^  2.  c.z. 
Cap.6.v.6.  Riirfam  crticifigentes  Filium 

Dcip.^ox.z. 
Cap.7.v.iT.  Translato  enim ftccrdotio  ^^ 
neceffc  efi,  Ht  çj^-  Icgis  fausLuw  fiat,pAg. 
Z^  i.col.ijn  fin  .0  feqq. 
v.ZT^-Et  alijqiiidem  piares  faãi funt  Sa- 
cerdotçs^ídtirco  qtíod  morte proh^berin~ 
t»rpermanc}e,pag.xfz.col.  i . 


,v 


Lueares  da  Sagrada  Ercritiira:  f9^ 


íttermm,  fempkernum  hde(  fic^dd 

Cap.ç.v.  1 1 .  Pontrfexfamyt^irttm  hmra, 

G'4.  lo.v.  I4.^w<«  9lfUtione,c(íHfrnímavà 

infempííertmm/ànãíficatos^p.tS^.c  i . 

Í/.19.  ^f  Pilíffm  Dei,  conculc(!iverky(S 

■ .  Jàngmnemteflamenú  follmam    dum- 

rity  in  quo  fanãificams  efty  ^  ffirim 

•  ■  gráúa  contHmtliamfecerit^f. ^00.6,1. 

Cap.  I  KV>  24.6c  2^:  Mojfes granas  fa^ 

Uhs  negavitfe  ejfefiíium  fdiA  FbaraU' 

vis :  magis  eligem  affigi  vum  pepul» 

Cap.  n.v.  1 7.  Ohedite  Prafofins  veBns^ 
ÇSfubjaceteeis.Ifji  enim  pervigHant , 
i^mji  rnmnm  po  animahis  vesím 
reddtíHrí^p.lfi.c.l. 

ExEpift.J.D.Petri. 

Cap. i.v.^.ÔC 4..  BehedtBíís Deus,  &P^" 
terDommmftri  Tefii  Chriftí  ,  qui  fe- 
4mdum  mifeníordiamfmm  magnam 
reireneravit  nos  in  hícreditarem  incor- 
mptibilem^^  incontaminatam,  &  im- 
marcifcibilem,  cmfervatam  in  CaUs  in 
vobts^p.-i^^ZX.iÃnfin.^  feqq, 
v.J.AumTnquoÀper  ignenf  prob^tur.p. 

?/.8.  Quem  chm  mn  vidsriíis  ,  diligiiisy 
vag.'iiz.c.z.infii. 

Ex  EpiJb:2.D.Petri. 
Cap.  1.V4.  Per qHen^^tnAxima,^ pretio^ 
(â  nobis promi[fa  dimavit :  fitperhíscef' 
ifciamini  dtvin^  confortes  na:ur^,  pag. 

%i.  I o.  Fratr es  Jat agite,  utper  b&na  opera 
€enar/i  vefiram  vocationem,  &  eleíiio' 
4í€mfaciatis,p.  1 1 9.<?.  i .  £5*  feqq. 
Ex  Epift.i.D.Ioanu% 


yabemMs-amd  Patrcm.Iefitm  Chrifinm 
•  jHftum,p.i^'è.c.x.  .  ; 

Gap-.'' .V.  1 .  f^tdeíe  qHítlémcharitatem  de^ 
.  ^dit^mbis Pater  ,  «í  fil^j    Dei nomine- 

míir^&Jtmus.  Propterhoc  mund'isn(n^- 
^  'novit nos:  quia nonmvit mm, p.TJ^. 

çoL%.infin.êfeqq.  r      ■  ^ 

"^^.í.  Oftoniamifidebimus  mmpcuticjtt 

^.281. Cl. 
'      '    Ex  Libr.Apocalypíis. 
Gap.T.v.14.  OquH  ejm  tanquam  fiam* 

ma  igms,p.^'j€.c.x. 
V.16.  GladiHsutrâqpte parte  acHtus,  pag. 

143  .c.x. 
Cap.4.v.6.  Ante,^retrKp.'2^%$.c.x. 
v.j.  EtqaartHm-  animal fimile   aquik 

mlanti,p.'^%S  ^^'^• 
v.lO.Mittebamcor()nasfiias  ante  thro" 

num^p.^^^^-c.i.infin: 
C'X^.''^  .&'  Agnfimjianten^  tanqmm  oc* 

oípim,f  .1%^.C'  I  .^  i- 
«^.  9  .Cantabmt  cant.icmn  novtím,  p-^'ifi. 

(j.i.infin. 
v.ii. Dignui  efi  Agnm, qm  (fccifm efi, 

Mcipere  virtmem,  ^  divinitatem,  pag. 

%'^^.c.i.&feqq. 
C^p. ó.v.^.Fídifiíbtmaltare  animas  in* 

terfeãoruntprpptef  verbftm  Dei^.z^S. 

€.%.infin.&fiq. 
V.  iz.  Solfa^Hs  eíí  niger,  tanquamÇai;-^ 

cuscilicinm.p.SS^  c.'2..infin. 
Capj.v.iy.  Et  abfiergn  Deus  emnem 

laçrjmam  abocuUs  eorum^.ò^i^.c.  i . 
Cap.i4.v.4.  Virgines  enimfunt,    Hi  (è- 

mtmtur  Agnnm  qmctínqíie  ierit.fag^ 

goj-.í-.i. 
í^.ó.  Habcii^em  Evangelium  tíernum,  pt 

l^ó.c.Z.infin.&feq. 
^.  j.QMía  vmt  horajfidkij  e^u,  p.  i^y* 


í 


f94  Index  dos 

Cap.  19.V. li.  Etmtapiteejusdiadema'     Cap.2 

ta  míííta,p.f^g.c.í.én  prtnc. 
Gap.  10. V. II.  Et  vidí  throriHm  magnum 
.IgOfiàiÂnm,  (3  fedentemfuper  eum^k  cu- 
jHs  confie  ãh  fugit  terra  ,  (^  calum,  p. 


t;.  II.  Et  vidi mortHos magno s y& pn/tiloí 
fiantes  in  confpeãu  throm,p.iS.ç.  i . 

Xhià.Etlihriapertifunt:  ^  almsliher 
apertus  efi,  ejui  efi  vita  :  ^  judicati 
funt  mortm  ex  his  cjHétfçripta  erant  in 
lihris  jècmidkm  opera  ipforum^p.-i^.c.  i . 


,  V  4,  £/  mcrs  ul  ra  n»n  erit^  ne- 

^H€  InlÍHs.nec^Hs  dolorerit  ultra  ,  e^uia 

prtma  aipferHm,p.;^^6.c.l. 
v.zi.  Platea civttatis  aumm  míwdnm^ 

J&.446.  c.  1  .infin  &[€Cfef, 
Ibid.  Tanquam  vurum  perltuidHm^p,^ 

446.C.X, 
V.  2^.  Nam  ciar it aí    Dei  illuminavit 

eam^^  lucerna  ejm  efi  Agnus,  p.  x 54. 

col.l.&feefq. 
v.i  7.  Non  intrabit  in  eam  alit^Hod coi»* 

qmnaium^.^'j.c,  i.  » 


IN 


f9f 


I  N  D  E  X 

Das  couías  mais  nota^^^is. 

Os  Numeros^ftgmfich  às  Tagims. 


A   S  Acções  de  cada  hum 


.-  :^  f\  faó  a  fua  eíFencia,  pag. 

:  >i  15',  1 1 6.  A  verdadeira  fidalguia  he 
Acção,  p.i  17.  Nas  Acçoens  íê  de- 
vem fundar  as  eleiçoens,  &  fegu* 
rar  as  pred^ílinaçoens^p.i  1 8, 

'^<laÕ.  Elcufa  que  teve  Adão  para  naô 
refponder  a  Deos,quando  lhe  per- 
guntou aonde  eftava^  p.  21.  Por 
valofjSc  virtude  do  fanguedc Teu 
Filho  foi  a  Virgem  Maria  prefer- 
vadadopeccadode  Adaõ  ,p.i6i. 
<  ufque  ad  í  óf.  Adaó  nafcendo  uni- 
camente l)omem,nem  por  iílb  dei- 
xou defermininojp.aS^»  A  Adão 
deo  Deos  particularmente  o  titulo 
de  imagem  fua ;6c  porque,  p.ggi» 
Porque perdeo  Adão  com  o  Pa- 
raifo  a  Monarchia  do  Vniverfo,  p. 
540.  Perguntafejfe  Adão  pela  def. 
t)bediencia  perdeo  o  fer  que  tinha» 
út  imagem  de  Deos,p.3f  i. 


Jima.  E  bem-  porque  mais  fe  deve 
temer  a  morte  da  Alma,  que  a  dd 
^orpo,  he  o  juizo  de  Deos  mais  te-  . 
meroro,qu.e  o  dos  homens  1 6c  por- 
que, p.78.  ÔC  ulterius.  Por  mats, 
que  húa  Almafofle  fenhorade  to- 
do o  mundo  j  fempre  ficaria  vafla  ^ 
porque  fó  Deos  a  pode  encher,  p. 
íff.  O  que  devem  procurar  os 
verdadeiros  Chriftãós,he  encher  a 
Alma  com  a  graça,ôc  a  graça  com 
as  obras,  p.ayS.  A  Alma  que  che- 
gou ao  ciime  da  perfeição  da  vi* 
da  conteraplativa,nem  as  acçoens. 
lhe  divertem  a  contcmplaçáo,nem 
a  contemplação  Ihe.diverte  as  ac- 
çoeils,  p.^  1 1 1 0  que  ou  ver  de  fer 
verdadeírkimagem  de  Deos,  nam 
baila  queieja  homem  c5  Alma  ^ 
fenão  também  Alma  com  home, 
p.522.  He  tanta  a  alteza  de  huma 
Aima,que  eílà  em  graça,  que  che- 
ga Deos  a  fe  tratar  com  o  homem 
com.  tartta  familiaridade  ,  como  f© 
faaõigu^Sjp.37g.    .^,  ; 


i 


1» 


5^6 


Altura.  A  mefma  Altura  dos  graa- 

des  lugares  he  o  final  certo  de  fua 

niina,p.io9.  Naõ  ha  Altura  nêfte 
Z  .mundo, que  naõ  feja  preeipicio,  p. 

211.  Os  lugares  aítos,  ainda  que 

não  haja  enveja,  nem  competen- 
(     cia,  que  os  inquiete,  elles  mefmos 

fe  inquíetáo,ÔC  a  quem  eítànelles,. 

p.i  19210.. 
^^mhifAo..  A  Ambição   dos  homens 

mais  os  leva  a  fubir  pelo  difficul- 
;    toío,que  a  decer  pelo-  fácil >  p.roó.. 

Onde  ha  enveja  ,  êc  Ambição  de. 

Iugares,na5  ha  virtude,p. x  1 8s.    " 
«á^/^í>..Hum  dos  grandes  efcandalfis 

do  muiidb,  he  naõ  le  teftar  dos 
t'  Amigos^  p.  4.07;  O  maior  Amigo 
!     permanece  atè  a  morte:  depois  da 

morte,ninguem  he  AmigG,p*4o8. 
'Amor.  Naõ  pronoftica  m.elhor,  quem 

-  melhor  entende  ,  íènaõ  que  líjais 

-  ama,  p.ii;^.  A  cegueira  do.  Amor 
próprio,  he  muito  maior,  que  a  cc- 
gueirados  olhos^p.  124.&  ulterrus. 
O  Amor  he  hum  íehtimento,  que 
faz  iníènfiveis,  p.139.  Não  ha  mo- 
tivos,porque  hajamos  de  amar  a 
Deos  fobre  todas  as  coufaspara  o 
fim  da  vida,  pelos  quaes  ji.  agora  o 
naõ  devamos  amar  aífim,Jpag.i  5-0.. 
Maishedceftranharo  Amor  dos 
primeiros  lugares,  do  que  os  mel^ 
mos  lugares,  p.  230.  De  quantas 

'  partes  ha  de  conftar  o.  Amor  de 
Dcos,p.283.  Porque  a  graça  con- 
íifte  em  amar  ,  &  ler  araado  de 
Deos,  mais  fe  deve  efcolhcranrcs 
a  graça,que  a  gloria,  ainda  que  a 
gloria  confifte  cm  vei*  ao  mcfmo 
Deos,  p.^/i.ufq.ad  374.  Paor  hc 


Index  dar 


não  amar  a  Deos,  que  não  ver  a 
Deos,  p.577.urq.ad  58a.  O  Amor, 
&  deféjo  bem  ordenado  da  gloria,, 
naõ  ha  de  íer  por  amor  da  gloria , 
fenâo  por  amor  da  graça,  pag.3  83. 
NaCortedeChriíto,  os  que  tem 
por ofítciofer verdadeiros,  faó  os 
que  tem  porpremio  o  fer  amados: 
&  porque ,  P41 2.  Amar  he  entre- 
gar o  coração:  mentir  he  encu- 
brilo,  P413.   A  graça  ha  de  que- 

^  rcríè  fó  por  Amor  da  graça,p.  423. 
ufq.ad  417.  Naó  pôde  haver  mais. 
fino  Amor,  que  aquelle ,  que  en- 
trega o  coraçãojSc  fecha  os  olhos,- 
p.4i7.  Ate  os  Gentios  condenão  o 
Amor,ou  cobrça.dos  bens  do  mú» 
do,p.468.  Deixar  a  Deos  por  amor 
dos  nadas  do  mundo ,  he  fazer  a^ 
Deos  menor  que  nada  :  mas  dei- 
xar o  tudo  do  mundo  por  amor  de: 
Deos,  he  fazer  a  Deos  maior  que 
tudo,p.5'47.  Tanto  crecc  Deos  em 
íuagrandeza,quanto  deíprezão  os 
homens  por  feu  Amor,p. 549. Qp^ 
injuíliças  íabe  fazer  o  Amor  divi-- 
no,p.55'i. 

'jânjçi.  Porque  quiz  Deos,  quando  ca- 

^  ibgou  os  Anjos  máos,ficaílem  par- 
te deli  es  na  Região  do  ar,p.529. 

Annos.  Seguircmíè.  aosannos  os  de- 
Icnganos,  he  fazer  o  tempo>o  que 
faz  o  tempo  :  mas  anticiparemíc 
os  dcfenganos  aos  annos,  he  fazer 
a  razão,o  que  o  tempo  havia  de  fa- 
zer, p.5'41.  Poucos  annos  cm  Pa- 
laciojConvencidos  ,  £c  dcfengana- 
dos,  grande  vitoria  da  razaô,p.542.. 

Apçfiolos.  i\  perturbação  que  caulou 
nos  Apoíiolos  a  doutrina  de  Chvi- 


cotifasmalsnotdvets. 
<   fto^qmn Jo lhe  prometeo, Sc  pro- 
fetizou no  Sacramento  a  comida 
.  de  feu  corpo,p.i40;  Sutisfa-z  Chri- 
.  ftoásdifíiculchides  dos  Apoftolos 
fobre  a  doutrina  dcfte  myílerio-,.p. 

■  aAi.  Como  os  Apoilolos,fendo  tao 
:  põucos,fe  pode  eítender  a^fua  pre- 

■  gaçáo  às  mais.  remotas  diílancias 
:  do  mundo,  p.H9-  Quando  os  do- 

ze  Apoftolos  repartirão  enu-e  fy  o 
.  mundo,  fe  levara  cada  hum  a  lua 

alcofa  dos  fragmentos  do  paó^com. 
,  que  Chriílo  deode  comer  a  cin- 

-  GO  mil  homens,baftariáo  aquellas 
.  fobras  afuftentato   mundo  todo, 

p.169. 270. 
\árte.  Antes  de  haver  no  mundo  a  Ar- 
teda pintura,  retrataváofe  os  ho- 
mens cada  hum  Vela  fua  fombra,, 
p.240.  He  teftemunha  a  Arte,para 
prova  dos  bens  do  Ceo,puros  ,6c 
.  fem  mifturade  mal,p44.6.  Quem 
:  forão  os  primeiros,  qfe  achaoha- 

-  ver  ufadadaartelhariapelo  artiH- 
.  cio  da  pólvora,  p.49i-  Maishene- 

ceíTario  para  fe  gerar  no  ar  hum 
rayo  natural,que  na  terra  hum  ar- 

:  tifiGÍal,p.494-QiJ^^^^^  '''^'°''  ^^^''^^ 
20  fazem  eíleS,lbid. 

'^ml^Htoí.Uc  tal  maneira  fumio  em 
"    fy  oi  Verbo  encarnado  os  Attribu- 
tos  de  fuadivindade,quc  depois  de 
-  encarnar  „  não  aparecião  nelle 
.  mais,  que  os  vaííos  da  mefma  di- 
vindade,p.255.  A  primeira  proprie- 
dade dadivindade,que  hefer  Deos 
-•  Efpirito,he  o  primeiro  Attributo, 
>  queGhriftoreftaurou  no   Sacra^ 

mento,  p.i59.wM<^ ^44- 


B 


}f^7. 


AS  Batalhas  da  razão  ca 


Batalha.     .„ 

os  annos  he  húa  guer- 
ra, em  que  refiftem  mais  os  pou- 
cos,que  os  muitos,p.5'4 1 . 
Bamfia.  Dceftar  o  Bautifta  einpri- 
zoens  fe  pi'ova,que  hade  haver  ou- 
D-o  juizo,ôí:  outro  mundo,pag. 5',6. 
.  Como  fe  verifica  dizer  Chrilto,  % 
o  Bautifta  era  Elias  ;  êc    dizer    o- 
■  Bautifta,que  não  era  Elias,  pa  16.: 
Mamjmo;  Se  queremos  rémiflaõ  dos. 
:  peccados,  tomemos  a  penitencia», 
como  Bautifmo,p.i49i  Ainda  que 
os.Bautifmos  lejaó    femelhantes- 
nos  adultos,6c  nos  innocentes ;  faS 
:  com  tudo  muito  difFe rentes  nos 

-  bautizados,  p^iSô; 
Maixezja.  Sò  o  ultimo  lugar  eftà  livre 

deinquietaçoens;;6c  não  por  00-; 

tro  privilegio,  lenão  por  fer  o  mais 
,  baixo,  pi220;22r. 
BâMavmturança.  A  melhor  couCãjqué 
:  tem  a  Bemaventurançajuam  he  <>;■ 

gozar  a  gloria,he  o  íèguraí  a   gra- 
.  ça,pi426.  ComonoCeo  acômu-; 

-  íiicaçáo  da  gloria  dos  Bemaventu- 
rados  he  univeríàlmente  de  todo?,! 
&  particularmente  de  cada  hum^i 
p.46  i.6c  ulterius.Qimmgrande  fe- 
ra a  gloria  dos  Beraaventurados  5, 
fendo  elles  infinitos,  &  agloriade 
cada  hum.  as  glorias  de  todos^pag,. 

■  466.467. 

Benção.  O  que  tiver  Bênção  para  to- 
'  dos,  pode  entrar  em  preíumpçoés^ 
,   de  Meflias,p:96i97.  A.  defiguàlda- 
dedas  Beuçoensnãoargue-  defí;- 
gualdadfi; 


.5p8  Index  das 

gualdadc^deamor  cmqucmasdà,         juizo  de  Dcosbaíbfer  Bom  no 


lenãodifFcrençade  merccimétos, 
cm  quem  as  recebe,  p.  98.  Porque 
razaó  ninguém  eftà  contente  com 
a  fua  Benção,  Ibid.Ôc  p.99. 

Bens.  Naó  fó  faó  talentos  os  dotes  da 
natureza,  6c  bens  da  fortuna,6c  os 
doens  particulares  da  graça,  fenão 
também  os  contrários ,  ou  priva- 
ções de  tudo  ifto,  p.42.6c  ulterius. 
Ainda  que  os  amigos  fejaó  os  noí^ 
fos  maiores  Bens,  não  íe  còíluma 
no  mundo  teílar  dos  amigos j  por- 
que íaó  Bens,que  fe  acabão  com  a 
vida,p.4o8.  A  grande  differença 
que  ha  entre  os  bens  da  glo- 
ria do  Ceo  ,  êc  os  das  glorias  do 
mundo,  p  4^4.  Todos  os  Bens  do 
mundo,  faó  Bens  com  miftura  de 
males :  &  ella  he  a  primeira  diffe- 
rença,queha  entre  cllcs,6c  os  Bens 
da  gloria,  p.455r.urq.ad444tSò  os 
Bens  da  gloria,  íàó  Bens  íèm  mi- 
ftura de  nenhum  mal,  p.  445'.uíq. 
ad  44S,  Dos  Bens  do  mundo,  quá- 
do  muito  logra  cada  hum  os  íèus : 
dos  Bens  do  Ceo,&:  no  Ceo  logra 
cada  hum  os  feus^  &  mais  os  de  to- 
dos :  òc  cfta  he  a  ícgunda  diíferen- 
ça,que  ha  entre  huns,  6c  outros 
èens,p.449.  ufq.  ad467.0s  Bens 
do  Ceo  gozãofe  por  junto,  6c  nam 
fucceíTi vãmente:  6c  he  ú  terceira 
diíFerença,que  elles  tem  dos  Bens 
do  mundo,p.468.6c  ulterius. 

Bom.  Para  íeies  bem  julgado  no  jui- 
zo de  Deos,  bafta  que  vòs  fcjais 
bom :  mas  para  feres  bem  julgado 
no  juizo  dos  homcns.he  necellario 
que  ningucm  fcja  mao,  p.  83.  N» 


ultimo  inílante  da  yida :  6c  no  jui- 
zo dos  homens  bafta  ler  máo  em 
qualquer  tempo,  p.84.>Seeu  fou 
Bom,  por  mais  que  me  julguem 
mal  os  homens,  naó  me  podem  fa- 
zer mdo.E  fe  eu  íou  máo,  por  mais 
que  me  julguem  bem,naõ  me  po- 
dem fazer  Bom^ag.  i  g  7.  Se  fores 
Bom,  fera  o  voíío  lugar  bom  :  6c 
fe  fois  melhor,  fera  melhor,  p.  19& 
199. 
Bondade.  He  tal  a  Bondade  de  Deos  , 
que  quando  quer  caítigar  os  ho- 
mens, o  que  mais  fente  he  naó  ha- 
ver algum,  que  íe  lhe  opponha,  6c 
lhe  reíifta,p.486i487. 


c 


CapA.    A^Otejada  a  Capa  de  Elias 

^^com  a  de  Ahias  ,  fc   vè 

quanto  vai  de  capa  a  capa,de  eípi* 

rito  a  eípirito ,  6c  de  zelo  a  zelo,  p, 

10:5. 

Caridade.  A  Caridade  de  qualquer 
Bemaventurado  cxcita,aftciçoa,6c 
obriga  naturalmente,  Ôc  fcm  mila- 
gre a  cada  hum, a  que  íè  alegre,  6c 
goze  dos  bens  de  todos,  p.  465*. 

CaJUgo.  Qual  he  a  juftiça,  com  que 
Deos  nos  haja  de  caftigar  pelo  que 
naó  conhecemoSjp.^l.  6c  ulterius. 
No  juizo  de  Deos  não  baila  a  cer- 
teza do  futuro  para  o  caíHgo,6c  ba* 
fta  a  emcda  do  paliado,  para  o  per- 
dão, p.77.  De  Deos  faó  mais  para 
fe  temer  os  caíligosj  6c  dos  homcs, 
06 juiios,p, 79.6c  uicerius. 

Ciufi. 


^  confasfnatsnotaveíi,  f99 

C4///S.Qiiacs  faó  as  caufas  naturaes  da         o  íangue  do  Horto,  para  Ter  prefe- 


inquietaçãodos  lugares  altos,pag. 
ai8. 

Cafas.  Como  paíTaõ  as  Cafas  de  hum 
domínio  a  oiitro,pag.  19.20.  Com 
que  razão,  pia,&:  chri(tãa  nas  nãos 
aCafa,aque  os  Hereges  chamão 
Praça  de  armas,  nòs  a  dedicamos  a 
S.Barbara,p499.urq.ad  50 1 . 

Clanfira.  Como  íè  pôde  ajuntar  a 
Claufura  com  a  psregnnaçáo,pag. 
5-68. 

Ceo.  O  Reyno  dos  Ceos  em  todos  os 
tempos  tem  três  eftados  :6c  quaes 
faó  ,  p.149.  Sò  no  Ceo  ha  melho- 
res lugares,p.i99.urq.  ad  ioi.  No 
mundo  o  ultimo  lugar  he  o  me- 
lhor: mas  no  Ceo  he  melhor  o 
-primeiro,  p,^26.^^ 7.0  Sacra  aen- 
to  não  fó  íêrà  eterno  no  Ceo  pela 
eceniidade  de  feus  efteitos:  fenão 
também  de  fua  própria  fuílancia, 
p.ajT^.uíq.adzóo. 

'Cegueira.  QLiaó  grande  he  a  cegueira 
dos  que  lè  vem  excedidos  nos  ta- 
lentos, p.  47.  Porque  acha  mais  a 
vontade,  fendo  cega,^que  o  enten- 
dimento fendo  lince,  para  julgar  ^ 
p.  6g.  A  cegueira  do  amor  pró- 
prio he  maior  que  a  cegueira  dos 
olhos,p.  1 24.6c  ulterius. 

Cidades,  Quaes  forao  as  mais  afama- 
das Cidades  do  mundo ,  p.  i  ^5.  14. 
E  como  todas  tem  )à  paflado,Ibia. 
E  quantas  paíTáraõ  de  humdomi- 
ntoaoutro,p.i8.i9. 

Conceição.  Quando,  onde,  6c  como  o 
Filho  da  Virgem  Maria  obrou  .0 
Myfteiio  de  ma  ConceiçâG,p.  165*. 
6c  deinceps.  Que  prerogativa teve 


rido  ao  da  Cruz  no  Myfterio  da 
Conceição  de  Maria,  p.i  72.ufq.adi 
]  74.  Húa  admirável  propriedade 
do  Myfterio  da  Conceição  defcu- 
berta  da  hirtoria  de  Samfam,  pag. 
175'.  Anticipouíè  o  fangue  do 
Horto  ao  da  Cruz,  porque  foi  có- 
vcniente,para  gloria  daConceição 
da  Virgem,que  o  preço  de  ília  re- 
dempção  foíTe  também  anticipa» 
do,  p.178.179. 

Co«^/f5f .  Qiiando  parece,qiie  mudou 
Deos  de  condição,p.  141 . 

Cênciencias.  Ho  dia  do  luizo  fe  haõ  de 
allumiar  as  conciencias  de  todos 
os  homens,  para  íè  manifeftar  tu- 
do o  qiie  nellas  cfteve  efcondido, 
p.54. 

Confelho,  Quam  cruel  executor  he  hú 
Confelho  náo  executado,p.  5*10. 

ContíL.  Tudo  paíTa  para  a  vida,6c  nada 
pafla  para  a  conta,p.5.8c  deinceps. 
Ao  crivo  do  trigo,  6c  ao  crivo  das 
nuvens  íè  compara  efte  paíTar,  6c 
não  paíTar  da  vida,  6c  da  conta,  p.' 
2.5.  Tudo  o  que  paífou  para  a  vida, 
heonada^  quenãopaíipu  para  a 
conta,  p.17.  O  livro  da  vida  he  hô. 
ío :  6c  os  livros  da  conta  faõ  mui- 
tos,p.  28.  Ate  o  nada  não  efcaparà 
da  conta  nòdia  do  luizo,  p.28.ufq. 
ad  ^1.  De  que  haó  de  dar  conta  no 
dia  do  luizo  os  que  tiveraó  oífi- 
ciosjôc  cargos  neíle  mundo ,  p.56. 
E  como  ha  de  fer  rigorofa  efta  co- 
ta, Ibid.  Como  ha  de  fer  exã6t:a  a 
conta  dos  Talentos,que  Deos  deo 
a  cada  hum,  p.4x.  6c  ulterius.  Co- 
mo badeíèr  dií^iícultofa  a  conta 

das 


M 


"5&oo;  Index 

■  áz%  dividas ,  cm  q  efcamos  a  Deos, 

no  dia  do  Iuizo,p47.Gc  deinceps. 

CiT/íípíJ.  O  coração  he  o   verdadeiro 
;  final  da  profecia,p.iig.Arettat|ue 

•  ferio  o  coração ,  defende  de  todas 
.  ^sfettaSí  p.139.  A  penitencia  para 

•  revogar  o  JUÍZO  de  L)cos,  voltanos 

•  o  coração,  p.  144.  Se  Deos  agora 
eílà  dando  golpes  ao  coração  do 
pcccador,ôc  elle  lhe  não  abre^  mal 

-  pôde  efperar  depois ,  que  Deos  o 
ouça,quando  o  queira  chamar,  p. 

.  i5'4.Quem  agora  não  ouve  a  Deos 
de  todo  coração,  quando  elle  cha- 

.  ma  5  não  ha  de  chamar  a  Deos  de-- 
pois  de  todo  o  coração,  p.   155.  A- 
inar,hc  entregar  o  coração :  men- 

,  íir,heçncubnlo,p,4ig.  Quemcó- 
quiíla  a  graça  pela  graça ,  conten- 
tàfe  com  o  coração,  p^if. 
Ckryjíp.  O  corpode  Chriilo  no  Sacra- 
mento nãoeftàcom  as  condiçoésJ 
naturaesde  corpo,  fenão  as  mila- 
grofasde  elpirito,p.x4i.AíTnn  co- 

:  mo  na  Encarnação  fe  contrahio  o 

,  vácuo  da  divindade  peio  incorpo- 

.  rado:  aííim  no  Sacramento  rcílau- 
rou,6c  encheo  o  corpo  de  Chriilo 

.  omefmovacuo  pelo  incorpóreo, 
p.242.  AíTim  como  Chriilo  no  Sa- 
cramento encheo  o  primeiro  vafio 
da  divindade,  efpirituahzando  o 
feu  corpo,6c  fazendoíc  corpo,{èn- 
doefpirito:  aíTnn  eíla  admirável 
transformação   não   fó  a    obrou 

.  Chriilo  em  feu  corpo  facramenta- 
clo,  fcnãoquc  também  por  meyo 
do  melmo  corpo  facramentado  no 
la  comunica  anos,  p.  245.  ufq.  ad 
Ç145. 0  ratcíaio  íc  da  dos  mais  At- 


das 

■   tributos,  Ibiá.&  deinceps. 

Cofi^;4.  Mais  hedarderoílo  ao  muti^ 
do,  quando  o  mundo  nos  moílra 
bom  roílo,  do  que  darmos  nos  af 
coftasrao  mundo,quando  o  mundo 
nos  vira  as  coílas,p.5'4g, 

ConverfaS.  Naó  ha  razão  nenhúa,  que 
noshvredenos  convertermos  lo- 
go, fenos  havemos  de  converter 
depois,  p.  150.  Quem  fenaó  con- 
verte agora  ,  ordinariamente  fal- 
lando,  naó  fe  ha  de  converter  de- 
poisjp.iyi. 

Crecimemo.  Crecer  fóra  da  própria  cf- 

pecie,não  he  aumento  ,  he  mon- 

llruoíidade,p.ioo.Como  fepòdcm 

-  coníiderar  crecimentos   em  Deos, 

.  p.5'45-.ufq.ad  5-47. 

Chrtjlo.  Deixotmos  Chriilo  cõmuni- 
cadoem  fia  doutrina,  nâofó  hum 
rayo  de  fua  divina  luz,mas  tres,pa- 
.  raque.vcjumosagorao  que  no  dia 
do  luizo  havemos  de  ver,  p,  54.  E 
quaes  faó  eiles  trcs  rayos,  p,  55-,  ôc  • 
ulterius.  Como  nos  ha  de  pedir 
contaChriftonodiado  luizo,  de 
quanto  lhe  devemos, p.  48.  ufque 
ad  5'z.  QLial  foi  a  maior  defefi  que 
Chriilo  tevedefuainnocencia,  p. 
6^.  Muito  melhor  me<:onheço  cu 
diante  da  imagem  de  hum  j^ecca- 
do,que diante daimagem  de  hum 
.  Chnílo  crucificado,  p,  i^g.  Que 
.  grande  remédio  faó  os  pcs  'de  hum 
Chrirto,para  fe  lhe  não  dardo  juí- 
zo dos  homcnsjp.  140.0  langue  de 
Chrifto  não  foi  derramado  por  fua^ 
fantiífima  Mãy  cm  rcmillaõ  de 
peccados,p.ió:^,  164.  He  virtude 
d©  fangue  de  Chrifto  poderfc  dar 


toufasmais 

antes  de  fe  receber,  p.  1 7  7  •  ^  P^*'^^ 
do  fangue,  que  Chriíto    efpecial- 
mente  a pplicou  para  prefervaçáo 
do  pcccado  na  Conceição  de  fua 
íantiirinva  Máy,  foi  a  mcfma,  que 
de  Tuas  puriílimas  entranhas  tniha 
recebido,ôc  guardado,  p.i85'.  ufq. 
ad  188.  O  Cordeiro  vivo,6c  como 
morto,que  vio  SJoaó,  he  Chrifto 
facramentado,  p.  2:^5'.  ufq.  ad  a^S. 
Chrrfto  facramentado  comunica 
aos  homens  a  immeníidade,  que 
tem  no  Sacramento,  p.248.urq.  ad 
25'i.  Ainda  que  o  facerdocio  de 
Chrifto  fejâ  eterno  ,  ôc  eterno  o 
meímo  Chrifto,  parece  que  fenao 
pôde  fuprir  no  Sacramento  o  va- 
íio  da  eternidade  do  Verbo  na  En- 
carnaçâo,p.25'i.  Provafe  o  contra* 
rio,  Ihid  U  ufq.  ad  ^.25*4.  Chrifto 
náofoi  íóhúa  vez  íacníicado,  íe- 
não  duas,  p.26 1 .  Nem  fó  hiia  vez 
entregue  nas  mãos  de  feus  inimi- 
gos, íenáo  duas,  p.  z62.  zó^.  Para 
tquc  S.  Gonçalo  náo  choraflc,  &  fé 
filimentafíe  ,  quando  era  tninino  j 
J)unha6-no  diante  da  imagem  de 
Chrifto  crucificado^p.  289. 
triatura.  As  menores  Criaturas  dâs 
feníírivas  nos  eníinão  a  delprezar 
os  lugares  altos5p.22i^ 
€rHt.  Não  foi  o  primeiro  fangue  da 
Cru2L,  fcnáo  o  do  Horto,  o  que 
Chrifto  derramou  por  fua  Mãyjp. 
i66M  ulterius.  No  fuor  do  litn- 
gue  do  Horto  ouve   húa    nova 
Cruz  fem  cravos,  p.  168.   Porque 
razaõ  o  fangue  da  Cruz  fahio  jun^- 
tamente  com  agua  ;  ôc  o  do  Horto 
não,  p.171.  c£ie  ventàgemleva 
Tom. 7^. 


notáveis.  ^^2. 

em  Chrifto  O  amor,  que  nos  mo- 
ftrou  no  S:icramento,ao  amor,quc 
nos  moftrou  na  Cruz,  p.  j6o.  Os 
Martyrcs  pagaó  a  Chrifto  nt 
Cruz,  os  Religiofus  no  Sacramen- 
to, p.  567 .  Porque  razaó  nos  Re- 
Ugioíos  fe  deve  antes  tomar  o  no- 
nicdaGruz,  que  o  do  Sacramen- 
to,p.5r65.564. 

Cuidiida.Covíio  ficão  baldados  os  cui- 
dados dos  que  toda  a  vida  empre- 
gáo,para  acquirir»  &  aumentar  os 
bens  defi:e  mundo, p45'5'. 


D 


I^X  Avid  foi  o  homem,qúe 

U        " — '" 


t)avid.  .     w- ' . 

1/  mais  fe  podia  prezar  de 
fy  meiino  ,  ôc  o  que  menos  fe  pre- 
stava de  fy  mefmo :  Sc  porque,  p. 
Í28.  Porque  razão  perdoou  Deos 
:  a  David ,  Ôc  não  perdoou  a  Saul^ 
Gonfeflando  ambos  o  feu  peccado^ 

D^momo.  Menos  arrifcado  he  fer  acu- 
fado  dos  Demónios jdo  que  fer  jul- 
gado pelos  homens,p.70.Aftim  co- 
mo Deòs  feito  homem  quiz  mor- 
rer na  Cíuz,para  fe  vingar  do  De* 
monio  j  afíim  traçou^que  nos  o  co^ 
meflemos  no  Sacramento  ,  para 
continuar ,  6c  confumar  a  melma 
vingança,p.264.  HerodeSjôc  o  De- 
moniò^untamente  condenarão  a 
Chrii^à  morte,  quando  o  P^dre 
Eterno  lha  comutou  em  defterro, 
pag.5'26. 

De<ys.  Porque  coníidera  Deos  nao  os 

noflbspaíibs,fenâoasnoflas  péga- 

Rr  das. 


€q^ 


Indèxdas 


\i 


da3,p.2f.Enrheíburaõ  os  homens 
a  ira  de  Deosparao  dia  dojuizo, 
.p.ió.ij.Conhece  Deos  muito  mais 
de  nòs^do  qut'  nòsdenòs,.  pag.ag. 
Aflim  como  Decs   fabe  tanto  de 
iiòsjaíTiín  nòs  fabemos  muito  pou- 
co de  DeoSjp.^o.^i.  Qual  he  aju- 
íliça,com  que  Deos  nos  haja  de 
caítigar  pelo  que  não   conhece- 
mos,  p.:^2.5c  ukcrius.Comoxoma- 
râ  Deos  conta  no  dia  dojuizo  rj3S 
ReySjôc  aos  Prelados,p.;7.  ufq.  ad 
4 1.  Como  nos  havemos  de  conté- 
mr  com  os  talentos,  que  Deos  foi 
lèrvido  damos,  pag.  44.  ufq.ad  47.. 
O  juizo  dos  homens  he  mais  rigo-. 
rofo,que o  de  Deos   ',  porque  os 
homens  jiílgaocom-avontadCj.Sc 
Deojjulgacom  o  entendimento, 
p.óo.u fq , ad  64.  He  mais  terr'i\''el  o 
juizodos  home,ns,queo'  de  Deosi, 
porque  no  de  Deos  baila,  fóo  te- 
lèemunho  da,  própria  concienda: 
no  dos  homens  apropria ;  concien- 
-cia  não  vai  teftemun ha,  p.64.  ufq. 
ad  6-;.  Outro  motivo  deíla^  verda- 
de hejporcjue  no  juizo  de  Deos  as 
noflasboas  obras  defendem-nos : 
&  no  dos  homens,.o  nollb  maior 
.inimigo/aó  as  noílas  boasobraSj.p. 
67.uiq.ad  j-o:  Também  he  mais  te- 
jneroíò  o  juízo  dos  homens,  quso 
de  Deos^  porque  Deosjulgii  o  que 
Gon!'iece,ôc  os   homens  julgão' o 
que  nio  conhecem,  p.  70.  ufq.  ad 
74.Supoíio  que  o  juizo  de  Píx>s  fc- 
Jji juizo  fii  a',  ainda ojuizo  dos  ho- 
mens he   niais  tcmeroíb,  ,p.75'aiíq. 
nd  77.0  juizo  dos- homens  h<j  mais 
íÊiriCtolb,,  que  o  de  Deos,£or  doz*: 


razoensmais  fobre  as  outras,  qiic 
convencem  eíla  verdade,p.8 1  .ufq. 
ad  86.  Qiiando  parece,que  mudou 
Deos  de  condição,  p.141.  No  tri- 
bunal da  Penitencia  o  juizo  de 
Deos  revogafe,  P.143.6C  deinccp?.. 
Grandes  excellencias  do  juizoda 
penitencia  fobre  o  juizo  de  Deos, 
p.147. 14H.  Deos,  em  quanto  ho- 
mem, fendo  fua  a  eleição  do  lu- 
gar, tomou  o  ultimo  entre  elies,.p. 
225.  No  Sacramento  ficou  o  cor- 
po de  Chnfto  propriamente  cor- 
po de  Deos,.pag.2^x.  5c  dcinceps. 
Qiiantopode  vença-  S  Gonçalo 
peias  forças  que  Deos  lhe  deo,  pa- 
ra a  fabricada  fua  Ponte,  pag.  g  14. 
515".  Nunca  deixamos  de  receber, 
quando  pedimos  a  Deos,ainda  que 
nos  naó  dè  o  que  lhe  pedimos,  pag. 
512.  Deos  não  hefó  Deos  de  per- 
tOjfenaõ  de  longe,p.-gg8.  Todoo 
apparato  da  Mageílade  de  Deos  , 
hefogOíp.476. 
Dejprer^o.  No  tribunal  da  Penitencia 
o  juizo  dos  homens  deíJDrezafe,  p. 
Ig3.uíq.adj42.  Quam  grande  mal 
fazemos  homens  todas  as  vezes, 
quedcfprezáoa  graça  de  Deos,p.-, 
^99.ôC4oo. 
Dejpofirio,  Dcfpoíarfe  Deos  no  Paço 
he  maravilha  grande,  pag.5'54.0. 
myíVcnocm.que  Deos  mais  pro- 
priamente fc  deípola  com  as  AI- 
maSjhe  o  Sacramento  da    Eucha- 
nília,p.5-3j,  ^ 
Z)^y?/w.  C^jcm  le  refolveo   a  naôde- 
icjaj-jpòdc.  competir  de  felicidade 
com  Jupitcr,p.2i^. 
Defeito,  Quam  bem  reputada  he  a  vi- 
da-. 


coufaswats 

lj>ias.  Todos  OS  dias  para  os  que  vive 

-  ■  entre  os  homens,  faó  dias  do  juízo, 
$)ng.8i .  Todos  os  u-ílbmbros  de  ira^ 
de  juítiça,de  vingança  do  dia  do 
íuizo,com  fc  vokar  o  coraçam  a 

,  C)eos,reacabão,p.  144.  Se  depois 
dodiadotózo  podem  haver  pe- 
nitencia, poderafc  revogar  a  fen- 
tençadojuizode  £>eos,p.  145'.  ufq. 
ad  147 .  O  que  Chriíto  chama  ig- 
norância do  dia  do  luizo ,  nam  he 
ignorancia,he  fegrcdo4-).4ii. 

.Viferença.  Três  diíFerenças  entre  os 

bens  do  mundo,&:  os  da  gloria,  p. 

.A34.&  deinceps,  Húa  das  razoens 

•    2a  differ^nça  deftes  bens ,  he,por- 

<]uc  no  mundo  ha  meu,6c  teu,pag. 

Í)i^niÁid$.  As  cansno  Sacerdócio  íaó 
.  :  os  címaltcs  da  Coroa;  &:  na  Prela* 
^?oíía,o  oi-namento  da  dignidade,pag, 

Bifcítrfi.  Ha  muitos,  que  profetizão 
depois  pelo  arrcpendimento,o  que 

.  fora  melhor  ter  profetizado  antes 
pelo  difcurro,p.  1 14. 

J>i/í>i:.  Que  pouco  cafo  fe  ha  de  faaer 
do  quediràôos  homens,  quando 
fe  trata  da  penitencia,  que  he  o  xc- 
mcdio  dospc<:cados,p.i^8;  ulq.&d 

-    14^ 

Dividas.  Como  no  dia  do  luizo  nos 
hade  Deos.pedir  conta  das  dividas 
a  que  nos  obrigou  em  vida  com  os 
feusbeneficio?,p47.  urq.adfi.  E 
cjuacs  fejáo  eílas  dividas,lbid. 

S>m-a.  Quando  as  dores  faé  iguaes, 
íentcmle  todas ,  quando  hua  he 
spior-grufpende  as^oncras^.  J3p. 


nota-veis.  ^^.í 

Dot^.  Nao  lo faô  talentos  os  dotesdii 
natureza,  os  bens  da  fortuna,  ôc  os 
doens  particulares  d  a  graça,  fená* 
também  os  contrários  ,  ou  priya- 
çoens  de  tudo  rí:to,p42.ôculteriHS. 


Edifi€Í9. 


HA  duas   maneiras   de 
edificar:  edificar  por 
edificio,5c  edificar  por  edificação  , 

Elação.  Ò  ultimo  lugar  merecido  por 

-    cliílribuiçã:o  alhea,  pode  fer  afrcti- 

tofo  :  tomado  por  eleição  própria, 

he  o  mais  honrado,  p.  124.  &  ulce- 

rius,  O  nde  ha  m uito  em  que  ele-. 

ger,não|>òde  haver  pouco  fobre 

que  duvidar,p.28 1 . 

Emenda.  No  j  uizo  dos  homens,  nem 

para  o  futuro  vai  a  incerteza,  nem 

.    paraopaffado  a  emenda,  pag.  77. 

No  tribunal  da  Penitencia  fc  eme» 

da  o  juízo  de  fy  mefino,  p/ii^.ufq* 

ad  i:^':^^ 
Emprepi.  Como  S.Gonçalo  fendo  lo, 
acdefafliftidodetodaa  outra  cô-. 
panhia,6c  poder,  fe  atreveo,&:  con- 
íêguioa  emprefa  da  fua  Ponte,q«e 
muitos,êc  mui  poderofos  juntos  jà 
mais  emprendenão,  p.  5  i2.ufq.  ad 

Emamafio.  iVffim  como  pela  Encar» 
nação  a  Divindade  de  Cbnllo  íe 
delpiodos  attributosde  Dtos,  Sc 
fe  veílio  das  propriedades  de  cor  - 
po:  afíim  o  mefmo  corpo  de  Çhn- 
fto  pelo  Sacramento  íe;  defpio  das 
-  uro.pricaadesdecorpo,Ôc.  fcveíliQ 
^    "^  Rrij  ^^ 


i 


^^4  Index  das 

dosattributosdc  Deos,  p.  135.  &         vo  Hebreo,p.i2.EcomopafráríIo 


deinccps 

Entendimento.  Quem  julga  com  enté- 
dimento,  pòdejulgar  bem,6c  pòdc 
julgar  mal :  quem  julga  com  a  võ- 
tade,nunca  pode  julgar  bem,  p.6o. 
Quanto  vai  de  fer  julgado  com  o 
entendimento,  ou  com  a  vontade, 
p.62.  Todo  o  homcm,que  tem  en- 
tendimento, o  que  faz  muito  de 
propcíito nefte valle de  lagrimas, 
hedifpora  ruaarcenção,p.4:5g. 

Effera.  Cada  hum  fe  deve  medir  den- 

■   tro  da  fua  esfera  p.  1 00» 

^JmoU.  Cíifo  íin guiar  contra  a  ley  ge- 
ral da  ermoIa,&:  privilegio  dos  po- 
bres, p.^  14. 
Efpelho.Como  he  o  Verbo  Divino  eíl 
pelho  da  magcftade  de  Deos ,  6c 
imagem  de  íua  bondade,  pag.  gg^-. 

.  A  mais  perfeita  figura,  que  mven- 
tou  a  natureza,  &  não  pode  imitar 
a  arte,  he  a  que  fe  vè  no  eípelho,  p. 

<Ei^mí'.  Como  todos  íe  cegão  nojui- 
10  de  íy  mefmos  ,  todos  querem 
.   benção  fora  da  fua  efpecic,p.  99. 

EJperanfa.  He  bemaventurada  a  efpe- 
■  rança,com  que  neíla  vida  cfpera- 
mos  a  gloria,  pag.3 70.  Quem  dàos 
bens  na  efperança,  da-os  aonde  faò 
maiores,p.  5-47.  Mais  dà  quem  del- 
preza  o  que  eípera,  quò^ífucm  dà  o 
que  pofl'ue,p.5'49. 

Efpirito.  Apnmeira  propriedade  da 
Divindade,  que  he  fei  Deos  Efpi- 
nto,heo  primeiro  attributo  ,que 
Chriílo  reílaurou  no  Sacramai- 
to,p.239.ufq.ad  244. 

f-flados.  Quantos  Eítados  teve  o  Po- 


todos,  Ibid.  O  Rcyno  dos  Ceoj 
em  todos  os  tempos  tem  três  Eda- 
dos;&quaesfaó,p.i49.    Os  luga- 
res altos,ou  fejaó  do  Eltado  Eccle- 
fiaftico,  ou  do  Ellado  íccular,  íaó 
os  mais  aparelhados  para  a  caida, 
p.iit.  OEílado  Religiofo  tem 
mais  de  Sacramento,que  de  Cruz, 
p.5r56..5r^9 
EfiatHa.  Nmguem  melhor  facrifica  a 
Deos  o  mundo,  que  quem  lho  of- 
ferece  em  Eíi:atua,p.f47. 
EftitTfa^o.  Cada  hum  em  feu  juizo 
não  fe  deve  eílimar  mais ,  q  aquil- 
lo,  em  que  cUe  mefmo  fe  avalia,  p. 
ig2.  Ainda  que  Deos,por  fer  infi- 
nito, não  pôde  crecer  em  fy  mef- 
mo j  por  fer  limitado  o  conheci- 
mento humano,  pôde  crecer  na 
nofla  eílimação,p.5'45'.  Segundo  a 
eítimaçaõjque  fazemos  de  Deos, 
ôç  do  mundojou  crece  Deos ,  Sc 
diminue  o  mundo,  ou  crece  o  mú"- 
do,6c  diminue  Dcos,p.5'4Ó. 
Efpofa.  Sendo  a  Virgem  MariaEfpo- 
fa  de  Deos,  não  podia  ficar  cativa 
do  pcccado  de  Adaõ,  p.  161.  EH- 
pofacomas  calidades,  de  q  Deos 
lè  agrada,não  fe  acha  nos  Palácios, 
achafe  no  deferto,p,5'55r. 
EfireiUs.  Porque  razaõ  no  dia  do  Juí- 
zo haó  de  cahii-  as  Eftrellas,  ôc  naò 
o  Sol,nem  a  Lua,p.2io. 
Eternidade.  O  terceiro  vafio  da  Di- 
vindade na  Encarnação ,  que  he  a 
Eternidade,  he  o  terceiro  arrribu- 
to,que  Chrillo  encheo  pelo  Sacras 
mento,  pag.25'1.  ufq.  ad  15-8.  EíU 
mefmaprcrogativadc  Eterno  nos 
cõiuu- 


Iroufag  mais 
■  comunica  Chrifto  no  Sacramen- 

^v^ngelho.  O  livro  dos  Evangelhos 
depois  do  fim  do  mu  ndo  ha  de  du- 
rar eternamécejp.xfá.  uíq.ad  2^8. 
Os  validos  haò  de  ler  Evangeli- 
ftas,p.4i  I .  Porque  razaõ  os  Evan- 
geUltas devem  ícr  amados,  p4i i. 
Como  compraó  os  Santos  os  the- 
fouros  efcondidos  do  Evangelho, 
pag.481. 

Bxempío.  Exemplos  da  Magdakna,co 
que  íc  convence  a  fy,  paradefprc- 
;  zar  o  juizo  dos  homens,  p.  140.  O 
maior  exemplo  dos  poderes  da  pe- 
nitencia, que  no  mundo  ouve,pag. 
i45'.ufq.ad  147.  Pôde  mais  facil- 
mente darfe  o  bom  exemplo ,  que 
o  conrelho,p,5'4i. 

Excomunhão. Qn^m  poderofa  he  a  for- 
ça da  ExcómUnhíió  Te  deixa  ver 
em  hum  milagre  de  S.  Gonçalo,  p. 

194-  


fahilas.  f^^Omo  tem  páííado  as 
^^_^Fabulas,quGos  Anti-- 
gos  fingíraó,p.io.  E  como  nas  Fa- 
bulas paliarão  também  os  noflos 
vicios,p.ii. 

Fama.Os  mvejoíôs  mais  Tentem  a  Fa- 
ma, 6c  gloria  alhca  ,  que  as  fuás 
afrontas  proprias,p,f  ia. 

iviz/or.  Para  fe  vencerem  as  difficul- 
dades  dos  primeiros  lugares,  nam 
baftuó  juftiça,&:  favor,pag.207.  A 
Natureza,a  Graça  ,  &  a  Fortuna 
fazem  três  coufas  no  mundo  ,  que 
fempre  crecem,p.4i6. 


notdveU.  éoj 

H  A  Providencia  divina  faz,  quç  os 
nollos  próprios  vi  cios  fejaõ  as  te- 
ftemunhas  de  nofla  Fè,  pag.^/.  A 
quem  tem  Fè,  Sc  Efperança  refta  ^ 
fó  fazer  penitencia :  &  como  fe  ha 
de  refolvcr  a  ella,p.  149.urq.ad  i  ^6. 

Fecmáidade.  A  efterilidade  da  gloria , 
6c  Fecundidade  da  graça  he  huma 
grande  razaõ,porque  ff^iia  de  efco- 
Iher  antes  a  graça,  que  a  gloria,  p, 
:^84.ufq  ad  586. 

Feltcidade.  Ninguém  he,nem  pode  fer 
felice  com  a  alma  noutra  pane,  p. 
459.440!  Ainda  fingindo,  que  ou- 
veíie  homem  no  mundo  taõ  afor- 
tunado, que  lograílê  todos  os  feus 
bens  pacificamente,nâo  teria  com 

-  tudo  líTo  perfeita  felicidade,  p.45'6. 

Ferm'>fura.Q\xztsÍQY2iQ  as  mais  fer- 
mofas  Heroínas  da  naçaõ  Hebrèa, 
p.í2.  E  como  todas  paílarap,8c  foi. 
rao  fatais  a  quem  as  amou,lbid. 

Fidalguia.  A  Fidalguia  he  de  todos  os 
dez  predicamentos,  6c  de  todos  os 
quatro  humores,  p.  1 1 7- 

Fij^Hra.CoTCi  quantas  figuras  tem  apa- 
recido o  mundo,p.4.6c  ulterius.  A 
figura,  que  os  Governadores  haò 
de  trazer  fempre  diante  dos  olhos, 
he  o  mefipo  Rey  ,  de  quem  elles 
laó  imagens,  p.^fo.  Em  que  con- 
fifte  a  Figura,5r  femelhança  do  Sa- 
cramento com  a  gloria,  p45'9. 

Filho.  Porque  razaõ  ha  de  vir  Chriílo 
a  julgar  o  mundo  na  reprefenta- 
ção  de  Filho  de  homem,  6c  não  de 
Filho  de  Deos,  pag.  59.  Como  he 
Chriílo  Filho  Prip.iogeniro  de  fua 
fantiffima  Máy ,  6c  a  Mây  Filha 
Primogénita  do  ¥ú\\Q  ?  p'^g-  1 66. 
E  na6 


6  6 


Index  das 


Enão  fó  he  a  Máy  Primogénita 
•    do  Filha,mas  também  Unigénita, 
.*    p.169.  Gomo  a  Virgem  Maria  he 
í-    Máy  ,&  Pay  juntamente  de  feu 
bemdito  Fiiho,  p.  1 74.  Dcíde  a  E- 
ternidade.prometeoDeo.saíeu  Fi- 
lho a  prerogativa  de  poder  encher 
no  Sacramento  o  vaílo  da  meíma 
Eternidade  ,  de  que  fe  defpio  ^na 
Encarnação,  p.  251.  ^^^^^{ç.  antes 
efcolher  agraça,que  a  gloriír,  por- 
^que  a  graça  faz  ao  homem  filho  de 
.    DeoSjéc  a  gloria  herdeiro^  F- ^74* 

uíqueadgyô. 

Wim.  Deos  não  julga  íenão  110 £m :  os 

homens  não  efperão  pelo  fim,, para 

■  ■  julgar^p.yj.uíq.ad  77.  Quem  quer 

começar  btm,&  acabar  b.em,hade 

-  começar  pelo  fim,  ^  acabar  pelo 
.    principio,p  327.  ■  ..      >  y^ 
FmeT^íi,  Não  pôde  :harv^er  'mats  fííio 

amor,que  aquelk,  que  entrega  o 
CGraça5,6c  fecha  os  olhos ,  .P42.7. 
.A  maior  fineza  da  vn:tude  nos  fer- 
=^'osde  DeoSjhclògeitaremfe  ato- 
iT^ar  por  aumento  da  gra-ça  os  rigo- 

,;  -res,    qiieíaõ   remédio  da  culpa  , 

oifag.5^5'0. 

W^jO'  O  elemento  do  fogo  iie  o  iriais 

-  cfcondido,Sco  mais  nobre  doVni- 
verroyp.4 74. Porque  não  deo  Deos 
a  Adáo  o  dominio  do  elemento 
-do  fogo,p.476.0  fogo  não  consen- 
te fcrero  as  couías  o  que  laõ^p^S:^^ 
Entre  os  clenicnios  lo  o  fogo  não 
h€  Pay  ,  p.  484.  Mas  depois  qu£  o 
fogo  artificial  íc  ajuntou  com  a 
jpoivora,  cm  todo  o  género  de  vi- 
íventes  tem  filhos  de  fogo,  p.  495-. 
<Jom©  íc  iij  u  dá  o  ,  Sc  dão  a  móo  o 


fógo,ac a nguanas Walhas  navais, 
P499.  Com  que  myílerio  fingirão 
os  Antigos  a  Vulc'ano,Dcos  do  fo- 
go,manco,  & encoílado ahú boi- 
dáo,p.5'oo. 

Fome.  Communicanos  OhriftoTio  Sa- 
cramento a  infinidade  de  feu  cor- 
po, fazendo  que  fcja  infinita  a  fo- 
mcjou  nòs  -infinitos  na  fome  com 
que  o. comermos,  pag.270.6c  uke- 
rius. 

■For ima.  Sò  quem  foúbc  fazer  eleiçãa 
do  ultimo  iugar,  defarmoua  For- 
tuna,p.xi4.i  15-.  Tambcm^na  fan- 
tidade  ha  Fortuna,  p.404. 

Furtai.  Os  bens  áç^Çcc  mundo  ,  ainda 
que  não  haja  ladroens,  que  os  fiu*. 
tem,eUes.mefmos  fenos  roubáo, 
P454- 

G 

Gado.  O  pciorgado  ^e  guardai*  hc  d 
homem,  p.  i<^y 

Georfjetrta.  Qumi)  gmndehc  aciencia 
Geometricaj-para  o  emprego  cerro 
das  balas  da  Artelharia,  P.497.498L 

Gemhí.  Aié  os  Gentios  condcnavíun 
o amor,ou  cubica  dos Idcus doma- 
do, p.  468.469.      . 

íjtgamef.  A  dekcndcncia -dosGigan. 
tcs,  p.^.  E  como  ti  palfadojájlbui 
De  quantas  coufas  aqucnia  o  Sol, 
nenhuma  he  mais  agradccida,qiic 
a  erva  Gigante,  p.  99.  Os  peccados 
pela  continuação  iazcmle  gu;an- 
ttís,  p.15'4.  Qiicfijndamcntorc\-e 

;  a  Filofofia  das  fabulas,  para  fingir, 
qucos  Gigantes  fizeiaó  4i,ucrra  ao 


^^Osf^T^j"- 


ÇUri^ 


iToiífcn  ínaís  notáveis, 
ihriai  CòmparacTa  a  Gloria  có  a  gra-         ulteriuç. 

ç;í,  antes  havemos  de  cfcolher  a 

Graça,que  a  Gloria,p.:^69.  &:  uite- 

rius.Amar  a  Graça  por  anior  da 

Gloria ,  he  querer  gozar  o  premio: 

amar  aGloria  por  amor  da. Graça, 

hq  querer  fegurar  o  amor ,  p.  416. 

A  grande,  difterença  que- ha  entre 

osbensda  Gloria  do  Ceo; ,.  6cos 

chamados  bens  das  glorias  do  mu- 
do ,.p-  4.34-  Quam  grande  fera  a. 
.  gloria  dos  bemaventurados,  fendo 

dlesinfinitosyôc  a  gloria  de  cada: 
.  hum,as  glorias  de  todos,p  4664%. 
.  Ha  cafos,. em  que  por.  pedir  licen- 
ça, fe  perdem  as  mais  gloriofas  ac- 

foês,p.479. 
pvnno.  Todos  os  que  govemaó  faõ 
.  imagens  .defeusPrincipes,-p.5^i. 
-  Quam  grandes faó  as  difficuldades 
.  dos  que  governam  .em  >fua.  própria 
,  terra:,fendo imagens  dos  feuáReys, 

Ç.  ç^44.  ufque  ad  248.  Porque  os 

governos  antes  coítumão  mudar :as 
_  conçliçoens  dos  homens,  que  con- 

fervalas jo  mais  feguro  mcyo  de  to^ 
'  dos  feria.coFtarasraizes,  p.:;49.0s 

Governadores  ,,  que   não  íaã  da 

terra,que  governaõ,  ôi  vede  fora 

a  goí^ernalas,  carecem  das  proprie- 

ílades  mais  importantes  para  i  bem 

governarem,p.35'5'. 
Qofto.  Quaes  faó  os  goílos,  &  o  fabor, 

.  que  lè  acham  livres  de  amarguras 

no  ultimo  k]gar,p.  lag.  Maôs,Sc  o- 

lhos,5c  gofto  experimétaraõ  como 

o  corpo  deChriftono  Sacramen- 

.  toefl:àinfinito,p.i68.ufquead  270. 

.  Quam  penfionados  da  o  mundo  os 

gi)ílos,§c.bens  deita  vida,p.449.Sc 


4úf 


Gra^a..  O;  verdadeiro    penitente  ^ 
ellimao  que  pôde  dar  a  graçadff" 


Deós ;  6í  fó  temeo  que  a  pode ri-- 
rar ,  p.  i  ^  7.  Para  hum  homem  fc- 
eonverterinaó  baila  fó  vida,  faudcy» 
6c  juizo  j  mas  he'  principalmente 
neceíiariaagraga  dÈDeoí?,p.  i^^^. 
O  chamar  a  Deos  de  todo ^  o-  cora- 
ção,  naô  depende  fó  de  noífo  alve-- 
drio  ,  fenão  também  da  graça  de; 
Dtos,  p.rjjT.Saó  tam  efquecidõs  os- 
homens  de  fazer  efcolhado- lugar" 
que  mais  lhe  con  vem,  qu2  fe  algãi 

'  ouve ,  que  a  fizefie ,  foi  por  eípfe- 
cial  auxihoda  graça  Divina,p.23,i» 

-  Annda  que  enchemos  aaUna  comi 
a  graça,  devemos  encher  a-graça^ 
com  as  obras ,  fem  as  quaes  a  graças 
não  permanece  ,  p.  .278.  Nem  por' 
fer  a  Ley  de  Ghriáo  Lsy  da  graça^. 
ha  de  fer  nella  tudo  graça,  .p.29f:.. 
eomparadà  a  Graça  com  a  Glon%, 
antes  devemos  efcolher  a  Graças,* 
que  aGloria, p.3 69.  ufque  ad  386.. 
Quem  foube  fo  achar  paralelo  aí. 
graça  da  Mây  de  Deos,  p.  593- Â^ 

■  í inundação  dedehcias,  com  que.  ai 
Senhora fubia para  o Ceo ^  eraõ  as; 
de  fua  gra^a,  p  .394.  Queminam  a- 
ceita  a  graça  de  Deos,fecha  as  por-- 
tus  àSantiíIima  Trindade,  p.  ^96.- 
Q^am  pouco  cafo  fazem  os  ho- 
mens da  eleição  da  graça,  p*  ^96.'. 
Scdeinceps. 

Grand-ézjt.  Os  bens,  que  o  mundo  châ-- 
.  ma  grandes,  ío  íãé  bens,  quando  is.; 
deixaôjSc  fó  íaõ  grandesjqiiandoie- 
efperaó,p.  5-49. 

Gnerrof,  Qu^e  guerras  da^ntiguid^deí 


I 


» 


6o  ^  Indexe  das 

tem  pafrado,p.  S.  No  tempo  da  paz         Sc  os  homens  conhecerão  os  cora- 


podeíe  rofrer,que  fe  dem  os  lugares 
às  geraçoens  j  mas  no  tempo  da 
guerra  ,  naõ  fe  haó  de  darfe  naô  às 
acçoens,p.  ii8.  Notável  coufahe, 
que  tenha  a  graça  defpojos ,  como 
íe  fora  guerra,  p.4i5'.Quanto  mais 
trabalhofa  he  a  guerra  do  mar,que 
ada  terra,p.497. 

Hírí^tjça.  Devefe  antes  efcolher  a 
Graça^que  a  Gloria;porque  a  Gra^ 
ça  faz  aos  homens  filhos  de  Deos* 
Êc  a  Gloria  herden-os,  p.c^74.ufque 
ad^jó.  S.  loaõ  Evangelilta  foi  a 
herança  principal  de  leu  teftamcn* 
to,  p» 409»  Mais  deixava  Chrifto 
cm  deixar  por  herança  S.  loaõ  E- 
vangeliftaaSuaMáy  ,  do  que  em 
dar  o  Reyno  do  Ceo  a  Dimas  ,  p. 
411.  Onde  oPay  heDeos,  tanto 
direito  tem  à  herança  dos  bens  os 
anependidosjcomo  os innocentes, 

P  458.  .^    ^      ^ 

Homens.  Quanto  variarão  os  homens, 
deíde  a  lua  primeira  infância,  p.45'' 
Qual  foi  o  primeiro  homem  y  que 
fe  atrevèo  a  por  a  Coroa  na  cabeça, 
p.6.  Paílaó  os  homens  como  íenaõ 
paílàraõ,  p.  20.  Nenhum  homem 
pode  entrar  duas  vezes  no  mcímo 
rio:  6c  porque,  p.  21.  Os  homens  , 
que  chegaó a ier velhos,  morrem 
féis  vezes  :  ôccomo,p.  25.  Enthe- 
íburaó  os  homens  para  o  dia  do  lui* 
2.0  a  ira,6c  vingança  de  Deos,  p.26. 
-Lj  O  juizo  dos  homens  he  muito 
mais  temcrofo  ,  que  o  juizo  de 
Deos;  ôc  porque,  p.j/.  Sc  ultcnus. 


çoens,  nao  navia  que  temer  léus 
Íuizos,pi6vPorque  queria  David, 
queojulgaíleDeos,  ôcnãoosho- 
mens,p.67.68.  Quanto  mais  feguro 
he  ir  ao  luizo  de  Deos  com  pccca- 
dos ,  que  ao  dos  homens  com  mila- 
pres,p.  69.  Quantas  vezesjulgaó  og 
Homens  pelo  que  nunca  vos  paflbu 
pelopeníamento  ,  p.  72.  Ecomo 
jujgaó  também,  pelo  que  nem  a  el- 
les  lhes  paílbu  pelo  penfamento,  p. 
73.  Comojulgaó  os  homens  antes 
do  fim ,  p.  75".  ufque  ad  77 .  Os  ho- 
mens ,  quando  teftemunhaó  de  fy 
mefmoSjíãó  humacouíã,6c dizem 
outra,  p.89.  Sc  ulterius.  Os  homens 
olhados  pelas  primeiras  paredes, 
naó  faõ  mais  que  hum  Idílio  do  ze- 
lo, p.icó.  ufque  ad  108.  Para  pro- 
nofticarcmbéos  Portuguezes  an- 
tigosjconfultaváo  as  entranhas  dos 
homens,  p.  iig.  Nenhuma  coufá 
trazemos  os  homens  mais  dctraz 
de  nòs ,  que  a  nòs  melmos,  p.  1 25'. 
Mais  fe  devem  temer  ospeccadcs, 
que  o  juizo  dos  homens,p.iq7,No 
juízo  dos  homens  appcllafedt pois, 
no  luizo  de  Decs  appcllafe  antes, 
p.  i44.Todoohomcmneílemun, 
do  dcíeja  melhorar  de  lugar,p.  194, 
195-.  TcdÀS  as  maravilhas  do  Cor* 
po  de  Chriílo  no  Sacramento  >  co- 
munica aos  homens  omefmoSn^ 
cramcnto,p.i^9.  &  ultenus.  Chri-^ 
ílo  Sacramentado  comunica  aos 
homcsaimmeníidaac,  que  tem  no 
Sacramento,  p.248.uíquc  ad  2f'. 
S.  Gonçalo  naícco  Minino  Ho* 
mcm>p»28ó.&.  ultcriuç^Os  homens, 

que 


coiífas  mais  notawis.  ^^^^ 

que governaó homens, haõ  deter         tiírniiaMá)r,p.iSi.  ufquc  ad  ^icÍ4. 


avcço.ôc  direito,  p.z9  7.  Aílim  co- 
mo no  feu  nalcimento  foi  S-  Gon- 
çalo minino ,  como  homem;  aífim 

;  depois  de  morto  foi  homem,  como 
Deos,  p.  517.  ÔC  ulterius.  Nósjfen- 
do  na  idade  homens ,  na  vida  ,  8c 
cofbumes  fomos  mininos,  p.  326. 
Como  deve  o  mundo  abrir  os  o^ 
lhos,  &  não  fe  contentar  de  ver  os 
homens  fó  por  fora,  mas  confídera- 
los  também  por  dentro,p.440. 

H.nra.  O  ultimo  lugar  merecido  por 
diftribuiçaó  alhca ,  pôde  fer  afron^ 

-  tòfo:  tomado  por  eleyção  própria, 
he  o  mais  honrado,  p.  X24.  &  ulte- 
rius. As  acçoens,6c  feitos  honroíbs 

.  com  mayor  razão  fe  podem  elperar 
daquelles,que  querem  acquirir  ho- 
ra, que  dos  que  cuidaó,ôc  dizem, 
"quejàatcm,p.  55*8.  &  ulterius.  A 
diftcrença  da  honra,com  que  Deos 
communica  no  Ceo  aos  Bemaven- 
turados  a  íua  vifta,  &  aos  q  o  amaõ 
na  terra  a  fua  graça ,  moftra  quan- 
to a  graça  deve  fer  preferida  à  glo- 
ria, p.281. 

^orto.  No  Horto  colherão  Chriílo,&: 
fua  Santiílima  Máy  os  primeiros 
frutos  da  Redempçaó,p.  167.6c  de- 
inceps.  No  Horto  ouve  hum  novo 
Calvário ,  fem  monte;&  no  fuor  do 
fangue,huma  nova  Cruz,,  fem  cra- 
vos, p.i68.  O  effcito  geral  do  lan- 
gue da  Cruz,foi  remir  j  &  o  parti- 
cular do  langue  do  Horto ,  remir 
prefervando,  p.i 70.  uíque  ad  1 72. 
■  O  Sangue ,  que  Chriílo  fuou  no 
Horto ,  foi  o  mefmo,  que  na  En- 
carnação tinl:^^  recebido  de  fua  Sã- 


Hoftia.  Depois  do  fim  do  mundò,íe 
confervarà  eternamente  no  Ceo 
huma  Hoftia  confagrada,p.2f ^uf- 
queadi^S. 


ídolo.  Como  faõ  os  homens  ídolos  do 
zelo,p.io6.  ufque  ad  108. 0  que  faz 
a  penitencia  para  defprezar  o  Ido- 
iodo  juízo  dos homens,p.  134.  uf- 
que ad  142.  Como  fe  fazem  as  al- 
mas Idolatras,p.  y^o. 

Ignorância.  O  perfeito  lègredo ,  he  o  q 
chega  a  fer  ignorância, p.  420.  ; 

Imagem.  Todos  os  que  goyernaô  íâõ 
imagens  dos  feus  Príncipes,  p.331. 

:  AAdaódcoDeus  particularmen» 
te  o  titulo  de  Imagem  fua :  &  por- 
que,p.332.0  que  ouver  de  ler  Ima- 
gem verdadeira  de  Deos,  naó  baila 
que  feja  homem  com  alma;  fenam 
também  alma  com  homem,  p.  335- 
Porque  razão  diziaõ  os  Antigos, 
queaiipagem  de  Mercúrio  fenam 
fazia  de  qualquer  madeiro,  p.  324. 
Como  fie  o  Verbo  Divino  Imagé 
da  bondade  de  Deos,  p.  33^.  Anti- 
guamente  conheciaõíèas  imagens 
dos  homens  pelas  fuás  íbmbras ,  p. 

341.  Quanto  excedem  às  vezes 
as  fòmbras  deftas  imagens  aos 
Reyrcíe  que  íàó  imagens ,   p.  34.1. 

342.  Os  que  faõ  imagens  dos  Icus 
Kcys  em  terra,  onde  íaõ  naturaes, 
ainda  tem  outras  difficuldades  no 
íèu  governo,  p. 344.  ufqu€  ad  348, 
Mais  eftimaó  os  íupremos  Monar- 

Ss  cas 


""Pt- 


■^^MB 


tti 


J 


6io  hidex 

cas  os  obfcquios  que  fe  f  a:zem  a  Tu  as 
Imagens,  que  a  fuás  próprias  pef- 
foas ,  p.  g6o. 

Immmjidade.  A  Imméfídade  he  o  fcgú- 
do  vaíio  da  divindade  ,  que  pelo 
Myílerio  da  Encarnação  fe  Umi- 
tou  a  hum  fó  lugar,  p.  14^.  E  deíla 
immenfidade  do  que  Deos  fedei- 
pio  pela  Encarnação ,  fe  reveftio 
outra  vez  pelo  Sacramento  ,  Ibid. 
ufquead  p.2jri. 

Immonalidade.  A  nofla  injuíliça  he  a 
mais  evidente  prova  da  noíla  im- 
mortalidade,  p.  y;,  Q  corpo  de 
Chrillo  no  Sacramento,  fendo  na- 

.  tural mente  corpo  mortal  ,  ficou 
immortal:  &  íendo  naturalmente 
paífivel ,  ficou  impaííível  p.261 .  uf- 
quc  ad  264.  E  como  eftes  dous  ef- 
feitos  de  mimortalidade ,  &  impaf- 
fíbilidade  fe  nos  communicaõ  no 
Sacramento,p.i64.  ufquc  ad267, 

ImpAJjibthdade.  O  corpo  de  Chriílo  no 
Sacramento,  fendo  naturalmente 
paílivt.1,  ficou  impaílivel,  pag.26i. 
urquead264.  E  como  nos  comu- 
nica no  Sacramento  eílv?  mefmo 
eífeito  de  impaílivel,  p.264.  E  ain- 
da que  a  mefma  experiência  pare- 
ce,que  faz  difiicultofo  elle  efieito 
de  impaffibilidade ,  não  deixa  o 
corpo  de  Chriílo  de  nolo  comuni- 
car no  Sacramento,  p.iój-.zéó. 

•  /w/?m(?.QLiaes  foraó  os  primeiros  Im- 
périos do  mundo,  p.6.  A  fua  infta- 
bilidade,  Ibid.  Profecia  das  duas 
partes  do  mundo,  a  pólvora,  8c  o 
Império  Otomano,  p  492.49 g. 
Infinidade.  O  vaíio  da  nifinidadc  do 
Verbo  na  Encarnação    fuprio  o 


das 

corpo  de  Chriílo  no  Sacramento, 
p.267.ufq.  ad27o.  E  como  íe  nos 
comunica  pelo  Sacramento  cílc 
mefmo  eífeito  de  infinito,pag.270. 
ufq.ad27z.  A  infinidade  da  graça 
da  MãydeDeos,p.g9^. 

Inferno.  O  que  dizem,Sc  falíâo  no  In- 
ferno os  condenados,  p.5':^.  ufq.  ad 
55'.  Nem  porque  mais  íc  deve  te- 
mer o  Inferno,  6c  morte  da  alma , 
que  a  do  corpo  ,  he  mais  temerolò 
ojuizo  de  Deos,que  o  dos  homens: 

-  6c  porque,p.  78.6c  ulterius. Porque 
fe  compara  o  zelo  ao  Inferno,  pag. 
106.  Por  confervar  a  graça,  atè  hc 
licito  querer  antes  padecer  as  penas 
do  Inferno,p.ç^8o.  No  invejoío  atè 
as  penas  do  Inferno  íaó  mais  tolr- 
raveis,que  a  gloria  alhea,  pag.  522. 
ufq.ad  5-24. 

Injuria.!.  As  injurias  faó  a  mufica  dos 
penitentes,p.  i  :>8.  i  ^9. 

Innocencia.  QLianto  mais  calla,  cntaõ 
allega  por  fy  melhor  diante  de 
Deos,p.5'i7.  Não  pòdc  chegar  a 
mais  o  mais  fervoroío  defcjo  da 
fintidadc,que  fogeitarfe  aos  remé- 
dios do  peccado,quem  goza  os  pri- 
vilégios da  innocencia,p.5'5x.  Não 
ha  lãcrificio  mais  fcmofo  aos 
olhos  de  Deos ,  que  húa  innocen- 
ciaifiuítreem  habito  de  peniten- 
cia,p  5,-4. 

Intentos.  Os  que  não  chcguo  a  ter  ex- 
ecução, caufaõ  a  maior  pena  do 
mundo,p. 5- 1 7.ufq.ad  5-2.0.  Provafe 
o  mcímo,p.5'i7.5'2H. 

Inveja.  Nos  tribunais  onde  a  inveja 
prefidc,  as  virtudes  íaó  peccados,p. 
jio.Sáotaó  linces  os  olhos  da  in- 
veja. 


coufas  mais 
vcja,qne  nosimpoíliveis  do  pec- 
catio  defcobrem  culpa,  p.yij.fiô. 
Os  invejofos  niíiis  féntem  os  bens 
alheos,queos  males  próprios,  pag. 
5'ii.uiq.ad525'. 

Invifibdtàade.  Se  o  Verbo  veílindoíê 
de  corpo  humano ,  de  inviíivel  íè 
fez  viíiveli  o  mefmo  corpo  para  re- 
cuperar a  inViíibilidade  perdida 
na  Encarnação  ,  fe  tornou  a  fazer 
invifivelna  Encarnação,  P.275.E 
efla  raefma  invifibilidade  noís  co- 
munica Chriílo  íàcramentado, 
Ibid.ufq.  ad2  75'. 

Jogos.  Qiie' jogos  ouve  .nomúdo'mais 
celebrados,  p.9.10.  E  coittOpàíIá- 

■'  rão todos, Ibid.  >?ííí;>..'^  -  u. 

íiiiz^.  Dèos  julga  como  luiz:  6c  os  bo- 

.mens  julg^o  como  judiciários,  p. 

8g.  No  juizo  dos  homens  não  ba- 

íl:a,que  hum  julgue  com  juftiça, 

'paraefcapar-de  fer  julgado  inju- 

t''ftamente,p.  85*.  Ninguém  ha  taô 

-   '  reâio  juiz  de  fy  mefmo,  que,oudi- 

ta  o  que  he,ou  feja  o  que  diz,pag. 
p.&ulterius. 
Ihízjo.  Os  dous  maiores  portentos^que 
^    fe  háo  de  ver  no  theatro  univerfal 
-'   do  dia  do  luizo,  pag.a.  Gomo  he  o 
diadoluizo  húa  rede  lançada  no 
mar,p.24.  Atè  o  nada  não  efcapa- 
rà  da  conta  no  dia  do  luizo,  p.  28. 
ufq.ad  g2.  Em  três  Parábolas  nos 
e  ■ -rcíumio  Chriílo  em  íumma  toda  a 
*-'• 'Conta,que  nos  ha  de   pedir  no  dia 
-•^o  luizo :  6c  quaes  faó,  p.gf.ôc  de- 
inceps.  O  juízo  dos  homens  he 
muito  mais  temerofo  ,  que  o  juizo 
de  Deos :  &;  porque,p,5'7.  &:  ulter. 
Qual  he  o  juízo  de  cada  hum  .de 


notdveis.  6m 

nos  para  C0íifigp,p.88.5c  deiíTceps. 
Como  todos  fe  cegão  no  juizõ  de 
fy  meímos,  todos  querem  benção 
fora  da  fua  efpecie,p.99.  Como  íàõ 
diveríbs  os  íucceílbs  ,  6c  osjuizos 
humanos, p.  112.  No  tribunal  da 
Penitencia  fejulgaõ  o  juizo  de  ly 
mefino,  o  juizo  dos  homens ,  ôc  o 
j  u  i zo  de  Deos :  6c  como,  pag.  121. 
&ulterius.  , 
Ififliça.  Para  íe  vçn  cerení  às  difficul- 
dadesdosprimeiros  lugares,  nant 
baílãojuíliça,6c  favor,p,207. 


L 


Ladroens.  Porque  na  terra  ha  La- 
droes, &noCeo  naójpor  iífo  ha- 
vemos de  fazer  os  nofíos  theíòu- 
ros  dos  bens  do  Ceo,5c  no  Ceoj  5c 
naó  dos  bens  da  terra,  6c:  na  terra. 

Lagrimas.  Porque  razão  nem  as  la- 
grimas ,  qUe  íàô  de  goílo  ,  tem  lu- 
gar no  Ceò,p.  448.  449. 

Ley.  O  juizó',  com  que  nos  julgamos 
huns  aos  outros,  he  Ley, que  pu- 
zemosaDeos ,  para  que  ellé  por 
ella  nos  julgue  também  a  nòs,  p. 
85-.  Nem  por  fer  a  Ley  de  Chriílo 
Ley  da  Graça,  ha  de  íer  nella  tu- 
dograça,p.297. 

Z-fír^/.  Qiieiètras,6c  ciências  tem  flío- 
recido  nÒ  mupdo,pag.8.9.  E  como 
tem  jà  paífado  todas,  Ibid. 

Líceffça.Ha  cafos,em  que  por  pedir  li, 
cença  fe  perdem  as  mais  gloriofas 
acçóens,p.479. 

Livros.  O  Livro  da  vida  he  hum  fó:& 
Ss  ij  os 


n 


■li 


íflii 


Cl2 


os  Livros  díi  conta  iàõ  muitos ,  p. 
a8.  Todos  os  peccados  dos  fubdi- 
tos  íe  carregâo  no  Livro  das  con- 
tas dos  Superiorcs,p,  2  7. 

Loures.  Náo  baila  muitas  vezes  ,  que 
fp^  os  bens  defte  mundo  fejáo  noílòs, 

para  que  o  mefmo  mundo  no  los 
deixe  lograr,p.4yo. 

Z/y^.  Nenhúa  benção  fe  podia  dar  à 
Lua  mais  venturofa  ,  que  o  náo 
crecer,p.ioi. 

Luffar.  O  j uizo  de  Deos  ha  de  fer  em 
humfólugar:ôc  ojuizo  dos  ho- 
mens he  em  todos  os  lugares,p.8i. 
No  tempo  da  paz  deíe  o  primeiro 
lugar  a  quem  melhor  for  :  mas  no 
tempo  da  guerra  ha  de  darfe  a  que 
melhor  obrar,  p.  119,  Todo  o  lu- 
gar he  nada,p.i96.i97.No  mundo 
naó  ha  lugar  melhor,p.  198.  Sò  no 
Cco  ha  melhores  lugares,pag.  199. 
ufq.ad  201.  O  melhor  lugar  he  o 
ultmiOjp.io^.ôc  deinceps.No  Ceo 
naó  tem  lugar  a  diviíàó,que  ha  nos 
bens  da  terra,de  meu  ,  ôc  teu,  pag. 
460. 

Z-»2,.  Deixounos  Chrifto  comunica- 
do em  fua  doutrina  três  rayos  de 
ília  divina  luz,  para  que  vejamos 
agora  o  que  no  dia  do  luizo  have- 
mos de  ver,  p-g4.  E  quaes  faó  eftes 
três  rayos  de  luz,p.^ j.6c  ulterius. 


In^ex  das 


M 


Mal.  He  propriedade  dos  males  últi- 
mos ,  izentarcm  de  fy  mefmo  a 
quem  oprimem,  p.i  14.  Para  haver 
mal,  ôc  bem  baila  hum  fó  momen- 


to,p.4^6.  O  poilco  caía,que  fe  de- 
ve fazer  dos  bens  deíle  mundo, 
poríerem  fempre  taò  miílurados 
com  os  malesjcomo  fe  verdadeira- 
mente foraô  puros  males  ,  p.  44^. 
444.  Com  que  razão  clamaó  as 
Efcrituras,  quedas  partes Scnten- 
trionaes,  &  do  Norte  fahiria  todo 
o  mal,  p.  491.492. 

Mandantentoí .  No  juízo  de  Deos  ,  que 
guardar  os  Mandamentos,  pode  e- 
Itar  feguro:&  no  juizo  dos  homens 
não  aproveita  guardar  os  Manda- 
mentos,p.8:^.  Ha  mandamentos  da 
ley  da  Inveja,  aílim  como  ha  Man- 
damentos da  Ley  de  Deosjp.^ig. 

M^o.  Como  havemos  de  aceitai*  da" 
mão  de  Deos  os  talentos,  que  cllc 
for  fervido  darnos,  pag.44  ufquc 
ad47. 

Maravilhas.  Quantas,  Sc  quaes  foram 
as  Maravilhas  no  mundo  celebra- 
das,p.ig.  E  como  todas  paíláraó, 
Ibid.  Por  mais  que  cada  hú  fe  pin- 
te Daravilhofo  no  ícu  conceito, 
faltalhe  para  Mefliasa  condiçam 
principal  :  &:  qual  he,p.9». 

Marta.T\es  fuppoíiçoens neccflarias, 
para  íe  tratar  daConceiçaó  da  Vir- 
gem Maria,  p.  i6o.  Por  valor  do  J 
langue  de  fcu  Filho  foi  a  Virgem  1 
Maria  prefcrvada  do  cativeiro  do 
pcccado  de  Adão,  p.iói.uíquc  ad 
164.  S.Bernardino  de  Sena  diz, 
queremio  Chriílo  a  Virgem  Ma- 
na fua  Máy  com  o  primeiro  fan-j  j 
gue,que  derramou  na  Cruz,p.i65'«  'f 
Allimno  HortOjComono  Calvo-  . 
rio  obrou  o  Filho  de  Maria  como 
Jcfu  ,  2c  comoRedcmptora  fua 

rc- 


mífas  mais 

yedempção,  p.  169.  E  eom  que  dif- 
fcrença,Ibid.  Que  prerogativa  te- 
ve o  fangue  do  Horto  para  fer  pre- 
ferido ao  da  Cruz  no  myfterio  da 
Conceição  de  Maria,p.i7i.urque 
âd  174. 0  fangue  animofo,que  no 
.    ;Horto  faltou,&  fahio  fora  das  veas 
1  ide  Chrifto,  foi  o  que  o  Verbo  en- 
carnado confcrvava,6c  tinha  rece- 
bido do  fangue  de  fua  Mãy,p.  184. 
A  graça  daVirgem  Maria  tçm  trcs 
eftados  de  perfeição,  p.^Só.Quan- 
to  eftimou  mais  a  Virgem  Maria 
a  graça,que  a  glaria,  p.  38 /.Quan- 
to Dcos  quíz  que  crecefle  a  graça 
de  Maria,  pag.  588.  Quacs  foraó  os 
.^j.au mentos  da  graça  da    Virgem 
.  s  Maria,p.  :i89.ul^.ad  ^95". 
Medidn,  _C2^ú2i  hum  fe  deve  medir  de- 
tro  da  fua  esfera,  p.  100.  Para  fc  co- 
nhecerem os  que  o  zelo  come,  ou 
.;  os  q  come  do  zelo,  deve  fer  medi- 
ar dos  pela  cintura, p.104  NoApofto- 
a^ílado  de  Chrifto  S.Joaó  Evágelifta 
;^  yfempre  era  do  fcu  tamanho,p4i8. 
Como  pela  medida  do  paõ,ou  pe- 
lo paó  fem  medida  fe  avalia  a  gra- 
ça,p.424.  Nunca  as  maquinas  vi- 
vas igualaó  as  niédidas  das  Ibnha- 
das,p.5'47.  . 

j\^eyos.  Aflim  os  meyos  univeríaes, 
como  os  particulares,  com  q  Deos 
aflifte  a  todos  os  homens,  faó  os  ta- 
lentosjde  que  devemos  dar  cota  a 
Deos,  p.4i.  Como  os  meyos  entre 
fy  contrários  nos  podem  igualmé- 
-  te  levar  àfalvação,p.4:^ 44.  Quâ,- 
tos  meyos  ,&  remédios  inventa- 
rão os  homens,  para  cada  hú  pof. 
fuir  quietamente  o  feu:  mas  fem 


notáveis.  .  ^'3 

proveito,  pagin.  45'!. 
Memoria.  Os  homens  comummente 
não  fabem  guardar  fegredo ,  por- 
que o  encomendão  à  memoria,  6c 
não  ao  efquecimento,p.42o.  ^ 
Mentira.  Na  matéria  de  vos  quê  fois, 
todo  o  homem  mente  duas  vezes: 
húa  vez  mentefe  a  fy  ;  outra  vez 
mentenosan0S,p.89. 
Merecimento.  Hum  grade  delito  mui- 
tas  vezes  achou  piedade  :  hum 
grande  merecimento  nunca  lhe 
Faltou  inveja,  p.67.  Adiverfidade 
das  bcnçoens  náo  argue  defigual- 
dade  de  amor  em  quem  as  dà ,  fe- 
nâo  differcnça  de   merecimentos, 
cm  quem  as  recebe,p.98.  Qiianto 
mais  cufta  o  alcançar  ,  que  o  me- 
recer, p.aoS. 
Milagres,  Não  ha  coufa,  de  que  mais 
fc  efcandalizem  oshomens,que  d« 
haver  quem  faça  milagres,pag.6^. 
_    Se  foftesleprofo  algum  dia,  ainda 
que  Deos  faça  milagres  em  vos, 
leprofo  haveis  de  fer  toda  a  vida, 
P7  7-  Qtiantos  milagres  vemos  ne- 
fte  muHdo,8c  quantos  homens,  êC 
alvitres,  mi lagrofosà  cufta  do  pàõ 
alheo,p.295'.  Não  eftà  a  perfeição 
do  milagrofo  em  poder  fazer  os 
milagres,  fenaô  em  os  fáber  fazer, 
p.  29(^iS'ão  milagrofo  fe  moftra  S. 
Gonçfk)  quando  faz  por  nòs  os 
milagresjcomo  quando  ceíl^a  de  os 
f^zeçíp.gi:^.  Qiiaes  fió  as  infignias 
dos  milagres    daquellas  imagens 
dos  Reysjquandotornaõ  das  Con- 
quiftas  para  donde  viera5jp;34^. 
^/>3í«o.S.  Gonçalo   nafceo  mmma 
homem  >p.2.86.6c  ukenus, 


ii 


m 


um' 


6i4* 


Mijericordia.  Porque  Dcos  ama  a  Mi- 
lericordia,&  a  verdade,por  iílb  da- 
rá a  graça,6c  mais  a  gloria,  p.369. 
He  tal  a  bondade  de  Deos,  que 
quando  quercaftigaros  homens, 
f  porque  nunca  fe  efquece  defua 
mifericordiaj  o  que  mais  fente  he, 
naó  haver  algum,  que  fe  lhe  oppo- 
nha,&:  lhe  rcfiíla,p486. 

/J/í?ríf. Quantas  vezes  morrem  os  ho- 
mens,que  chegão  a  fcr  velhos,pag. 
23.  De  todos  os  géneros  de  morte 
pôde  haver  eíperança  de  efcapar  j 
&fó  a  morte,  que  traz  configo  a 
velhice,  he  morte  fem  eíperança, 
p.  308.  Intentos  naó  executados 
cauíaóíiúa  morte  ,  que  por  mais 
penar,  não  mata:  fabefe  fentir, 
mas  naólefabe  explicar,  pag.5'19. 
Porque  lhe  parecia  a  Job  melhor  a 
morte,  que  a  vida,  p.  5-37.  Porque 
razaó  íe  compara  o  amor  grande  à 
morte,Sco  amor  maior  ao  Infer- 
nojp.^óo. 

'Mndança.  O  juizo  de  Deos  pôde  mu- 
darfeiÔc  o  dos  homens  naó  fe  mu- 
da,p.8;. 

Mundo.  Com  quantas    figuras   tem 

'  aparecido  o  mundo,  pag4.&  ulte- 
rius.  Qual  foi  a  maior  oílentaçiío 
de  grandeza,  que  fe  vio  jYpíle  Mú- 
do,p.20.ii .  De  eftar  o  Bautifta  em 
priíòens  fe  prova,que  ,ha  de  haver 
outro  juizojêc  outro  Mundo,  pag. 
56.  Quantas  tragedias  fe  repreíòn- 
tão  no  Mundo,em  que  as  mefmas 
injuftiças  faó  verdadeiras,  pag.  74. 
Como  pôde  ler ,  que  haja  outro 
tribunal  no  Mundo,em  que  o  jui- 
7.0  de  Deos  íe  rcvoguç,  pag.   145. 


Index  das 


Nefte  Mundo  nâo  ha  lugares,pn<y. 
196.197.  Nem  ha  lugar  melhc?, 
amda  fuppondo,  que  haja  lugares, 
p.198.  E  admitindofe  haver  me- 
lhores lugares  ,  íó  no  Ceo  os  ha, 
pag.i99.ufque  adioi.  No  Mun- 
do o  ultimo  lugar  he  o  melhor : 
mas  no  Ceo  o  melhor  he  o  prunei- 
ro,p. 226.22 7.  Três  coufas  ha  no 
Mundo,que  íempre  crecem,  pag. 
416. 

N 


Nada.  \  Tè  oNadanãocfcaparà 
--tjL  de  dar  conta  no  dia  do 
Iuizo,p.28.ufq.ad  gi.Quantos  pcc- 
cados  lè  veràõ  fair  no  dia  do  luizo 
debaixo  do  Nada,que  agora  os  ho- 
mens nâo  vem  ,  nem  querem  ver 
em  fuás  conciencias,  p.  54.  Como 
nos  conhecemos,  que  fomos  Na- 
da ,  vendo  as  imagens  de  noílbs 
peccadosjp.ig^.  Todo  o  lugar  he 
Nada,  p.196.  197.  Deixara  Deos 
por  amor  dos  Nadas  do  mundo,he 
fazer  a  Deos  menor  que  Nada,  p. 

5-47- 

Nafcimento.  Deos  ha  de  julgar  os  vi- 
vos,Sc  os  mortos:  6«c  os  homens  atè 
os  que  eítáo  por  nafcer,  julgaó,  p. 
82.  Comopreícrvou  Chrillo  cio 
peccado  a  lua  íántiííima  Máv,  an- 
tes de  fer  nafcido,&:  fendo  primei- 
ro o  Nafcimento  de  fua  Máy,  que 
oleu,p.i76.i77. 

Nao.  Todos  imos  embarcados  na 
meíma  Nao,que  he  a  vida:&  todos 
navegamos  com  o  mefmo  vento, 
que  beotcmpo,p,2i.22. 


coiifas  mais  notáveis, 


éíi^ 


Naturez^a.  Os  bens  Ibbrenaturaes  ex- 
cedem na  nobreza,  preço,  &  dig- 
nidade a  todos  os  bens  da  Nature- 
2a,p.^68. 

Nome.  Qiiando  começou  o  nome  do 
governo  no  mundo,p.ggi  .Não  he 
JLiftojQue  conferve  a  memoria  dos 
Pays  no  Nome  ,  quem  profeíla  o 
clquecimento  dos  Pays  na  vida,p. 
^-fó.ufq.ad  558.  Porque  razam  fe 
deve  antes  tomar  na  Religião  o 
nome  da  Cruz ,  que  o  do  Sacra- 
raentOíp.^óg  5*64. 

i\r/;<»?e/í7.  Os  Profetas  naõ  fe  ha5  de 
conhccer,né  avaliar  pelo  N  ume- 
ro,  fenaô  pela pefojp.  109.  Sc  ulte- 
rius. 

Nuvem.  Como  he  a  Virgem  Maria 
Nuvem  leve,p.5'29. 

o 

Obedi.nciít.  "TT  M  quãto  Adão  obe- 
[_/deceo,  &  guardou  o 
Regimento,  que  Deos  lhe  tinha 
dado  no  Paraifo,  confervou  emíy 
a  imagem  politica,  que  tinha  de 
Deos,p.35'3.  Como  devem  osfub- 
ditos  ter  íogeiçâo  prompta,ôc  ale- 
gre obediência  a  feus  Governado- 
res ,  por  íeiem  imagens  de  íeus 
Reys,p.^5'7. 

Ohras.  A  perfciçáonaõ  coníifte,  em 
que  as  nollas  obras  fejão  boas,  íe- 
não  em  que  fejão  bem  feitas,  p-  g. 
Quem  leva  a  calumnia  nas  obras, 
não  importa,  que  tenha  as  defefas 
no  coração,  p.65.  Para  com  os  ho- 
mensjO  maior  immigo,que  temosj 


faó  as  noflas  boas  obras: &  porque, 
P.67.&:  dtinceps.  Qiianto  ao  con- 
trario das  obras  julgão  os  homens 
os  penfamentos,  p.  7 1 .  6c  ulterius. 
Cada  hum  he  o  que  faz ;  ôc  não  he 
outra  coufa,  p.iif.  116.  As  boas 
obras  faó  a  maior   fegurança  de 
noílã  predeílinação,  p.120.  Como 
fe  entende  c  modo  de  faílar  da  Ef- 
critura,  que  Deos  ao  dia   fetimo 
defcançou  de  todas  as  obras  ,  que 
tinha  fcito,p.5 19.6c  310, 
0<aí/í».  Muitas  vezes  parecem    finezas 
de  amifade,  o  que  faó  ódios  reíina- 
diílimosjp.fi  i.ôc  ulterius. 
Oferta.  Como  fe  pôde    ofFerccer  a 
Deos  mais,  do  que  delle  fe  tem  re- 
cebido,p.548. 
Officios.  Como  no  dia  do  luizo   ha  de 
pedir  Deos  conta  dos  Officios ,  ÔC 
cargo§,q  fe  exercitarão  nefta  vida, 
p.  ç^y.ufq.  ad4i.  Em  Deos  a  von- 
tade, &  o  entendimento  tem  re- 
partidos os  Officios,p.  61. 
Olhos.  Quem  quizcr  julgar  os  outros, 
vire  os  olhos  para  détro  de  fy  meí- 
m:0,p.86.  Os  verdadeiros  Profetas 
conheccmfe  pelos  olhos,  pag.  i.i?. 
Maior  cçgiieu'a  he  ver  hua  coufa 
por  outj^ajque  não  ver  nada ,  pag. 
114.  A^pçnitencia,  ou  nos  volta  os 
olhos  de  (ora  para  dentrojpara  que 
nos  vejão  :  ou  nos  vira  anos  mef. 
mos  de  dentro  para  fora,  para  que 
nos  vejamosjp.  125.Sc  ulterius.  Os 
noflbspeccados  poílos  diante  dos 
olhos,convenccm-nos  a  nòs  com 
noícojôc  emendão  o  noíTojuizo 
com  o  nollo  próprio juizo,  p.  152. 
A  penitencia  para  o  juizo  de  fy 

meí- 


íB 


m 


6i6 


Index  das 


u 


mcfmo  abrcnos  os  olhos  \  &  para  o 
juizo  dos  homens  fechanos  os  ou- 
vidos, p.  1 54.  Mãos,  olhos,  &  gofto 
experimentarão  como  o  corpo  de 
Chrifto  eftà  no  Sacramento  infi- 
nítamente,p.i68.  uíq.  ad27o.  Aí^ 
fim  como  he  grande  dignidade 
das  imagens  dos  Príncipes  o  ha- 
ver de  repreíêntaios  nos  olhos  do 
mundo;  aílim  he  muito  difficulto- 
Ib  o  acerto  deíTa  reprefentação,  p. 
334-  Ql^aiTti  errada  he  a  eílimaçáo 
daquelles,  que  íb  eftimaõ  o  q  vem 
com  os  olhbs,p.g78. 

Oppojií^ão.  Ha  de  preferiríe  a  graça  à 
gloria.-  porque  o  oppofto  da  graça 
.  he  naô  amar  a  Deos ;  6c  o  oppofto 
da  gloria  he  náo  ver  a  Deos,  p.^7  7. 
ufq.ad  gSo.  Como  íèrvem  as  lem- 
bras, &  os  oppoftos,para  mais  illu- 
ftrar  os  contrarioSjp.^oz.  ufque  ad 
5-04. 

Oração.  A  efficacia  da  Oração  de 
Chrifto  no  Horto,foi  a  que  futili- 
2.0U  o  fangue  nas  veas,6c  o  fez  ma- 
nar em  ftior,p.  1 79.  E  iftb  para  fer 
anticipado  o  preço  da  rcdempçaó 
da  Senhora,  Ibid. 

Ovelhas.  Como  o  bom  Paftor  nam  ha 
d€  defemparar  as  fuás  Ovelhas,  p. 
a98.urq.ad300.Eem  t|uecafo  lo 
poderá  ter  elcu  fa  para  Ò  fazer,  pag. 
goi.  Argumentaíé  contra  eftacl- 
cufíjp.goi  ôcdeinccps. 


pAçtençh. 


o 


Diviniífimo    Sacra- 
aientQa  huns  Mar- 


tyrcs  fazia  impaíTiveis  pela  impaf- 
ribihdade.&  a  outros  pela  Pacicn- 
cia^.261 

P^fo.DefpofarfeDcos  no  Paço  ,  hc 
inaravilha  grande, p. 5-54. No  Paço 
ainda  quando  o  conhecem  os  mui- 
tos annos,nam  fe  atreve  ao  deixar 
os  poucos,p.^42. 

Paj.  Como  S.  Gonçalo  ainda  hoje  hc 
Pay  de  familias,p.3 1 7.Qué  he  filho 
do  Pay  do  Ceo,contentarfe  ló  com 
o  íeu,he  peccado  grande,  que  co- 
mete contra  o  Ceo,p.457.Nam  le- 
ra verdadeiro  Pay,  nem  verdadei- 
ra Máy  o  que  nam  cftimar  menos 
os  íeus  bens,que  os  de  feus  filhos, 
p,465'.  Entre  todos  os  elementos 
fó  o  fogo  nam  hc  Pay,p.484. 

Paraholas.  Em  três  Parábolas  nos  re- 
fumio  Chrifto  em  fummatoda  a 
conta,  que  nos  ha  de  pedir  no  dia 
do  Iuizo:Ôc  quaes  fam,  p.35.  &  de- 
inccpf. 

Paraifi.  O  Paraiíb  Terreal  foi  a  pri* 
meira  ícerta,  cm  que  aparece  o  o 
mundo,  p.  4,  Atè  no  Paraifo  Ter- 
real havia  bens  com  miftura  de 
males. 

Pão.  Quando  os  doze  Apoftolos  re- 
partiram entre  fy  o  mundo,fe  leva- 
ra cada  hú  configo  a  fua  alcofi,dos 
fragmentos  do  Paó,com  q  Chrifto  1 
deo  de  comer  a  cinco  mil  homens, 
baftariáo  aquellas  fobras  afuftcn- 
taromundo  todo,p.269.  i7o.Em 
hum  milagre  que  S.  Gonçalo  fez 
noPfiOjíèvcmos  cfFcitos  da  Ex- 
communhão,&  abfolviçáo,  p.294. 
Muito  melhor  fc  governaria  o 
mundo,  fe  viílcaios  pobres  de  Pát> 
~   ~      0$ 


coiifas  mais  notáveis.  ,    r^,  ^P 


P^fior.  O  melhor  P;iíi:or  de  todos,  he 
o  que  fendo  mancebo  Tabe  fer  Pa- 
ftor,p.i9i.A  maior  falta  dos  Faftò- 
res  he  a  do  valor,p.292.  O  bom  Pa- 
Itor  não  ha  de  fer  tudo  bondade,  p. 
197.0  bom  Paftor  naó  deve  defem- 
pararas  fuás  ovelhas,  p.a98.ufq.  ad 
300.  E  quando    poderá  terefcuía, 
paraofazer,pag.5oi.  Argumentafe 
contra  erta  efcuía,p. 301.6c  ulterius. 
Pdz..  No  tempo  da  Paz  pòdcfe  fofrer, 
que  fe  dem  os  lugares  àsgeraçoens: 
mas  no  tépo  da  guerra  não  fe  háõ 
de  dar,fenão  às  acçocns^p.  118. 
Peuados.  A  vida  paíla,  6c  os  peccados 
não  paílaò,p.i4.&:  ulterius.  Excep- 
tos  os  que  peccâo  com   ignorância 
invécivel,os  demais  peccaó  no  pec- 
cado,6c  na  ignorância,  com  qo  naó 
conhecem,p.53.  Todos  os  peccados 
dos  fubditos  fe  efcrevem  no   hvro 
das  culpas  dos  fuperiores,  p.  37.  Cà 
fica  tudo  aquillo,porque  peccamos, 
6c  o  que  fó  levamos  com  nofco,  he 
o  peccadojp.j^.  Quanto  mais  íegu- 
ro  he  ir  ao  juizo  de  Deos  có  pecca- 
dos,que  a  dos  homens  có  milagres, 
p.69.  A  quem  conhece  a  graveza  dos 
peçcadosjtodo  o  caftigo,que  naõ  he 
o  etcrno,lhe  parece  muito  pouco,p. 
105.  Como  havemos  com   David 
eonfidcrar  peccados,  &  mudar  epi- 
tetos,p.  12S.6C  ulter.  Os  noílos  pec- 
cados poílos  diante  dos  olhos  con- 
vencem-nos  a  nos  có  nofco,  p.»  g^,. 
Mais  fe  devem  temer  os  peccados,q 
o  juizo  dos  homens,  p.157.  Se  que- 
remos remiílaó  dos  peccados,  have- 
mos tomar  a  penitenciajcomo bau- 
Tom.7. 


ainda  q  foi  derramado  por  fua  Mây 
fantiírima,não  fe  derramou  em  re- 
milfaó  de  pòccados,p.i63.i64.  Af- 
fim  et) mo  Chrífto  fe  adiantou  a  re- 
dempçaó  de  fua  Mãy  ;  aífim  a  mef- 
ma  redempçáo  fe  anticipou  aopec- 
cado,  p.176.  Oímpeccavel  não  fe 
pode  fazer  peccador  de  culpa,  mas 
pòdcfe  fazer  peccador  de  penas,pag. 
55-2.  A  penitencia  honra  aos  pecca- 
dores:  os  innocentes  honraó  a  peni- 
tencia,p.  55-5-. 
Ptf^^K^^.  Porque  confidere  Deos  nana 
os  noíTos  paífcs,  fenaõ  as  nofias  pê- 
gadasjp.iy.iô. 
Penfamentos.Qnmto  ao  contrario  das 
obras  jutgaó  os  homens  os  Penfa- 
mcntos,p  71  .&  ulterius.Náo  ha  pe- 
na tão  exceffiva,como  hum  Penfa- 
mcnto  fruftradojp.fiS.ufq.  ad  520. 
Provafe  o  mefmo,  p.  5-1 7.5'28. 
Penitencia.  No  tribunal  da  Penitencia 
fe  julgâoojuizo  de  fy  mefmo,o  jui- 
zo dos  homens,&  o  juizo  de  Deos:ôc 
como,p.i2i.  écdeinceps.  Por  dous 
modos  faz  a  Penitencia,  que  os  ho- 
mens cheguem  a  fe  ver  interiormé- 
te,como  convém, p.  ii^.Gom  abrir, 
ou  fechar  hum  fentido  faz  a  Penite- 
cia  de;íprezar  o  j  uizo  dos  homens,  p. 
i:^4.Quefaz,6cdcvefazcro  verda- 
deiro penitente,  p.  136.&;  ulterius. 
As  injurias  íàó  a  muíica  dos  penité- 
tes,p.  1 38. 1 59.  Grades  exceliencias 
do  juizo  da  Penitencia  fobre  o  juizo 
deDeos,p.i47. 148.  Não  hafacrifí- 
cio  mais  fermofo  aos  olhos  de  Deos, 
que  húa  innocencia  illuílre  em  ha- 
bito de  Penitencia,p.  5-5-4. 

Tc  Per- 


ri- 


í>i8   ^  Index  das 

FerfeiçâõA  perfeição  naóconriile  nos       &  o  fim  junto  com  o  principio,  p.-; 


verbos,íenâo  nos  advérbios,  p.g. 

Perda  Çl}i-2im  pouco  fefintaó  as  per- 
das da  graça,p.g97.Como  Te  devem 
pefar  em  balança  as  perdas  da  eJci- 
çáo  da  graça,  p.^98. 

JPez.o,hs  profecias  não  fe  haó  de  julgar 
pclonumerojfenâo  pclopezo,  pag. 
ui.Qijam  pouco  pezaoos  homens 
o  morgado  da  graça,p.ç^99. 

Vohora,  Qiiem  foioprmieiro  inven- 
tor da  Polvora,p,492.Mas  íèbem  íè 
lerem,8c  entenderem  as  Efcrituras, 
acharemos,q  quatro  mil  annos  antes 
a  tinhajà  inventado  Deos,  pag  504. 

Predejimaí^ao.  Nas  acçoens  fe  haõ  de 
fçgurar  as  Predeílinaçoens,p.i  19. 

Prelados.  De  cjue  tomará  Deos  conta 
no  dia  do  luizo  a  hum  Prelado,  pag. 

.  ^9.uíq.ad4i. 

Premio.  hm-siY  íí  graça  por  amor  da 
gloria,  he  querer  gozar  o  premio : 
amar  a  gloria  por  amor  da  graça,he 
querer  icgurar  o  amor,  p.  416. 

Prefir/-/pçao.  Todo  o  talento  he  arrif- 
cado  ao  perder,  ou  a  naó  dar  boa 
conta  delle  a  prefumpçâo^humana, 
p,4f.ufq.ad47. 

Príncipe.  Pela  primeira  faludadc,em  q 
G  Vaílallo  for  achado,hade  logo  cair 
para  fempre  da  graça  do  Príncipe, 
p.4i:5,Náoha  couía  que  mais  cre- 
Ça,que  os  lados  dos  Príncipes,  pag. 
4if.ulq.ad4i7.  Omaiorahuíò  ,& 
rifco,  que  tem  a  graça  dos  Princi- 
pes,hc  andarem  o  páo,&:  a  graça  jú- 
tos,p4i:^. 

Prmaprj.  No  dia  do  luizo  fc  verá  o 
pnncjpio  do  mundo  junto  cõ  o  fim. 


Qual  foi  a  primeira  fcena  no  prin- 
cipio do  mundo,  p.4.  Quãdo  comc- 
çou,&  teve  principio  a  idolatria,  p. 
y.Quando principiarão  as  guerras, 
íbid.Iulgaros  fins  pelos  principio?, 
he  juizoincerto,p.75'.Quem  come- 
çar bem,&  acabar  bem,ha  de  come- 
çar pelo  fim,&  acabar  pelo  princi- 
pio,p.g27. 

PrivilegtQ.  He  Privilegio  concedido 
noCeoaos  Virgens,que  elles  íó  fi- 
gáo  ao  Cordeiro,que  he  Chrifto ,  a 
todas  as  partes  por  ondc,&  para  on- 
de forjp.^of.  Efte  mcfmo  Privile- 
gio teve  S.Gonçalo  natena,6c  por 
modo  mais  fupcnorjlbid. 

Profetas.  Qiiantos  Profetas  ouve  no 
PovoHebréo,p.  i2.  E  como  todos 
pafiáraójlbid.Como  íe  prczáo  algús 
de  Profeta8,p.io8. Por  onde  Je  hão 
de  conhecer  os  verdadeiros  Profe- 
tas jp.iop.ufq.  ad  115, 

Q 

jQ^edts.  /'"^I-^ugur  mais  alro  he  o 
y^  ^  que  mais  diípoem  pa- 
ra fecaii-dtI!c,p.zio.Não  ha  altura 
neítemundojque  naó  íeja  prccipi- 
cio,p,2ii.  Todos  os  lugares  akos, 
ou  Icjaó  ÓG  Cco,ou  da  terra,  ou  na 
lgreja,ou  fora  dclln,  íaoos  mais  pe- 
rigolòs,  &:  os  mais  aparelhados  p*ia 
a  caida,  p.  iii.  Dos  lugares  altos, 
ainda  que  né  todos  cahiráo,  podiáo 
cahirjScil]bbaíi:a,para  naô  lerem  íè* 
guros,p.2 15.214.  Ainda  que  no  ul- 
timo lugar  também  pode  haver  ca- 
hidas,ifibfe  entende  dos  qnellcçf- 
tiveremcm  pc,mas  naó  deitados,  p. 
215.  ^.e. 


jOucflão.  Puzerão  alguns  Thcologos 
^m  Queftáo  ,  qual  dos  criados  da 
Parábola  dos  talentos  íe   moílrára 
mais  induftrioío,  p.46.47.  Difputa- 
fc  a  Qiieftâo,de  quem  he ,  &  o  que 
diz  de  ly  cada  hum  de  nos,  p.  88.  & 
deinceps.  HeQiieíHo  dos  Expofi- 
tores.feeílàaindao  Cherubim  rio 
Paraifo  guardando  o  que  elle  guar- 
dava, p.  25-9.  &  %6o.  <Jueílâo  grave 
entre  os  Theologos :  em  que  coníi- 
ftc  no  homem  o  Ter  imagem  de 
Deos,  p.  332.  Outra  Qiíeítão  dos 
Thcoiogos,re  Adão  pela  defobedi- 
encia  perdeo  o  fer  ,  que   tinha,dc 
imagem  de  Deos,p.35-2. 
Olíietação.  O  ultimo  lugar  he  o  me- 
ihor,por  fer  o  mais  quieto,  p.2i6.6c 
ulterius.  O  homem,  que  íbube  naô 
querer  outro  lugar, fenaó  o  ultmio, 
he  o  que  logra  a  verdadeira  Quicta- 
çaõ,p.zi7.  218.  Ainda  que  não  haja 
fnveja,  nem  competência  dos  luga- 
res altos,elles  mefmós  fe  inquietaó, 
ôc  a  quem  eftá  nelles,p.2i9.&  210. 

D 

Rajõs.  \  /í  Ais  he  necellario  para 
*".^  j  V  1  figurar  noarhúRayo 

-i^iatural.que  na  terra  hum  artificial, 
p.494.  Quanto  maior  eftrago  fazem 
eítes.lbid.Muitos ouve,  que  quize- 
ráo  imitar  os  Rayos,  que  a  Gentili- 
dade chamava  de  lupiter,  p.495'.  A 
•^  íjue  fe  reduz  todo  o  apparato  .  &  fa- 
'ÍJ'1)rica  eíb-ondofa  de  hú  Rayo  no  ar, 

'  '^Reder/ipç^o.  Aílim  no  Horto,comò  no 
Calvário  obrou  Chrifto  aRedemp- 
çáo  de  ilia  Mãy :  mas  no  Calvário , 


côufàs  mais  notáveis. 


619 

como  univerílilmentc  rcmida:6c  no 
Horto,como  fingukrmente  prefer- 
vada,  p.169.  Anticipoufeo  fangue 
do  Horto  ao  da  Cruz  ,  porque  foi 
conveniente  ao  Myílerio  da  Con- 
ceição da  Virgem,  que  o  preço  da 
Redempção  da  Senhora  foíTe  tam- 
bém anticipado,p.  1 78. 1 79. 
Regimento  Mos  Governadores  naó  ti- 
rarem os  olhos  dos  Regimentos  de 
jeus  Reys,teràó  femprc  prefentes  as 
fuás  imagens,5c  figuras,p.350.urque 
ad  55-4. 
Rtys.  Os  Reys,que  tinhão  fido  os  ido- 
latrasjou  eri)^vida,ou  depois  da  mor- 
te, vinhão  também  a  fer  ídolos,  p.7. 
E  como  paíláraõtodosJbid.Dc  qu,e 
tomara  Deos  conta  a  hum-Rey  n» 
dia  do  luizo,  pag.57.38.  A  diftancia 
entre  os  Reys ,  ík  icus  valTallos  im- 
poflibilita  a  boa  reprefentação  de 
fuás  imagens,p.:^37.  Qi-iãdo  os  Reys 
vão  do  íèu  Reyno  às  Conquiílas,5c 
das  Conquiftat  tornaõ  ao  Reyno  , 
aquelles  longcs  tem  depois  os  feus 
pertos,íp,  339.  Quando,6ccomo  as 
fombras  deitas  imagens  dos   Reys 
excedem  a  medida  de  que  íaõ  ima- 
gens ,^341. 342.  Os  Reys  no  que  ef- 
crevem,5í:  ordenão,  fe  retratâo  a  fy 
mefmos,pag.  35 i.Qiic  conceito  fez 
ElRey  Salamaõ  dos  bens  deíle  mú- 
do,p.437.ufq.ad439.  ^ 

Reynos.  Pãflaó  os  Reynos  de  hua  par- 
te para  a  outra,p.  18.  E  quantas  ve- 
xes tem  pafiado  o  de  Portugal,  Ibid. 
Não  fe  podem  julgar  com  acerto  os 
fins  dos  Reynos  pelos  principios,  p. 
76.  QiialheoReynodo  Ceo,  que 
Chrilto  chama  femcihante  ao  thc- 
Tt  ij  fouro 


D- 


620 

louro  efconJido,  pag.472.^ 

Religião.  Os  Martyres  pagaô  a  Chrifto 
na  Cruz  ,  os  Religiofos  pagaõ  a 
Chrifto  naReligiaó,':).56i.Qiieca- 
lidades  tem  a  cella  de  hum  Rcligio- 
fo,para  íc  comparar  com  a  lepultu- 
ra  de  Chrifto,p.^6i. 

Remsdio.  Que  remédio  nos  poderá 
livrar  da  cirannia  dojuizodos  ho- 
inens,p.84.urq.ad  86.  E  como  fe  en- 
tende eíle  remedioJbid.Pelo  remé- 
dio dos  homens, parece  ,  que  muda 
Deos  de  condição,p.  140. 

Rendas.  O  coração  do  Príncipe  ha-fe 
de  eíli  mar  pelo  rendimento,  &  naó 
pelas  rendas :  ha-fe  de  eílimar  nellc 
o  rendidojôc  naoo  rendoíò,p4i5'. 

Republica.  Ondenaíceo,8c  como  tem 
pafíaJoa  Republica  Hcbréa,pagin. 
II. 12. 

Revogação.  No  tribunal  da  Penitencia 
o  juízo  de  Deos  revogafe,  p.  142. 6c 
deinceps. 

.Rezjão.  DuasHióasrezoens  ,  porque 
tudo  neíle  mundo  paíra,p.  14.6c  de- 
inceps. O  juízo  de.  Deo?  começa 
defde  o  ufo  da  rezão  por  dianterSc  o 
dos  homens  muito  antes  do  uíò  da 
rezão julga,&  condena,  p.  8i.  Nas 
matérias  eípirituaes  o  que  coftuma 
fazer  o  tempo,melhor  he,que  o  faça 
a  razáo,p.5':^9. 

Rrfco S'ào  \-n;\\s  aniícados  os  talentos, 
que  na  eminência  íè  cílremão  fobrc 
todos,',).47.0  maior  abuíb,&  ama- 
iornlco,qiie  tem  a  graça  dos  Prín- 
cipLS,he  andarem  o  pão,  ík.  a  graça 
juntos,p.4i^. 

Rftina.  O  ukimo  lugar  he  o  mais  íc- 
curo ;  nos  outros  a  fua  mefma  aku- 


Indexdas 

ra  he  o  pronoílico  certo  de  fua  rui- 
na,p.209.ufq.ad  iijT. 


Sabedorin.  \  Mageílade  do  poder 
x\  qualquer  a  pôde  re- 
prefentar  facilmente  .•  porem  as  ac- 
çoens  da  Sabedoria,faó  mui  poucos 
os  que  fejáo  capazes  de  as  exercitar, 
p.3^5'.  Quanto  fe  preza  a  Sabedoria 
de  Deos  dos  thefouros  efcondidos , 
quefez,6ctem  neíle  mundo,p47^. 

Sacramento.  Pela  Encarnação,  Dcoí;,q 
era  unmenfo,  ficou  limitado  a  hum 
íó  lugar :  &  pelo  Sacramento,Chri- 
fto,que  era  limitado,  ficou  imméfo, 
&  eílà  em  todos  os  lugares,  p.  i  ^4. 
A  mefma  difteréça  dos  Attnbutos 
divinos  fe  vè  em  Chndo  pela  En- 
carnaçaôySc  pelo  Sacramento,  Ibid. 
Chriílo,  em  quanto  íàcramentado, 
beo  Cordeiro  de  Deos,  que  tira  os 
peccados  do  mundo,  p-i^)*.  ufq.  ad 
2:^8.  Aperturbaçaô,quecauíbu  nos 
Apoítolos  a  doutrina  de  Chriílo, 
quando  lhe  profetizou  a  comida  de 
ícu  corpo  no  Sacramento,  p.140.  E 
como  Chrifto  íatisfez  às  fuás  diffi- 
culdades,p.  241.  O  corpo  de  Clwi- 
fto,aííim  como  eftà  no  Sacramento 
transformado  cm  fy,afltm  eftà  tam- 
bém transformado  para  nòs,  p.244. 
A  immeníidade  divina,dc  que  Deos 

-fe  defpío  pela  Encarnação,  fe  reve- 
ílio  outra  vez  pelo  Sacramento,  pag. 
24f.  ufq.ad  25'!.  O  terceiro  vafio  da 
divindade  na  Encarnaçaõ,que  he  a 
Eternidade,he  o  tcrceiroAttributo, 
q  Chrifto  encheo  pelo   Sacraméta, 

P*< 


coíifas  mais  notáveis 


621 


y>.i5'i  .iifq.ad  168.E  efla  meíma  pre- 
rogativa  de  eterno  nos   comunica 
Chnílo  no  Sacramento,  p.iyç.xdo. 
Como  fe  nos  cômunicáo  no  Sacra- 
mento os  effeitos  de  immortaí  ,  Sc 
impairivel,p.264.uíq.ad  164.  O  va- 
fio  da  infinidade  do  Verbo  na  En- 
carnação íuprio  também  o  corpo  de 
Ciinllo  no  Sacramento,  p.  ló/.ufq. 
ad  270.E  como  fe  nos  comunica  pe- 
lo Sacramento  efte  eíFeito  de  infini- 
tojp.i/o.ufq  ad  iji.Seo  Verbove- 
ftindofe  de  corpo  humano,  de  invi- 
fivel  fe  fez  vifivel  j  o  mefmo  corpo 
depois  íe  fez  inviíivej  no  Sacramen- 
to,p,r73.E  efla  mefma  invifibilida- 
de  nos  comunica  Chnílo  facramen- 
tado,IbidAiíq.ad  175.  Porque  nam 
quiz  Chriílo,queno  Sacramento  fi- 
ca lie  a  lullancia  de  paõ,p,  423,50  no 
Sacramento  ha  exemplo  de  comu- 
nicação total,  6c  toda  em  todos  ,  ôc 
tota],&  toda  em  cada  hum  ,  p  45:9. 
O  Sacramento  da  Euchariíbahe  o 
myftcrio,em  que  Deos  fe  defpofò  cõ 
noflasalmas,p.55f.  Porque  diz  Za- 
charias,que  o  íacrificio  do  corpo*  6c 
fangue  de  Chrifto  no  Sacramento 
he  melhor  que  todos,p.5"5-r. 
SAlv>'íção.Como  os  meyos  entre  fy  c5- 
tranos  nos  podem  levar  igualméte 
á  falvaçáo,p.4.g.  44.  Os  que  deixâo 
a  penitencia  para  a  hora  da  morte, 
raramente  fe  faivaa,  p.  » 5'!.  A  todos 
falvou  Cbriíío :  mas  a  fua  íantifiima 
Máy  propnamente,como  defenfor, 
pag.187. 

Sangue.  Pelo  fíingue  de  Chrifto  ficou 
a  Virgem  Marra  fua  Máy  livre 
do  cativeiro  dopeccado,  p.ióz.ufq. 


ad  165'.   Não  foi  o  primeiro  Jangue 
da  Cruz,fenão  o  do  Horto ,0  q  Chri- 
fto  derramou  por  fua  Máy,  p.  16Ó.& 
ulterius.  O  effeito  geral  do  fangue 
da  Cruz  foi  remir  jS:  o  particular  do 
langue  do  Horto,remir  prefervan- 
do,p.i7o.ufq.ad  1 72.  He  virtude  do 
fangue  de  Chrifl:o  poderíe  dar,  an- 
tes de  fe  receber,p.  1 77. 0  fangue,  q. 
Chriílo  fuou  no  Horto  ,  foi  o  mél- 
mo,que  na  Encarnação  tinha  rece- 
bido de  fua  fantiílima  Máy,  p.  181. 
ufq.ad  184.  O  fangue  de  Chriílo  té 
virtude  para  nos  prefervar  dos  pec- 
cados  futuros,.p.i89.  Porq  chamou 
Chriílo  teílamento  ao  feu  lângue,6c 
não  aofeucorpo,p.409.  Quando  as 
obrigaçoens  da  fmgue    íè  deixão 
por  amor  de  Deos,  naó  hc  fazer  of- 
fc-níí^he  fazer  lifonjaao  Sacramen- 
to,p.56fmfq-ad  5*67, 
Santidíde.O  que  deve  fei*  o  homem, 
que  logo  começa,6c  ha  de  fer  grarft. 
de  Santo,p.287.  Também  na  laati- 
dade  ha  fortuna,p.404. 
Segurança.  O  ultimo  lugar  he  o  mais 
leguro:o3oucros,quanta  mais  altos, 
tanta  me  nas  fegurança  tem,  p. 2, 09. 
ôt  deinceps.  Dos  lugares  altos,ainda 
que  nem  todos  cahíraó ,  podiaãca- 
biri6c  ifto  baila,  para  não  ferem  a 
verdadeira  fegurança,p,2i3^2i4. 
Segredo'.  Nenhum  fegredo  he  íegreda 
perfcitOj  fenão  o  que  pafla  alerig- 
nora.ncia,p42o.Não  dizer  hum  ho- 
mem o  fegredo,  que  i-abe,  he  guar- 
dar íegrâo.às  coufas;  mas  naódi- 
zeivque  labe  o  fegredo,  he  guardar 
fegreda  ao  íegredo:  &iílohe  mui- 
to mai  or  fegredo,p .  422^ 


l 


<;2i 


Index  das 


Scti^cKças.Q^mc^  fao  as  fcntenças,onde 
a  vontade  he  juiz,p.62.65. 

Sepultura.  Qiie  calidades  tem  hiima 
ceiia  de  Religioíb  ,  para  fe  cõparar 
com  a  Tepultura  de  Chrifto,  p.fó i . 

Sinal.  Nojuizode  Deos  os  finais  dizé 
com  o  juizo:6c  no  juizo  dos  homens 
o  juizo  não  diz  com  os  finais  ,  p.  82. 
Muitas  coufasfe  vem  hoje  daquel- 
las,queos  Profetas  antiguamente 
deraó  por  finais  dos  tempos  do  Meí^ 
fiasp.94-95'.  O  coração  he  o  verda- 
deiro final  da  profccia,p.  1 1 1. 

Sombra.  Antes  de  haver  no  mundo  a 
Arte  da  Pintura.retratavãofc  os  ho- 
mens pelafua  rombra,p.g4o. 

Sjóida.  Porque  he  mais  facil  o  íubir  , 
que  o  decer,  por  ifio  os  últimos  lu- 
gares faó  mais  fáceis  de  confeguir, 
p.  205.6c  ulterius. 

^/.Tí-fj^/ôi.  Os  fucceflos  íàõ  final  de  co- 
nliccer  os  Profetas,p.  1 14. 

€uperiores.M^\oY  Ibgeição  he  a  dosSu» 

.  periores,que  a  dos  fubditosjp.  37. 

T 

Talentos.  ^""^Omo  nodia  do  juizo 

\_y  ha  de  pedir  Deos  cota 

dos  Talentos,que  deo  nefta  vida  a 

cada  hum:  &  quacs  faó-xftes  Talen- 

tos,p.4i.urq.ad47.  Qiianto  vaHam 

'   os  Talentos  Hebraicos,p.48. 

•Tonpo.O  tempo,&  o  nada  laó  as  duas 
cauíàs  , porque  tudonefte  mundo 
paflã,p.  14.6c  deinceps.  Como  fc  àcC- 
creveotempo,  Ibid.  Muitas  coufas 
levem  hoje  das  que  antiguamente 
dcríioos  Profetas  por  finais  dostc- 
pos  do  Meífias,  p.95'.  Nas  matérias 


temporacs,o  que coíluma  fazer  c  tc- 
po,bem  he  que  o  faça  o  tempo  :  mas 
nas  matérias  eípirituacs ,  o  que  co- 
ftuma  fazer  o  tempo, melhor  he  q  o 
faça  a  razaôjp.^gp. 

T^rra.  Ainda  que  a  terra  toda  não  paí- 
ra,pairaõ,  &  fempre  eíláo  paliando 
todas  as  partes  della,p.i7.uíq.ad  10. 
Todos  os  lugares  da  terra  mais  faó 
alheos,quenoílos,p.i99.ufq.ad  201. 
Se  aterra  tivera  olhos,  vendo  tudo 
o  que  fe  move  entre  ella,  &  o  Ceo  , 
fe  havia  de  contentar  muito  de  fer 
cila  o  ultimOjSc  mais  baixo  lugar  do 
mundo,p.ii  7.  Outro  grande  docu- 
mento defta  verdade  nos  da  a  terra 
nasarvorcs,p.22o.22i.Náo  ha  ter- 
ra mais  difficultofa  de  governar ,  q 
a  Patria,p.g29.  Que  pouco  calo  Ic 
deve  fazer  dos  bens  da  terra,  p.45'7. 

Tefiamento.  Porque  íe  não  deixam  os 
amigos  cm  tcíhmcnto,  p.408, 

Tcftemktjha.  Os  homens  quando  tc- 
Itemunhaó  de  ly  mefmos,húa  couíà 
he  o  que  íaó,&;  outra  coufa  hc  o  q 
dizem,  p.  89.  A  arte  he  teftemunha 
para  prova  dos  bens  doCeo,puros,&: 
jèm  miítura  de  mal,p.446. 

Thefifíro.  Húa  das  coufas  admiráveis, 
que  fez  Deos  neftc  mundo ,  &  de 
que  muito  fe  preza  lua  fabedoria  , 
íãóos  thefouros  eícondidos,  P472. 
Qual  he  o  mais  nobre ,  Ôc  o  mr.is  iii- 
códido  theíòuro  doVnivcrfo,p.474. 

T)v^««.?/.  Ojuizodefy  mefmo  entra 
no  tribunal  da  Pcnitccia  có  os  olhos 
tapados,p.ii4.  Ojuizo  dos  homens 
entra  no  mclino  tribunal  có  os  ou- 
vidos fechados,  p.  154.  O  juizo  de 
Deos  também  fe  julga  nelle  tribu- 
nal 


covfasmais 
nal  revogantíofc,  com  voltarem  os 
homens  ocoraçaô,p.i44. 

Tri»dade.  Porque  razaó  o  dar  le  attri- 
buc  à  terceira  Pcílba  da  Santiílima 
Trindade,^  o  julgar  á  fegunda,  p. 
6i .  Entre  todas  as  creaturas  irracio- 
naes,  nenhúa  traz  em  íy  mais  im- 
preílò  o  caraòtcr  da  fantiffimaTrin- 
dade,que  o  rayo,p.485'. 

T/z/^íÇ-íi.  Náo  ha  alegria  neíle  mudo 
taó  privilegiada,quc  naó  pague  pen- 
íaó  à  triíl;eza,p.443. 

Trintifo.  A  maior  oítentação  da  gran- 
deza dcfte  mundo,  foi  a  pompa  dos 
Triunfos  Romanos,p.io.2 1 . 

Trovoens.  Rayos ,  &  trovoens  faô  as 
mais  teracroíàs ,  &  formidáveis  ar- 
mas de  Deos,p.488^ 


V 


/\ eidos  de  nòsmeflnos, 
porque  trazemos  os  olhos  por  fára, 
6c  a  nos  por  dentro,  p.  1^7.  Qtianda 
para  confeguir  os  intentos  da  vaida- 
de não  baítaõ  todos  os  homens;  pa- 
ra os  da  caridade  baila  humío  ho- 
memjp.^i^.  Porque  Deos  he  mife- 
te-  ricordiof),  ôc  verdadeiro,  poriílb 
nos  ha  de  dar  a  graça,  Sc  mais  a  glo- 
ria,p.:^69.T7o. 

FalU.Quc  valle  de  lagrimas  hc  aquela 
le,onde  fó  o  home  afliílido  da  graça 
de  Deos  pocm  q  íeu  lugar,  p.122» 
Valido .Dcvzç^ò  a  Valido,  amda  que 
Santo,he  efcrupuloíiuicvaçaõ,  pag, 
406.OS  Validos  haô  de  fer  Èvange, 
hftas,p4ii.  Os  Validos,  haó  defi- 


notdveis..  ^  ^z  3 

car  como  dantes  era5,p.4i  5*. 
;^^í7.Tudo  Deos  criou  vafio:  mas  lo- 
go enchco  tudo,p.x76.  Depois  que 
Deos  pelo  beneficio  da  Encenação 
fe  fez  n*mão  noflb ,  nos  defpaaharà 
cheos  de  tudo  o  que  a  nofla  necef- 
fidade  lhe  reprefentar  vafio ,  P.277V 
Como  eílaráa  graça  lempre  chea  > 
8c  nunca  vafía,p.2  79. 
Felhice.  N í\o  conúilc  a  velhice  na  cor 
dos  cabellos,  fenaó  na  pureza  da  vi- 
da,p.z92.  A  velhice  he  idade  ,  para 
ter  trabalhado  ,  6c  não  para  traba- 
lhar: para  ter  feito,  Ôc  não  para  ia- 
.  2er,p.:^G9.G  muito  que  S. Gonçalo 
trabalhou,  ainda  depois  de  velho, 
Ibid,  Híáa  velhice  enganada ,  he  a 
maior  fem-razão  do  tempo :  humà 
mocidade  deíenganada,  he  a  maior 
vitoria  da  razaó,p.  5*4 1, 
Fenda.Toà^s-ãS  vezes    quehumho« 
mem  peo€a,,vçndeíè  pelo  feu  pecca- 
do,p.i52, 
Férdé{de,Deots]u\g!i  com  verdade  cla-^ 
ra :  6c  os  homens  fingidamente,pag, 
8:^.Se  a  nofla  penitencia  tora  verda- 
d£ira,haviamos  fazer  pouco  caio  das 
opinioensdo  mundo,  p.  154.  Que 
-fazjôc  deve  fazer  o  verdadeiro  peni- 
tente,p.  igô.Sculterius.  Quem  naai 
falia  vei'daáe,nâo  ama,  P4 1  :^, 
Vidos.  A  Providencia  divina  faz,  que 
os  noílbs  próprios  vicios  íejaó  tefte* 
munhas  de  noíla  Fè,  p.  57.  Qiianta 
tem  os  maíes  viciado,  6c  corrompi-, 
do  os  bens  defte  mundo,p.442, 
Víd4.  Tudo  pafia  para  a  vida,6c  n^a 
pafla  para  a  conta,  p.  :^.  6c  deinceps. 
Todos  imos  embarcados  na  mío  de- 
lia vida iSc  como  navegamos  nella. 


62^  In  de. 

pag  21 .  A  vida  paíla,  6c  os  peccados 
nfio  pafi{iõ,p.24.Sc  uicerius.  Tudo  o 
que  paflbu  para  a  vida ,  he  o  nada,  q 
não  paliou  paraa  conta,p.i7.  Se  fo- 
lies leproíb  algum  día,ainda  q  Deos 
faça  milagres  em  vòs,leprofo  haveis 
de  fer  toda  a  vida,pag.77.  Deos  não 
nos  julga  mais,que  as  duas  partes  da 
vida :  6c  os  homens  atè  a  terceira,  q 
hc  a  do  rono,julga5,  p.  Si.  Os  luga- 
res deita  vida  mais  faó  alheos,  que 
próprios, p.ioi.Húa  vida  encerrada 
entre  quatro  paredes ,  nenhum  no- 
me lhe  vem  mais  próprio,  que  o  de 
morta,6c  fepultadajp.i/f.Dividife  a 
vida  dos  homens  em  quatro  partes, 
com  nome  de  quatro  vigias,  p.  285. 
Como  andaó  travados  neíla  vida  os 
goílos  có  os  deígoílos,p.  441.8c  ulte- 
rius.  Quam  mal  reputada  he  a  vida 
dos  Palacios,p.5'36.  A  melhor  parte 
dos  bens  defta  vida,hÊ  o  eíperar  por 
clles,pag.5'48. 

F/^/4.Dividilèa  vida  do  homem  em 
quatro  partcs,com  o  nome  de  qua- 
tro vigias,p,i83.  S.  Gonçalo  naófó 
foi  Santo  delias  quatro  vigias.fenao 
da  quinta,p.285'.6c  deinccps. 

Vmganu.  Aílim  como  Deos  feito  ho- 
mem quiz  morrer  na  Cruz  ,  para  lè 
vingar  do  Demoniojaflim  traçou,  q 
nòs  o  comeflcmos  no  Sacramento , 
paracontinuar,&  coníumar  ameí^ 
:  ma  vingança,p.264. 

Vt^íi.  A  differença  da  honra,com  que 
Deos  communica  no  Ceo  aos  Bcm- 
aventurados  a  fua  viíla ,  6c  na  terra 


xdas 

aos  que  o  amao  a  ília  graça ,  moÍRra 
quanto  a  graça  deve  ler  preferida  à 
glo.na,  p.  5  8  í .  E  a  razão  defta  vcn- 
tagem  he  i  porque  a  gloria,  que  ha- 
vemos de  gozar  no  Ceo  pela.  \i:hi, 
cá  a  poíliiimos  na  terra  pela  graça, 
pag.382. 

Vocaí^ao.  A  maior  divida,de  que  have- 
mos dar  conta  a  Deos  no  dia  do  lui- 
zojhe  a  da  vocação,  p.51.  Em  mui- 
tos caíos  não  baila  a  mclinaçáo ,  & 
deliberação  própria  \  mas  heneceíl 
faria  efpecial  vocação  divina,  p.goi. 

Vontade.  O  juizo  dos  homens  he  mais 
rigorolo,que  o  de  Deos :  porq  Deos 
julga  com  o  entendimento  ,  &  os 
homens  julgão  com  a  vontade, pag, 
60.  ufq.ad  64.  A  nofla  vontade  he 
feita  pela  medida  do  Ceo ;  6c  porq, 
p,447.Nòsmermos  por  noífa  von- 
tade baftamos  para  nos  dcfpojar- 
mos  dos  nollos  bens,p.45o. 


Zelo,  /'^Omofeenganão  os  que  fc 
V^^prezaó  de  muito  zclolos,  p, 

102.  Quanto  vai  de  zelo  a  zelo,  pag. 

10^.  Hahuns,aqucmo  zelo  come; 

&  ha  outros,que  comem  do  zelo,  p. 
j  04.  Qual  ha  de  fcr  a  igualdade  do 

zelo,p.io5'.  E  qual  he  a  condiçam 
do  verdadeiro  zelo,  p.106.  Qiiantas 
maldades  fe  cometem  debaixo  da 
capado  zelo.p.ioó.ufq.ad  108. 


FINIS. 


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